domingo, 30 de dezembro de 2018

José Henrique Borges Martins, o Ferreirinha das Bicas e o Bravo



José Henrique Borges Martins, o Ferreirinha das Bicas e o Bravo

Neste último texto da rubrica que intitulei “Com os pés na terra”, que foi publicada no Correio dos Açores, entre 13 de abril de 2011 e 9 de outubro de 2018, e depois desta data no meu blogue “Pois alevá…diário de um professor”, em virtude de naquele jornal, sem qualquer explicação, não ter sido publicado um texto sobre Paulo Freire, farei uma singela homenagem ao poeta terceirense José Henrique Borges Martins e a dois improvisadores da ilha Terceira que ele tão sabiamente acarinhou e de algum modo os imortalizou, Francisco Ferreira dos Santos (o Ferreirinha das Bicas) e Manuel Borges Pêcego (o Bravo).

José Henrique Borges Martins que comigo esteve presente em diversas reuniões, onde um grupo de cidadãos preparou a criação, em Angra do Heroísmo, de um jornal independente dos poderes instalados, o “Directo”, que foi dirigido pelo meu colega da Escola Secundária Padre Jerónimo Emiliano de Andrade, António Neves Leal, foi um poeta de mérito e um destacado investigador da cultura popular, tendo elaborado, entre outos, e publicado trabalhos sobre os cantadores e improvisadores populares e sobre crendices e feitiçarias.

Para além de dar o seu contributo ao “Directo”, Borges Martins, que combateu o Estado Novo com a sua poesia, colaborou com o extinto jornal “A União” e com o “Jornal da Praia”.

Com os livros “Cantadores e improvisadores da ilha Terceira”, de 1984, e “Improvisadores da Ilha Terceira. suas vidas e cantorias”, de 1993, Borges Martins homenageou alguns heróis do povo, os cantadores populares.

De entre eles, destacamos o Ferreirinha das Bicas que terá sido, segundo alguns, o maior de entre eles, e o Bravo que foi um homem livre e que por isso teve problemas com as autoridades por dizer verdades que as incomodavam.

O Ferreirinha das Bicas nos seus improvisos mostrou preocupações sociais e denunciou as desigualdades e a sociedade hipócrita onde vivia.

As duas quadras abaixo ilustram bem o pensamento do seu autor:

Vai preso quem rouba um pão
Por sua necessidade,
Mas quem rouba meio milhão
Passeia pela cidade

Eu conheço falsos sábios
Que pregam religião
Que mostram Cristo nos lábios
E o diabo no coração

A temática das desigualdades sociais, também, foi por diversas vezes abordada por Manuel Borges Pêcego. Para além de ilustrar a sua condição social, a quadra abaixo revela o seu espírito crítico:
Fui pagar a contribuição,
Mas não foi com dinheiro falso,
P’ra calçar tanto ladrão
Que por mim, ando descalço

O Bravo teve problemas com a polícia que o mandou internar na casa de saúde de São Rafael. A causa terá sido uma quadra dita em frente à cadeia, onde denunciou as injustiças deste mundo:
Oh, como esta vida é feia
Presos, meditai a fundo.
Só nunca vão à cadeia
Os maiores ladrões do mundo.

Pico da Pedra, 31 de dezembro de 2018
Teófilo Braga

sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Açoriano e mestre em Educação Ambiental lidera abaixo-assinado contra regresso do gado ao Parque Ecológico do Funchal, Associação avança com Providência Cautelar


DEZ 25, 2018 - 11:24:59 PMHENRIQUE CORREIA

Açoriano e mestre em Educação Ambiental lidera abaixo-assinado contra regresso do gado ao Parque Ecológico do Funchal, Associação avança com Providência Cautelar

Henrique Correia, 25 de dezembro de 2018

Teófilo Braga, açoriano, professor, mestre em Educação Ambiental, fundador da Associação Ecológica Amigos dos Açores, é o primeiro subscritor de um abaixo-assinado que visa pressionar a atual gestão da Câmara do Funchal, liderada por Paulo Cafôfo, contra o eventual regresso do gado ao Parque Ecológico.
Ontem, a Associação dos Amigos do Parque Ecológico do Funchal, presidida por Raimundo Quintal, já tinha tornado público que interpôs “uma Providência Cautelar, no Tribunal Administrativo do Funchal, visando a suspensão imediata da eficácia da decisão da Câmara do Funchal de autorizar a criação de gado no Parque Ecológico”.
Hoje, Teófilo Braga dá conta que está já a circular o abaixo-assinado no sentido de contrariar essa decisão, O primeiro subscritor já visitou o Parque Ecológico por diversas vezes e participou, como voluntário, numa jornada de plantação de espécies nativas”.
No texto do abaixo-assinado, refere que “foi com alguma estranheza que tomámos conhecimento de que a Câmara Municipal do Funchal autorizou, recentemente, a criação de gado no Parque Ecológico do Funchal. Como a realidade dos factos demonstra, após a retirada do gado, em 1995, foi possível verificar, no Parque Ecológico do Funchal, a recuperação da biodiversidade, a qual a par da água e do solo são recursos vitais para a Madeira, apesar do revés provocado pelo incêndio de origem criminosa ocorrido em agosto de 2010”.
O mesmo texto que suporta o documento que está já a circular, aponta que “a medida agora tomada, a concretizar-se, será um duro golpe no trabalho que tem sido feito até agora, isto é a reflorestação com vista à recuperação das formações vegetais primitivas, à redução da erosão, à diminuição dos efeitos das cheias e ao reforço das nascentes. Estamos solidários com os trabalhos desenvolvidos ao longo de cerca de vinte anos pela Associação dos Amigos do Parque Ecológico do Funchal e apoiamos a tomada de posição daquela contrária ao regresso do gado ao Parque Ecológico”.
Face ao exposto, refere, “apelamos ao bom senso do senhor Presidente da Câmara Municipal para que volte atrás na sua decisão, respeitando o que é afirmado na página 83 do Plano de Gestão do Parque Ecológico do Funchal: “Não estão identificadas quaisquer áreas com a função de silvo pastorícia, nem se vislumbra considerar esta atividade como um objetivo futuro para estas áreas”.
Fonte: Notícias do Funchal
https://funchalnoticias.net/2018/12/25/acoriano-e-mestre-em-educacao-ambiental-lidera-abaixo-assinado-contra-regresso-do-gado-ao-parque-ecologico-do-funchal-associacao-avanca-com-providencia-cautelar/?fbclid=IwAR2qi_2zGNTmuGl5h_Yhio1hnr6B6qSoeivEJEEgdfgwte7IKo7gfpUa7TU

terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Em defesa do Parque Ecológico do Funchal


Assine aqui:
https://www.change.org/p/presidente-da-c%C3%A2mara-municipal-do-funchal-regresso-de-gado-ao-parque-ecol%C3%B3gico-do-funchal

REGRESSO DE GADO AO PARQUE ECOLÓGICO do FUNCHAL

Foi com alguma estranheza que tomámos conhecimento de que a Câmara Municipal do Funchal autorizou, recentemente, a criação de gado no Parque Ecológico do Funchal.

Como a realidade dos factos demonstra, após a retirada do gado, em 1995, foi possível verificar, no Parque Ecológico do Funchal, a recuperação da biodiversidade, a qual a par da água e do solo são recursos vitais para a Madeira, apesar do revés provocado pelo incêndio de origem criminosa ocorrido em agosto de 2010.

A medida agora tomada, a concretizar-se, será um duro golpe no trabalho que tem sido feito até agora, isto é a reflorestação com vista à recuperação das formações vegetais primitivas, à redução da erosão, à diminuição dos efeitos das cheias e ao reforço das nascentes.

Estamos solidários com os trabalhos desenvolvidos ao longo de cerca de vinte anos pela Associação dos Amigos do Parque Ecológico do Funchal e apoiamos a tomada de posição daquela contrária ao regresso do gado ao Parque Ecológico.

Face ao exposto, apelamos ao bom senso do senhor Presidente da Câmara Municipal para que volte atrás na sua decisão, respeitando o que é afirmado na página 83 do Plano de Gestão do Parque Ecológico do Funchal: “Não estão identificadas quaisquer áreas com a função de silvo pastorícia, nem se vislumbra considerar esta atividade como um objetivo futuro para estas áreas”.

Primeiro Subscritor: Teófilo Braga, açoriano, professor, mestre em Educação Ambiental, fundador da Associação Ecológica Amigos dos Açores. Já visitou o Parque Ecológico do Funchal por diversas vezes e participou, como voluntário, numa jornada de plantação de espécies nativas, organizada pela Associação dos Amigos do Parque Ecológico do Funchal.

Algumas notas a propósito das Narrativas Insulanas


Com os pés na terra (399)

Algumas notas a propósito das Narrativas Insulanas

Com um prefácio de Avelino de Freitas Meneses que não acrescenta nada à obra, a “Letras Lavadas Edições” publicou, em março de 2018, o livro “Narrativas Insulanas” da autoria de Sebastião Carlos da Costa Brandão e Albuquerque, visconde do Ervedal da Beira, por decreto do mal-amado Rei D. Carlos.

Embora não se trate de um livro que se compare ao que de melhor um não natural escreveu sobre a ilha de São Miguel, como foi o caso dos irmãos Buller, recomendamos a sua leitura a quem quer conhecer um pouco mais a vida na nossa ilha em 1894. De entre o que o autor escreveu, sem a pretensão de publicar, destacamos uma visita ao Pico da Cruz, a sua ida às Furnas e às Sete Cidades e a descrição das visitas aos três jardins de Ponta Delgada: António Borges, Jácome Correia e José do Canto. No que diz respeito às tradições, destaco o relato de uma coroação do Espírito Santo e das Festas do Santo Cristo dos Milagres.

