terça-feira, 30 de outubro de 2018



“Encontro com uma profissão” de Eduardo Calisto de Amaral (1)


Embora apresente na capa a data de 2017, foi editado este ano um livrinho, da autoria do professor Eduardo Calisto Soares de Amaral, intitulado “Encontro com uma profissão”.

Com uma tiragem pequena e com uma distribuição restrita, o que é uma pena, o último trabalho daquele professor que marcou não só os seus alunos, mas todos os que com ele conviveram, merecia, pelos ensinamentos que dele se poderá extrair, uma maior divulgação. Contudo a decisão da família não foi esta e deve ser respeitada.

A pedido da família, o que muito me honrou, escrevi uma nota introdutória que achei por bem dar a conhecer aos leitores do Correio dos Açores. Dada a sua extensão, nesta semana divulgo a primeira parte e na próxima a segunda.

Este livro, tal como sugere o seu título, aborda parte da vida do professor Eduardo Calisto Soares de Amaral, com destaque para o período que vai desde 1955, ano em que iniciou a sua carreira profissional, na Escola Velha da Ribeira Seca, na Calçada, até 1992, ano em que se aposentou, estando também colocado na mesma localidade, mas no edifício do Plano dos Centenários.

Nesta nota introdutória, que escrevo com todo o gosto a pedido da sua família, é-me impossível fazer referência a todos os assuntos que o professor Eduardo Calisto aborda no seu livro, como o serviço militar que teve de cumprir por duas vezes, a aquisição e as alterações sofridas na sua casa, onde acabaria por habitar ainda antes de chegar a luz elétrica, a frequência de um curso de Orientação Pedagógica, as romarias à Senhora da Paz, as visitas de estudo anuais, o cantar à Estrelas, as festividades em honra de São João, etc., etc.. Assim, apenas destacarei as questões relacionadas com a educação.

Embora o professor Eduardo Calisto nunca esqueça, ao longo do texto, todas as pessoas que com ele cooperaram, com destaque para a sua “companheira de toda a vida”, a professora Adelaide da Conceição Soares, e para o seu cunhado, o professor Valter Soares Ferreira, que possuía uma destreza tal que era capaz de “reparar, melhorar, construir tudo e qualquer coisa que pudesse, de certo modo, melhorar o nível do ensino, no aspeto prático e visualizado”, esta pequena obra é muito mais do que uma despretensiosa autobiografia. Com efeito, através da sua leitura atenta é possível conhecer um pouco do estado da educação em dois regimes políticos diferentes, o Estado Novo, distinguindo-se dentro deste o período que foi até 1970, ano em que o Professor Catedrático José Veiga Simão assumiu o cargo de Ministro da Educação Nacional, e o regime democrático instituído a 25 de abril de 1974.

No que concerne às escolas, as descrições do Prof. Eduardo Calisto mostram que, sobretudo antes do Plano dos Centenários (1941-1969), que surgiu para, entre outras razões, acabar com o mau estado das instalações existentes nas várias escolas e para suprir a falta de salas para a separação dos sexos, não eram as mais dignas tanto para os docentes como para os alunos. A título de exemplo refiro o caso da Escola Velha da Ribeira Seca onde numa das salas “o professor, se sentado, não tinha visibilidade nenhuma para uma parte da sala” e as retretes sobretudo a masculina onde “por vezes as fezes chegavam a sair pela porta fora”.

Mas mais importante do que a apresentação do estado lastimável em que encontravam as instalações escolares, o mérito do Professor Eduardo Calisto está em não se ter conformado com a situação e, quer com ajuda exterior, quer recorrendo aos próprios meios, isto é, ao seu trabalho, ao dos colegas, e ao dos alunos, como no caso da escola referida, transformou o recreio desprezado num “belíssimo campo de mini-futebol “e “num pequeno jardim rústico”.

Relativamente à Escola Nova da Ribeira Seca, embora o edifício já apresentasse melhores condições, ao longo do tempo foi sofrendo melhoramentos, dos quais destaco o arranjo da latada da frente, a construção do tanque-piscina, o fecho dos alpendres, a instalação de alto-falantes e de intercomunicadores nas diversas salas, as alterações na cozinha e no refeitório e a construção dos anexos com duches e vestiários, etc. etc.

