sexta-feira, 31 de maio de 2019

Caldeira Velha- Monumento Natural


Caldeira Velha- Monumento Natural


Em Setembro de 1999, a Associação Amigos dos Açores apresentou à Direcção Regional do Ambiente uma proposta de classificação da Caldeira Velha, com o objectivo de impedir a degradação e descaracterização do local, e, permitir a optimização do seu uso para diversos fins, contrariando-se, assim, a tendência para intervenções avulsas e desarticuladas.

A proposta dos Amigos dos Açores concretizou-se este ano através do Decreto Legislativo Regional nº 3/2004 que classificou a Caldeira Velha como Monumento Natural Regional, tendo em conta, entre outros motivos, a “sua raridade, elevada importância científica, paisagística e social, bem como o inequívoco interesse turístico, recreativo e cultural”.

Desde sempre a Caldeira Velha foi muito procurada, tanto por visitantes nacionais como por estrangeiros, tendo a maioria deles deixado relatos da sua passagem pelo local. Entre os demais visitantes ilustres, destaca-se o médico inglês Joseph Bullar que, com o seu irmão Henry, visitou o local, em 1838, tendo deixado o testemunho da sua visita no livro “Um Inverno nos Açores e um Verão no Vale das Furnas”.

Ocupando uma área de 11,975 ha, a Caldeira Velha localiza-se na vertente Norte do Maciço Vulcânico do Fogo, na freguesia da Conceição, concelho da Ribeira Grande, numa importante fractura daquele maciço vulcânico.

A Caldeira Velha constitui um importante campo fumarólico localizado numa importante falha do complexo vulcânico do Fogo, numa zona de risco vulcânico médio- alto e de baixo risco sísmico.

As águas da Caldeira Velha são sulfatadas e alumínicas, com uma temperatura de 90º C e pH 3,13. Um pouco acima da cota da Caldeira (315m), a água da ribeira, na cota de 328 metros, é alcalina ferruginosa e com a temperatura de 25,2º C. (Zbyszewski,1961).

Em 1985, altura em que os proprietários dos terrenos procederam ao abate da vegetação luxuriante existente no local, alguma centenária, já a primitiva vegetação havia dado lugar a espécies introduzidas para os mais diversos fins, nomeadamente os industriais e ou ornamentais. Assim, entre as espécies de maior porte, encontravam-se, na Caldeira Velha, criptomérias (Cryptomeria japonica), incensos (Pittosporum undulatum), e plátanos (Platanus x hybrida).Depois do referido corte, a par das plantações efectuadas, houve uma recuperação do coberto vegetal por algumas espécies, com predomínio das invasoras, nomeadamente a acácia (Acacia melanoxylon) e a conteira (Hedychium gardneranum).

Para além das espécies referidas, hoje, ainda podem ser encontradas as seguintes: feto pente (Blechnum spicant), feto do botão (Woodwardia radicans), feto- arbóreo (Sphaeropteris cooperi), Leycesteria formosa, feto do cabelinho (Culcita macrocarpa), queiró (Calluna vulgaris), feto real (Osmunda regalis), Selaginella kraussiana e fona de porco (Solanum mauritianum).

No que diz respeito à avifauna, entre outras espécies, podem ser encontradas as seguintes: pombo torcaz (Columba palumbus azorica), tentilhão (Fringilla coelebs moreleti), canário (Serinus canaria), alvéola (Motacilla cinerea patriciae), estrelinha (Regulus regulus azoricus) e melro negro (Turdus merula azorensis).

Nas águas da ribeira da Caldeira Velha vive a rã (Rana perezi) e na zona envolvente à Caldeira Velha podemos encontrar os seguintes mamíferos: o coelho (Oryctolagus cuniculus), o furão (Mustela furo) e o morcego dos Açores (Nyctalus azoreum).

Teófilo de Braga
(Terra Nostra, 28 de maio de 2004)