Neste texto apenas vou fazer referência a alguns aspetos que por algum motivo achei por bem dar a conhecer a quem não teve, ainda, a oportunidade de ler o livro referido.

Sobre a minha terra de nascimento, Vila Franca do Campo, o autor relata uma ida à Lagoa do Fogo, não muito bem-sucedida devido ao mau tempo, a partir da Prainha de Água d’Alto. Como o autor apenas esteve de passagem pela vila, no regresso das Furnas a caminho de Ponta Delgada, sobre a mesma apenas escreveu o seguinte: “Passámos em Vila Franca do Campo às quatro horas da tarde, só pudemos ver galinhas, e eram tantas que a mim e ao Matos deu-nos para fazer a estatística delas, no espaço de cem metros e só à volta do carro contámos, eu noventa e oito e ele oitenta e sete, os galos não entravam na conta.”

Quando se diz hoje que a preocupação com os direitos dos animais é uma moda recente, o autor mostra-nos que tal afirmação está errada, pois já no século XIX ele escreveu sobre o assunto. Com efeito, na descrição da visita às Sete Cidades que foi feita com o apoio de burros e de um macho, o autor refere o seguinte: “Despedi-me, primeiro do macho, e depois do acessório, ao Sr. José Jacinto Raposo, industrial moageiro de Feteiras, satisfiz os honorários combinados, dei-lhe ainda uma gorjeta, e pedi-lhe em seu nome que por aquele dia desse férias ao bom animal, e não fosse prendê-lo de novo à moenga, ele assim o prometeu, mas quem sabe se cumpriria!”.

A descrição dos jardins de Ponta Delgada é fabulosa, pelo que só por ela não me arrependi de ter adquirido o livro. Não vou transcrever o que sobre cada um deles o autor escreveu, limito-me, apenas, a referir a introdução que ele fez. Assim, segundo ele “há três parques em Ponta Delgada que por forma alguma não devem deixar de ver-se, pois são admiravelmente belos e alguns deles ricos em plantas, arbustos e primores. …O primeiro, que fica do lado poente é do Sr. António Borges, o segundo é do Sr. Conde Jácome, e o terceiro do Sr. José do Canto. O primeiro revela um artista e poeta; o segundo um fidalgo; o terceiro um sábio inteligente amante adorador da natureza em toda a realidade das suas forças e expansões.”

Termino este texto, com uma referência a dois aspetos que não agradaram ao visconde do Ervedal da Beira. Segundo ele, “a gente da ilha em geral é boa e afável, muito atenciosa e dedicada ao trabalho, acolhe muito bem as pessoas que por ali passam. Tem, contudo, defeitos que lhe não posso perdoar. Os homens comem canários e as mulheres não só comem os canários, o que é mais agravante da parte de quem deve ter maior sensibilidade no coração, mas além disso envolvem-se nuns medonhos e horríveis capelos (capotes) ou capuzes que as transformam em bruxas ou feiticeiras.”

Uma vez mais recomendo a leitura do livro e dou os meus parabéns à editora.

Pico da Pedra, 26 de dezembro de 2018

Teófilo Braga

domingo, 23 de dezembro de 2018

Manhãs de Páscoa


Com os pés na terra (398)
Manhãs de Páscoa

Numa conhecida rede social tenho vindo a divulgar algumas espécies existentes nos Açores, dando a conhecer o seu nome científico, o nome comum, a origem, a família e o local onde podem ser encontradas.

Uma das espécies que mais despertou a atenção dos leitores foi a Euphobia pulcherrima, a qual apresenta, entre outros, o nome comum de Manhãs de Páscoa. A maioria estranhou aquela designação, pois floresce por altura do Natal e houve um que disse que a conhecia pelo nome de Repúblicas.

Neste texto, para além de tentar esclarecer a questão dos nomes comuns, que variam de terra para terra e que são atribuídos pelas mais diversas razões, darei a conhecer um pouco mais a espécie referida que é oriunda do México.

O roubo de plantas da espécie referida dos Jardins de Ponta Delgada, noticiado recentemente pelo jornal Correio dos Açores, monstra que o vandalismo continua a ser prática corrente na nossa ilha, e prova que a planta tem interesse económico, pois quem o faz, fá-lo porque quer embelezar a sua casa sem gastar dinheiro ou para ganhar dinheiro fácil, através da sua venda.

Não tendo dados sobre a importância económica da espécie nos Açores, menciono, abaixo, a informação recolhida num artigo publicado na “Revista Mexicana de Biodiversidad”, em junho de 2015.

De acordo com os autores do artigo citado, a espécie é uma das plantas ornamentais de maior importância económica em todo o mundo, superando as suas vendas anuais os 100 milhões de dólares, nos Estados Unidos da América.

Não conhecemos qualquer utilização, nos Açores, da Euphobia pulcherrima para além da ornamental, mas há bibliografia que menciona diversos usos medicinais sobretudo relacionados com doenças de pele. Por outro lado, o livro Segredos e Virtudes das Plantas Medicinais, inclui a espécie na lista de plantas ornamentais exóticas, tóxicas ou alergizantes.

Luís Franquinho e António da Costa, no seu livro “Madeira Plantas e Flores”, apresentam três nomes comuns para a Euphobia pulcherrima: Manhãs de Páscoa, Poinsétia e Eufórbia Cardeal. Raimundo Quintal, na lista de plantas do Jardim José do Canto, por seu turno, apresenta os seguintes nomes comuns: Poinsétia e Estrela-de-Natal. Ainda sobre os nomes comuns da espécie que vimnos referindo, a página Web “Paisagismo Digital”, apresenta os seguintes: Estrella-federal , Pascuero , Poinsetia , Flor-de-pascua , Flor-de-nadal, Pascuero , Árvore-república , Poisetia , Flores-de-páscoa , Manhãs-de-páscoa , Folha-de-sangue , Flor-de-páscoa , Poinsétia e Bico-de-papagaio .

Os nomes comuns dados nos Açores à espécie são, pelo menos tudo leva a crer, importados. Por razões de economia de espaço e tempo, e por alguns nos parecerem óbvios, apresentamos a seguir uma explicação ou uma tentativa de explicação para dois deles.

O nome Manhãs de Páscoa poderá ser devido ao facto de, em Espanha, “Felices Pascuas!” ser uma “forma tradicional de felicitar la Navidad” e o de Poinsétia é uma forma de homenagear o médico, botânico e estadista dos Estados Unidos da América, Joel Roberts Poinsett (1779 - 1851).


Pico da Pedra, 24 de dezembro de 2018

Teófilo Braga

sábado, 22 de dezembro de 2018

Roubos de plantas


Roubos de plantas
(Correio dos Açores 21 de dezembro de 2018)

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

O Visconde do Ervedal da Beira e os canários



Notas Zoófilas (136)

O Visconde do Ervedal da Beira e os canários


No livro “Narrativas Insulanas”, escrito por Sebastião Carlos da Costa Brandão e Albuquerque que viveu em Ponta Delgada, onde fora colocado como juiz no Tribunal da Relação dos Açores (Ponta Delgada) em janeiro de 1894 há duas referências que mostram alguma sensibilidade do autor relativamente à proteção dos animais.

A primeira diz respeito a um macho que participou numa visita do autor às Sete Cidades, em que aquele pagou ao seu proprietário o devido e deu-lhe uma gorjeta pedindo para que o animal fosse poupado ao trabalho no resto do dia.

A segunda referência diz respeito à apanha de canários para serem usados na alimentação, o que se verificou até quase ao fim do século XX. Com efeito, apesar da proibição da apanha continuaram a serem vendidos num conhecido restaurante na Ribeira Grande, tendo tal facto sido denunciados por várias vezes às autoridades pela associação Amigos dos Açores.

Sobre os canários, Sebastião Carlos da Costa Brandão e Albuquerque no livro citado, editado em março de 2018, pelas Letras Lavadas Edições, a par do uso do capote e capelo, considera que o seu uso na alimentação “são defeitos” que não pode perdoar às pessoas de São Miguel.

Na página 174, do livro que recomendamos a sua leitura, sobre o assunto podemos ler o seguinte:


“Os homens comem os canários, e as mulheres não só comem os canários, o que é mais agravante da parte de quem deve ter maior sensibilidade no coração, mas além disso envolvem-se nuns medonhos e horríveis capelos (capotes) ou capuzes que as transformam em bruxas ou feiticeiras.

Não se pode imaginar o quanto é agradável sair e percorrer os campos, e ver-se a gente acompanhado e saudado pelos suavíssimos gorjeios dos canários! Voam e cantam felizes e alegres pelos ares e arvoredos, e não têm o estrídulo cantar dos seus companheiros de outros países, embora de mais vistosas plumagens; as suas notas são brandas, melodiosas, os sons têm gemidos e tristezas, têm risos e alegrias. Que sacrilégio e que barbaridade a guerra de extermínio que lhes fazem e o canibalismo feroz com que os devoram!

Nas mesas dos hotéis aparecem terrinas cheias destes inocentes, que são devorados com a ferocidade e prazer de cafres; que horror!

Desculpam-se os seus perseguidores com a fava e grão-de-bico que as pobres avezinhas comem apenas para o seu sustento, e lhes pagam fidalga e generosamente com as suas encantadoras melodias!”