Teófilo Braga

domingo, 28 de outubro de 2018

COMBATE À TAUROMAQUIA NOS AÇORES: DO INÍCIO DO SÉC. XX ATÉ 2012



COMBATE À TAUROMAQUIA NOS AÇORES: DO INÍCIO DO SÉC. XX ATÉ 2012

Neste texto tenta-se fazer uma primeira reflexão, necessariamente incompleta por escassez de tempo, acerca da oposição às touradas nos Açores, desde o início do século XX até ao ano de 2012.
Na luta contra a tauromaquia, nos Açores, podemos distinguir três fases: a do combate individual, a da oposição à “espanholização” das touradas e a da defesa da abolição de todo o tipo de touradas.
A Primeira Fase
A primeira fase (1901- abril de 1988) é a fase da oposição às touradas por parte de algumas personalidades açorianas, que se distinguiram no campo da ciência, da cultura, da literatura e da vida política, algumas delas a residir fora dos Açores.
Nesta fase distinguiram-se, entre outras pessoas, Alice Moderno (1867-1946) (fig.1) que para além da sua atividade de jornalista, escritora, agricultora e comerciante, foi uma mulher que pugnou pelos seus ideais republicanos e feministas, sendo uma defensora da natureza e amiga dos animais.

Alice Moderno foi uma das fundadoras da Sociedade Micaelense Protectora dos Animais e não foi indiferente às touradas. Com efeito, o jornal que dirigiu A Folha (1902-1917) deu guarida a diversos textos contra as touradas, a maioria dos quais da autoria do zoófilo Luís Leitão.
Foi convidada e assistiu contrariada a uma tourada, na ilha Terceira, e não ousou comunicar aos seus amigos, considerando-os “semi-espanhóis no capítulo de los toros”, o que pensava pois, escreveu ela, “não compreenderiam decerto a minha excessiva sentimentalidade”.
Na sua carta XIX, referindo-se à tourada a que assistiu escreveu o seguinte:
“É ele [cavalo], não tenho pejo de o confessar, que absorve toda a minha simpatia e para o qual voam os meus melhores desejos. Pobre animal, ser incompleto, irmão nosso inferior, serviu o homem com toda a sua dedicação e com toda a sua lealdade, consumindo em seu proveito todas as suas forças e toda a sua inteligência! (…) Agora, porém, no fim da vida, é posto à margem e alugado a preço ínfimo, para ir servir de alvo às pontas de uma fera, da qual nem pode fugir, visto que tem os olhos vendados!”
“E esta fera [touro], pobre animal, também, foi arrancada ao sossego do seu pasto, para ir servir de divertimento a uma multidão ociosa e cruel, em cujo número me incluo! (…) Entrará assim em várias toiradas, em que será barbaramente farpeada até que, enfurecida, ensanguentada, ludibriada, injuriada, procurará vingar-se, arremessando-se sobre o adversário que a desafia e fere. Depois de reconhecida como matreira, tornada velhaca pelo convívio do homem, será mutilada”.
Alfredo da Silva Sampaio (1872 - 1918), que foi um médico açoriano que se notabilizou como naturalista, como fundador do primeiro posto de observação meteorológica na ilha Terceira e autor de uma vasta obra sobre a história, a geografia e a história natural da Terceira, insurgiu-se contra o barbarismo das touradas à corda que na sua altura eram muito mais violentas/desumanas do que são hoje.
Embora longa a citação, retirada do seu livro “Memória da Ilha Terceira” (Fig. 2), publicada em 1904, vale a pena a leitura do seu texto sobre as touradas à corda:
“Uma corrida de touros à corda constitui, desde muito tempo, o principal divertimento do povo terceirense. Por ela abandonam os trabalhadores os campos, as oficinas, etc., deixando de ganhar o seu salário, para se transportarem a algumas léguas de distância, a verem um toiro, que, na maior das vezes, nada tem de bravo, e que percorre, amarrado por uma longa corda, algumas centenas de metros de uma estrada.
São geralmente em dias de trabalho que têm lugar estas corridas, e no dia seguinte ao de uma festa do Espírito Santo ou de outra qualquer festa religiosa. Ou são os impérios que promovem este divertimento público, ou qualquer influente político que, querendo ser grato aos seus amigos, promove e concorre com a maior parte das despesas.

Se é agradável e pitoresco a aglomeração de povo armado de compridos e grossos varapaus ferrados (muitas vezes mais perigosos que o touro), e os balcões e janelas das casas repletas de raparigas com vestuários de variegadas cores, ao mesmo tempo é bárbaro ver a corrida de um pobre animal, geralmente malezzo, ser espicaçado por milhares de paus, que lhe produzem largos ferimentos, chegando algumas vezes a esvaírem-lhes os olhos.

Findo o espectáculo, que é anunciado por muitos foguetes, recolhe o povo satisfeito a suas casas, sem se lembrar do salário que perdeu, e que pode facilmente adquirir ali a causa da sua morte.”