PICO DAS CAMARINHAS E PONTA DA FERRARIA


PICO DAS CAMARINHAS E PONTA DA FERRARIA


Em Outubro de 1998, a Associação “Amigos dos Açores” elaborou e remeteu à Direcção Regional do Ambiente uma proposta para classificação do Pico das Camarinhas e Ponta da Ferraria como Área Protegida. Passados quase seis anos, foi com satisfação que tomámos conhecimento que se encontra em discussão pública um projecto de Decreto Legislativo Regional que irá classificar aqueles locais como Monumento Natural.
O Pico das Camarinhas é um cone de escórias basálticas, localizado no extremo Oeste de São Miguel, sendo assim designado, segundo Gaspar Frutuoso (séc. XVI), nas Saudades da Terra, por “ter árvores desta fruta no seu cume”. Alguns séculos antes da descoberta dos Açores, por volta de 1140, o Pico das Camarinhas terá entrado em erupção, tendo a escoada lávica emitida fluido para Oeste, originando o delta lávico da Ponta da Ferraria.
Localizado junto ao caminho que liga os Balneários à nascente termal, pode-se encontrar um pequeno cone com uma cratera circular no seu topo que é designado por cone litoral ou pseudocratera. Aquele cone não possui uma conduta de alimentação profunda e ter-se-á formado na sequência de pequenas explosões resultantes do contacto da base da escoada lávica com a água do mar.
Para além do atrás mencionado, a região do Pico das Camarinhas e da Ponta da Ferraria apresenta outro aspecto de interesse geológico: a presença de rochas granulares ricas em olivina e piroxena, formadas em profundidade e trazidas à superfície no decurso de episódios vulcânicos posteriores.
No que diz respeito à nascente termal, em 1964, o Dr. Carlos Pavão de Medeiros, num artigo da revista Insulana a ela se refere do seguinte modo: “O seu caudal é abundante sendo a temperatura de 62,5º; mineralização de 20,9584 gramas por litro com teor de cloreto de sódio de 16,982 por litro. É uma água muito alcalina, cloretada, sulfatada, bicarbonatada, sódica, cálcica e magnésica”. De acordo com o mesmo autor, as águas da Ferraria eram utilizadas principalmente para o tratamento de reumatismos e nevrites.
Em termos florísticos, no Pico das Camarinhas existe uma das últimas formações de Myrica faya - Erica azorica existente na ilha e mesmo nos Açores e na fajã regista-se a presença de endemismos, como o bracel (Festuca petraea), planta outrora usada pelos caiadores para fabrico dos pincéis.
São várias as espécies de aves presentes no Pico das Camarinhas e na Ferraria. Entre elas destacamos o melro-negro (Turdus merula azorensis), a toutinegra (Sylvia atricapila), o canário-da-terra (Serinus canaria) e o tentilhão (Fringilla coelebs moreleti). Além das aves, merecem destaque alguns insectos endémicos associados à urze e à faia (Myrica faya), nomeadamente Ascotis fortunata azorica, Cyclophora azorensis, Argyresthia atlanticella e Cixius insularis.
A preservação ambiental do Pico das Camarinhas e Ponta da Ferraria em conjunto com a sua utilização racional para fins recreativos e turísticos, enquadrada pelo Farol da Ferraria e pelo Miradouro do Escalvado, poderá contribuir para a conservação da paisagem desta zona da ilha e para o desenvolvimento económico das freguesias limítrofes.

Teófilo Braga

(Terra Nostra, nº 233, 30 de abril de 2004)

quinta-feira, 30 de maio de 2019

ILHÉU DE VILA FRANCA - O MAS FORMOSO ILHÉU QUE HÁ NAS ILHAS


ILHÉU DE VILA FRANCA - O MAS FORMOSO ILHÉU QUE HÁ NAS ILHAS

O mais formoso ilhéu que há nas ilhas, no dizer de Gaspar Frutuoso, com uma área aproximada de 6,2 hectares, fica situado em frente a Vila Franca do Campo, a sensivelmente 480 m da Ponta de São Pedro e a 1200 m do cais do Tagarete. O Ilhéu de Vila Franca do Campo encontra-se dividido em duas partes bastantes distintas: o Ilhéu Grande, a Oeste, e o Ilhéu Pequenino, a Este. Entre os dois existe uma baía quase circular, que comunica com o mar através de um canal estreito - o Boquete.

O ilhéu de Vila Franca é um cone vulcânico, resultante de uma erupção submarina em águas pouco profundas, constituído por tufos basálticos de cor amarelada ou acastanhada. De acordo com Forjaz (l988), o ilhéu de Vila Franca ter-se-á formado há cerca de 3000 anos.

O ilhéu apresenta fendas, designadas por golas, a maioria das quais estabelece a ligação entre a baía e o mar exterior. Uma estrutura bastante curiosa é o Farilhão, rochedo situado a Sul do ilhéu, com 32,5 m de altura e que resultou do efeito abrasivo das vagas do mar.

A flora do ilhéu de Vila Franca apresenta varias espécies exóticas, sobretudo de origem africana e americana, com destaque para a cana (Arundo donax), o incenso (Pittosporum undulatum), a piteira (Agave americana), o metrosídero (Metrosidero tomentosa), a vinha (Vitis labrusca e Vitis vinifera) e a lantana (Lantana camara), mas, ainda, conserva algumas espécies endémicas, como a urze (Erica azorica), a erva-leiteira (Euphorbia azorica), a figueira- brava (Senecio malvifolius), o louro (Laurus azorica), e a Spergularia azorica.

O ilhéu do ponto de vista faunístico possui uma grande variedade de aves, entre as quais destacamos: o pombo-da-rocha (Columba livia), o milhafre (Buteo buteo rothcildi), o estorninho (Sturnus vulgaris granti), o melro-negro (Turdus merula azorensis), a gaivota (Larus argentatus atlantis), o garajau comum (Sterna hirundo), o garajau rosado (Sterna dougallii) e o cagarro (Calonectris diomedea borealis).