Pico da Pedra, 20 de dezembro de 2018

Teófilo Braga

terça-feira, 18 de dezembro de 2018

Festas do Santo Cristo manchadas e a loucura das touradas em 1961


Com os pés na terra (397)

Festas do Santo Cristo manchadas e a loucura das touradas em 1961

Em 1961, as festas da cidade de Ponta Delgada, as maiores festas religiosas dos Açores, realizadas em honra do Senhor Santo Cristo dos Milagres foram manchadas pelo derramamento de sangue de animais (touros) para pura diversão de alguns sádicos que se dizem humanos. Com efeito, a Agência de Publicidade SPAL voltou a colaborar com um grupo de terceirenses na organização de dois festivais tauromáquicos que se realizaram nos dias 8 e 11 de maio, respetivamente segunda-feira e quinta-feira do Santo Cristo.
Nesta segunda investida da indústria tauromáquica terceirense, em 1961, recorde-se que a primeira ocorreu pela Páscoa, para além de touros das ganadarias de José de Castro Parreira e José Diniz Fernandes, vieram da ilha Terceira os amadores Henrique Parreira e Amadeu Simões e o grupo de forcados chefiados pelo cabo Osvaldo Simões que na sua estreia terá feito uma pega de costas. Para as duas touradas de praça, veio “expressamente de Madrid” o famoso matador espanhol Luís Lucena.
Na segunda tourada realizada o cabo dos forcados foi levado pelo touro de um extremo ao outro da praça até embater num muro. Levado ao hospital pela ambulância dos bombeiros voluntários foi-lhe diagnosticada “uma simples comoção sem fracturas”.
Para além das duas touradas, realizou-se uma garraiada onde atuaram oito “neófitos micaelenses”.
De acordo com o jornal Correio dos Açores os três novilhos foram lidados por António Manuel da Câmara Cymbron, Luís Ricardo Vaz Monteiro de Vasconcelos Franco e Henrique Machado Soares e como forcados atuaram Victor Manuel Rebelo Borges de Castro, Luís Fernando da Câmara Cymbron e João de Sousa Duarte com o auxílio de Luís Manuel Athayde Mota e António Manuel Rebelo Borges de Castro.
Na altura, o entusiasmo pelas touradas era tanto que foi muito falada a construção de uma Praça de Touros em Ponta Delgada, tendo sido aventados um terreno pertencente à Câmara Municipal de Ponta Delgada na rua da Mãe de Deus, em frente ao Foral da Misericórdia, e um outro pertencente a particulares localizado em São Gonçalo.
A adesão de alguns micaelenses às touradas em 1961 causou algum pânico na ilha Terceira como se poderá confirmar através de alguns textos publicados nos jornais daquela ilha.

Assim, a 20 de Abril de 1961, a ANI transcreveu uma notícia do Diário Insular onde se afirmava que uma subscrição para a construção de uma praça de touros em São Miguel já havia recolhido cerca de 2000 contos. Na mesma notícia ainda se pode ler o seguinte: E a piada reside exactamente, desde que se confirme a notícia da tal subscrição, no facto de S. Miguel ameaçar desviar da Terceira o centro tauromáquico do arquipélago com a construção de uma praça que, naturalmente, destronaria a velha Praça de S. João” e continua: “Podem não achar-lhe qualquer piada os aficionados terceirenses, mas a verdade é que o facto não deixa de a ter. Ou não terá?”
De igual modo, o Jornal A União, citado pelo Correio dos Açores, de 4 de Maio de 1961, também publicou um texto intitulado “Virou-se o feitiço…” onde a dado passo pode ler-se:

“Por bem fazer…mal haver. A embaixada académica (Liceu) que foi a S. Miguel e quis levar até aos nossos irmãos micaelenses um pouco daquela descuidada alegria que as Touradas emprestam à mocidade terceirense, deve estar agora convencida de que, indo “por bem”, o seu esforço redundou num péssimo serviço prestado à ilha Terceira. Lançando em Ponta Delgada o “vírus” da Festa Brava, mudaram possivelmente o “eixo” desse atractivo até há pouco “exclusivamente terceirense” em terras Açorianas, criando-se mais uma situação “subsidiária” de que não será fácil furtar-nos dentro de pouco tempo”.

Ainda a atestar o interesse pelas touradas, o Correio dos Açores noticiou a organização de uma excursão de micaelenses à Terceira para assistirem a uma tourada de gala que se realizou a 3 de julho de 1961 e que contou com a participação do toureiro português António dos Santos e do “matador” espanhol Orteguita, onde foram corridos touros vindos do continente português.

Felizmente a barbaridade descrita hoje não existe na ilha de São Miguel, apesar dos incentivos dados por governantes sem escrúpulos e a conivência de parte da Igreja Católica.

Pico da Pedra, 18 de dezembro de 2018
Teófilo Braga

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Duas notas sobre Francisco Soares Silva


Com os pés na terra (396)
Duas notas sobre Francisco Soares Silva

Por mais de uma vez escrevemos sobre o operário micaelense Francisco Soares Silva que foi diretor do jornal Vida Nova que se publicou em Ponta Delgada no início do século XX.

A leitura do livro “Os Alevantes da Memória”, da autoria de David Luna de Carvalho, editado em 1999, pelas Edições Salamandra dá-nos a conhecer a ligação de Francisco Soares Silva ao concelho do Nordeste, na ilha de São Miguel.

Tal como aconteceu com a democracia surgida com o 25 de abril de 1974, que foi construída essencialmente por adeptos do Estado Novo daí o estado em que o país e a região se encontram, a República implantou-se em terreno onde escasseavam os republicanos.

No caso do Nordeste, o autor referido menciona a pouca adesão à República, dando como prova o facto de apenas 43 pessoas terem assinado a sua proclamação. Ainda segunda a mesma fonte, para além do administrador do Concelho, “feito à pressa republicano”, apenas havia dois nomes que não estavam associados à monarquia como se pode ler através do seguinte extrato: …o único que não tinha a ver com o partido republicano era o médico-cirurgião, António Cabral de Mello. O outro nome, Francisco Soares da Silva, assumia-se como “Socialista-Libertário”.

Por que razão assinou Francisco Soares Silva, a proclamação da república nos Paços do Concelho do Nordeste?

De momento, desconhecemos já que nas pesquisas efetuadas até ao momento o seu nome aparece sempre ligado a Ponta Delgada.

Outro livro consultado, recentemente, que esclarece um pouco mais a ligação da feminista Alice Moderno com os principais responsáveis pelo jornal Vida Nova é o da autoria de Breno de Vasconcelos, intitulado “Paz Cinzenta …os Açores através de algumas figuras e episódios de uma época”, editado em Lisboa, em 1979.
Francisco Soares Silva foi um dos primeiros sócios da Sociedade Micaelense Protetora dos Animais, instituição fundada por Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa. Foi também na tipografia de Alice Moderno que chegou a ser impresso o jornal Vida Nova de Francisco Soares Silva.

Através do livro de Breno de Vasconcelos ficamos a saber que um dos dirigentes do movimento operário em são Miguel, Manuel Medeiros Cabral, companheiro e vizinho de oficina de Francisco Soares Silva, possuía a sua “Agência Funerária Cabral” ao lado do escritório de Alice Moderno, no edifício que era pertença daquela ilustre escritora e defensora dos animais.

Sobre o débil movimento operário micaelense, onde o nome de Francisco Soares Silva, teve um papel ímpar, Breno de Vasconcelos escreveu o seguinte:

“No auge das campanhas proletárias que também surgirem em Ponta Delgada, mestre Cabral tomou parte activa, juntamente com um seu vizinho de oficina, Francisco Soares Silva, mais conhecido por “mestre Chico Manco”, que era bastante inteligente e foi um dos acérrimos defensores da classe operária”.

Pico da Pedra, 14 de dezembro de 2018

Teófilo Braga

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

domingo, 9 de dezembro de 2018

A Maçonaria nos Açores


A Maçonaria nos Açores

Muito pouco se tem escrito sobre a presença da Maçonaria nos Açores pelo que sobre a mesma apenas conhecemos um excelente livro da autoria de António Lopes, intitulado “A Maçonaria Portuguesa e os Açores (1792-1935)”.

Instituição respeitável, como todas as outras está infiltrada por pessoas que se aproveitam para fins diversos dos da organização, nomeadamente para benefício pessoal ou de familiares e amigos.

Sendo uma organização secreta, que não se justifica nos dias de hoje, pouco se sabe acerca dela, nomeadamente nos Açores. Uma importante fonte para ficarmos a conhecer algumas “trafulhices” feitas por alguns dos seus membros é o livro publicado em 2013 pela Esfera dos Livros, intitulado “Segredos da Maçonaria Portuguesa” da autoria de António José Vilela.

O livro, entre outras informações, dá a conhecer “o vasto património da maçonaria, quem são os maçons eleitos para o Parlamento do GOL-Grande Oriente Lusitano, o que dizem as atas confidenciais das sessões, onde, entre outros assuntos, já se votou a criação de serviços de inteligence e as ligações do espião Jorge Silva Carvalho aos altos graus da maçonaria e ao atual ministro Miguel Relvas”.

Em relação aos Açores há pouca informação, mas dado o interesse ou o desconhecimento por parte da maioria dos açorianos, vamos divulga-la, abaixo.

Na página 235, pode ler-se que Ricardo Rodrigues, atual presidente da Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, partilhava o templo da Loja Maçónica Abade Correia da Serra, nº 69, com Adelino Cunha, José Gomes Ferreira e com os deputados do PSD Carlos Páscoa e José Manuel Canavarro.

Na página 121 há a referência à Loja “Renascer “, de Ponta Delgada, que tinha como venerável mestre António Joaquim Rodrigues Lopes.

