sábado, 26 de novembro de 2011

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Sobre a Greve geral de amanhã




A greve geral possível, mas não a necessária

Amanhã, 24 de Novembro, uma greve geral sai de um parto difícil exigido pelas ruas e com as burocracias sindicais a resistirem até ao fim! Hoje, como há 100 anos, reclama-se contra a carestia de vida, mas, ao contrário do que aconteceu na emblemática e trágica greve geral de Novembro de 1918, as greves já não reivindicam direitos para os trabalhadores mas a não abolição dos direitos que ainda restam da guerra de classes que o Capital tem vindo a ganhar em toda a linha. Nesta em particular, as baterias estão apontadas para o aumento do IVA em bens essenciais, para o aumento dos transportes públicos, para o corte de 50% nos subsídios de natal deste ano, para o corte total dos subsídios da função pública nos dois próximos anos... Não se exige nada a não ser que o roubo seja parado, num registo que perdoa o que já foi roubado.

Para os trabalhadores que nunca viram subsídio de natal ou de férias algum, que sobrevivem à margem dos sindicatos, sem contrato de trabalho, trabalhadores por conta doutrém e que declaram rendimentos por conta própria e, mesmo para muitos dos que têm o tipo de emprego a que se chamava “seguro”, "greve" é, cada vez mais, uma palavra sem significado exequível. De repente, a dúvida sobre o amanhã, a ameaça de desemprego, estão tão presente entre todos que não há passo que seja dado sem a ter em conta. Urgem formas de integrar os protestos de quem “não pode” fazer greve.
Mas uma greve é uma greve, um dos instrumentos mais antigos e poderosos da classe trabalhadora e esta é apenas a terceira geral neste país a seguir a 1974, a primeira em que, mais do que uma luta de trabalhadores, se espera um adesão de cidadãos empobrecidos, em que os problemas do vizinho passaram a ser os nossos. Pela primeira vez, uma greve contará com o apoio concreto de movimentos sociais, nomeadamente os apelidados de indignados e, ao contrário do que aconteceu há um ano, terá concentrações em todas as capitais de distrito.

Neste contexto, a adesão é uma incógnita, apesar de se saber já, mais ou menos, o que ela significará em termos de vida concreta no dia de amanhã. Mas, independentemente de tudo isso, não será com uma greve que se destronará o governo ou que se conseguirá um novo 25 de Abril que volte a pôr o poder nas mãos de quem o deveria ter em democracia: o povo. Aliás, se a greve for semelhante ao que têm sido greves anteriores, não passará dum ritual domesticado de legitimação dos sindicatos, sendo a grande válvula de segurança do regime, porque contém os protestos em espaços ritualizados. A este respeito, Rui Ramos, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, diz que “se a CGTP não conseguir conter os protestos, isso será um sinal claro que há um descontentamento que transborda e que está para além deste aspecto ritual que as greves gerais costumam representar”.