Dado o grande interesse natural e paisagístico e em virtude do seu fácil e indiscriminado acesso e uso, tornando-o muito vulnerável, foi considerado, por Decreto Legislativo Regional nº. 3/83/A, de 3 de Março, Reserva Natural.

Neste momento, está em curso o processo de reclassificação e aguarda-se, esperamos que para breve, a criação dos órgãos de gestão e a implementação do seu Plano de Ordenamento. Só assim será possível conciliar a protecção dos valores

Março de 2004

Teófilo Braga


quarta-feira, 29 de maio de 2019

Simplício Gago da Câmara e a agricultura micaelense


Simplício Gago da Câmara e a agricultura micaelense

Na semana passada dediquei o texto a Simplício Gago da Câmara, tendo mencionado, entre outros aspetos da sua vida, o seu contributo para a reflorestação da ilha de São Miguel. Neste texto, darei a conhecer o seu contributo para o desenvolvimento da agricultura.

Vila Franca do Campo foi um concelho com grandes quintas de laranjeiras, tendo a sua apanha sido magistralmente descrita pelos irmãos Joseph e Henry Bullar no seu livro “Um inverno nos Açores e um verão no Vale das Furnas”. Simplício Gago da Câmara foi, segundo Luís Arruda, produtor e exportador de laranja, tendo introduzido em São Miguel “a laranja dita sevilha, a partir de sementes obtidas em Londres”.

Simplício Gago da Câmara não era um mero produtor de laranjas, ou um agricultor passivo. Pelo contrário, tal como estudava muito sobre História Natural também observava com pormenor as plantações e experimentava. Assim, de acordo com um texto publicado no nº 7 d’O Agricultor Micaelense, verificando que possuía uma laranjeira enfezada que não reagia a qualquer tratamento resolveu “decotá-la para que rebentasse com mais força e que, traçando-a a meio do tronco, observara que o âmago estava todo negro, e azougado, o que não tinha dúvida de atribuir ao defeito proveniente da mergulhia”.

Na Gorreana, para além da plantação de matas com pinheiros, giestas e criptomérias, Simplício Gago da Câmara também cultivou chá e iniciou a sua industrialização.

Simplício Gago da Câmara foi produtor de vinho, a partir de videiras que possuía sobretudo no seu prédio do Convento. Para além dos terrenos do Convento, importa referir que depois de adquirir o ilhéu de Vila Franca do Campo, Simplício Gago da Câmara fez plantações de vinhas que perduram até ao século passado.

A criação de gado bovino também foi uma das atividades desenvolvidas por Simplício Gago da Câmara como se pode depreender de uma nota publicada no número dois d’ O Agricultor Micaelense. Com efeito, o autor do texto menciona o cultivo de beterraba que servia de alimento para os porcos, para os bois d’engorda, para as vacas de leite, para todos os animais” e acrescenta que “em Vila Franca o Sr. Simplício Gago está dando há mais de três meses, uma arroba de beterrabas por dia a cada um dos vários bois que prepara para o açougue e outro tanto às suas vacas e porcos, com o que têm medrado a olhos vistos..”

O cultivo do linho também foi experimentado por Simplício Gago da Câmara, como demonstra o relato de uma reunião da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense realizada 11 de dezembro de 1848. Assim, na reunião referida, presidida por José Jácome Correa, aquele expôs “uma amostra de linho com seis palmos de comprido, de semente originária de Riga”.

Simplício Gago da Câmara também se preocupou com o cultivo do trigo e com os trabalhos associados à debulha. Assim, de acordo com um texto publicado n’ O Agricultor Micaelense nº 7, ele introduziu “umas pequenas máquinas de debulhar, portáveis e movidas por dois homens”. Ainda no que diz respeito a maquinaria para aligeirar o trabalho no campo, é atribuída a Simplício Gago da Câmara uma máquina a vapor existente em São Miguel que era multifuncional, pois tanto servia para moer trigo ou milho como para serrar madeira.

Não sabemos se teve concretização, mas Simplício Gago da Câmara projetou a introdução de “um moinho de azeite, movido a vapor, e uma prensa hidráulica para a expressão do óleo”. De acordo com o texto publicado no primeiro número d’ O Agricultor Micaelense, “ a importante introdução a que aludimos será o mais forte incentivo e fomento de uma cultura abandonada entre nós [a produção de sementes oleaginosas] mas de incontestável e reconhecida vantagem entre os estranhos”.



Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31839, 30 de maio de 2019, p 13)

segunda-feira, 27 de maio de 2019

Açores- natureza morta


Açores- natureza morta

A imagem do Largo do pelourinho, rebatizado de Largo Dr. José Medeiros Ferreira, em Vila Franca do Campo, mostra o horror que autarcas de todos os lugares têm à terra e o seu ódio às flores que só são úteis para uso em discursos hipocritamente ambientalistas.

Cinzentões como são, preferem a ditadura do cinzento!