O libertário terceirense Adriano Botelho (1892-1983) manifestou, num texto intitulado “Contra os espectáculos imorais”, publicado, em 1925, no suplemento literário ilustrado do jornal A Batalha e reunido no livro “Adriano Botelho, memória e ideário” (fig.3), uma opinião muito semelhante à de Alice Moderno, como se pode concluir através da leitura do seguinte extrato:
”…fazem-se por outro lado, reclames entusiastas de espectáculos, como as touradas de praça onde por simples prazer se martirizam animais e onde os jorros de sangue quente, os urros de raiva e dor e os estertores da agonia só podem servir para perverter cada vez mais aqueles que se deleitam com o aparato dessa luta bruta e violenta, sem qualquer razão que a justifique”.




Companheiro de Adriano Botelho no movimento anarquista português, o cientista terceirense Aurélio Quintanilha (1892-1987) (fig. 4) que, entre outras funções, foi professor da Universidade de Coimbra, foi também um opositor às touradas tendo, a meados do século passado, afirmado o seguinte:
"Como homem e como professor não posso deixar de lhes enviar a minha mais completa e entusiástica adesão ao protesto levantado pela Sociedade Protectora dos Animais contra um espectáculo indigno do nosso tempo, da nossa mentalidade, da nossa civilização".



A Segunda Fase
A segunda fase (maio 1988- maio de 2009) é balizada pela oposição à introdução de touros de morte nos Açores e o chumbo, a 14 de maio de 2009, pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores de um Projecto de Lei destinado a introduzir a sorte de varas.
Na sequência da notícia da apresentação por Adolfo Lima, Secretário Regional da Agricultura e Pescas para análise, em Plenário do Governo Regional dos Açores, suportado pelo PSD, de uma proposta que havia sido elaborada pelo Dr. Álvaro Monjardino (fig. 5), através da qual se pretendia que nos Açores fosse introduzida as touradas com touros de morte, os Amigos da Terra/Açores (atualmente Amigos dos Açores) organizaram uma campanha internacional que culminou com a apresentação de uma petição ao Parlamento Europeu.



A intenção não avançou, tendo na altura o presidente do Governo Regional dos Açores, Dr. Mota Amaral, comunicado ao Director do Eurogroup for Animal Welfare que a legislação não avançaria devido às "reacções negativas da opinião pública".
A 21 de outubro de 1995, na ilha Terceira, realizou-se numa quinta particular uma tourada à espanhola, onde foram toureados e mortos dois touros. Na ocasião, tal ato a que assistiu o atrás mencionado membro do governo foi contestado por várias pessoas singulares e coletivas, como os Amigos dos Açores (fig. 6), algumas sociedades protetoras de animais e pelo partido os Verdes, na Assembleia da República.
Em resposta, a um ofício dos Amigos dos Açores, aquela associação recebeu da Presidência do Governo Regional dos Açores um ofício que dava conta que o Presidente do Governo Regional dos Açores, Dr. Mota Amaral, tinha dado a devida atenção ao “protesto manifestado, informando que se tratou de um espetáculo realizado numa propriedade particular e que este tipo de touradas estão proibidas nos Açores” e acrescentava que “O Governo Regional por princípio e tendo sempre, também, em conta o impacto negativo na opinião pública açoriana de semelhante ato, envidará todos os seus esforços para que tal não se venha a repetir na Região Autónoma dos Açores”.

A 18 de outubro de 2002, o parlamento aprovou a introdução da sorte de varas, com 26 votos a favor, 13 contra e 4 abstenções. Este diploma veio a ser “chumbado” pelo Ministro da República, Sampaio da Nóvoa, já que não se revestia de interesse específico regional.
A contestação a esta nova tentativa de introdução da sorte de varas, como primeiro passo, para a introdução de touros de morte, partiu novamente dos Amigos dos Açores e, desta vez, contou, também, com a participação da Associação dos Amigos dos Animais da Ilha Terceira, que elaborou uma petição que recolheu duas mil assinaturas e que foi entregue ao Ministro da República (fig. 7).


