sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

A Sumaúma-bastarda, uma cruel invasora

A Sumaúma-bastarda, uma cruel invasora

A sumaúma-bastarda (Araujia sericifera Brot.) também conhecida por seda, pepino-de-seda, planta-cruel, etc., é uma planta trepadora, pertencente à família Apocynaceae,, que pode atingir 6 metros, originária da América do Sul.

A sumaúma-bastarda foi descrita por Félix de Avelar Botero (1744-1828), lente de Botânica e Agricultura na Universidade de Coimbra. O nome genérico Araujia, foi dado em homenagem ao botânico amador António de Araújo e Azevedo, o 1º conde da Barca, e o “apelido” específico sericifera está relacionado com os filamentos sedosos que rodeiam as sementes.

Não se sabe, é sempre difícil conhecer, quando e quem introduziu a sumaúma-bastarda nos Açores. Sabe-se que chegou à Europa no século XIX como ornamental e têxtil, para aproveitamento da fibra do fruto, e que a espécie já estava presente, em 1856, no Jardim José do Canto, em Ponta Delgada.

Em 1966, no seu “Catálogo das Plantas Vasculares dos Açores”, Ruy Telles Palhinha considerava a sumaúma-bastarda subespontânea em São Miguel e na Terceira. Hoje, a espécie pode ser encontrada em todas as ilhas dos Açores, exceto em São Jorge e no Corvo.

De acordo com informação colhida no livro “Flora Terrestre dos Açores”, de Virgílio Vieira, Mónica Moura e Luís Silva, a sumaúma-bastarda que é utilizada como ornamental escapou-se da cultura e tornou-se uma espécie invasora, sendo “frequente em arribas, matos de Morella e Pittosporum, sebes, terrenos abandonados, muros nas margens de matas e beiras de estradas; geralmente até 300 m de altitude.”

Embora se desconheça qualquer uso da planta na medicina popular e na alimentação nos Açores, a sumaúma-bastarda possui propriedades medicinais, sendo muito usada pelos nativos das regiões de onde é originária. As folhas, os frutos e sobretudo as sementes são também usadas na alimentação humana.

As folhas da sumaúma-bastarda constituem uma alternativa às da planta-da-seda (Gomphocarpus physocarpus E. Mey.) como fonte de alimento para as lagartas das borboletas monarca.

Pico da Pedra, 30 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

(Membro do Núcleo Regional dos Açores da IRIS-Associação Nacional de Ambiente)

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Onde residiu Alice Moderno em Ponta Delgada?

Onde residiu Alice Moderno em Ponta Delgada?

Desconhecemos onde morou Alice Moderno quando vivia com os pais em Ponta Delgada. Sabe-se que, em 1883, o pai possuía o consultório na Rua do Colégio, nº 65 (atual rua Carvalho Araújo). Não sabemos se o consultório se localizava no mesmo edifício da moradia.

Foto1- Rua do Colégio, 65 (porta da direita)
Em 1887, quando a família foi viver para a Achada do Nordeste, Alice Moderno fica, em Ponta Delgada, em casa da Dona Rosa Emília de Sequeira Morais, localizada na Rua dos Mercadores, nº 21, 2º andar.

Foto 2- Rua dos Mercadores, nº 19 (o nº 21 não existe atualmente, a porta a meio tem o número 19)

Em princípios de 1893, Alice Moderno já se encontrava a viver no número 69 da Rua dos Mercadores, em casa da senhora Maria Augusta de Morais.

Foto 3- Rua dos Mercadores, 69 (porta à direita)

Ainda no ano de 1893, Alice Moderno começa a viver em casa de D. Maria Emília Borges de Medeiros, na Rua da Fonte Velha, nº 36 (atual Rua Manuel da Ponte). Viveu nesta casa, cujo usufruto vitalício lhe fora legado por aquela senhora, até ao fim da sua vida em 1946.

Foto 4- Rua Manuel da Ponte, 36 (porta ao centro debaixo da placa)

Todas as imagens estarão corretas se não foram, ao longo do tempo, alterados os números de polícia.

Fonte: Vilhena. M. (1987). Alice Moderno: A mulher e a obra. Angra do Heroísmo. Direção Regional dos Assuntos Culturais-Secretaria Regional de Educação e Cultura

Pico da Pedra, 21 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

sábado, 17 de dezembro de 2022

Uma palmeira-da-geleia, uma brassaia e algumas mélias no Pico da Pedra


Uma palmeira-da-geleia, uma brassaia e algumas mélias no Pico da Pedra

Ao contrário dos textos anteriores em que fiz menção a plantas existentes em ruas do Pico da Pedra ou em espaços públicos, hoje faço referência a três plantas existentes em espaços privados, mas visíveis para todos os transeuntes que passem na Rua Fernando Dias Martins Carreiro, na Avenida da Paz e na Rua da Saudade.