Na página 259, há um quadro com os dirigentes da Loja do GOL em Angra do Heroísmo. Assim, a Loja “Vitorino Nemésio” tinha em 2006 os seguintes dirigentes:
Dimas Costa Lopes- Venerável mestre
Jorge Paulos Bruno – Representante e primeiro vigilante
Júlio Dinis Lopes da Silva-Representante (suplente) e segundo vigilante
Francisco Jorge Silva Teixeira – Primeiro experto

José Sousa
Açores, 8 de dezembro de 2018

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

O dia 13 de junho de 1974 na história de Vila Franca do Campo


O dia 13 de junho de 1974 na história de Vila Franca do Campo

Sobre o assalto à Câmara Municipal de Vila Franca do Campo conhecemos algumas versões do que terá ocorrido, todas elas ligadas a pessoas que estiveram de um ou do outro lado da barricada, isto é, dos que defendiam a substituição do executivo em exercício por um uma comissão ligada ao Movimento Democrático (MD) ou por outra que estava ligada ao Partido Popular Democrático Açoriano (PPDA).

Sobre este assunto já escrevi um texto que foi publicado no Correio dos Açores, no dia 24 de abril de 2013, com base em informações que possuía, oriundas de um livro do Dr. Manuel Barbosa, em dados recolhidos junto de pessoas que presenciaram o ato e de documentos, sobretudo folhetos, que recolhi na altura e do que presenciei, pois assisti ao referido assalto.

Volto ao tema, não para fazer juízos de valor sobre ninguém, mas porque recentemente tive acesso ao Processo sobre os acontecimentos que foi instruído pelo Governo Civil do Distrito Autónomo de Ponta Delgada.

Antes de fazer referência ao assalto propriamente dito, apresento os nomes das personalidades envolvidas no processo de “assalto ao poder” na Câmara Municipal da Vila.

O executivo municipal em exercício de funções quando se deu o 25 de Abril de 1974 era composto por Orlando Augusto Borges Brandão, António dos Santos Botelho e António Daniel de Carvalho e Melo.

Para substituir as pessoas referidas que, como era de esperar, estavam ligadas ao Estado Novo, o Movimento Democrático, apresentou uma comissão que tinha a seguinte composição: Raúl Eduardo do Vale Raposo Borges, Armando Botelho Henrique, Alfredo Moniz Gago da Câmara, Elias Pimentel Costa e João José Sardinha.

Curiosamente tal como acontece sempre que há mudanças de regimes ou mesmo mudanças de partidos no poder há sempre os adesivos ou lapas que mudam de opinião para se manterem na mó de cima. No caso em apreço na comissão referida há um elemento que sete meses antes era apresentado num jornal vila-franquense como como membro da Ação Nacional Popular, o partido que suportava o Estado Novo.

Insatisfeitos com a comissão proposta pelo Movimento Democrático foi apresentada aos vila-franquenses no dia 11 de junho, elementos do Partido Popular Democrático Açoriano no dia 13 pretenderam apresentar uma alternativa no mesmo local, o Jardim Antero de Quental.

Foram escolhidos para o efeito Eduíno Simas e Eduardo Calisto, que estando numa “Janela da “Construtora” não chegaram a dar a conhecer a equipa porque gritaria e o barulho feito com latas velhas e outros objetos pela multidão concentrada no local não o permitiu.

Relativamente aos responsáveis pelo boicote à sessão, através da leitura dos relatórios da PSP e do presidente da Câmara Municipal em exercício não restam dúvidas de que eram partidários da Comissão proposta pelo Movimento Democrático. Assim, enquanto Orlando Brandão culpa diretamente o MD e estranha a presença de Manuel Barbosa e Renato Resendes, acusando-os de por meio de apaniguados trazerem pessoas de Água d´Alto e de Ponta Graça, o relatório da PSP refere que três autocarros de passageiros trouxeram pessoas daquelas localidades para boicotar a sessão e refere que um dos filhos de Alfredo Gago da Câmara e o filho de Elias Pimentel da Costa andaram pelas casas pedindo latas e panelas velhas e que o chefe dos Correios de Vila Franca assumiu a responsabilidade dos rapazes terem ido para a rua perturbar a manifestação.

Sobre quem assaltou o edifício da Câmara Municipal o Relatório da PSP, através do depoimento do subchefe João Gomes, identificou as seguintes pessoas:

“O FILHO DE ELIAS PIMENTEL DA COSTA, que foi o primeiro da entrar com ANTÓNIO DA SILVA, vendedor de peixe, UM FILHO DESTE empregado comercial, que trabalha com o Laurindo, OS DOIS FILHOS do Alfredo Moniz Gago da Câmara, UM TAL DIONÍSIO, chefe dos Correios, que esteve na varanda, O FILHO DA PENICA (Laiola), o MANUEL ou JOSÉ RAINHA, pescador e ADELINO PIMENTEL CASIMIRO, que foi visto sair da Secretaria do Tribunal acompanhado de um rapaz”.
Teófilo Braga

5 de dezembro de 2018



segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Notas Ecológoicas



NOTAS ECOLÓGICAS 1, 3 de dezembro de 2018

1- Cagarro Ave Regional dos Açores
Faltam 25 assinaturas para que esta petição ser enviada à Assembleia Legislativa dos Açores:

http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=PT87499&fbclid=IwAR0x8EOv_CzEN31DBtsoWWvzWMv1chUmNQMyHxwOe51RTOHjHXqaUAolnGI

Se concorda, assine ainda hoje!

2- Fraude científica para defender a tauromaquia
O sociólogo Luís Capucha, aldrabou para tentar justificar cientificamente a tauromaquia. Veja o texto aqui:
https://www.dn.pt/pais/interior/sociologo-acusado-de-instrumentalizar-revista-cientifica-para-defender-tauromaquia-10264241.html

3- Ética Aplicada: animais
Para quem quiser aprofundar o assunto recomendamos a leitura do livro “Ética Aplicada: Animais”, editado pelas Edições 70, em maio de 2018

Abaixo um resumo, em espanhol, que poder ser lido aqui: https://revistes.uab.cat/da/article/view/v9-n4-mendoca
La creciente concienciación respecto a la sensibilidad de los animales está derivando en cambios relevantes en la sociedad y un compromiso en auge para garantizar su bienestar. Portugal ha estado avanzando de forma sólida, aunque lenta, incluso a través de la aprobación de cambios legales que sitúan a los animales en el centro del escenario. El trabajo académico sigue siendo esencial para fortalecer los enfoques teóricos que son la base de estos cambios sociales y políticos. En este contexto, el libro portugués “Ética Aplicada – Animales” (traducción del autor) constituye una fuente importante para aprender y reflejar los principales temas relacionados con los animales. El libro abarca una amplia gama de temas desde el estatuto ético de los animales hasta la domesticación, los animales de compañía, la experimentación animal, la ganadería, el vegetarianismo, las especies amenazadas y el activismo. Esta reseña describe y analiza brevemente el contenido del libro.

terça-feira, 27 de novembro de 2018

Podas vergonhosas


Uma vergonha que se repete ano após ano e não nenhum responsável que ponha cobro a isto?

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Os limites da autonomia dos professores nas escolas


Com os pés na terra (394)
Os limites da autonomia dos professores nas escolas

De acordo com a Lei de Bases do Sistema Educativo “é da especial responsabilidade do Estado promover a democratização do ensino, garantindo o direito a uma justa e efectiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares”.

Segundo a mesma lei o sistema educativo está organizado de modo a “Contribuir para desenvolver o espírito e a prática democráticos, através da adopção de estruturas e processos participativos na definição da política educativa, na administração e gestão do sistema escolar e na experiência pedagógica quotidiana, em que se integram todos os intervenientes no processo educativo, em especial os alunos, os docentes e as famílias.

Se analisarmos os resultados escolares facilmente se concluirá que não basta alargar a escolaridade obrigatória para garantir que todos ou pelo menos a grande maioria dos alunos que frequenta a escola tem índices de aproveitamento elevados. Em sumo, se o acesso está democratizado, a igualdade de oportunidades no sucesso ainda é uma miragem.

Relativamente à democracia nas escolas, podemos afirmar que é apenas formal. A título de exemplo, menciono o caso dos pais que estão representados no Conselho Pedagógico, onde, como é obvio, se tratam ou deviam tratar de assuntos de natureza pedagógica, não tendo para tal, salvo raras exceções, formação para o efeito e não estão representados no concelho executivo, onde deviam estar, pois a razão de existência da escola é haver alunos.

Ainda em relação à democracia, numa escola, tal como devia acontecer na sociedade, só faz sentido uma democracia participada e o mais direta possível, para não excluir ninguém.

Relativamente à participação e autonomia dos docentes, o Estatuto da Carreira Docente dos Açores (ECDRAA) define que o “direito de participação exerce -se no âmbito do sistema educativo regional, da escola, da aula e da relação entre a escola e a comunidade que ela serve” e compreende, entre outros, “o direito à autonomia técnica e científica através da liberdade de iniciativa, no âmbito da orientação pedagógica, a exercer no quadro das orientações curriculares e planos de estudo aprovados e dos projetos educativos das escolas, na escolha dos métodos de ensino, das tecnologias e técnicas de educação e dos tipos de meios auxiliares de ensino mais adequados” e “o direito de participar em experiências pedagógicas, bem como nos respetivos processos de avaliação”.

No que diz respeito aos deveres dos professores para com os alunos, o ECDRAA, entre outros destaca a promoção do desenvolvimento do rendimento escolar dos alunos e a qualidade das aprendizagens, de acordo com as respetivas orientações curriculares e atendendo à diversidade dos seus conhecimentos e aptidões e organizar e gerir o processo de ensino e aprendizagem, adotando estratégias de diferenciação pedagógica suscetíveis de responder às necessidades individuais dos alunos”.

