quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Vidas Exemplares no Plano Regional de Leitura

O livro "Vidas Exemplares" passou a fazer parte da lista de livros recomendados para o ensino secundário do Plano Regional de Leitura, destinado a apoio a projetos no âmbito da História dos Açores.

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Milho-de-vassoura

Milho-de-vassoura

Ao fazer limpezas na cave da minha casa, encontrei uma vassoura que foi feita por meu pai, Teófilo de Braga (1925-1991), na nossa casa, na Ribeira Seca de Vila Franca do Campo, há cerca de 35 anos.

Lembro-me que anualmente meu pai semeava milho-de-vassoura com o único objetivo de fazer vassouras para serem usadas em casa e algumas poucas para venda.

Com a evolução da sociedade, as vassouras feitas a partir do milho-de-vassoura caíram em desuso, sendo substituídas por outras artificiais e hoje já não é muito comum observar nos campos aquela planta.

O milho de vassoura ou sorgo (Sorghum bicolor (L.) Moench) é uma planta pertencente à família Poaceae, originária da África subsaariana. Existindo vários tipos de milho de vassoura, dependendo do fim principal a que se destinam (granífero, sacarino, vassoura e forrageiro), a variedade cultivada na ilha Terceira era, segundo Orlando de Azevedo, a technicum.

O milho-de-vassoura é uma planta anual que pode crescer até 2 metros, com caules fortes e lenhosos com folhas longas e estreitas. As suas inflorescências desenvolvem-se no topo da planta, originando após polinizadas panículas, cuja palha é usada no fabrico das vassouras.

A nível mundial o sorgo é, depois do trigo, do arroz, do milho e da cevada, o quinto cereal mais cultivado no mundo.

O milho-de-vassoura é usado para a alimentação humana em vários países do Sul de África, da Ásia e da América Central e para a alimentação de animais nos Estados Unidos da América, na Austrália e na América do Sul.

No Brasil, a planta foi introduzida pelos europeus e espalhou-se por todo o território, dando origem a uma indústria de fabrico de vassouras que floresceu até ao aparecimento de fibras sintéticas.

Orlando de Azevedo, já citado, num texto intitulado “A cultura do milho vassoura na Ilha Terceira”, publicado no nº XI do Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, escreveu que se tratava de uma “cultura bastante rendosa, e com possibilidades de incremento se o mercado continental for devidamente alargado”. Segundo ele, a principal utilização que valoriza o milho-de-vassoura era o fabrico de vassouras, mas as sementes também serviam de alimento para as galinhas e os porcos. O milho de vassoura também era muito útil como “abrigo a outras culturas mais delicadas, como são as hortícolas.”

Na ilha Terceira, a sementeira era feita na Primavera, a germinação ocorria passados 8 a 10 dias, era sachado em maio, junho e julho e a colheita era feita em setembro ou no início de outubro.

Depois de cortado três palmos abaixo da extremidade era seco e depois ripado para separar a semente do espigo. A parte restante da planta servia como forragem e era usado como combustível para os fornos.

Sempre com recurso ao texto referido, fica-se a saber que na ilha Terceira existiam várias oficinas para manufatura de vassouras.

Para além de serem consumidas na ilha, eram enviadas pequenas quantidades de espigo e de vassouras para as outras ilhas do arquipélago dos Açores e para Portugal continental.

Na minha casa, não me recordo de ser dado qualquer uso às sementes, para além de serem guardadas para serem utilizadas no ano seguinte, mas, no que diz respeito a vassouras havia autossuficiência.

Pico da Pedra, 24 de novembro de 2023

Teófilo Braga

terça-feira, 21 de novembro de 2023

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Cabaça


A Cabaça

A cabaça (Lagenaria siceraria (Molina) Standl.) é uma trepadeira anual com folhas grandes, pertencente à família Cucurbitaceae, nativa de África. Daquele continente passou para os outros levada pelos migrantes ou pelas correntes marítimas que transportavam as sementes no interior das cabaças que flutuam.

Aos Açores, a cabaça terá chegado com os primeiros povoadores, pois já há referência à sua presença no livro 4 das Saudades da Terra. Como se pode constatar através de dois excertos publicados abaixo, de acordo com Gaspar Frutuoso, a cabaça era usada para cozinhar alimentos ou como vasilhame.

“Havendo aqui no tempo antigo pouca louça, coziam a carne em cabaças, e às vezes cozinhavam um carneiro e uma cabra, ou carne de vaca, cozendo-a e assando-a na pele, fazendo uma fogueira na terra, e depois de muito quente, faziam uma cova nela, e embrulhando a carne do gado que matavam na mesma pele, a metiam na cova, tornando-a a cobrir com a cinza e rescaldo da fogueira, e tornando a fazer outra fogueira em cima, assim se cozia.”

“Na era de mil e quinhentos e dez, havia nesta ilha um Lopo das Cortes (de que já tenho dito que morava na vila da Ribeira Grande, às Covas de longo do mar, junto do porto de Santa Eria, onde havia muito mato de sanguinhal), o qual, querendo comer mel fresco de abelhas, mandava a um seu filho, chamado Bertholameu Lopes, pai de Adão Lopes, que morou depois dentro na dita vila, junto da bica velha, que derramasse o mel que tinha em casa em umas cabaças e fosse buscar outro fresco ao sanguinhal, nas tocas e buracos das árvores e sanguinhos, onde as abelhas criavam muito. Tanta fartura havia de tudo nesta ilha, sem indústria nem trabalho de seus moradores.”