Na Rua Fernando Dias Martins Carreiro podem ser vistas duas palmeiras-da-geleia (Butia capitata).

A palmeira da-geleia é uma planta da família Arecaceae, originária do Brasil, Uruguai e Argentina que floresce geralmente nos meses de maio a agosto.

A palmeira-da-geleia, que normalmente possui uma altura com 3 a 5 m, é uma bonita planta ornamental que produz uns frutos comestíveis, chamados coquinhos, ricos em vitaminas A e C, que podem ser utilizados para o fabrico de sumos, gelados, compotas, geleias e licores.

Embora haja várias receitas para o fabrico do doce de coquinho, abaixo transcrevo uma delas, retirada o blogue O Avental da Ana (https://oaventaldaana.blogspot.com/):

Ingredientes: 800 g de frutos (pesados sem caroço) e 400 g de açúcar

Preparação: Colocam-se numa panela os frutos e o açúcar, leva-se ao lume até a fruta cozer. A seguir, com o auxílio de uma varinha mágica desfaz-se até ficar numa pasta grossa.

No passado dia 1 de novembro, ao passar na referida rua vi que os proprietários das palmeiras-da-geleia ofereciam a todos os interessados os frutos daquela planta, os coquinhos. A generosidade era tanta que também cediam sacos para o transporte. Uma brilhante ideia, que embora comum em alguns países sobretudo nórdicos, é rara entre nós, sendo por isso louvável.

Na Avenida da Paz, encontra-se uma planta ornamental muito bonita, sobretudo quando está no período de floração, denominada brassaia ou árvore-guarda-chuva (Schefflera actinophylla).

Pertencente à família Araliaceae, a brassaia é uma planta oriunda da Austrália e da Nova Guiné que floresce nos meses de agosto, setembro e outubro. Podendo crescer até 15 m de altura, a brassaia pode produzir até 1000 flores que dão origem a grandes quantidades de néctar.

Muito rara na ilha de São Miguel, para além do exemplar existente no Pico da Pedra, apenas conhecemos outras brassaias na Avenida Gaspar Frutuoso, em Ponta Delgada, e na Rua do Passal, na cidade da Ribeira Grande.

Na Rua da Saudade, é possível observar mais do que uma mélia, também conhecida por amargoseira, lilás-da-índia ou sicómoro (Melia azederach).

Pertencente à família Meliaceae, a mélia, que pode atingir 20 m de altura ou mais, é originária da Ásia-Sul e Oriente, e está em flor, entre nós, nos meses de abril e maio.

A mélia é cultivada como ornamental em quase todo o mundo e é usada em jardins ou em arruamentos. As suas folhas são usadas com fins medicinais e as flores são muito aromáticas e muito visitadas pelas abelhas e outros polinizadores. A sua madeira é muito fácil de trabalhar pelo que pode ser usada em carpintaria.

Pico da Pedra, 19 de novembro de 2022

(Voz Popular, 202, dezembro de 2022)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

Luís Rocha Monteiro: Biólogo, cientista e ambientalista notável

Luís Rocha Monteiro: Biólogo, cientista e ambientalista notável

A 11 de dezembro faz 23 anos que faleceu, no acidente aéreo ocorrido na ilha de São Jorge, o biólogo e investigador do Departamento de Oceanografia e Pescas (DOP) da Universidade dos Açores, Luís Manuel Ribeiro da Rocha Monteiro.

Luís Monteiro, que tem o seu nome perpetuado através do painho-de monteiro (Oceanodroma monteiroi), uma nova espécie de ave marinha que descobriu e estudou, foi muito mais do que um mero investigador universitário. Com efeito, nos seus curtos 37 anos de vida, desenvolveu uma atividade cívica digna de registo, quer através da sua participação associativa, quer através das campanhas de defesa do património natural que implementou.

No que diz respeito ao associativismo ambiental, Luís Monteiro foi o principal dinamizador do Núcleo do Faial da Quercus e foi membro dos Amigos dos Açores-Associação Ecológica.

No que concerne a ações de sensibilização e educação ambientais e de pressão política, destacamos o “Projeto Azorica”, a campanha “Um espaço para os Garajaus” e “A Escola e o Cagarro/SOS Cagarro”.