Mais uma tentativa de introdução da sorte de varas, nos Açores, terminou, a 14 de Maio de 2009, com o chumbo pela Assembleia Legislativa Regional de uma proposta naquele sentido. Na votação, 28 deputados votaram contra e 26 a favor, registando-se duas abstenções e a ausência de um deputado do Partido Socialista que fora um dos seus proponentes.
A campanha contra esta última tentativa da introdução da sorte de varas partiu do Blogue Terra Livre/CAES - Colectivo Açoriano de Ecologia Social e contou com a participação da Associação de Amigos dos Animais da Ilha Terceira, que manifestou a sua discordância, dos Amigos dos Açores - Associação Ecológica, que para além da sua tomada de posição na comunicação social, enviou uma carta à Unesco, do CADEP, de Santa Maria, cujo coordenador escreveu vários textos para a comunicação social e outros dirigidos aos deputados, para além do contacto pessoal com alguns deles.
Para além das associações referidas, tomaram posição pública a Azórica, através de um texto assinado pelo seu presidente, e a Sociedade Micaelense Protectora dos Animais, que já não tinha qualquer atividade há alguns anos e que nunca mais deu razão de si depois, também emitiu um comunicado onde apelava aos deputados regionais para não aprovarem “os espetáculos que têm como pano de fundo os maus-tratos e o sofrimento dos animais”.
Foi no decurso da campanha, que vimos referindo, que surgiu o coletivo virtual “Açores Melhores sem Maus Tratos aos Animais” cujo principal é a Proteção dos Animais nos Açores, mas que é solidário com todas as lutas que tenham o mesmo fim em qualquer parte do Planeta.


A Terceira Fase

A terceira fase, iniciada em junho de 2009, surge como reação à tentativa de estender a tauromaquia a outras ilhas dos Açores, nomeadamente a São Miguel e a Santa Maria.
A expansão do negócio sujo da tauromaquia para as outras ilhas tem contado com o apoio direto ou indireto de departamentos do Governo Regional dos Açores, como a Direção Regional do Desenvolvimento Agrário, de alguns presidentes de Câmaras Municipais, com destaque para a de Lagoa, por juntas de freguesia, por um pároco e as últimas por Irmandades do Espírito Santo e pela Associação de Estudantes da Universidade dos Açores, cujo presidente é natural da ilha Terceira e tem ligações com a Tertúlia Tauromáquica Terceirense.
Como é impossível fazer algo na ilha Terceira, no que às touradas à corda diz respeito, pois este ano durante 168 dias, da época oficial, realizaram-se 244 touradas, ainda assim menos 13 do que no ano anterior, a reação tem-se limitado ao protesto pela realização de touradas noutras ilhas, sempre que é do conhecimento público (fig. 10).

Para o caso da ilha Terceira foram feitos protestos, envio de e-mails a várias entidades, pelo facto de ser ter realizado uma tourada de praça no dia 20 de junho de 2010, dia de luto nacional pela morte do escritor José Saramago, o que é proibido pelo artigo 12º do
Decreto Legislativo Regional n.º 11/2010/A (Regulamento Geral dos Espectáculos Tauromáquicos de Natureza Artística da Região Autónoma dos Açores). Foram, também, enviados, em outubro de 2010, e-mails à Diretora Geral da UNESCO para que esta “recuse a inscrição da Festa Brava da Terceira como Património Imaterial da Humanidade, por parte da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo. Mais recentemente, na sequência da promoção pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores de uma tourada à corda no programa das comemorações do Dia dos Açores que foi celebrado, no dia 13 de junho de 2011, na cidade da Praia da Vitória, na ilha Terceira (Açores) foi feita uma campanha de protesto junto da Assembleia Legislativa Regional que decidiu transformar os e-mails enviados em petição.

As formas de protesto utilizadas têm sido a emissão de comunicados para a comunicação social, a publicação de textos em blogues, o envio de e-mails e ou petições aos promotores. Por uma única vez, em julho de 2009, um grupo de pessoas decidiu manifestar-se na rua contra a realização de uma tourada à corda promovida pela Câmara Municipal da Lagoa, ilha de São Miguel, tendo sido vítimas de agressões verbais e físicas, alegadamente por parte de funcionários da autarquia.

Nesta fase surgiu, em julho de 2009, o blogue/coletivo de defesa dos animais “Arquipélago dos Animais” que combateu todos os espetáculos com uso de animais (touradas, vacadas, bezerradas, rodeios, etc.)

Para além do blogue/coletivo Arquipélago dos Animais, continuam ativos nesta fase os Amigos dos Açores, o CADEP- Clube de Amigos e Defensores do Património de Santa Maria, o Blogue Terra Livre/CAES - Coletivo Açoriano de Ecologia Social e o blogue/coletivo Açores Melhores sem Maus Tratos Animais.