Carreiro da Costa, no Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, nº 15, menciona o uso da cabaça para enchimento de vinho, para transporte de água ou leite ou como caixa de ressonância de alguns instrumentos musicais.

O autor referido explica como eram preparadas as cabaças para serem usadas como recipiente para leite, na ilha do Corvo:

“…faz-se esvaziando as mesmas das sementes respectivas, sendo depois de secas, meio cheias com seixos recolhidos nos calhaus do mar. Em seguida são chocalhadas com cuidado para que as pedras alisem a superfície interior da cabaça, dando-lhe assim um vidrado que torna a casca impermeável”.

Embora, até ao presente, não tenha encontrado qualquer referência ao uso da cabaça para fins alimentares, sabe-se que também era cultivada para usos culinários. Joaquim Barboza, em 1902, escreveu que a mesma era usada “principalmente para o fabrico de doces seccos e de calda, muito recomendados pelos médicos nas convalescenças.”

Joaquim Barboza também refere o seu uso como planta ornamental. Segundo ele “a planta, pela rapidez da sua vegetação, número e beleza das suas grandes flores brancas, assim como pela forma e dimensões dos seus fructos, pode ser empregada com vantagem para os efeitos decorativos que se obtêm como planta trepadeira.”

Embora a cabaça possua propriedades medicinais, como drástica, emoliente, purgativa e antinefrítica (as sementes), não consegui encontrar qualquer menção ao seu uso na medicina popular nos Açores.

É possível encontrar algumas peças de artesanato feitas com os frutos da cabaça e na minha infância os mesmos eram usados como boias. Muitas crianças aprenderam a nadar colocando duas cabaças, postas de cada um dos lados da cintura amarradas com uma guita.

17 de novembro de 2023

Teófilo Braga

segunda-feira, 6 de novembro de 2023

domingo, 5 de novembro de 2023

A Conteira e o seu futuro


A Conteira e o seu futuro

A conteira (Hedychium gardnerianum Sheppard ex Ker Gawl.), também conhecida por roca-da-velha, cana-roca, choupa, roca-de-vénus, bananilha, roca-do-vento, rubim e flor-de-besouro, é uma herbácea, perene, rizomatosa que em média atinge de 1,5 a 2 m de altura com flores amarelas fragrantes.

Como terá chegado aos Açores a conteira que é nativa dos Himalaias?

Em meados do século XIX foi fundada em São Miguel a Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense, instituição que promoveu o incremento do movimento secular de introdução de plantas exóticas no nosso arquipélago para os mais diversos fins.

Foi num número do periódico daquela sociedade, “O Agricultor Michaelense” que alguém sugeriu a introdução da conteira para embelezar os nossos jardins, não se sabendo ao certo quem a introduziu e quando, embora seja provável que tenha sido José do Canto. Conhecida é a sua presença em São Miguel em 1851.

Dos jardins, a conteira escapou-se com muita facilidade para outras áreas, tornando-se uma terrível “praga” que integra a Lista Nacional de Espécies Invasoras (Decreto-Lei nº 92/2019, de 10 julho).

Apesar do exposto, o açoriano sempre procurou tirar dela o máximo proveito, embora algumas tentativas do seu uso, para além do ornamental, não tenham até agora sido bem-sucedidas.

É conhecido o uso das suas folhas para envolver os queijos de cabra e para alimento do gado quando não há outra forragem mais nutritiva.

Já foi pensado o seu uso para a produção de álcool, mas tal não seria economicamente viável, tal como não terá sido uma experiência de fabrico de papel que era de boa qualidade.

Em 1946, o jornal Açores fazia referência à utilização da conteira nos seguintes termos: “Da sua raiz pode extrair-se uma bebida alcoólica; da sua flor um perfume suave e do seu caule a celulose.”

O mesmo jornal em dois números refere a presença em São Miguel de uma fábrica de papel.

Afonso de Miranda, que foi o principal entusiasta da ideia, em 1943 e que havia conseguido a desfibração perfeita da conteira, juntou-se a José Maria de Andrade Albuquerque Forjaz de Sampaio e os dois constituíram uma sociedade para exploração da pasta de conteira para fabrico de papel.

A fábrica Sampaio e Miranda. Lda. foi instalada no Vale das Furnas e produziu papel que foi muito bem aceite no mercado, tendo todo ele sido vendido pela firma Domingos Dias Machado, Sucr..

Na altura, o entusiasmo era tanto que o articulista do jornal “Açores” escreveu o seguinte:

“E se amanhã se tornar realidade a montagem de fábricas idênticas na Ribeira Grande e Sete Cidades, as populações respectivas e dos arredores acolherão a ideia com júbilo justificado, porque tomando por base o movimento de 1944, das Furnas, verificamos um activo diário de cerca de 600 pessoas. Ora numa região ainda mais rica de conteira, como as Sete Cidades, não é difícil de prever um maior número de pessoas com o seu salário assegurado”.

Em 2014, o empresário Roberto Amorim teve a ideia de utilizar a conteira para produzir recipientes que pudessem substituir o plástico. Será que a sua louvável iniciativa terá pernas para andar ou como tantas outras ficará pelo caminho?

Pico da Pedra, 4 de novembro de 2023

Teófilo Braga