O Dr.
Botelho e a agricultura
O
Dr. José Pereira Botelho possuía terrenos na Rua Margarida de Chaves, em Ponta
Delgada, na Carreira, na Fajã de Cima e nas Alminhas, na Lagoa, ocupados,
essencialmente com laranjeiras e vinhas.
O
cultivo das vinhas na ilha de São Miguel terá começado nos primeiros anos do
povoamento da ilha, como se pode concluir do que escreveu Gaspar Frutuoso, nas
Saudades da Terra: “Deu esta ilha, em ano de boa novidade, perto de duas mil
pipas de vinho ,,,. Setecentas na cidade, outras tantas na Lagoa, quatrocentas
na Ribeira Grande, e as mais no Nordeste e Povoação, e em toda a ilha.” De
acordo com o cronista, os primeiros pés de vinha terão sido plantados em 1500,
no Rosto do Cão, por João Gonçalves.
No
século XIX, por volta de 1853, as primitivas vinhas foram destruídas pelo oídio
e pela filoxera pelo que tiveram se ser substituídas pela vinha americana ou vinha
de cheiro que terá sido introduzida por António Borges da Câmara Medeiros que
mandou vir de Paris 1000 plantas.
O
Dr. José Pereira Botelho, foi dos primeiros a optar pela vinha de cheiro, tendo
feito as primeiras experiências no quintal da sua casa da Rua Margarida de
Chaves, onde chegou a produzir 10 pipas. No seu tempo, o Dr. Botelho chegou a
ser um dos maiores produtores, de São Miguel de vinho de cheiro.
Aos
nomes de António Borges da Câmara de Medeiros, que instalou a primeira estufa
de ferro e vidros e cultivou ananases, e José Bensaúde, que começou o cultivo
com fins comerciais e é responsável pela primeira exportação para Inglaterra,
em 1864, podemos associar o do dr. Botelho que foi também dos primeiros a fazer
a experiência em estufas que possuía.
O
Dr. Botelho também está associado à cultura da laranja que terá começado nos
Açores no século XVI, sendo possuidor de algumas quintas. De acordo com
Francisco Maria Supico, das diversas variedades de laranjeiras cultivadas em São
Miguel, o Dr. Botelho possuía três: “Laranja do Dr. Botelho – Obtida por
semente. É grande e belo fruto.”; Laranja dulcíssima – do sr. Dr. Botelho. Foi
obtida por semente. É muito doce e temporã.
A árvore aos 17 anos ainda apresentava frutos de casca grossa.”;
“Laranja prata- do sr. Dr. Botelho. É muito comum na Lagoa. Excelente, tardia,
raríssima são as árvores que não dão frutos de primeira sorte.”
No
dia 11 de janeiro de 1843, com a presença do Dr. Botelho, foi criada, em Ponta
Delgada, a SPAM- Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense que publicou o
jornal “O Agricultor Micaelense”, cuja segunda série contou com a redação de
António Feliciano de Castilho.
O
Dr. Botelho não foi apenas um dos primeiros sócios da SPAM, foi um sócio
convicto e ativo, pois colaborou ativamente com as direções, quer em comissões
por elas criadas, quer em preleções destinadas a sócios e a convidados.
O
Dr. Botelho foi preletor em várias sessões sobre Química Agrícola que ocorreram
às segundas-feiras e às quintas-feiras durante algumas semanas. Curioso é o
facto de estas sessões não serem exclusivamente teóricas, como se pode constatar
através do seguinte extrato transcrito de “O Agricultor Micaelense”: “Aqueles
srs. que desejarem fazer mais completos estudos, ou pretenderem manipular no
laboratório, deverão entender-se com o secretário da Sociedade ou com o Sr.
Doutor José Pereira Botelho”. Devido a doença do Dr. Choque, o Dr. Botelho
também se encarregou de dar lições de Botânica.
No
que diz respeito a comissões, o Dr. Botelho fez parte de uma comissão destinada
a fazer estudos comparativos das várias rocas mecânicas existentes em São
Miguel. Também fez parte de uma comissão encarregada de verificar se uma
preparação criada pelo sr. Domingos Monteiro Torres era eficaz no tratamento do
“bicho das laranjeiras”, de outra destinada a examinar uma proposta de José
Honorato Gago da Câmara de criar na SPAM
um Gabinete de Química e de outra com o
objetivo de analisar a eficácia do método do Dr. Choque no tratamento
das laranjeiras.
Por
último, embora não relacionada com a agricultura propriamente dita, o Dr.
Botelho foi sócio fundador, com 5 ações de 5$000 réis cada, da Sociedade de
Avicultura e Aclimatação Micaelense, criada em abril de 1891, com o fim de
“criar aves e outros animais domésticos vendendo exemplares e ovos nesta ilha,
ou fora dela, promovendo exposições, concedendo prémios, medalhas e menções
honrosas, e propagação de raças puras neste distrito”.
Teófilo
Braga
(Correio
dos Açores, 32193, 29 de julho de 2020, p.16)