TB

quinta-feira, 23 de maio de 2019

A propósito de Simplício Gago da Câmara


A propósito de Simplício Gago da Câmara

Através da leitura do livro “Alguns aspectos de intervenção humana na evolução da paisagem da ilha de S. Miguel “Açores” da autoria do arquiteto paisagista José Marques Moreira, especialista em plantas ornamentais e uma referência como pedagogo, tomei conhecimento de que associado aos nomes de José do Canto, António Borges e José, Jácome Correa está Simplício Gago da Câmara, morador em Vila Franca do Campo, como responsáveis pela grande introdução de exóticas na ilha de São Miguel.

De acordo com Marques Moreira, a introdução referida ocorreu sobretudo a partir de 1853, mas enquanto os primeiros adquiriram as espécies, “originárias da América Central, ilhas do Pacífico, das costas Africanas, da Austrália e da Nova Zelândia”, em viveiristas de França, Bélgica e Inglaterra, Simplício Gago da Câmara mandava-as vir diretamente da Austrália.

Muito conhecidos José do Canto, António Borges, José Jácome Correa sobretudo pelos jardins que deixaram, Simplício Gago da Câmara é quase desconhecido da maioria das pessoas, pelo que importa recordar alguns aspetos da sua vida.

Simplício Gago da Câmara, proprietário rico e aventureiro que foi para a Austrália para explorar ouro, nasceu em Ponta Delgada a 19 de maio de 1808 e faleceu na mesma cidade a 7 de agosto de 1888.

A ida para a Austrália para explorar jazigos de ouro destinava-se, segundo o seu trineto José Gago, a fazer fortuna para “obter os meios de estabelecer novas indústrias e desenvolver a sua terra natal”. Se é certo que a exploração de ouro foi um fracasso, não é menos certo que o tempo em que Simplício Gago da Câmara esteve na Austrália permitiu que ele, apaixonado pela História Natural, observasse e estudasse a fauna e a flora locais, ao mesmo tempo que já selecionava as espécies da flora australiana que poderia levar para São Miguel.

Depois de ter ganho algum dinheiro como barbeiro e hortelão na Austrália, Simplício Gago da Câmara regressou a São Miguel trazendo consigo plantas e ou sementes de eucaliptos, acácias e araucárias.

De acordo com José Gago, Simplício Gago da Câmara oferecia às centenas ou aos milhares as plantas que obtinha nos seus viveiros localizados no prédio do Convento, em Vila Franca do Campo, e ele próprio plantava em matas em São Brás e na Fajã do Calhau. Para além das espécies já referidas, Simplício Gago da Câmara plantou, em terrenos localizados por cima da Gorreana, pinheiros, giestas e criptomérias.

Outra aventura em que se meteu e que se traduziu em mais um fracasso foi a da pesca do bacalhau. Com efeito, tentando introduzir a pesca do bacalhau nos Açores, em vez de comprar um navio no continente decidiu aproveitar as madeiras que possuía nas suas matas mandando construir um barco no Porto Formoso. Tendo partido para a Terra Nova, onde a pesca foi proveitosa, acabou por perder quase todo o bacalhau apanhado ao trazê-lo para Vila Franca do Campo para o secar.

Em termos de participação cívica, Simplício Gago da Câmara esteve ligado à Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense que teve como principal dinamizador o seu primo José do Canto, à Santa Casa da Misericórdia de Vila Franca do Campo e à Associação das Escolas Móveis.

Agricultor, sendo produtor de vinho e produtor e exportador de laranja, Simplício Gago da Câmara foi membro da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense, tendo sido secretário da comissão vinícola.

Dirigiu com sucesso durante quatro anos a Santa Casa da Misericórdia de Vila Franca do Campo, tendo, entre outras iniciativas, contratado dois médicos. Apesar disso, tal não impediu que viesse a ser vítima de uma “demissão injusta e violenta”.

Simplício Gago da Câmara, generoso como era, foi um dos principais contribuintes da Associação das Escolas Móveis.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31835, 24 de maio de 2019, p. 16)

quarta-feira, 15 de maio de 2019

José de Almeida Fernandes, pioneiro da Educação Ambiental


José de Almeida Fernandes, pioneiro da Educação Ambiental

Com 87 anos de idade, faleceu no passado dia 29 de abril um dos homens mais influentes em Portugal no que diz respeito à conservação da natureza e à educação ambiental, o biólogo José de Almeida Fernandes.

Figura (quase) desconhecida, mesmo por aqueles que promovem ou dinamizam ações ditas de educação ambiental no nosso arquipélago, José de Almeida Fernandes é recordado por mim em todas as ações de formação dinamizadas no âmbito da formação contínua de professores.

Este texto é o meu modesto contributo para que a sua obra não caia no esquecimento e a minha homenagem ao homem que dedicou a sua vida, quer em instituições públicas quer a nível associativo, à defesa do ambiente.

No que diz respeito ao associativismo, José de Almeida Fernandes foi durante três décadas dirigente da Liga para a Proteção da Natureza, a mais antiga organização de conservação da natureza da Península Ibérica, fundada em 1948 na sequência de um apelo do poeta Sebastião da Gama por ocasião da destruição da mata do Solitário, na Arrábida.

