sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Pinheiros



Pinheiros

O meu último texto publicado no Correio dos Açores sobre a criptoméria, que considerei como sendo a planta mais utilizada como árvore de Natal, nos Açores, suscitou por parte de alguns leitores amigos alguns comentários, mencionando que nas suas casas, no passado usavam pinheiros.

Como me pediram algumas informações sobre os pinheiros, o texto de hoje é a eles dedicado.

O pinheiro terá sido uma das primeiras árvores introduzidas pelos povoadores na ilha de São Miguel. A propósito daquela árvore, o cronista Gaspar Frutuoso, no livro IV das Saudades da Terra, ao descrever a freguesia de São Roque escreveu o seguinte: “…porque tem um rico e grande pomar, com cento e sete grandes laranjeiras, todas arruadas por boa ordem, e um pinheiro de grande sombra e muitos limoeiros…”

Ainda sobre a introdução de pinheiros, há a registar o facto do capitão donatário Manuel da Câmara ter trazido de Lisboa, em 1553, sementes de pinheiros e que a sua cultura foi intensificada pelos padres da Companhia de Jesus que, por volta de 1750, fizeram grandes plantações nas Furnas, com grande sucesso, pois os mesmos foram cortados cerca de 40 anos depois, e no Charco da Madeira, que foram quase todos destruídos por um furacão ocorrido em 1779.

Outro facto relacionado com os pinheiros e que mostra o espírito empreendedor existente no século XIX foi a tentativa de aproveitar a sua resina. Estiveram envolvidos no projeto, por ordem decrescente das quotas que correspondiam à área de pinheiros: José do Canto (27%), José Jácome Correia (20%), Ernesto do Canto (20%), Barão da Fonte Bela (10%), Barão da Fonte Bela (Jacinto) (10%), Clemente Joaquim da Costa (8%) e Caetano de Andrade Albuquerque (5%). Embora com alguns resultados positivos em termos de extração da resina, o projeto foi abandonado, pois não compensava do ponto de vista económico.

Para além dos mencionados, entre outros, empenharam-se, no século XIX, na plantação de pinheiros bravos, Francisco Jerónimo Pacheco de Castro que os mandou plantar nas Furnas e José Pacheco de Castro que fez plantações na Gorreana e na Lagoa do Congro.

Outra nota curiosa, descrita por Carreiro da Costa, no primeiro volume do livro “Etnologia dos Açores” está relacionada com a utilização da resina numa festa realizada em Ponta Delgada. Segundo o autor citado, “em 1894, quando foi festejada, em São Miguel, a ligação do cabo submarino entre a Europa e a América, via Açores, a doca de Ponta Delgada foi toda iluminada com barricas de resina de pinheiro, extraídas das matas do Lameiro, pertencentes a José Jácome Correia”.

O género Pinus apresenta pouco mais de 100 espécies identificadas, sendo que nos Açores as mais abundantes são o pinheiro-bravo (Pinus pinaster) que já se encontra naturalizado e o pinheiro-manso (Pinus pinea).

Nativo da região Mediterrânica o pinheiro-bravo, segundo os autores do livro “Árvores de Portugal e Europa”, editado, em 1992, pelo FAPAS- Fundo para a Proteção dos Animais Selvagens, atualmente é cultivado “até à Grécia a E e atinge as costas atlânticas de França e de Portugal onde constitui a principal espécie florestal”.

Isabel Nogueira, no livro “Iconographia Selecta Florae Azoricae”, publicado pela Secretaria Regional da Cultura em 1988, depois de referir a importância da sua madeira para o fabrico de mobiliário, caixotes, aglomerados, etc., menciona a utilização na medicina. Segundo ela, “as gemas foliares postas de infusão e fervidas depois em água bastante açucarada produzem um bom xarope (xarope de seiva de pinheiro) que é utilizado na cura de catarros e bronquite”.

