sábado, 31 de março de 2018

Escavando na tauromaquia em São Miguel



Escavando na tauromaquia em São Miguel

A prática de torturar bovinos e cavalos é muito comum na ilha Terceira e tem-se mantido ao longo dos tempos não por ser uma tradição digna, mas porque é lucrativa para alguns. A sua sobrevivência só tem sido possível pelo apoio que recebe de políticos e governantes.

O farmacêutico natural da Lousã, que se estabeleceu em São Miguel, Francisco Maria Supico (1830-1911), na rubrica que manteve no jornal “A Persuasão” intitulada “Escavações” refere-se à realização de touradas na ilha de São Miguel, numa das muitas tentativas da indústria tauromáquica terceirense de espalhar o vício anacrónico de torturar animais ou assistir à tortura dos mesmos.

Numa notícia publicada no referido jornal, a 3 de julho de 1872, pode-se ler o seguinte: “Houve já duas corridas de touros, sendo a última, domingo. Quem nunca viu touradas não desgosta; quem as tem visto acha o divertimento abaixo de medíocre”.

A 17 de julho do mesmo ano, o jornalista depois de noticiar a realização de mais uma tourada, acrescenta que o dito divertimento “não promete sustentar-se, porque lhe faltam as condições essenciais: touros e toureiros”.

A 18 de setembro, no jornal referido, o redator pede “à autoridade competente para que não permita mais funções de touros, se não a pessoas competentes; porque, permitindo-se, acontece o que aconteceu no domingo último, que ia sendo fatal o divertimento”.

No 2º Volume das “Escavações”, Francisco Maria Supico faz uma síntese do abominável divertimento de ver sofrer animais nos seguintes termos:

“As touradas de 1872 deram-se num terreno da rua Formosa confinando com a rua da Alegria.

Para as de 1881 e 1882, armou-se praça em forma na rua da Mãe de Deus, quase em frente dado Negrão.

Gado e toureiros vieram da Terceira por conta de um empresário de lá, que não fez fortuna com a imperfeita exibição da arte tauromáquica.

Em S. Miguel dá-se o fenómeno de se não manter a braveza do gado indígena; e o que vem de fora amansa breve.

Não é por isso terra em que se possam ter grande apreço as bravias belezas do toureio.”

Hoje, a submissão dos principais partidos políticos ao capitalismo tauromáquico faz com que uma prática condenada em todo o mundo civilizado continue a fazer as suas vítimas, humanas ou não, nos Açores.

31 de março de 2018
Teófilo Braga

terça-feira, 27 de março de 2018

Alguns marcos históricos da educação ambiental e da defesa do ambiente (5)



Alguns marcos históricos da educação ambiental e da defesa do ambiente (5)

Dando continuidade aos textos anteriores sobre o tema, hoje, damos a conhecer alguns marcos importantes, tanto internacionais como nacionais, relacionados com a defesa do ambiente e a educação ambiental que ocorreram entre 1974 e 1982.

Em 1975, por iniciativa da ONU e da UNESCO realiza-se, em Belgrado, um seminário internacional sobre educação ambiental no qual foi aprovada a Carta de Belgrado, um documento muito importante que ainda hoje devia ser alvo de reflexão. No seu texto, entre outros, encontra-se o seguinte alerta.

"Governos e formuladores de políticas podem ordenar mudanças e novas abordagens para o desenvolvimento, podem começar a melhorar as condições de convívio do mundo, mas tudo isso não passa de soluções de curto prazo, a menos que a juventude mundial receba um novo tipo de educação. Esta implicará um novo e produtivo relacionamento entre estudantes e professores, entre escolas e comunidades, e entre o sistema educacional e a sociedade em geral."

Em Portugal, em 1975, foi criada a Secretaria de Estado do Ambiente.

No dia 10 de julho de 1976, na cidade de Seveso, ocorreu uma explosão numa fábrica de produtos químicos, tendo havido a libertação dioxinas. Embora se pense que não terá havido mortes de humanos diretamente relacionadas com o ocorrido, 193 pessoas sofreram de váias doenças. Na altura morreram 3000 animais e outros 70 000 tiveram de ser abatidos para evitar a entrada da dioxina na cadeia alimentar.

Em Portugal a Constituição da República Portuguesa que entrou em vigor a 25 de abril de 1976 passou a reconhecer a todos os cidadãos o direito a um ambiente ecologicamente equilibrado e o dever de o defender (art. 66º).

Em 1977, realizou-se na cidade de Tbilisi (Georgia), antiga URSS a "Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental", na qual foram elaborados os princípios, as estratégias e as ações orientadoras em educação ambiental que ainda são adotados em todo o mundo.

Em 1979, foi assinada, em Berna, a Convenção sobre a Vida Selvagen e os Habitats Nauturais na Europa com os objetivos de conserver a flora e a fauna selvagens e os seus habitats naturais, em particular as espécies e habitats cuja conservação exija a cooperação de diversos estados, e promover essa cooperação.