José de Almeida Fernandes, ainda durante o Estado Novo, desempenhou um papel importante na Comissão Nacional do Ambiente, criada a 19 de junho de 1971. Depois do 25 de abril de 1974, nomeadamente a partir de 1975, o seu trabalho prosseguiu e intensificou-se tendo representado o país em diversas organizações internacionais, presidiu ao Instituto de Conservação da Natureza e mais tarde ao IPAMB-Instituto de Promoção Ambiental, criado por ele em 1993 com o objetivo de promover ações no domínio da formação e informação dos cidadãos e apoiar as associações de defesa do ambiente.

José de Almeida Fernandes deixou-nos, entre outros, mais de 30 artigos científicos, um
trabalho sobre a sua paixão, a Arrábida, intitulado “A Serra da Arrábida: o seu interesse botânico perante o turismo”, publicado, em 1954, no Boletim da Sociedade Portuguesa de Ciências Sociais e o livro, publicado em 2002, intitulado “Do Ambiente Propriamente Dito - Considerações pouco canónicas sobre o Ambiente e o Desenvolvimento Humano”.

Denominando-se como ambientalista cético, mas não pessimista nem cínico, José de Almeida Fernandes no seu livro aborda temas como o lugar do homem na natureza, os recursos e a capacidade de carga da Terra, a conservação da natureza e as áreas protegidas, as crianças e o ambiente, a guerra como fenómeno ecológico e a educação ambiental.

José de Almeida Fernandes não foi nada meigo, diria que foi justo, quando criticou os que dizem uma coisa e fazem outra, os que não sabem o que dizem e os que usam determinadas palavras para, apenas, embelezar discursos.

Sobre o assunto escreveu que o “discurso do nosso tempo é, na realidade, um encadeamento mais ou menos lógico de palavras ditas e escritas para ocultar a lógica do discurso da vida” e acrescentou o seguinte: “A “muleta” ambiente é hoje indispensável à solidez” do discurso político, seja ele do poder ou do contra-poder. Com tal usura perdeu a força que devia ter dominada que foi pelo joio dos interesses, da mentira, da pseudopreocupação pela “gestão solidária” dos bens da terra”.

Ele que foi o grande impulsionador da educação ambiental no país, também denunciou os que usam e abusam da palavra educação para esconder a sua incapacidade para contribuir para melhorar a sociedade em que vivem.

A propósito da educação escreveu:

“Funciona como uma panaceia universal, que resolverá as asneiras que teimamos em cometer, ou que, como poeira nos olhos, perpetuará o poder, castrando conscientemente o Homem que existe dentro de todos nós”.

“Arma eleita pelo sistema, garante a reprodução do que interessa e o desprezo pela inovação que não seja “conveniente”. É, pois, urgente mondar a Educação, antes que o homem vá também acompanhar o joio na lâmina da gadanha da “ceifeira”.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31828, 16 de maio de 2019, p. 8)

quarta-feira, 8 de maio de 2019

segunda-feira, 6 de maio de 2019

Reações ao assassinato de Ferrer y Guardia nos Açores


Reações ao assassinato de Ferrer y Guardia nos Açores

“O verdadeiro educador é aquele que, às vezes até mesmo contra as suas próprias ideias e vontades, apoia a criança e o desenvolvimento de suas energias.” (Ferrer y Guardia)

Em 1909, por ordem do governo espanhol, foi fuzilado em Espanha o pedagogo Francisco Ferrer y Guardia (1859-1909) fundador da Escola Moderna que funcionou em Barcelona entre 1901 e 1906.

O assassinato de Ferrer y Guardia, foi condenado em todo o mundo não só por quem como ele era anarquista, mas pelas mais diversas pessoas e organizações mais progressistas.

Neste texto, depois de uma breve referência à personalidade e à pedagogia racionalista de Ferrer y Guardia, daremos a conhecer, de forma sucinta, qual foi a reação ao seu fuzilamento por parte de algumas personalidades açorianas e como os jornais dos Açores trataram o assunto.

Ferrer y Guardia e a Pedagogia Racionalista

Francisco Ferrer y Guardia nasceu em Allela, perto de Barcelona a 10 de janeiro de 1859. Em 1886, apoiou um fracassado pronunciamento militar que pretendeu instalar a República, pelo que teve de se exilar em França, onde sobreviveu ensinando espanhol.

Como homem de ação, ao regressar a Espanha, onde a sociedade era dominada pela superstição religiosa e onde a taxa de analfabetismo era superior a 50%, Ferrer fundou, em 1901, a Escola Moderna.

De acordo com Sílvio Gallo, Ferrer acreditava que se aprendia pelo afeto, isto é, embora a aprendizagem fosse “um ato mental, racional, nada se aprende se antes não passar pelo coração, se não mobilizar o desejo”.