O regime jurídico da criação, autonomia e gestão das unidades orgânicas do sistema educativo (Decreto Legislativo Regional nº 13/2013/A de 30 de agosto) por sua vez estabelece que compete à unidade orgânica “proceder à aferição dos critérios de avaliação dos alunos, garantindo a sua coerência e equidade e desenvolver métodos específicos de avaliação dos alunos, sem prejuízo da aplicação dos normativos gerais”.
Desconheço o entendimento que a tutela da Educação dá a “aferição dos critérios de avaliação”, mas parece-me que nas escolas tal é entendido como uma mesma grelha de excell usada na avaliação dos alunos para todas as turmas, pelo menos para cada um dos departamentos curriculares.
A opção por uma única grelha de avaliação para todos os alunos para mim é tão absurda como o é a planificação anual ou periódica igual para toda a escola quando as turmas são completamente diferentes.

Teófilo Braga
Pico da Pedra, 27 de novembro de 2018

terça-feira, 20 de novembro de 2018

ALICE MODENO E MARIA EVELINA DE SOUSA HOMENAGEADAS EM LISBOA


ALICE MODENO E MARIA EVELINA DE SOUSA HOMENAGEADAS EM LISBOA

Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa foram duas mulheres que se distinguiram no seu tempo, tendo o seu trabalho em diversas áreas sido reconhecido não só no arquipélago como fora dele.

Se sobre Alice Moderno há várias obras publicadas, com destaque para três livros da Professora Doutora Maria da Conceição Vilhena, a vida e a obra de Maria Evelina de Sousa está muito longe de ser conhecida, entre nós açorianos.

Injustamente ignorada ou vista como uma “ajudante” de Alice Moderno Maria Evelina de Sousa teve um pensamento próprio e uma intervenção inovadora na área da educação, sendo de destacar a sua Revista Pedagógica que já serviu de tema a uma desse de mestrado de Isolina Júlia dos Reis e Reis de Medeiros, intitulada “Revista Pedagógica (1906-1916). A modernidade do Pensamento Pedagógico em São Miguel nos Inícios do Século XX”, que merece uma leitura atenta.

No texto de hoje, damos a conhecer dois eventos, ocorridos em Lisboa, em que as duas açorianas foram homenageadas. Assim, Alice Moderno, açoriana pelo coração, já que nasceu em Paris, e Maria Evelina de Sousa, natural de Ponta Delgada, foram alvo de reconhecimento público, em agosto de 1912, na sede da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas e em maio de 1924, por ocasião do 1º Congresso Feminista e de Educação que se realizou de 4 a 9 de maio.

A primeira homenagem referida foi amplamente noticiada pela imprensa lisboeta, tendo “O Mundo”, dirigido por França Borges, publicado uma notícia no próprio dia e no dia a seguir ao evento. Na nota publicada, no dia 10 de agosto, dia da homenagem, podemos ler o seguinte: “É hoje, como noticiamos, que se realiza na sede da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas uma sessão de homenagem às distintas escritoras D. Maria Evelina de Sousa e D. Alice Moderno, a última das quais é sobretudo uma notável poetiza…”

A segunda, como já afirmámos ocorreu no 1º Congresso Feminista e de Educação, na sequência da intervenção de Tito de Sousa Larcher que mencionou o facto de que nos Açores, de acordo com os dados estatísticos, havia mais mulheres do que homens a saber ler. Aquele ilustre cidadão nascido em Braga, mas que se distinguiu pelo seu trabalho em Leiria, onde doou à Biblioteca e Arquivo Distrital cerca de 3200 obras, propôs “um voto de saudação às mulheres açoreanas que, no meu entender, deve partir da mesa, dada a alta categoria social do seu presidente.”

A congressista Judith Rocha associou-se às palavras de Tito Larcher e recordou os nomes de Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa. A sua intervenção, transcrita no livro “O Primeiro Congresso Feminista e de Educação (Relatório)” da autoria de Arnaldo Brazão, publicado pelas Edições Spartacus, em 1925, foi a seguinte:

“A propósito das considerações do Sr. Titi de Sousa Larcher, das quais se vê que a mulher açoreana é menos analfabeta que o homem, eu quero lembrar o nome de duas propagandistas do feminismo e da educação da mulher nos Açores, as senhoras D. Alice Moderno e D. Maria Evelina de Sousa, e apresento a seguinte proposta de aditamento à do Sr. Tito Larcher:

Proponho que dessa saudação proposta à mulher açoreana se destaquem os nomes das dedicadas propagandistas da instrução e das reivindicações feministas a professora D. Maria Evelina de Sousa e a poetisa D. Alice Moderno.”


A saudação não só foi aprovada como o presidente da mesa, Bernardino Machado, que foi presidente da República Portuguesa por duas vezes, de 6 de agosto de 1915 a 5 de dezembro de 1917 e de 1925 até ser destituído pelo golpe militar de 26 de maio de 1926, a propósito da mesma, afirmado o seguinte:

“Associo-me com todo o prazer ao aditamento apresentado pela ilustre congressista Srª D. Judith Rocha, saudando as Sras. D. Alice Moderno e D. Maria Evelina de Sousa.”

Teófilo Braga
Pico da Pedra, 20 de novembro de 2018

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Jardim dentro de Jardim


Jardim dentro de Jardim

O Jardim José do Canto é membro do “Botanic Gardens Conservation International”, qualidade que foi recuperada em 2016, durante a implementação de um projeto de recuperação e revitalização, coordenado pelo Doutor Raimundo Quintal, que ocorreu entre janeiro de 2014 e dezembro de 2017.

Para pertencer ao organismo referido os jardins devem promover ações de sensibilização/ educação e possuir nas suas coleções de plantas, espécies nativas da região onde estão inseridos.

Embora já existissem, no Jardim José do Canto, espécies endémicas dos Açores, como o pau-branco, existindo um exemplar bastante antigo que pode ser visto muito perto do busto do rei D. Carlos, durante o projeto de recuperação foi criado, junto à estátua do criador do Jardim, José do Canto, um espaço para os endemismos açorianos.

Antes de fazer uma listagem das espécies endémicas existentes, sempre que possível mencionando os usos das mesmas no passado, apresento o ponto da situação da flora açoriana, recorrendo ao livro “Flora Vascular dos Açores-Prioridades em Conservação”, da autoria de Luís Silva, Mónica Martins, Graciete Maciel e Mónica Moura, publicado pelo Centro de Conservação e Proteção do Ambiente e pelos Amigos dos Açores, em 2009.

De acordo com os autores mencionados, “o número actual de plantas vasculares nos Açores será de aproximadamente 947 taxa”, sendo o número de espécies nativas reduzido (menos de 300) e o das endémicas bastante reduzido, isto é, 72, cerca de 7,2% do total das plantas vasculares. Os mesmos autores referem que “mais de dois terços da flora indígena açoriana, um património natural único dos Açores, corre sérios riscos de desaparecimento.”

Se é verdade que as plantas têm de ser protegidas nos seus habitats, não é menos verdade que ninguém protege o que não conhece, pelos que a presença de espécies endémicas nos jardins poderá contribuir para criar uma mais forte consciência ambiental nos cidadãos que poderão agir em defesa do património natural da sua terra ou pressionar as entidades governamentais para o fazerem.

No Jardim José do Canto, se não me enganei na contagem, existem cerca de 20 espécies nativas dos Açores, sendo o número de endémicas cerca de 15.

Que plantas endémicas pode o visitante observar?

Entre outras, as seguintes:

A mais interessante, a Vidália (Azorina vidalii), que ao contrário do que diziam alguns especialistas, propaga-se com extrema facilidade, podendo ser encontrada hoje em locais onde antes não existia, como o litoral da cidade da Ribeira Grande, o litoral de Ponta Delgada (entre a Praia das Milícias e o Miradouro do Rosto do Cão) e no Ilhéu de Vila Franca do Campo. Muito bonita como ornamental, encontra-se em alguns Jardins Botânicos fora dos Açores.

A ginja-do-mato (Prunus azorica), também é uma bonita ornamental, que também já pode ser vista em alguns jardins. A sua madeira foi, outrora, usada em marcenaria.

O azevinho (Ilex perado), que quando está com os seus frutos maduros, fica muito bonito, tem grandes potencialidades como planta ornamental, No passado a sua madeira foi usada em obras de marcenaria.

O louro (Laurus azorica), hoje, tem pouca utilização. No passado a sua madeira era utilizada para o fabrico de charruas e cangas para as juntas de bois e o óleo da baga de louro foi usado na iluminação e como remédio para curar feridas no gado.

O folhado (Viburnum treleasei) é uma bonita planta ornamental cuja madeira foi muito usado no fabrico de alfaias agrícolas.

O cedro-do-mato (Juniperus brevifolia) que foi usado em tinturaria e a sua madeira na construção de igrejas e barcos.

Teófilo Braga

13 de novembro de 2018

Gagarro 2018

Depois de ter estado envolvido na origem das campanhas de salvamento do cagarro, pensava que com a entrada em cena de muitos voluntários, alguns à força, estava dispensado. Mas, mais uma vez este ano não deixei para os outros o que foi possível fazer.

Hoje, foi a vez de um cagarro que se encontrava na Escola Secundária das Laranjeiras.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Encontro com uma profissão de Eduardo Calisto de Amaral (2)


Encontro com uma profissão de Eduardo Calisto de Amaral (2)

“A vida só é bela quando é uma empresa em benefício de outros homens e do mundo” (Agostinho da Silva)

Hoje, divulgamos a segunda parte da nota introdutória que fizemos ao livro “Encontro com uma profissão” da autoria do professor Eduardo Calisto de Amaral.