O pinheiro- manso, também originário da mesma região, por seu turno pode ser encontrado quer no Sul da Europa quer a Oeste da Ásia. É uma espécie muito cultivada devido às várias utilizações da sua madeira, por ser uma bonita ornamental e pelo pinhão que é comestível.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 32014, 27 de dezembro de 2019, p.19)

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Sobre a criptoméria, a árvore de Natal dos Açores


Sobre a criptoméria, a árvore de Natal dos Açores

A planta mais utilizada como árvore de Natal nos Açores será a criptoméria (Criptomeria japonica) que é conhecida, também, pelos seguintes nomes vulgares: Clica, Cricomé, Titomé, Clipa.

A criptoméria é originária do Japão, onde para além de espontânea é cultivada, sendo uma das principais árvores produtoras de madeira daquele país e onde, também, é muito usada como ornamental em jardins, bosquetes e alamedas. A. Fernandes, no livro “Iconographia Selecta Florae Azorica”, publicado em 1983, faz referência a uma avenida “plantada por um padre, OGO SHONIN, há cerca de 650 anos (717 se nos referirmos à data actual)”, com mais de 1 milha de comprimento e com árvores com uma altura que varia entre os 38,4 m e os 57,6 m.

A introdução da criptoméria nos Açores terá ocorrido em meados do século XIX numa altura em que escasseava a madeira para as caixas usadas na exportação da laranja e depois para a do ananás.

Nos Açores, nomeadamente na ilha de São Miguel a área plantada de criptoméria tem variado ao longo dos tempos. Em 1934, o engenheiro silvicultor, Gonçalo Estrela Rego estimava que em São Miguel a mesma ocupava uma área de 1327,26 hectares o que correspondia a 29,45 % da área florestal da ilha.

Depois do relatório de Estrela Rego, na ilha de São Miguel assistiu-se a uma plantação intensiva, em regime de monocultura de criptoméria, de tal modo que hoje a criptoméria é a espécie florestal mais abundante, destronando o pinheiro bravo que era a espécie que ocupava maior área, segundo um inquérito florestal de 1932-1933. No final do século passado a criptoméria ocupava a área de 10 600 hectares, o que correspondia a 69% da área de matas de São Miguel.

A madeira de criptoméria é muito usada na construção civil e a espécie foi muito usada como cortina de abrigo em zonas de pastagem e em estradas de altitude.

De acordo com A. Fernandes, já mencionado, o género Criptomeria, cujo “nome deriva das palavras gregas Kryptos, escondido, e meroe, partes” possui apenas uma espécie, existindo várias variedades.

Uma cultivar muito bonito e que é usado sobretudo como planta ornamental é o “Elegans” que dá origem a árvores mais pequenas, com altura que varia entre os 5 e os 10 metros.

Esta cultivar que surgiu no Japão em meados do século XIX, foi importada para a Europa em 1854 pelo inglês Thomas Lobb, não se sabendo quem a trouxe para os Açores.

Conheço há muitos anos uma sebe de criptoméria elegante numa pastagem existente nas Lombas, na freguesia da Ribeira das Tainhas, no concelho de Vila Franca do Campo. Os interessados em conhecer a planta também a podem encontrar num caminho existentes nas plantações de chá da Fábrica de Chá da Gorreana e no Parque Beatriz do Canto, nas Furnas.

Como não há bela sem senão, a plantação de grandes áreas de criptoméria para além de transformar a paisagem das diversas ilhas dos Açores colocou em risco várias espécies endémicas. Sobre esta questão, o botânico sueco Erik Sjögren no seu livro Plantas e Flores dos Açores, publicado em 2001, escreveu o seguinte: “Apenas algumas plantas da laurissilva conseguem sobreviver debaixo do forte ensombramento dos povoamentos adultos de Cryptomeria e sobre a camada espessa de folhas e ramos, que se deposita sobre o solo e impede a colonização da maioria das plantas….O corte da floresta nativa para plantação de Cryptomeria é uma forte ameaça à sobrevivência da floresta endémica da zona-de-nuvens, que pertence ao mais valioso tipo de florestas, com características de relíquia do mundo”.