Na Escola Moderna, seguia-se a “pedagogia racional” a qual segundo Sílvio Gallo é “um processo educativo que eduque pela razão, para que cada ser humano seja capaz de raciocinar por si mesmo, conhecer o mundo e emitir seus próprios juízos de valor, sem seguir nenhum mestre, nenhum guia”.

Embora não discutindo a utilidade de provas em alguma circunstância, o que é certo é que na Escola Moderna de Ferrer “não havia prémios nem castigos, nem provas em que houvessem alunos ensoberbecidos com nota dez, medianias que se conformassem com a vulgaríssima nota de aprovados nem infelizes que sofressem o opróbrio de se verem depreciados como incapazes”.

Ainda sobre a não existência de provas, Ferrer escreveu o seguinte: “os elementos morais que este ato imoral qualificado de prova inicia na consciência da criança são: a vaidade enlouquecedora dos altamente premiados; a inveja roedora e a humilhação, obstáculo de iniciativas saudáveis, aos que falharam; e em uns e outros, e em todos, os alvores da maioria dos sentimentos que formam os matizes do egoísmo”.

Para além do referido, Ferrer dava importância ao jogo e às brincadeiras não só por serem ações naturais das crianças, mas porque contribuíam para a saúde corporal, para o desenvolvimento físico e pelo contributo que davam para a descoberta de habilidades e predisposições.

No que diz respeito às instalações escolares, Ferrer não aceitava uma escola fechada entre quatro paredes de modo que na sua Escola Moderna a par de salas bem decoradas, havia pátios destinados à realização de atividades ao ar livre. Além disso, toda a atividade escolar era complementada com visitas a fábricas e passeios diversos.

Acusado, injustamente, de ter instigado uma insurreição operária, a Semana Trágica de Barcelona, foi preso, acabando por ser fuzilado em Montjuïc no dia 13 de outubro de 1909.
Como seu desaparecimento físico, o seu pensamento não caiu no esquecimento. Com efeito, as suas ideias, sobretudo após a sua morte, influenciaram a abertura de outras escolas em diversos países, como a Voz do Operário, em Lisboa, e serviram de inspiração a diversos pedagogos, como o brasileiro Paulo Freire.

Reações ao fuzilamento de Ferrer y Guardia nos Açores

O fuzilamento de Ferrer foi muito noticiado nos Açores, nomeadamente na ilha de São Miguel, tendo as posições variado muito. Com efeito, os órgãos de informação mais progressistas, nomeadamente de inspiração anarquista, como o “Vida Nova” ou socialista, como “O Repórter, e republicana condenaram veementemente o assassinato. Houve pelo menos um jornal que tentou manter a neutralidade, o Diário dos Açores, e outros, mais conservadores, como a Liberdade, de Vila Franca do Campo, ou o Correio Michaelense, de Ponta Delgada, pelo contrário apoiaram o governo espanhol e regozijaram-se com o desaparecimento prematuro daquele pedagogo espanhol.
Num texto, não assinado, publicado no Jornal A Folha, no dia 24 de Outubro de 1909, a dada altura o autor ou autora, supomos que a feminista e republicana Alice Moderno condenou o crime, escrevendo o seguinte:
“Ferrer foi um brasseur d’idées, foi um desses indivíduos excecionais que, nesta época de egoísmo, em que se entrechocam os mais sórdidos e desmedidos interesses pessoais, sacrificou toda a sua fortuna particular, toda a segurança individual, toda a sua tranquilidade espiritual, por uma ideia- combatendo por ela até ao ponto de ver correr, pelos furos das balas reais, o seu sangue generoso”.
O jornal “O Repórter”, cujo proprietário e diretor era o socialista Alfredo da Câmara, no dia 24 de Outubro de 1909, também condenou o assassinato de Ferrer nos seguintes termos: “não é impunemente que se mata ou manda matar um Ferrer, entidade de destaque no campo das lutas pelas reivindicações sociais; não é impunemente que se arremessa um cartel de desafio aos explorados, para regalo dos exploradores, aos pobres e aos humildes para tranquilidade dos argentários poderosos…”.
No dia 31 de outubro do mesmo ano, o articulista de “O Repórter” escreveu que “a execução de Ferrer foi um assassínio monstruoso, levado a cabo pelos jesuítas e congreganistas espanhóis de cumplicidade com um governo de camândulas e de punhal”.
A 10 de Novembro de 1909, João Anglin, então jovem estudante anarquista, escreveu no jornal “Vida Nova” o seguinte:
“Não foi em vão que Cristo regou com o seu sangue as urzes do Calvário, porque a sua doutrina sublime, apesar de deturpada e adulterada pelos que se dizem seus ministros, tem atravessado os séculos; não foi debalde que Giordano Bruno, Lourenço de Gusmão, Galileu e tantos outros sofreram horrorosos tormentos, porque a ciência que tanto amavam e por quem deram a vida, tem defendido radiosa Luz entre a espécie humana.
Assim também Francisco Ferrer, a infeliz vítima da malta reacionária, dessa horda de facínoras que para vergonha nossa ainda campeia infrene, acaba de ser cobardemente assassinado em Barcelona. A reação desde há muito tramava contra a existência desse grande vulto, desde há muito tentava perdê-lo. Buscou a ocasião propícia e achou-a.
Estão saciados os ódios, estão satisfeitas as feras!!”