Embora por vezes contando a colaboração da Direção de Obras Públicas e da Câmara Municipal de Vila Franca do Campo, todas as melhorias feitas na Escola da Ribeira Seca não seriam possíveis sem o muito trabalho voluntário de professores, contínuos e alunos, de muitos donativos e de receitas obtidas através de várias iniciativas.

Para além da lição que dá às presentes gerações e às futuras, o de contar sempre com as próprias forças, outra lição se pode tirar do que foi feito na Escola da Ribeira Seca e que mostra o pioneirismo e a ousadia de quem lá trabalhava, isto é, tendo sempre em conta o supremo interesse da educação e dos direitos das crianças, como sempre aconteceu, por vezes houve necessidade de desobedecer, como ocorreu quando foi decidido fechar os alpendres para “ver as crianças abrigadas em dias de chuva e vento” e fazer e manter uma ligação entre os recreios masculino e feminino, apesar de um vereador da Câmara Municipal de Vila Franca do Campo ter dito que tal era ilegal e afirmado: “Vocês têm de fechar isso novamente”.

O professor catedrático Rogério Fernandes escreveu que depois do 25 de abril o professor deveria não só ser um transmissor de conhecimentos, mas também um dinamizador cultural do meio onde estava inserido. Sobre as funções dos professores, quer pela leitura do texto, quer pelo conhecimento pessoal, já que fui aluno da Escola da Ribeira Seca e morador na localidade, confirmo que o professor Eduardo Calisto não esperou pela instalação do regime democrático, nem pela nomeação do ministro Veiga Simão, onde segundo ele “tudo começaria a mudar, nesta altura, quer a nível pedagógico, quer até de ordenado”, para dinamizar o desporto e a cultura nas escolas e comunidades por onde passou. Com efeito, no Porto Formoso dinamizou o teatro e o voleibol, em Ponta Garça, colaborou nos ensaios “cujos números eram apresentados em Festas Escolares no salão ao lado da Igreja”, e na Ribeira Seca, através de uma peça de teatro e um ato de variedades que esteve em cena, para além do ensaio geral destinado às famílias, cinco vezes.

Não sei se o professor Eduardo Calisto alguma vez leu algum texto do pedagogo Álvaro Viana de Lemos, mas por aquilo que fez nas escolas e nas comunidades sou levado a concluir que para ele ser professor era muito mais do que ensinar a ler, a escrever e a contar pelo que seria capaz de subscrever a frase que aquele um dia proferiu: “A educação é tudo; a instrução quase nada!”

Para além da educação para a responsabilidade e para o gosto em cultivar e amar a terra, o professor Eduardo Calisto refere no seu livro que o prazer das crianças era tanto que preferiam “o amanho da terra”, esquecendo-se de “toda a sorte de brincadeiras” e acrescenta que “um dos pequenos, de nome Teófilo Feitor de Andrade chegava em férias a ir sozinho arranjar os terrenos, sem que para tal tivesse sido mandado por alguém”. Este relato lembra-me um dos grandes objetivos de quem quer verdadeiramente educar, que é o de promover a autonomia das crianças e recorda-me a frase de Rui Grácio: “os mestres são os que criam, ou libertam, a autonomia dos discípulos”.

Recomendo a leitura deste livro que é importante para a história do ensino na nossa Vila e apelo a todos os seus colegas para que também partilhem as suas memórias.

Depois de, por duas vezes, ter lutado para que o professor Eduardo Calisto Soares de Amaral fosse homenageado por tudo o que fez pela sua terra, destacando a obra realizada na minha freguesia, a Ribeira Seca, termino, reafirmando a minha profunda admiração pelo cidadão, pelo educador e pelo humanista que estará sempre entre nós.

Teófilo Braga

sábado, 3 de novembro de 2018

Jogos da minha infância (3)


Ferro Quente

É um jogo de um contra todos os outros, em número que pode variar.

Depois de escolhida um marco ou base que podia ser uma árvore, uma parte de uma parede que passa a chamar-se ferro quente um dos participantes que também passa a designar-se por ferro quente fica encostado e conta até um número combinado previamente.

Terminada a contagem o ferro quente corre com o objetivo de apanhar os outros que por sua vez tentam chegar ao marco sem serem apanhados, ganhando assim a imunidade. Quando um deles é apanhado vai substituir o ferro quente, prosseguindo assim o jogo.

Na Ribeira Seca um dos locais escolhidos para ferro quente era o Arco.

terça-feira, 30 de outubro de 2018



“Encontro com uma profissão” de Eduardo Calisto de Amaral (1)


Embora apresente na capa a data de 2017, foi editado este ano um livrinho, da autoria do professor Eduardo Calisto Soares de Amaral, intitulado “Encontro com uma profissão”.

Com uma tiragem pequena e com uma distribuição restrita, o que é uma pena, o último trabalho daquele professor que marcou não só os seus alunos, mas todos os que com ele conviveram, merecia, pelos ensinamentos que dele se poderá extrair, uma maior divulgação. Contudo a decisão da família não foi esta e deve ser respeitada.

A pedido da família, o que muito me honrou, escrevi uma nota introdutória que achei por bem dar a conhecer aos leitores do Correio dos Açores. Dada a sua extensão, nesta semana divulgo a primeira parte e na próxima a segunda.

Este livro, tal como sugere o seu título, aborda parte da vida do professor Eduardo Calisto Soares de Amaral, com destaque para o período que vai desde 1955, ano em que iniciou a sua carreira profissional, na Escola Velha da Ribeira Seca, na Calçada, até 1992, ano em que se aposentou, estando também colocado na mesma localidade, mas no edifício do Plano dos Centenários.

Nesta nota introdutória, que escrevo com todo o gosto a pedido da sua família, é-me impossível fazer referência a todos os assuntos que o professor Eduardo Calisto aborda no seu livro, como o serviço militar que teve de cumprir por duas vezes, a aquisição e as alterações sofridas na sua casa, onde acabaria por habitar ainda antes de chegar a luz elétrica, a frequência de um curso de Orientação Pedagógica, as romarias à Senhora da Paz, as visitas de estudo anuais, o cantar à Estrelas, as festividades em honra de São João, etc., etc.. Assim, apenas destacarei as questões relacionadas com a educação.

Embora o professor Eduardo Calisto nunca esqueça, ao longo do texto, todas as pessoas que com ele cooperaram, com destaque para a sua “companheira de toda a vida”, a professora Adelaide da Conceição Soares, e para o seu cunhado, o professor Valter Soares Ferreira, que possuía uma destreza tal que era capaz de “reparar, melhorar, construir tudo e qualquer coisa que pudesse, de certo modo, melhorar o nível do ensino, no aspeto prático e visualizado”, esta pequena obra é muito mais do que uma despretensiosa autobiografia. Com efeito, através da sua leitura atenta é possível conhecer um pouco do estado da educação em dois regimes políticos diferentes, o Estado Novo, distinguindo-se dentro deste o período que foi até 1970, ano em que o Professor Catedrático José Veiga Simão assumiu o cargo de Ministro da Educação Nacional, e o regime democrático instituído a 25 de abril de 1974.

No que concerne às escolas, as descrições do Prof. Eduardo Calisto mostram que, sobretudo antes do Plano dos Centenários (1941-1969), que surgiu para, entre outras razões, acabar com o mau estado das instalações existentes nas várias escolas e para suprir a falta de salas para a separação dos sexos, não eram as mais dignas tanto para os docentes como para os alunos. A título de exemplo refiro o caso da Escola Velha da Ribeira Seca onde numa das salas “o professor, se sentado, não tinha visibilidade nenhuma para uma parte da sala” e as retretes sobretudo a masculina onde “por vezes as fezes chegavam a sair pela porta fora”.

Mas mais importante do que a apresentação do estado lastimável em que encontravam as instalações escolares, o mérito do Professor Eduardo Calisto está em não se ter conformado com a situação e, quer com ajuda exterior, quer recorrendo aos próprios meios, isto é, ao seu trabalho, ao dos colegas, e ao dos alunos, como no caso da escola referida, transformou o recreio desprezado num “belíssimo campo de mini-futebol “e “num pequeno jardim rústico”.

Relativamente à Escola Nova da Ribeira Seca, embora o edifício já apresentasse melhores condições, ao longo do tempo foi sofrendo melhoramentos, dos quais destaco o arranjo da latada da frente, a construção do tanque-piscina, o fecho dos alpendres, a instalação de alto-falantes e de intercomunicadores nas diversas salas, as alterações na cozinha e no refeitório e a construção dos anexos com duches e vestiários, etc. etc.

Teófilo Braga

domingo, 28 de outubro de 2018

COMBATE À TAUROMAQUIA NOS AÇORES: DO INÍCIO DO SÉC. XX ATÉ 2012



COMBATE À TAUROMAQUIA NOS AÇORES: DO INÍCIO DO SÉC. XX ATÉ 2012

Neste texto tenta-se fazer uma primeira reflexão, necessariamente incompleta por escassez de tempo, acerca da oposição às touradas nos Açores, desde o início do século XX até ao ano de 2012.
Na luta contra a tauromaquia, nos Açores, podemos distinguir três fases: a do combate individual, a da oposição à “espanholização” das touradas e a da defesa da abolição de todo o tipo de touradas.
A Primeira Fase
A primeira fase (1901- abril de 1988) é a fase da oposição às touradas por parte de algumas personalidades açorianas, que se distinguiram no campo da ciência, da cultura, da literatura e da vida política, algumas delas a residir fora dos Açores.
Nesta fase distinguiram-se, entre outras pessoas, Alice Moderno (1867-1946) (fig.1) que para além da sua atividade de jornalista, escritora, agricultora e comerciante, foi uma mulher que pugnou pelos seus ideais republicanos e feministas, sendo uma defensora da natureza e amiga dos animais.