Entre 1990 e 1995, Luís Monteiro foi o criador e principal dinamizador do “Projeto Azorica” que consistiu numa petição intitulada “Pela Sobrevivência da Vegetação Autóctone dos Açores”. A petição tornada pública em março de 1990, recolheu 6527 assinaturas, tendo sido entregue, em 1992, aos órgãos de soberania regionais, nacionais e comunitários. Como resultado desta petição, em 1995, a Assembleia Legislativa Regional aprovou uma Resolução (nº 13/95/A) onde recomendava que o governo implementasse um plano visando a proteção e conservação efetiva das zonas ecologicamente mais valiosas do Arquipélago, do ponto de vista botânico.

Em março de 1993, por iniciativa de Luís Monteiro e com a colaboração dos Amigos dos Açores, foi lançada a campanha “Um espaço para os garajaus”, em defesa dos garajaus, comum e rosado, tendo naquele ano e nos seguintes sido editados milhares de folhetos sobre as duas espécies, que foram distribuídos essencialmente nas escolas, e foram promovidas pequenas exposições, também em escolas e em sedes de juntas de freguesia.

Por iniciativa de Luís Monteiro as ações em defesa dos cagarros começaram em novembro de 1993, altura em que foi lançada a campanha “A escola e o cagarro” no âmbito da qual foi aplicado um inquérito, sobre a espécie, destinado a alunos das escolas, nomeadamente do 1º e 2º ciclos do ensino básico e distribuídos 10 mil folhetos informativos sobre a espécie.

Dois anos depois também por iniciativa de Luís Monteiro, surgiu a campanha “SOS Cagarro”, no âmbito do projeto LIFE “Conservação das comunidades de aves marinhas dos Açores”. Para a concretização do projeto a Direção Regional do Ambiente colaboraria com o DOP na coordenação e execução das ações de conservação direta e participaria nas ações de inventariação e monitorização de espécies. Por seu turno, os Amigos dos Açores apoiariam as ações de conservação direta, nomeadamente informação e sensibilização.

Com a sua morte prematura a Ciência e a sociedade perderam um grande investigador e um ativista ambiental que muito teria a dar para a construção de uma sociedade açoriana mais respeitadora de todos os seres vivos.

O Núcleo Regional dos Açores da IRIS-Associação Nacional de Ambiente recorda-o com saudade e não o esquecerá.

Açores, 10 de dezembro de 2022

P'lo Núcleo Regional dos Açores da IRIS

Teófilo Braga

Fotografia: http://siaram.azores.gov.pt/.../luis-rocha.../galeria/2.html

domingo, 4 de dezembro de 2022

Alice Moderno e o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais

Alice Moderno e o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais

No dia 11 de abril de 1915, Alice Moderno publicou, no seu jornal “A Folha”, o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais.

A letra é do jornalista Alberto Bessa (1861-1930) e a música da autoria de Thomaz de Lima (1887-1950). Alberto Bessa foi escritor e jornalista e António Thomaz de Lima foi violinista, compositor, maestro e professor no Conservatório Nacional de Lisboa, tendo residido em São Miguel, onde nasceu o seu filho Eurico Thomaz de Lima, na cidade de Ponta Delgada, em 1908.

Embora, hoje, o entendimento que se tem do “papel” dos animais no mundo seja bastante diferente do que havia no início do século XX, a letra do hino é clara ao afirmar que devemos amar e proteger todos os seres vivos, como se pode concluir através da leitura dos dois últimos versos:

“Sejamos todos bons para tudo o que é vivente:

- Árvore ou animal, insetos ou passarinho.”

Hino das Associações Protetoras dos Animais

Se o homem foi fadado o rei da criação,

E à frente dos mais seres a natureza o pôs,

É seu dever prestar aos outros proteção,

Sem ter jamais direito a ser o seu algoz.

Um povo civilizado

Só é o que souber

A tudo o que é criado

Amar e proteger

No mundo os animais são nossos companheiros,

E embora a natureza os fizesse inferiores,

É certo que lhes deu afetos verdadeiros,

Tornando muitos deles em nossos servidores.

Um povo civilizado

Só é o que souber

A tudo o que é criado

Amar e proteger

Devemos todos, pois, tratá-los com piedade,

Que há uma só justiça, com uma só razão,

Ambas a condenar toda a barbaridade,

Ambas a reclamar para eles compaixão.

Ser bom é uma virtude augusta e resplandecente,

Da qual cumpre seguir o largo e bom caminho,

Sejamos todos bons para tudo o que é vivente:

-Árvores ou animal, inseto ou passarinho.

Pico da Pedra, 4 de dezembro de 2022

Teófilo Braga