O jornal Diário dos Açores, o de maior circulação nos Açores na época, manteve-se imparcial, tendo no primeiro texto, publicado no dia 26 de outubro de 1909, relatado os últimos momentos de Ferrer e sintetizado o seu pensamento na seguinte frase: “A filosofia de Ferrer era simples: resumia-se no ódio forte e ardente à Igreja: o anticlericalismo era o seu dogma; tinha posto na ciência uma fé absoluta.”

Ao longo de cerca de 20 dias o jornal relatou o julgamento de Ferrer, as reações ao seu fuzilamento em vários países do mundo, com destaque para a transcrição de notícias de vários jornais. Relativamente a Portugal, para além das manifestações de protesto, destacamos um abaixo-assinado a saudar o desempenho do advogado de Ferrer que foi subscrito por várias personalidades, entre as quais o açoriano Manuel de Arriaga.

O Correio Michaelense, diário monárquico, por seu lado, tomou uma posição bem clara de condenação do pensamento de Ferrer, que distorceu em textos publicados durante alguns dias.
No dia 18 de outubro, um colaborador do jornal, em relação à morte de Ferrer escreveu o seguinte: Chamem-me, muito embora, os nomes que quiserem, esses que aí falam do caso com a lágrima velhaca no canto do olho hipócrita. Eu e eles sentimos da mesma forma, isto é, não sentimos cousa alguma pela morte de Ferrer, como não sentimos quando morre qualquer pessoa que não temos o gosto ou desgosto de conhecer”.
A explicação para esta posição deve-se ao facto do articulista considerar Ferrer “um livre pensador, propagandista da livre educação e fundador da Escola Moderna, escola ou grupo de escolas onde se observava o seu método educativo, assente na seguinte base. – Nem deus, nem pátria, nem fé, nem leis”.
O semanário monárquico e católico de Vila Franca do Campo, A Liberdade, dirigido pelo Padre Manuel José Pires seguiu as mesmas pisadas do Correio Micaelense, tendo publicado um texto a deturpar o que pretendia a Escola Moderna.
No dia 16 de outubro de 1909, esquecendo-se da compaixão pregada pelo cristianismo, o jornal aplaudiu a decisão do governo espanhol de mandar assassinar Ferrer nos seguintes ternos:
“Este revolucionário espanhol, e principal instigador das crueldades praticadas em Barcelona foi condenado à morte.
É mais uma vítima do movimento anárquico, que se pretende alastrar por toda a parte, pondo em sobressalto as nações e seus governos.
Se, porém, todos estes tiverem a energia do Governo Espanhol será restabelecida a tranquilidade pública.
É dura a lei da morte, mas em tais casos é a única salvação das nações no descalabro que as ameaça.”
O jornal A Persuasão, dirigido por Francisco Maria Supico, no dia 27 de outubro de 1909, num texto não assinado, intitulado “Guilhotinar, Fusilar” condenou os atos atribuídos a Ferrer, mas manifestou claramente a sua oposição ao seu fuzilamento, como se pode constatar através do seguinte extrato:
“A nosso ver o governo espanhol perdeu na questão Ferrer a melhor das ocasiões de se mostrar generoso e de grandemente se insinuar na simpatia universal, poupando a vida ao criminoso embora o mandasse para um presídio gastar em trabalhos úteis todos os alentos da sua vitalidade.
Pelo modo como procedeu com o revolucionário não acabou as revoluções antes muito contribuiu para aumentá-las; e menos demonstrou que matar é crime pois também matou.
Protestamos com todas as nossas forças contra este selvático modo de exercer justiça social”
Por último, o jornal, a União, de Angra do Heroísmo, dirigido por Manuel Vieira Mendes da Silva, no dia 18 de outubro de 1909, para além de condenar Ferrer, classificando-o como “um agitador raivoso”, apoiou a decisão do governo espanhol de o mandar executar e denunciou os republicanos portugueses por se terem colocado ao lado daquele pedagogo espanhol.
Sobre o assunto podemos ler:
“Um grupo d’homens que aproveita a condenação d’um grande malfeitor para mostrar sentimentos d’humanitarismo e dar provas de solidariedade política não é um partido com aspirações de governo, é quando muito, uma patrulha sem orientação e sem plano definido, disposta a levar ao meio da sociedade a desordem e toda a casta de perturbações.”
Considerações finais
O assassinato de Ferrer, que foi condenado pelas mais diversas entidades mais progressistas em todo o mundo, foi, também, aplaudido pelos sectores mais conservadores da sociedade, onde se incluía a hierarquia da igreja católica.
A condenação de Ferrer não foi o resultado de qualquer crime que tivesse cometido. Pelo contrário, Ferrer foi condenado por defender uma educação emancipadora ou como muito bem escreveu Anatole France, “o seu crime foi ser republicano, socialista, livre-pensador, o seu crime foi ter criado um ensino laico em Barcelona…”
Mais de um século depois da sua morte, importa continuar a estudar e dar a conhecer o pensamento de Ferrer, não só pelo seu valor histórico, mas porque a escola e a sociedade atuais atravessam uma profunda crise e alguns dos princípios da sua Escola Moderna ainda não perderam atualidade.
Principais fontes consultadas
Ferrer y Guardia, F. (2014). A Escola Moderna. São Paulo: Biblioteca Terra Livre
Sánchez, E. (s/d). Francisco Ferrer i Guardia Una educación libre, solidaria, que lucha contra la injusticia. http://educomunicacion.es/figuraspedagogia/0_ferrerguardia.htm