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32008, 18 de dezembro de 2019, p.14)

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Jane e Alfredo Bensaúde e a educação


Jane e Alfredo Bensaúde e a educação

Jane Bensaúde, que nasceu em Paris em 1862 e faleceu em Ponta Delgada em 1938, foi casada com Alfredo Bensaúde, que nasceu em Ponta Delgada em 1835 e faleceu na mesma cidade em 1922.

Jane Bensaúde foi escritora de livros para a infância e autora de vários manuais didáticos, adotados para as Escolas Primárias. Um dos seus livros, o “Método Simultâneo de Escrita e Leitura”, publicado em 1930, foi alvo de uma longa referência por parte do pedagogo Adolfo Lima, na Enciclopédia Pedagógica Progredior.

De acordo com um texto publicado no Dicionário de Educadores Portugueses, obra dirigida por António Nóvoa, Jane Bensaúde defendia o seguinte:

“As crianças aprendem mais facilmente a escrever do que a ler. Reter símbolos gráficos convencionais, a que correspondem símbolos orais igualmente arbitrários, é um trabalho árido, puramente de memória, que em nada pode interessar uma criança. Não acontece o mesmo com a aprendizagem da escrita, que é uma forma especial de desenho. Toda a criança normal manifesta desde muito cedo a tendência para desenhar; aproveitando-se convenientemente esse desejo, ela é conduzida por este método, não só a traçar as letras do alfabeto, mas subsidiariamente, a reconhecê-las e a compor palavras com elas”.

Jane Bensaúde colaborou com a revista “Os Açores” tendo publicado no número de março de 1928 o conto “O gato maltês”, ilustrado por Domingos Rebelo.

Alfredo Bensaúde, filho do abastado industrial José Bensaúde, depois de estudar em Ponta Delgada, a conselho do poeta Antero de Quental, aos 16 anos foi estudar para a Alemanha, onde concluiu, em 1879, o curso de engenheiro de minas, na Escola de Clausthal e, em 1881, o seu doutoramento na Universidade de Göttingen.

Apesar das oportunidades que teve para ficar na Alemanha a trabalhar, decidiu regressar a Portugal, onde a partir de 1885 passou a exercer a função de professor no Instituto Industrial e Comercial de Lisboa.

Alfredo Bensaúde que repudiou o tipo de ensino que era praticado em Ponta Delgada que classificou de “verbalista e mnemónico”, segundo Carlos Enes, num texto publicado no já referido Dicionário de Educadores Portugueses, não aceitou o que era praticado em Lisboa, tendo introduzido “as novas pedagogias de um ensino técnico virado para a prática e a experiência, improvisando alguns aparelhos e custeando as despesas para a aquisição de materiais.”

A grande obra de Alfredo Bensaúde, ninguém tem dúvidas, foi a criação do prestigiado Instituto Superior Técnico, de que foi diretor desde a sua fundação em 1911 até 1920 e a reforma do ensino da Engenharia em Portugal.

Como pedagogo, Alfredo Bensaúde, defendeu, o ensino prático e a Educação Física que deveria começar no seio das famílias, hoje importantíssima num país onde a obesidade é grande entre os mais jovens que vivem obcecados pelos jogos de computadores. Também considerou “a aspiração à independência pelo próprio esforço” como “um elemento moral de mais valia para o êxito na vida”, o que ainda hoje é sobrevalorizada pelos docentes e sobretudo pelos pais que muitas vezes não se preocupam com a formação integral dos seus filhos, mas apenas com os resultados académicos (as classificações) dos mesmos.

Das obras de Alfredo Bensaúde, merecem uma leitura para melhor conhecermos o seu pensamento, a biografia de seu pai e a sociedade micaelense, as “Notas histórico-pedagógicas sobre o Instituto Superior Técnico”, publicação de 1922 e o livro “Vida de José Bensaúde”, editado em 1936.