Fonte: http://pt.indymedia.org/conteudo/editorial/6112

terça-feira, 22 de novembro de 2011

A greve geral de 1918- a greve geral expropriadora



A greve geral de 1918
um marco na história do movimento sindical português

Francisco Canais Rocha

Historiador
Em 18 de Novembro de 1918, faz agora 90 anos, rebenta uma das mais importantes greves gerais que houve durante a Primeira República (1910-1926).
O objectivo fundamental dessa greve, dirigida pela União Operária Nacional (UON), criada em 1914, era o de protestar contra a carestia e falta de produtos alimentares e contra a política do governo, pois, enquanto o povo passava fome e os soldados morriam nas trincheiras da Flandres (na Primeira Guerra Mundial), os capitalistas e os agrários enriqueciam mais. Ocupava o poder Sidónio Pais, que só se preocupava com os interesses dos grandes capitalistas e dos latifundiários.
Apesar de longamente preparada e da combatividade demonstrada pelos grevistas, esta greve geral não atingiu os seus objectivos. Por um lado, devido ao fim da Grande Guerra, como ficou conhecida a Primeira Guerra Mundial, cujo Armistício foi assinada em 11 de Novembro, e que rasgou esperanças numa melhoria da situação a curto prazo, contribuindo, desse modo, para a desmobilização dos sectores mais moderados do operariado organizado. Por outro lado, por causa da violenta repressão, lançada sobre os sindicalistas no período que antecedeu a greve geral, expressa em inúmeras prisões e no encerramento dos seus sindicatos. E, por fim, a pandemia Pneumónica, também conhecida por «gripe espanhola», que assolava o País e que se saldou por mais de cem mil mortos, contribuiu igualmente para o insucesso do movimento, na medida em muitos sindicalistas e trabalhadores foram ceifados por ela.
O sidonismo, ditadura de novo tipo
Em Portugal, 1917 marca o início do fluxo do movimento sindical. Havia mais de um ano que Portugal participava na guerra e o esforço que esta exigia ao País acarretava consequências internas desastrosas, cujos efeitos recaíam, fundamentalmente, sobre os trabalhadores. Esta crítica situação «empurra» o operariado para a luta - a luta pelas «subsistências», contra a carestia de vida. Basta dizer que, de Junho de 1917 a Março de 1918, se travaram mais de 200 greves, das quais 171 (83 por cento) foram por questões salariais. Este movimento grevista tem o seu ponto alto no «Verão quente» de 1917, sendo o governo de Afonso Costa obrigado a decretar o estado de sítio (greve geral da construção civil), com mortos e feridos à mistura, seguida de greve geral de solidariedade, de 48 horas, decretada pela UON, ou a mobilizar os grevistas (greve geral dos telégrafos-postais, seguida igualmente de greve geral de solidariedade) e a prendê-los, nos barcos de guerra surtos no Tejo ou nos vários fortes militares espalhados pelo País, acusados de traição.
Mas a luta contra a a falta de géneros não é travada apenas através de greves. Por todo o País assiste-se a vagas de assaltos das populações. Aliás, os assaltos aos armazéns e lojas de víveres são a resposta do proletariado em geral, e do povo em particular, contra a carência e o açambarcamento dos géneros alimentares. Nesses assaltos participam não só os trabalhadores, mas também camadas da pequena burguesia e do campesinato.
O «Verão Quente» de 1917 prenuncia o sidonismo, o qual se inicia com o golpe de Estado militar de Sidónio Pais, levado a efeito em 5 de Dezembro de 1917. Sidónio Pais, que era membro da União Republicana, partido que esteve envolvido no golpe, ensaia em Portugal a primeira ditadura moderna de tipo fascista, que se veio mais tarde a concretizar na Itália com Mussolini, na Alemanha com Hitler, no nosso país com Salazar, na Espanha com Franco, etc..
Passada a primeira fase de expectativa e de «simpatia benévola» para com o sidonismo, depressa os trabalhadores passaram à ofensiva. A UON recusa ocupar o lugar no Senado sidonista e apela à organização operária para se afastar das lutas políticas. Apoiando-se cada vez mais nos monárquicos e na Igreja, Sidónio País levou a cabo uma política ao serviço dos grandes interesses económicos, como Alfredo da Silva (CUF), e dos latifundiários, e de repressão sobre o movimento operário. Os sindicatos da cidade e do campo são encerrados, os dirigentes sindicais são detidos e deportados para África, de onde alguns não regressarão. As cadeias enchem‑se de presos. Desde os mineiros de São Pedro da Cova aos pescadores de Portimão, passando pelos trabalhadores rurais de Alpiarça e Montemor‑o‑Novo, as prisões sucedem‑se por todo o País. Vive‑se um clima de terror, de verdadeira guerra civil. Segundo Bento Gonçalves, quando Sidónio Pais foi morto, em 14 de Dezembro de 1918, tinham passado pelas cadeias sidonistas, em Portugal e em África, cerca de 20 mil presos.(1)
Greve geral nacional