Alice Moderno foi uma das fundadoras da Sociedade Micaelense Protectora dos Animais e não foi indiferente às touradas. Com efeito, o jornal que dirigiu A Folha (1902-1917) deu guarida a diversos textos contra as touradas, a maioria dos quais da autoria do zoófilo Luís Leitão.
Foi convidada e assistiu contrariada a uma tourada, na ilha Terceira, e não ousou comunicar aos seus amigos, considerando-os “semi-espanhóis no capítulo de los toros”, o que pensava pois, escreveu ela, “não compreenderiam decerto a minha excessiva sentimentalidade”.
Na sua carta XIX, referindo-se à tourada a que assistiu escreveu o seguinte:
“É ele [cavalo], não tenho pejo de o confessar, que absorve toda a minha simpatia e para o qual voam os meus melhores desejos. Pobre animal, ser incompleto, irmão nosso inferior, serviu o homem com toda a sua dedicação e com toda a sua lealdade, consumindo em seu proveito todas as suas forças e toda a sua inteligência! (…) Agora, porém, no fim da vida, é posto à margem e alugado a preço ínfimo, para ir servir de alvo às pontas de uma fera, da qual nem pode fugir, visto que tem os olhos vendados!”
“E esta fera [touro], pobre animal, também, foi arrancada ao sossego do seu pasto, para ir servir de divertimento a uma multidão ociosa e cruel, em cujo número me incluo! (…) Entrará assim em várias toiradas, em que será barbaramente farpeada até que, enfurecida, ensanguentada, ludibriada, injuriada, procurará vingar-se, arremessando-se sobre o adversário que a desafia e fere. Depois de reconhecida como matreira, tornada velhaca pelo convívio do homem, será mutilada”.
Alfredo da Silva Sampaio (1872 - 1918), que foi um médico açoriano que se notabilizou como naturalista, como fundador do primeiro posto de observação meteorológica na ilha Terceira e autor de uma vasta obra sobre a história, a geografia e a história natural da Terceira, insurgiu-se contra o barbarismo das touradas à corda que na sua altura eram muito mais violentas/desumanas do que são hoje.
Embora longa a citação, retirada do seu livro “Memória da Ilha Terceira” (Fig. 2), publicada em 1904, vale a pena a leitura do seu texto sobre as touradas à corda:
“Uma corrida de touros à corda constitui, desde muito tempo, o principal divertimento do povo terceirense. Por ela abandonam os trabalhadores os campos, as oficinas, etc., deixando de ganhar o seu salário, para se transportarem a algumas léguas de distância, a verem um toiro, que, na maior das vezes, nada tem de bravo, e que percorre, amarrado por uma longa corda, algumas centenas de metros de uma estrada.
São geralmente em dias de trabalho que têm lugar estas corridas, e no dia seguinte ao de uma festa do Espírito Santo ou de outra qualquer festa religiosa. Ou são os impérios que promovem este divertimento público, ou qualquer influente político que, querendo ser grato aos seus amigos, promove e concorre com a maior parte das despesas.

Se é agradável e pitoresco a aglomeração de povo armado de compridos e grossos varapaus ferrados (muitas vezes mais perigosos que o touro), e os balcões e janelas das casas repletas de raparigas com vestuários de variegadas cores, ao mesmo tempo é bárbaro ver a corrida de um pobre animal, geralmente malezzo, ser espicaçado por milhares de paus, que lhe produzem largos ferimentos, chegando algumas vezes a esvaírem-lhes os olhos.

Findo o espectáculo, que é anunciado por muitos foguetes, recolhe o povo satisfeito a suas casas, sem se lembrar do salário que perdeu, e que pode facilmente adquirir ali a causa da sua morte.”


O libertário terceirense Adriano Botelho (1892-1983) manifestou, num texto intitulado “Contra os espectáculos imorais”, publicado, em 1925, no suplemento literário ilustrado do jornal A Batalha e reunido no livro “Adriano Botelho, memória e ideário” (fig.3), uma opinião muito semelhante à de Alice Moderno, como se pode concluir através da leitura do seguinte extrato:
”…fazem-se por outro lado, reclames entusiastas de espectáculos, como as touradas de praça onde por simples prazer se martirizam animais e onde os jorros de sangue quente, os urros de raiva e dor e os estertores da agonia só podem servir para perverter cada vez mais aqueles que se deleitam com o aparato dessa luta bruta e violenta, sem qualquer razão que a justifique”.




Companheiro de Adriano Botelho no movimento anarquista português, o cientista terceirense Aurélio Quintanilha (1892-1987) (fig. 4) que, entre outras funções, foi professor da Universidade de Coimbra, foi também um opositor às touradas tendo, a meados do século passado, afirmado o seguinte:
"Como homem e como professor não posso deixar de lhes enviar a minha mais completa e entusiástica adesão ao protesto levantado pela Sociedade Protectora dos Animais contra um espectáculo indigno do nosso tempo, da nossa mentalidade, da nossa civilização".



A Segunda Fase
A segunda fase (maio 1988- maio de 2009) é balizada pela oposição à introdução de touros de morte nos Açores e o chumbo, a 14 de maio de 2009, pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores de um Projecto de Lei destinado a introduzir a sorte de varas.
Na sequência da notícia da apresentação por Adolfo Lima, Secretário Regional da Agricultura e Pescas para análise, em Plenário do Governo Regional dos Açores, suportado pelo PSD, de uma proposta que havia sido elaborada pelo Dr. Álvaro Monjardino (fig. 5), através da qual se pretendia que nos Açores fosse introduzida as touradas com touros de morte, os Amigos da Terra/Açores (atualmente Amigos dos Açores) organizaram uma campanha internacional que culminou com a apresentação de uma petição ao Parlamento Europeu.



A intenção não avançou, tendo na altura o presidente do Governo Regional dos Açores, Dr. Mota Amaral, comunicado ao Director do Eurogroup for Animal Welfare que a legislação não avançaria devido às "reacções negativas da opinião pública".
A 21 de outubro de 1995, na ilha Terceira, realizou-se numa quinta particular uma tourada à espanhola, onde foram toureados e mortos dois touros. Na ocasião, tal ato a que assistiu o atrás mencionado membro do governo foi contestado por várias pessoas singulares e coletivas, como os Amigos dos Açores (fig. 6), algumas sociedades protetoras de animais e pelo partido os Verdes, na Assembleia da República.
Em resposta, a um ofício dos Amigos dos Açores, aquela associação recebeu da Presidência do Governo Regional dos Açores um ofício que dava conta que o Presidente do Governo Regional dos Açores, Dr. Mota Amaral, tinha dado a devida atenção ao “protesto manifestado, informando que se tratou de um espetáculo realizado numa propriedade particular e que este tipo de touradas estão proibidas nos Açores” e acrescentava que “O Governo Regional por princípio e tendo sempre, também, em conta o impacto negativo na opinião pública açoriana de semelhante ato, envidará todos os seus esforços para que tal não se venha a repetir na Região Autónoma dos Açores”.

A 18 de outubro de 2002, o parlamento aprovou a introdução da sorte de varas, com 26 votos a favor, 13 contra e 4 abstenções. Este diploma veio a ser “chumbado” pelo Ministro da República, Sampaio da Nóvoa, já que não se revestia de interesse específico regional.
A contestação a esta nova tentativa de introdução da sorte de varas, como primeiro passo, para a introdução de touros de morte, partiu novamente dos Amigos dos Açores e, desta vez, contou, também, com a participação da Associação dos Amigos dos Animais da Ilha Terceira, que elaborou uma petição que recolheu duas mil assinaturas e que foi entregue ao Ministro da República (fig. 7).


Mais uma tentativa de introdução da sorte de varas, nos Açores, terminou, a 14 de Maio de 2009, com o chumbo pela Assembleia Legislativa Regional de uma proposta naquele sentido. Na votação, 28 deputados votaram contra e 26 a favor, registando-se duas abstenções e a ausência de um deputado do Partido Socialista que fora um dos seus proponentes.
A campanha contra esta última tentativa da introdução da sorte de varas partiu do Blogue Terra Livre/CAES - Colectivo Açoriano de Ecologia Social e contou com a participação da Associação de Amigos dos Animais da Ilha Terceira, que manifestou a sua discordância, dos Amigos dos Açores - Associação Ecológica, que para além da sua tomada de posição na comunicação social, enviou uma carta à Unesco, do CADEP, de Santa Maria, cujo coordenador escreveu vários textos para a comunicação social e outros dirigidos aos deputados, para além do contacto pessoal com alguns deles.
Para além das associações referidas, tomaram posição pública a Azórica, através de um texto assinado pelo seu presidente, e a Sociedade Micaelense Protectora dos Animais, que já não tinha qualquer atividade há alguns anos e que nunca mais deu razão de si depois, também emitiu um comunicado onde apelava aos deputados regionais para não aprovarem “os espetáculos que têm como pano de fundo os maus-tratos e o sofrimento dos animais”.
Foi no decurso da campanha, que vimos referindo, que surgiu o coletivo virtual “Açores Melhores sem Maus Tratos aos Animais” cujo principal é a Proteção dos Animais nos Açores, mas que é solidário com todas as lutas que tenham o mesmo fim em qualquer parte do Planeta.