Mais recentemente, já em 2012, um pequeno grupo de pessoas que já trabalhava em conjunto e mantinha uma lista de discussão na internet decidiu criar um coletivo informal, o Movimento Cívico Abolicionista da Tauromaquia dos Açores, que integra elementos da ilha de São Miguel e da ilha Terceira e que mantém uma lista de discussão, onde para além de pessoas das ilhas referidas também tem incluídas pessoas da ilha de Santa Maria.
A 23 de março, de 2012, começou a recolha de assinatura para a petição “Pelo Fim dos Subsídios Públicos à Tauromaquia nos Açores”. Esta petição deu entrada na ALRA a 20 de abril de 2012. Sobre a mesma foi elaborado um vergonhoso relatório pela Comissão dos Assuntos Sociais da ALRA, onde esta justifica “a tortura” dado o interesse cultural e turístico.
A 13 de Julho de 2012, foi feita, por ofício ao Diretor Regional da Cultura, uma denúncia acerca da presença de crianças em touradas. Como resposta aquela direção regional comunicou que a denúncia sido enviada à Tertúlia Tauromáquica Terceirense em para esta se pronunciar. No dia 10 de outubro foi enviada nova carta a perguntar que medidas foram tomadas para punir os prevaricadores.
A 12 de novembro de 2012, foi divulgado o manifesto pelo fim da tauromaquia nos Açores. Neste o MCATA para além de divulgar o seu grande objetivo que é a abolição da tauromaquia nos Açores, divulga os princípios que adota e que são:

● Independência face a qualquer outro tipo de grupo social constituído, como partidos políticos, organismos oficiais, grupos económicos, crenças religiosas ou outros grupos de interesse;
● Sem fins lucrativos, todo o trabalho é estritamente voluntário;
● Sem quaisquer hierarquias, é privilegiada a discussão e o consenso como principal método de tomada de decisões.
● A não-violência, o respeito pelo outro e o diálogo estão na base de todas as iniciativas e intervenções.

Considerações Finais
Embora seja cada vez maior o número de pessoas que perde o medo de manifestar a sua discordância para com a realização de espetáculos que de um modo ou de outro maltratam os animais, como as touradas, as organizações dos Açores que se têm oposto aos mesmos são muitas fracas, tendo em conta o poder económico e o apoio político que possuem os promotores das touradas pelo que o combate à industria tauromáquica só terá êxito se o que tudo o que for feito nos Açores tiver um vasto apoio nacional e internacional.

Bibliografia:
Abreu, C. & Freire, J.(1989) (Org.). Adriano Botelho, memória & ideário (antologia de textos). Angra do Heroísmo: Direcção Regional dos Assuntos Culturais.
Sampaio, A. (1904). Memória sobre a Ilha Terceira. Angra do Heroísmo: Imprensa Municipal.
Vilhena, A. (1987). Alice Moderno a mulher e a obra. Angra do Heroísmo: Direcção Regional dos Assuntos Culturais.

(Letra a Letra, nº 7, outubro de 2018)

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

APONTAMENTOS SOBRE PAULO FREIRE


APONTAMENTOS SOBRE PAULO FREIRE

Comecei a ler, recentemente, o último livro de José Pacheco, fundador da Escola da Ponte, que é uma referência em termos de inovação pedagógica, mas que infelizmente é mais conhecida no estrangeiro do que em Portugal.

José Pacheco, no seu livro “Um compromisso ético com a educação” cita, entre os vários autores que o inspiraram, o nome de Paulo Freire (1921-1997) que é considerado como o mais célebre educador brasileiro.

Paulo Freire é um nome que me é familiar desde os finais de 1974 ou no início de 1975 quando alguns militares ligados ao Movimento das Forças Armadas estiveram em Vila Franca do Campo e me ensinaram o que designaram “método de Paulo Freire” para posteriormente o aplicar junto de pessoas que não sabiam ler nem escrever. Tal ocorreu com algum sucesso, pois com algumas sessões realizadas no primeiro andar de um edifício do senhor Alfredo Gago, situado na rua Teófilo de Braga, onde no rés-do-chão existia uma padaria, foi possível ensinar a ler a dois adultos que até então nem conheciam ou conheciam muito mal as letras do alfabeto.

Paulo Freire começou a trabalhar com adultos analfabetos em 1947, tendo sido professor de História e Filosofia da Educação na Universidade do Recife. A partir de 1962 o seu método de ensino começou a ser experimentado e em 1963-64 foi aprovado um plano para que fossem abrangidos, no Brasil, dois milhões de analfabetos.

Em 1964, após um golpe de estado ocorrido no Brasil, Paulo Freire foi preso e teve de se exilar. Mais tarde, o seu método passou a ser aplicado no Chile e no ano 1969-70 foi professor convidado no Centro de Desenvolvimento e Mudança Social de Harvard.