Teófilo Soares de Braga
Janeiro de 2019
(Letra a Letra, nº 8, abril de 2019)

domingo, 5 de maio de 2019

Gonçalo Ribeiro Teles: uma vida dedicada ao ambiente


Gonçalo Ribeiro Teles: uma vida dedicada ao ambiente

Esta semana, chegou-me às mãos um texto publicado no jornal “Público”, no passado dia 15 de abril, onde a autora dá a conhecer a decisão da reitoria da Universidade de Évora de não abrir novas vagas, devido à diminuição do número de candidatos, para a licenciatura em Arquitetura Paisagística no próximo o ano letivo.

O curso referido foi criado pelo engenheiro agrónomo e arquiteto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles, uma referência nacional e internacional para os ambientalistas, que em abril de 2013 recebeu a mais importante distinção internacional no âmbito da arquitetura paisagista, o Prémio Sir Geoffrey Jellicoe.

Político monárquico, logo depois do 25 de abril de 1974, fundou o Partido Popular Monárquico e, em 1985, o Movimento Partido da Terra. Antes da chamada Revolução dos Cravos, Ribeiro Telles, ao contrário da maioria dos monárquico,s foi um opositor ao regime de António Salazar e de Marcelo Caetano.

Com um trabalho notável na área do ambiente e do ordenamento do território, a ele se deve o projeto de vários jardins urbanos, de que destacamos o da Fundação Calouste Gulbenkian e o Amália Rodrigues. A ele, também, se deve a criação, entre outras, da Reserva Agrícola Nacional e da Reserva Ecológica Nacional. Por tudo o que fez, é considerado um dos pioneiros da defesa do ambiente e um dos inspiradores do movimento ambientalista português.

Para quem quiser aprofundar o seu conhecimento sobre a vida e a obra de Gonçalo Ribeiro Telles recomendo a leitura de dois dos seus livros: Para Além da Revolução, de 1985, e a Árvore em Portugal, publicado em 1999.

Publicado pelas Edições Salamandra, Para Além da Revolução é um livro onde o autor procura demonstrar “que é possível integrar Portugal, como Pátria livre e independente, no mundo diferente que se avizinha a passos largos” e pretende “contribuir para refazer a esperança, ciente de que esta deverá resultar mais do esforço coletivo e da responsabilidade de todos do que a acção isolada de cada um”.

No livro mencionado, é questionado o crescimento económico a todo o custo. Segundo Gonçalo Ribeiro Telles “o crescimento tem sido desequilibrado, uma vez que se têm apenas verificado em determinadas regiões, enquanto que outras se encontram sujeitas a uma exploração que conduz ao subdesenvolvimento e à fome” e acrescenta que as maiores inquietações se devem à “anarquia com que se processam os envenenamentos em cadeia ou a sistemática exploração das regiões subdesenvolvidas pela sociedade industrializada dos países ricos”.

Numa altura em que quase diariamente são cometidos atentados contra as árvores, o segundo livro A Árvore em Portugal, que tem como coautor Francisco Caldeira Cabral, por estar esgotado, deveria ser reeditado e de leitura obrigatória para autarcas, governantes e demais responsáveis por serviços públicos.

No prefácio à segunda edição, Ribeiro Telles lamenta não ter obtido os resultados desejados com a primeira edição, apesar do livro ter sido distribuído por todas as autarquias, “porque se continuaram a verificar plantações mal conformadas, impróprias para poderem resistir ao artificialismo do meio urbano e a efectuarem-se, sistematicamente, podas brutais tanto em muitas câmaras, como em instalações de outros serviços oficiais”.

Ribeiro Telles, no seu livro, refere que prefere “a árvore com a sua forma natural” e no que diz respeito às árvores de ornamento ou florestais acrescenta que “a poda não é uma operação cultural normal”.

Por último, em relação à escolha desadequada de plantas, no livro pode ler-se o seguinte: “Se não há espaço para a árvore é preferível plantar só o arbusto, ou mesmo só a flor e não contar depois com a tesoura para manter com proporções de criança o gigante que se escolheu impensadamente”.

Teófilo Braga
Correio dos Açores,31816,1 de maio, p.16)