A Terceira Fase

A terceira fase, iniciada em junho de 2009, surge como reação à tentativa de estender a tauromaquia a outras ilhas dos Açores, nomeadamente a São Miguel e a Santa Maria.
A expansão do negócio sujo da tauromaquia para as outras ilhas tem contado com o apoio direto ou indireto de departamentos do Governo Regional dos Açores, como a Direção Regional do Desenvolvimento Agrário, de alguns presidentes de Câmaras Municipais, com destaque para a de Lagoa, por juntas de freguesia, por um pároco e as últimas por Irmandades do Espírito Santo e pela Associação de Estudantes da Universidade dos Açores, cujo presidente é natural da ilha Terceira e tem ligações com a Tertúlia Tauromáquica Terceirense.
Como é impossível fazer algo na ilha Terceira, no que às touradas à corda diz respeito, pois este ano durante 168 dias, da época oficial, realizaram-se 244 touradas, ainda assim menos 13 do que no ano anterior, a reação tem-se limitado ao protesto pela realização de touradas noutras ilhas, sempre que é do conhecimento público (fig. 10).

Para o caso da ilha Terceira foram feitos protestos, envio de e-mails a várias entidades, pelo facto de ser ter realizado uma tourada de praça no dia 20 de junho de 2010, dia de luto nacional pela morte do escritor José Saramago, o que é proibido pelo artigo 12º do
Decreto Legislativo Regional n.º 11/2010/A (Regulamento Geral dos Espectáculos Tauromáquicos de Natureza Artística da Região Autónoma dos Açores). Foram, também, enviados, em outubro de 2010, e-mails à Diretora Geral da UNESCO para que esta “recuse a inscrição da Festa Brava da Terceira como Património Imaterial da Humanidade, por parte da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo. Mais recentemente, na sequência da promoção pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores de uma tourada à corda no programa das comemorações do Dia dos Açores que foi celebrado, no dia 13 de junho de 2011, na cidade da Praia da Vitória, na ilha Terceira (Açores) foi feita uma campanha de protesto junto da Assembleia Legislativa Regional que decidiu transformar os e-mails enviados em petição.

As formas de protesto utilizadas têm sido a emissão de comunicados para a comunicação social, a publicação de textos em blogues, o envio de e-mails e ou petições aos promotores. Por uma única vez, em julho de 2009, um grupo de pessoas decidiu manifestar-se na rua contra a realização de uma tourada à corda promovida pela Câmara Municipal da Lagoa, ilha de São Miguel, tendo sido vítimas de agressões verbais e físicas, alegadamente por parte de funcionários da autarquia.

Nesta fase surgiu, em julho de 2009, o blogue/coletivo de defesa dos animais “Arquipélago dos Animais” que combateu todos os espetáculos com uso de animais (touradas, vacadas, bezerradas, rodeios, etc.)

Para além do blogue/coletivo Arquipélago dos Animais, continuam ativos nesta fase os Amigos dos Açores, o CADEP- Clube de Amigos e Defensores do Património de Santa Maria, o Blogue Terra Livre/CAES - Coletivo Açoriano de Ecologia Social e o blogue/coletivo Açores Melhores sem Maus Tratos Animais.


Mais recentemente, já em 2012, um pequeno grupo de pessoas que já trabalhava em conjunto e mantinha uma lista de discussão na internet decidiu criar um coletivo informal, o Movimento Cívico Abolicionista da Tauromaquia dos Açores, que integra elementos da ilha de São Miguel e da ilha Terceira e que mantém uma lista de discussão, onde para além de pessoas das ilhas referidas também tem incluídas pessoas da ilha de Santa Maria.
A 23 de março, de 2012, começou a recolha de assinatura para a petição “Pelo Fim dos Subsídios Públicos à Tauromaquia nos Açores”. Esta petição deu entrada na ALRA a 20 de abril de 2012. Sobre a mesma foi elaborado um vergonhoso relatório pela Comissão dos Assuntos Sociais da ALRA, onde esta justifica “a tortura” dado o interesse cultural e turístico.
A 13 de Julho de 2012, foi feita, por ofício ao Diretor Regional da Cultura, uma denúncia acerca da presença de crianças em touradas. Como resposta aquela direção regional comunicou que a denúncia sido enviada à Tertúlia Tauromáquica Terceirense em para esta se pronunciar. No dia 10 de outubro foi enviada nova carta a perguntar que medidas foram tomadas para punir os prevaricadores.
A 12 de novembro de 2012, foi divulgado o manifesto pelo fim da tauromaquia nos Açores. Neste o MCATA para além de divulgar o seu grande objetivo que é a abolição da tauromaquia nos Açores, divulga os princípios que adota e que são:

● Independência face a qualquer outro tipo de grupo social constituído, como partidos políticos, organismos oficiais, grupos económicos, crenças religiosas ou outros grupos de interesse;
● Sem fins lucrativos, todo o trabalho é estritamente voluntário;
● Sem quaisquer hierarquias, é privilegiada a discussão e o consenso como principal método de tomada de decisões.
● A não-violência, o respeito pelo outro e o diálogo estão na base de todas as iniciativas e intervenções.

Considerações Finais
Embora seja cada vez maior o número de pessoas que perde o medo de manifestar a sua discordância para com a realização de espetáculos que de um modo ou de outro maltratam os animais, como as touradas, as organizações dos Açores que se têm oposto aos mesmos são muitas fracas, tendo em conta o poder económico e o apoio político que possuem os promotores das touradas pelo que o combate à industria tauromáquica só terá êxito se o que tudo o que for feito nos Açores tiver um vasto apoio nacional e internacional.

Bibliografia:
Abreu, C. & Freire, J.(1989) (Org.). Adriano Botelho, memória & ideário (antologia de textos). Angra do Heroísmo: Direcção Regional dos Assuntos Culturais.
Sampaio, A. (1904). Memória sobre a Ilha Terceira. Angra do Heroísmo: Imprensa Municipal.
Vilhena, A. (1987). Alice Moderno a mulher e a obra. Angra do Heroísmo: Direcção Regional dos Assuntos Culturais.

(Letra a Letra, nº 7, outubro de 2018)

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

APONTAMENTOS SOBRE PAULO FREIRE


APONTAMENTOS SOBRE PAULO FREIRE

Comecei a ler, recentemente, o último livro de José Pacheco, fundador da Escola da Ponte, que é uma referência em termos de inovação pedagógica, mas que infelizmente é mais conhecida no estrangeiro do que em Portugal.

José Pacheco, no seu livro “Um compromisso ético com a educação” cita, entre os vários autores que o inspiraram, o nome de Paulo Freire (1921-1997) que é considerado como o mais célebre educador brasileiro.

Paulo Freire é um nome que me é familiar desde os finais de 1974 ou no início de 1975 quando alguns militares ligados ao Movimento das Forças Armadas estiveram em Vila Franca do Campo e me ensinaram o que designaram “método de Paulo Freire” para posteriormente o aplicar junto de pessoas que não sabiam ler nem escrever. Tal ocorreu com algum sucesso, pois com algumas sessões realizadas no primeiro andar de um edifício do senhor Alfredo Gago, situado na rua Teófilo de Braga, onde no rés-do-chão existia uma padaria, foi possível ensinar a ler a dois adultos que até então nem conheciam ou conheciam muito mal as letras do alfabeto.

Paulo Freire começou a trabalhar com adultos analfabetos em 1947, tendo sido professor de História e Filosofia da Educação na Universidade do Recife. A partir de 1962 o seu método de ensino começou a ser experimentado e em 1963-64 foi aprovado um plano para que fossem abrangidos, no Brasil, dois milhões de analfabetos.

Em 1964, após um golpe de estado ocorrido no Brasil, Paulo Freire foi preso e teve de se exilar. Mais tarde, o seu método passou a ser aplicado no Chile e no ano 1969-70 foi professor convidado no Centro de Desenvolvimento e Mudança Social de Harvard.

Entre as várias ocupações e cargos que desempenhou, destacamos o de Secretário-Geral do Concelho Mundial das Igrejas.

Da sua vasta obra publicada, destacamos os seguintes livros: “Pedagogia do Oprimido”, “Educação como Prática da Liberdade” e “Uma Educação para a Liberdade”.

De acordo com Paulo Freire, o homem pode ser encarado como pessoa ou como coisa. Se o encararmos como coisa, a educação só pode conduzir a uma cada vez maior domesticação do homem e o ato educativo não é mais do que um ato de depositar conteúdos. Esta visão a que ele chama "conceção bancária" é a que infelizmente ainda predomina ainda nos dias de hoje.

Por outro lado, se o homem é visto como uma pessoa, deixa de ser uma "caixa passiva, que vai sendo preenchida", mas "um corpo consciente, desafiado e respondendo ao desafio", que está aberto ao mundo e atua de modo a transformá-lo.

Nesta segunda conceção chamada por Paulo Freire de humanista está afastada qualquer possibilidade do educador (professor) manipular o educando (aluno) porque nela está subjacente o seguinte: ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho e todos se educam entre si, mediatizados pelo mundo.

Sobre a tão apregoada neutralidade da educação/ensino, Paulo Freire é de opinião de que tal não passa de um mito. Com efeito, tal como Ivan Illich que considerava que as escolas constituem instrumentos de controlo social, ele defendeu que de forma consciente ou não a atividade dos educadores "desenvolve-se ou para a libertação dos homens- a sua humanização-, ou para a sua domesticação - o domínio sobre eles".

Para terminar este texto, que tem como fonte o último livro da autoria de Paulo Freire referido anteriormente, deixo uma pequena nota sobre o que ele chama de analfabeto político que “é alguém que tem uma perceção ingénua das relações dos homens e do mundo, uma inteligência ingénua da realidade social”. O analfabeto político ou não tem em conta a realidade e considera que o futuro é a repetição do presente ou considera que aquele já está pré-estabelecido. A primeira perceção ele considera reacionária, a segunda ele escreve que “é uma das deformações mecanicistas do pensamento marxista”.

Teófilo Braga
(enviado ao Correio dos Açores 14 de outubro de 2018, não publicado)