Entre as várias ocupações e cargos que desempenhou, destacamos o de Secretário-Geral do Concelho Mundial das Igrejas.

Da sua vasta obra publicada, destacamos os seguintes livros: “Pedagogia do Oprimido”, “Educação como Prática da Liberdade” e “Uma Educação para a Liberdade”.

De acordo com Paulo Freire, o homem pode ser encarado como pessoa ou como coisa. Se o encararmos como coisa, a educação só pode conduzir a uma cada vez maior domesticação do homem e o ato educativo não é mais do que um ato de depositar conteúdos. Esta visão a que ele chama "conceção bancária" é a que infelizmente ainda predomina ainda nos dias de hoje.

Por outro lado, se o homem é visto como uma pessoa, deixa de ser uma "caixa passiva, que vai sendo preenchida", mas "um corpo consciente, desafiado e respondendo ao desafio", que está aberto ao mundo e atua de modo a transformá-lo.

Nesta segunda conceção chamada por Paulo Freire de humanista está afastada qualquer possibilidade do educador (professor) manipular o educando (aluno) porque nela está subjacente o seguinte: ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho e todos se educam entre si, mediatizados pelo mundo.

Sobre a tão apregoada neutralidade da educação/ensino, Paulo Freire é de opinião de que tal não passa de um mito. Com efeito, tal como Ivan Illich que considerava que as escolas constituem instrumentos de controlo social, ele defendeu que de forma consciente ou não a atividade dos educadores "desenvolve-se ou para a libertação dos homens- a sua humanização-, ou para a sua domesticação - o domínio sobre eles".

Para terminar este texto, que tem como fonte o último livro da autoria de Paulo Freire referido anteriormente, deixo uma pequena nota sobre o que ele chama de analfabeto político que “é alguém que tem uma perceção ingénua das relações dos homens e do mundo, uma inteligência ingénua da realidade social”. O analfabeto político ou não tem em conta a realidade e considera que o futuro é a repetição do presente ou considera que aquele já está pré-estabelecido. A primeira perceção ele considera reacionária, a segunda ele escreve que “é uma das deformações mecanicistas do pensamento marxista”.

Teófilo Braga
(enviado ao Correio dos Açores 14 de outubro de 2018, não publicado)

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Letra a Letra


Acabou de sair o número 7 da revista, não periódica, “Letra a Letra”.

Neste número, os Açores estão em destaque com um texto de Dimas Simas Lopes, médico e artista terceirense, intitulado “Gandhi e Agostinho da Silva, Dois Mestres para o Século XXI” e um do micaelense Teófilo Soares Braga intitulado “Combate à tauromaquia nos Açores: do início do século XX até 2012”.

Para além dos textos referidos, é dado realce à ilha do Corvo. Assim, é republicada uma crónica, intitulada “Corvo - a ilha do comunismo patriarcal” de Paul Bartel, que viu a luz pela primeira vez no Correio dos Açores de 24 de setembro de 1933 bem como uns apetitosos textos do escritor Fernando Dacosta.

A revista pode ser pedida através do seguinte contato:
jope103 (arroba) hotmail.com

J.S.

Jogos da minha infância (2)

Quatro cantos (cantinhos)

Na terra ou num local cimentado, geralmente com um pedaço de telha (no cimento podia ser um giz, geralmente trazido da escola) desenhava-se um quadrado e traçavam-se as diagonais e duas linhas em cruz, unindo os centros dos lados do mesmo.

Cada jogador (só podem jogar dois de cada vez) usava três pedrinhas diferentes com o objetivo de as colocar alinhadas, em qualquer direção.

Como geralmente eram muitos os interessados em participar, jogava-se ao “bota fora”, isto é, quem perdia dava o seu lugar a outro.

sábado, 20 de outubro de 2018

Jogos da minha infância (1)

Ahhhhh Rolha!

Trata-se de um jogo de equipas, em que uma delas fica num determinado local de olhos fechados para não observar os movimentos da outra que se vai esconder num determinado local.

O objetivo da equipa que se escondeu é chegar com todos os elementos ao sítio onde a outra esteve e o desta é apanhar os elementos da outra equipa, bastando para tal apanhar um.

Na Rua do Jogo, o local que servia de base era a chamado “Cimento da Amélia”, zona cimentada que ficava em frente à casa de uma senhora já idosa chamada Amélia e os locais preferidos para esconderijos eram os terrenos situados no Canto da Ponta Garça.