Entretanto a situação dos trabalhadores continuava a degradar‑se. O açambarcamento e a carestia atingiam proporções nunca vistas, a repressão e a censura também, pois, apesar do custo de vida não parar de aumentar, Sidónio Pais reduziu os salários dos trabalhadores do Estado. Perante isto, a UON não podia ficar indiferente. Por um lado, porque muitos trabalhadores defendiam que só a unificação de todas as greves tornaria possível que a luta contra a carestia fosse eficaz, enquanto outros, os mais radicais, consideravam que tinha chegado o momento de se fazer a greve geral expropriadora com carácter revolucionário.
Assim, de acordo com a Federação da Indústria, a UON preparou um plano de trabalhos a levar a cabo pelo movimento sindical, que consistia no seguinte: 1.° - Promover em todos os sindicatos do País assembleias onde se discutiriam as reivindicações das classes profissionais; 2.° - Realização de comícios, no mesmo dia e à mesma hora, em Lisboa, Porto e em todos os centros industriais e agrícolas; 3.º - Preparar uma greve geral nacional, se o Governo continuasse a não atender as reclamações operárias.
Os comícios foram marcados para o dia 15 de Setembro de 1918, tendo‑se realizado cerca de 40. Muitos foram proibidos pelas autoridades, sendo substituídos por assembleias nas sedes dos sindicatos. Em Alpiarça e Montemor‑o‑Novo foram encerrados os sindicatos e mortos trabalhadores a tiro. Como escreveu Alexandre Vieira, secretário‑geral da UON, «a acção desenvolvida, não apenas em Lisboa mas em todo o País, no sentido de ser levada a efeito a greve geral, que abrangeria todo o território continental, foi considerável, podendo mesmo afirmar‑se que nunca em Portugal, como então, se trabalhou tão intensa e extensamente na preparação de uma greve. (2)
Nos meses que antecederam a greve geral, foi lançada uma violenta campanha contra o movimento sindical, que era acusado pelos jornais reaccionários (O Tempo, O Dia, A Situação) de pretender fazer uma revolução bolchevique. A burguesia portuguesa vivia amedrontada com a Revolução Russa, que tivera lugar no ano anterior, e temia que Portugal acordasse um dia sob o poder dos sovietes.
Apesar desta campanha, no dia 18 de Novembro os trabalhadores lançam‑se corajosamente na greve. Esta é seguida pelos ferroviários do Sul e Sueste, que impedem a circulação dos comboios durante vários dias, apesar do Governo ter mandado ocupar militarmente as estações de caminho-de-ferro; pelos trabalhadores rurais do Alentejo, que se mantêm em greve durante uma semana; pelos trabalhadores da construção civil de Lisboa, Évora e Setúbal e pelos gráficos da capital, que não permitem a publicação de jornais durante oito dias. Além disso, a greve foi ainda seguida por uma parte do operariado do Algarve (Portimão, Tavira, Silves e Olhão), do Barreiro e de Setúbal, pelos trabalhadores da Póvoa de Varzim, pelos ferroviários de Vale de Vouga e uma parte dos de Ovar e Gaia.
A greve foi esmagada a ferro e fogo. Centenas de trabalhadores foram presos, por todo o País, e dezenas deles, oriundos de Vale de Santiago, no concelho de Odemira, foram deportados para Angola, sem julgamento nem culpa formada. Eram acusados de terem ocupado as terras dos agrários no primeiro dia de greve. Ao mesmo tempo, dezenas de sindicatos, incluindo a UON, eram encerrados.
As perseguições aos sindicalistas continuaram até ao fim do reinado de Sidónio Pais. E agravaram‑se quando este foi morto, na estação do Rossio, antes de embarcar para o Porto. A Polícia Preventiva - criada pelo ditador e antecessora da PIDE, a polícia política do fascismo - invadia as sedes dos sindicatos e obrigava os sindicalistas a porem as bandeiras a meia‑haste, em sua memória.
Os objectivos imediatos da greve geral não foram alcançados. No entanto, nem por isso se pode considerar que a greve foi um fracasso total. Primeiro, porque menos de um mês depois, a 14 de Dezembro, Sidónio Pais era morto e o seu regime derrubado, sendo restauradas, pouco depois, as liberdades democrático‑burguesas. Segundo, e este é o aspecto mais importante, não obstante a repressão, o movimento sindical não foi desfeito. E tanto assim é que, três meses mais tarde, a 23 de Fevereiro de 1918, inicia a publicação do jornal A Batalha que, começando com uma tiragem diária de 7500 exemplares, em breve alcança os 18 mil, sendo na altura o terceiro diário português, logo a seguir ao Diário de Notícias e O Século. Em Maio desse ano conquista a jornada de trabalho de oito horas, velha reivindicação operária, e em Setembro seguinte funda a CGT (Confederação Geral do Trabalho), a primeira confederação dos trabalhadores portugueses.
Depois de 1918 mais greves gerais foram desencadeadas no nosso país, algumas das quais já depois da revolução democrática de 25 de Abril de 1974. Mas a greve de 18 de Novembro de 1918 permanece como um marco inapagável na História do movimento sindical português.
Notas:
(1) Bento Gonçalves, Elementos para a História do Movimento Operário Português, policop., 1969, p. 19.
(2) Alexandre Vieira, Para a História do Sindicalismo em Portugal, 2.ª ed., Lisboa, Seara Nova, 1974, p. 135.
Fonte: http://www.fiequimetal.pt/index.php?option=com_content&task=view&id=364&...