O Padre Manuel Vicente e a paixão pelas flores
Em textos anteriores associamos o padre
Manuel Vicente à recuperação do Jardim António Borges, em 1922. O tema de hoje
é a sua paixão pelas flores.
Não conhecendo qualquer escrito da sua
autoria, este texto tem por base o livro de Breno de Vasconcelos, intitulado
“Paz cinzenta …os Açores através de algumas figuras e episódios de uma época”,
publicado em Lisboa, em 1979, e alguns jornais da época.
O Diário dos Açores de 17 de fevereiro de
1938 quando faz uma retrospetiva da vida do Padre Manuel Vicente recorda “as
exposições de lindos crisântemos no Palácio Fonte Bela, atualmente Liceu Antero
de Quental, e que marcaram duma forma bem vincante, com seu aspeto ao mesmo
tempo de Jogos Florais”. De acordo com a mesma fonte, “eram certames a que
acorria tudo quanto a Ilha tinha de mais distinto no campo intelectual e no
meio social, sendo acolhidos com palpitante interesse pelo público”.
A paixão do padre Manuel Vicente pelas
flores não foi esquecida no poema da autoria do poeta micaelense Francisco
Espínola de Mendonça (1891-1944) escrito por ocasião do funeral daquele
sacerdote e publicado no Correio dos Açores, do dia 17 de fevereiro de 1938.
Abaixo transcreve-se um extrato:
Amou a Arte, as flores, a
Poesia,
Votando-lhes profunda
idolatria,
Um acendrado amor.
Sacerdote bondoso,
tolerante.
Na família um exemplo
edificante:
-Amigo e Protetor
…
Amarilis, crisântemos, as
flores
A que mais consagrou os
seus amores,
Cobriam-lhe o caixão.
E, curvadas, pendendo
enternecidas,
Pareciam dizer-lhe
agradecidas,
A sua gratidão.
Depois de referir que embora vivesse
modestamente, sem fortuna própria, e que o padre Manuel Vicente “foi figura da
alta sociedade micaelense, não propriamente pelos seus pergaminhos
genealógicos, mas muito mais pelo seu espírito e afabilidade no trato”, Breno
de Vasconcelos, no livro já mencionado, relata o seguinte:
“Não
posso precisar em que local organizou uma primorosa exposição de flores, com entradas
pagas.
Muitas
pessoas afluíram a visitar a exposição e a admirar não só as raras espécies,
como a elegância com que as mesmas se encontravam dispostas.
O
Bispo da diocese, nessa altura, estava de visita em São Miguel. Convidado a
visitar esta exposição, o Bispo apreciou devidamente o bom gosto do padre
Vicente e também as espécies florícolas. Ao despedir-se perguntou a que se
destinava o produto daquela exposição. O expositor, muito diplomaticamente e
com um sorriso reverenciado, respondeu que a receita revertia exclusivamente a
favor da cozinha económica do padre Manuel Vicente …da sua própria e bem
necessitada cozinha”.
Não se fique com a ideia de que todas as
iniciativas do Padre Vicente eram realizadas para benefício do próprio. Com efeito,
entre outras ações, organizou com fins caritativos “A Coroação da Menina do
Asilo” para apoio ao Asilo da Infância Desvalida.
Com os seus projetos, o Padre Vicente
conseguia mobilizar a comunidade para ajudar os mais necessitados, tendo sido a
Cozinha Económica, de que foi secretário, a instituição que mais beneficiou da
sua dedicação.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 32269, 28 de
outubro de 2020, p.14)
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