Não encontrámos qualquer referência bibliográfica a este jogo que tem semelhanças com o Ferro Quente, pelo que o nome que escolhemos é o do grito que a equipa que se escondia dava para dar sinal que o jogo podia começar, isto é, já podia ser procurada.

quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Dia Mundial do Ambiente


Partilha, nº 21, junho de 2008

terça-feira, 16 de outubro de 2018

Alice Moderno na Partilha


Partilha, nº 74, novembro de 2012

segunda-feira, 8 de outubro de 2018

A Escola de Ferrer, a de hoje e Agostinho da Silva


A Escola de Ferrer, a de hoje e Agostinho da Silva

Antes de dar a conhecer algumas ideias do pedagogo catalão Ferrer y Guardia (1859-1909) criador da Escola Moderna, tendo por base um livro que ele escreveu enquanto esteve preso na fortaleza de Montjuïc, esclareço que entre nós existe um Movimento da Escola Moderna, que não tem qualquer ligação com Ferrer, mas que foi inspirado no francês Célestin Freinet (1896-1966).

De acordo com Sílvio Gallo, Ferrer acreditava que se aprendia pelo afeto, isto é embora a aprendizagem “seja um ato mental, racional, nada se aprende se antes não passar pelo coração, se não mobilizar o desejo”.

Na Escola Moderna, seguia-se a “pedagogia racional” a qual segundo Sílvio Gallo é “um processo educativo que eduque pela razão, para que cada ser humano seja capaz de raciocinar por si mesmo, conhecer o mundo e emitir seus próprios juízos de valor, sem seguir nenhum mestre, nenhum guia”.

Começando pelas instalações escolares, Ferrer não aceitava uma escola fechada entre quatro paredes de modo que na sua Escola Moderna a par de salas bem decoradas, havia pátios destinados à realização de atividades ao ar livre. Além disso, toda a atividade escolar era complementada com visitas a fábricas e passeios diversos.

Num passado recente, nos Açores era fomentada a existência de clubes escolares e incentivava-se a realização de atividades extraescolares. Relativamente aos clubes, a Direção Regional da Educação chegou a editar um boletim intitulado “Clubismo” que no seu número oito, de dezembro de 1995, mencionava a existência nos Açores de trinta e um clubes. Hoje, restam muito poucos clubes que por vezes estão a funcionar com meia dúzia de alunos.

No que diz respeito a atividades extracurriculares, a recomendação é para a sua redução, com vista a não roubar tempo às aulas. Enfim, continua-se a privilegiar a transmissão de conhecimentos nas salas de aula, desligando a escola do meio onde se insere.

Sobre este assunto, Agostinho da Silva foi bem claro quando escreveu que “na escola aprendemos pouco e na vida aprendemos muito” e acrescentou: “só é viva a escola que estabelece com o ambiente uma série de trocas, que se deixa penetrar por ele amplamente e por sua vez o penetra e modifica”.

Embora não discutindo a utilidade de provas em alguma circunstância, o que é certo é que na Escola Moderna de Ferrer “não havia prémios nem castigos, nem provas em que houvessem alunos ensoberbecidos com nota dez, medianias que se conformassem com a vulgaríssima nota de aprovados nem infelizes que sofressem o opróbrio de se verem depreciados como incapazes”.

Ainda sobre a não existência de provas, Ferrer escreveu o seguinte: “os elementos morais que este ato imoral qualificado de prova inicia na consciência da criança são: a vaidade enlouquecedora dos altamente premiados; a inveja roedora e a humilhação, obstáculo de iniciativas saudáveis, aos que falharam; e em uns e outros, e em todos, os alvores da maioria dos sentimentos que formam os matizes do egoísmo”.

Agostinho da Silva, depois de referir que na escola tradicional são fomentados o isolamento e uma competição doentia, o que leva a que, ainda hoje, haja muitos alunos que não queiram trabalhar em grupo, escreveu que “a escola é uma carreira em que o aluno procura ultrapassar os camaradas e em que se sente sobretudo satisfeito quando for o primeiro da classe”.

Para Ferrer o “valor da educação reside no respeito à vontade física, intelectual e moral da criança”, assim o bom educador seria todo aquele que “contra as suas próprias ideias e suas vontades pode defender a criança, apelando em maior grau às energias próprias da própria criança”.

Agostinho da Silva que acreditava que “toda a educação verdadeira e sólida é uma autoeducação”, é mais claro quando se refere ao papel do professor que deve deixar de ser um mero transmissor de conhecimentos para ser um orientador dos alunos. Vejamos o que escreveu a este propósito sobre a Faculdade de Letras do Porto que foi extinta pelo governo: “…os mestres, mais do que ensinar, estimulavam a aprender e onde ninguém tinha de se pautar pelas receitas habituais, mas de escolher os seus próprios caminhos, certos ou errados”.