Termino, este meu texto, com uma curiosidade: Alfredo Bensaúde foi um exímio construtor de instrumentos de arco, nomeadamente violinos. Esta sua paixão iniciou-se em 1875, ano em que interrompeu os estudos para aprender na oficina do construtor de violinos dinamarquês Jacob Eritzoe.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 11 de dezembro de 2019, p. 9)

domingo, 8 de dezembro de 2019

Árvores dos Açores


Está previsto o lançamento para 15 de janeiro

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Cenas da Vida Escolar


Cenas da vida escolar
Hoje, nas escolas há dois assuntos que estão na ordem do dia: a aposentação e o fim dos chumbos.

A aposentação é o tema preferido para os docentes que estão quase no fim da sua carreira e que quase todos os dias contam o tempo que está a faltar. Além disso, também, quase diariamente, é abordada a esperança da alteração das leis de modo a tornar possível a aposentação mais cedo ou a possibilidade da alteração das condições da pré-reforma de modo a torná-la mais atrativa.

O fim dos chumbos é o outro tema, havendo quem, ainda sem receber qualquer instrução superior sobre o assunto, já esteja a agir de modo a promover o facilitismo que tanto condenam nas supostas intensões dos governantes.

Certo que voltarei ao assunto, abaixo, dou a conhecer um relato que me foi enviado sobre o decorrer de uma aula do ensino secundário.

Quarta-feira, dia 15 de maio de 2019, um docente começa a sua aula e afirma que a mesma será sobre o efeito fotoelétrico e o contributo de Albert Einstein para a sua explicação, acrescentando que antes de fazer uma curta apresentação com recurso a um “powerpoint”, vai passar um pequeno vídeo sobre o assunto.

Um aluno que entrou na sala e pousou a cabeça sobre a mesa, sinal de noite mal dormida ou de má disposição, diz em voz perfeitamente audível por todos os presentes: Estou farto de ouvir brasileiros!

De seguida, baixa a cabeça sobre a mesa e assim fica cerca de 45 minutos, interrompendo alguns momentos de silêncio com gemidos.

Quando, finalmente levantou a cabeça, gemeu, cantarolou, bateu com os dedos na mesa, tentou falar com os colegas, interrompendo o trabalho que estavam a fazer.
Alguns minutos depois, o professor escreveu no quadro a relação entre o eletrão-volt (eV) e o joule (J). A Maria perguntou-lhe o que significava o símbolo eV, o aluno que nada havia feito até ao momento, querendo fazer-se engraçadinho disse: Educação Visual.

A aula prosseguiu e o aluno, voltou a colocar a cabeça sobre a mesa e começou a falar sozinho, num tom de voz que era escutada em toda a sala de aula.

Em seguida, continuando na posição em que estava, fez uma pergunta que o professor não percebeu. Aquele não pediu para o aluno repeti~la, pois em aulas anteriores costumava fazer questões não relacionadas com os conteúdos que estavam a ser trabalhados, como por exemplo quando o docente está a explicar uma lei física ele pergunta se o mesmo gostou do jogo do Sporting ou do Benfica.

Algum tempo depois, o aluno ligou o telemóvel na aula, o que não é permitido pelo Regulamento Interno da Escola, para possivelmente ver as horas. Recorda-se que na aula anterior, o mesmo aluno, depois de várias vezes advertido pelo comportamento inadequado, sem qualquer respeito pelas regras, havia ligado o telemóvel e passado um vídeo com o som muito alto.

Depois, continuando a interromper os outros que estavam a trabalhar, ele que não abriu o caderno e não fez nada durante a aula, disse a um colega: deixa de conversar e faz os exercícios”.

Quase a terminar a aula, alguém no corredor gritou “AOOO”, o aluno tal como um eco repetiu na sala “AOOO”. Este mau comportamento de repetir sons é habitual da parte dele, apesar de ter sido inúmeras vezes advertido para o não fazer. Assim, é habitual ele repetir tudo o que ouve, desde máquinas a funcionar, alunos a gritar no recreio ou até o som emitido pelos pavões existentes numa propriedade próxima da escola.

Hoje, para aquele aluno e para muitos outros. não há qualquer diferença entre uma sala de aula, um quarto de cama ou o recreio.

Teófilo Braga