Teófilo Braga
Correio dos Açores, 31643, 9 de outubro de 2018, p. 16)

sábado, 6 de outubro de 2018

Recordando


Expresso das Nove, nº 527, 2 de junho de 2000

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

A Casa Azul


Ribeira Seca de Vila Franca do Campo, 4 de outubro de 2018

quarta-feira, 3 de outubro de 2018

A Casa Azul de Natividade Ribeiro


A Casa Azul de Natividade Ribeiro

Depois de alguns anos de procura, foi no passado mês de julho que, na Ilha da Madeira, consegui adquirir o livro “A Casa Azul” da autoria da minha conterrânea Natividade Ribeiro.

Tal como muitos outros jovens vila-franquenses, Natividade Ribeiro estudou no antigo Externato de Vila Franca, tendo mais tarde ido para Lisboa, onde se licenciou em Filosofia. Foi durante muitos anos professora de português em Macau e depois lecionou (ou ainda leciona?) em Lisboa.

Da autora, para além do livro que abordo neste texto, já tive a grata oportunidade de ler “Os Três Lugares de uma Mulher” que também recomendo.

Neste livro que, também, pode ser considerado autobiográfico, Natividade Ribeiro retrata a vida em Vila Franca do Campo no final da década de 60 e início da de setenta do século passado.

Estando por escrever a história da Vila daquele período, este livro, embora de carácter literário, dá a conhecer a vida de um camponês com terra e da sua família, retrata a vida de jovens estudantes pertencentes a um estrato social médio e aborda ainda que levemente a política nos últimos anos do fascismo e o entusiasmo nos primeiros anos após o 25 de abril de 1974.

Para além das pessoas da família da autora, penso que não será difícil identificar os seus professores no Externato de Vila Franca e o ex-professor que era um “bufo amigo”.

O livro apresenta outra originalidade que é a descrição de vários locais onde a autora fazia piqueniques com os colegas estudantes e outros amigos. Assim, através da sua leitura fica-se a conhecer um pouco a geografia do concelho, como o Ilhéu, a Lagoa do Fogo, a Vinha d’Areia, a Lagoa do Congro, etc..

Sobre o Externato de Vila Franca, Natividade Ribeiro recorda o professor de Francês que “adorava fazer chamadas individuais a alunos que não tivessem estudado, quase como um prazer sádico”, o de Matemática que dizia que nos testes ninguém copiava pois ele sabia sempre mais uma cábula do que o aluno e o de “Ciências que tinha a mania que só os testes difíceis provavam a sua competência” e que fazia perguntas sobre conteúdos que não tinha ensinado, estando as respostas “nas notas de rodapé, em letra muito miudinha, nos manuais dos nossos irmãos mais velhos”.

Não se tratava do mero uso da pedagogia tradicional, para a qual foram treinados. Eram verdadeiros atos de malvadez de pessoas que, acabaram por ser, injustamente, homenageados em Vila Franca do Campo como grandes professores. Enfim, deviam ser reconhecidos por outros serviços prestados à comunidade, se os prestaram, e não como pedagogos.

A propósito da Casa Azul, hoje em ruínas, que era um mirante, Natividade Ribeiro apresenta as preocupações dos agricultores. Era a elevada produção de batata que não tinha venda, era a produção do vinho que não era boa, era a preocupação com a vinda de açúcar do continente que poderia prejudicar a cultura da beterraba que era “uma cultura que continua a ser rentável e pouco trabalhosa”.

Sobre a cultura do ananás os agricultores preocupavam-se com a eventual proibição da apanha de leiva. Sobre este assunto pode-se ler: “Dizem que já há picos muito devastados. Mas hão-de arranjar um substituto que não prejudique tanto a natureza”.

No capítulo intitulado “Piquenique na Vinha d’Areia”, a autora recorda que a mesma era conhecida por “Praia das Francesas”, que “fora comparada por umas francesas extravagantes que faziam nudismo nas varandas, para grande escândalo dos naturais”. Sobre as alterações sofridas pode-se ler: “A Vinha d’Areia actual é outra praia. É uma praia do progresso, do consumo. Igual a tantas outras que se foram descaracterizando pela construção do parque automóvel, balneários, bares, “Aqua Park”, marina.”

Muito ficou por dizer, daí que recomendo uma leitura e valia a pena uma reedição.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31640, 4 de outubro de 2018, p. 22)