A 28 de março de 1979, o núcleo do reactor de uma central nuclear em Three Miles Island, Estados Unidos, funde parcialmente devido a uma falha no sistema de refrigeração. É libertada radiação para o exterior e fortemente abalada a confiança dos cidadãos na energia nuclear. Dois milhões de pessoas foram atingidas pelas radiações e foram necessários 400 milhões de dólares para voltar a por em funcionamento o reator, o que ocorreu três anos depois.

No mesmo ano, 1979, realizou-se, em Genebra a I Cimeira Mundial do Clima, onde pela primeira vez foi reconhecido que as alterações climáticas são um problema grave para o planeta.

Em 1982, realiza-se a Conferência de Nairobi, para analisar o trabalho feito após dez anos da Conferência de Estocolmo. Preocupados com o estado do ambiente, os participantes acordaram na formação da Comissão Mundial do Ambiente e do Desenvolvimento (CMAD), chefiada por Gro Harland Brutland.

A 10 de dezembro de 1982, na Jamaica realizou-se a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar que estabeleceu os princípios gerais da exploração dos recursos naturais do mar e criou o Tribunal Internacional do Direito do Mar.

Em 1982, nos Açores, foi criado o Círculo de Amigos das Furnas, com o objetivo de defender os interesses, também ambientais, do Vale Formoso.

(continua)
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31489, 28 de março de 2018, p.14)

sábado, 24 de março de 2018

Plantação de endémicas

Hoje, participei numa plantação de endémicas (urzes, vidálias e bracel) promovida pelos Amigos dos Açores.

terça-feira, 20 de março de 2018

Novas Rotas, Novo Rumo para a Educação



Novas Rotas, Novo Rumo para a Educação

Nos próximos dias, a Assembleia Legislativa Regional dos Açores irá pronunciar-se sobre uma petição, que também assinei, de um grupo de docentes e encarregados de educação que pretendem a criação de uma escola diferente da que temos tido até aqui.
Segundo os proponentes, a escola que anseiam será, acreditamos que em breve, “uma verdadeira comunidade aprendente” que irá “integrar nas suas práticas de ensino os contributos da investigação mais recente nas várias áreas do saber, relativas ao processo de aprendizagem, e, sobretudo, tem de admitir o facto inegável de que as crianças e jovens aprendem hoje de forma diferente e que, por esta razão, o sistema educativo tem de ser alterado para se adaptar a esta nova realidade”.
Para evitar mal-entendidos, que efetivamente já existem, como o de confundir o “Projeto Novas Rotas” com o movimento pedagógico português “Movimento da Escola Moderna”, quero deixar bem claro que não faço parte do Projeto Novas Rotas, mas que tenho a maior estima e consideração pelas pessoas que conheço e que estão a ele ligadas e que o que mais desejo é que “a nova escola” seja implementada já no próximo ano letivo. Quanto ao Movimento da Escola Moderna, sou membro ativo, tendo feito várias tentativas de implementar os seus princípios na minha ação educativa, mas o que escrevo neste jornal é da minha inteira responsabilidade, não comprometendo mais ninguém.
A leitura que fiz do relatório da Comissão Permanente dos Assuntos Sociais, no âmbito da apreciação da petição referida, deixa-me um pouco apreensivo acerca do futuro de um projeto que pela motivação e empenho dos docentes e pais e encarregados de educação envolvidos tem pés para andar. Com efeito, se a tutela não fecha a porta ao projeto, “admitindo a sua experimentação no âmbito de uma das unidades” acrescenta que não aceita “a alteração do modelo de colocação dos professores”. Não compreendemos este reparo pois, tanto quanto sabemos, todos os envolvidos no projeto já estão integrados na carreira docente em vários estabelecimentos de ensino, pelo que basta o recurso a uma das formas de mobilidade previstas no Estatuto da Carreira Docente para poderem lecionar na unidade orgânica que acolher o projeto.
Não vou pronunciar-me, com profundidade, sobre as interrogações de um deputado que afirmou que o “modelo ainda está em modo experimental”. Se se referiu à Escola da Ponte, uma das experiências inspiradoras do Novas Rotas, consideramos que a afirmação só revela desconhecimento da mesma já que ela existe desde 1976 e, sem ter alunos “escolhidos a dedo”, tem superado com sucesso todas as avaliações externas.
Falta de conhecimento também revela o Secretário Regional da Educação e Cultura ao comungar de “algumas preocupações expostas pelo Deputado”, tendo referido a “necessidade de formação dos professores”. Tanto quanto sei, e sei pouco pelas razões já expostas, os docentes envolvidos têm frequentado, ao longo dos últimos anos muitas ações de formação, e mais do que a simples frequência têm suportado alguns custos com a vinda de formadores exteriores à Região.
Um dos principais meios de derrubar “um projeto” ou de “destruir” uma ideia, não é não o aprovando ou proibindo-a de ser divulgada. Pelo contrário, é pura e simplesmente dizer que o que se pretende já é feito ou deturpando a ideia. Como exemplo, fora da escola temos o conceito de desenvolvimento sustentável, já de si pouco preciso, mas que é deturpado diariamente, pois em seu nome são cometidas as maiores barbaridades ambientais e injustiças sociais. Na escola, no passado, assistimos à morte da chamada área escola que foi, propositadamente ou não, confundida com as visitas de estudo que sempre foram feitas.
Não sei o que pretendeu o SREC ao afirmar que o “ProSucesso bebeu informação nas duas âncoras que suportam esta petição: Escola da Ponte e o Projeto Escola Moderna, fazendo referências a ações desenvolvidas e que coincidem com aquelas que são as pretensões da própria petição, do próprio projeto”. No que diz respeito à segunda “âncora”, para além de não ser um projeto, nunca pretendeu ser uma escola, sendo uma “Associação Pedagógica de Professores e de outros Profissionais da Educação” que possui um modelo pedagógico assente em três subsistemas integrados de organização do trabalho de aprendizagem: estruturas de cooperação educativa, circuitos de comunicação e participação democrática direta. Além do referido, e não duvidando da boa vontade e do empenho dos envolvidos no ProSucesso, importa ficar bem claro que o modelo do MEM não pode ser implementado de forma atomizada e não integradora.
Termino fazendo votos para que haja bom senso na Assembleia Regional e que esta recomende ao Governo a implementação de medidas que não obstaculizem a implementação, já no próximo mês de setembro, de um projeto que tem merecido muitas horas de trabalho e de dedicação a muitos colegas meus, que é desejado por um grupo significativo de pais e que, sobretudo, é uma mais-valia para os alunos desta terra.


Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31483, de 21 de março de 2018, p. 13)
https://www.facebook.com/novasrotaseducacao/

sábado, 17 de março de 2018

Sem sindicato, sem partido, não desisto de lutar

Ponta Delgada, 16 de março de 2018

Voto de Pesar pelo falecimento de Fernando José Rodrigues Filipe



Voto de Pesar pelo falecimento de Fernando José Rodrigues Filipe

(Proposta do Departamento de Ciências Físico-Químicas e Geográficas)

É com profundo pesar que o Conselho Pedagógico da Escola Secundária das Laranjeiras assinala o falecimento de Fernando José Rodrigues Filipe, de 63 anos, assistente operacional da nossa escola, no passado dia 12 de março de 2018.

Pessoa preocupada com o bem comum, tudo fazia para ajudar quem dele precisava, tendo ao longo da sua vida mantido uma ação cívica e política digna de registo, quer através da sua atividade sindical, quer da sua militância partidária.

Reunido no dia 14 de março de 2018, o Conselho Pedagógico regista com tristeza o falecimento de Fernando José Rodrigues Filipe, transmitindo à sua família o mais sentido pesar.

14 de março de 2018

(Aprovado por unanimidade)

quinta-feira, 15 de março de 2018

O Professor Mário de Oliveira e a Escola Única


O Professor Mário de Oliveira e a Escola Única

Nas minhas pesquisas sobre o tema da educação, depois de ter tomado conhecimento de algumas ideias defendidas pelo pedagogo Adolfo Lima que esteve ligado à Voz do Operário, instituição com sede em Lisboa que ainda disponibiliza serviços que vão do berçário ao 2º ciclo, e de ter visitado recentemente a sua sede, deparei-me com o nome de Mário de Oliveira, professor do ensino primário, hoje designado por primeiro ciclo do ensino básico.

Mário Augusto de Oliveira e Sousa (1892-1970) nasceu em São Paio, Gouveia, foi um militante libertário que esteve ligado ao movimento sindical, tendo sido delegado dos funcionários públicos ao Congresso Operário de 1922. Neste congresso foi aprovada por esmagadora maioria a adesão dos sindicatos portugueses à Associação Internacional dos Trabalhadores, de orientação anarcossindicalista, em detrimento da adesão à Internacional Sindical Vermelha, de orientação comunista.
No que diz respeito à sua atividade profissional, Mário de Oliveira lecionou na Guarda na Associação 1º de Maio e na Voz do Operário, tendo sido colaborador pedagógico do Dr. Adolfo Lima.
O professor Mário de Oliveira foi também muito ativo no movimento associativo de professores, tendo sido um dos animadores da Associação dos Professores de Portugal, da União dos Professores de Portugal e da Liga de Ação Educativa.
Mário Oliveira foi editor da revista “Educação” e foi autor da brochura “A Escola Única-uma nova ideia pedagógico-social”, editada em Lisboa, no mês de outubro de 1933.
Segundo Joaquim Pintassilgo e Maria João Mogarro, num texto, não datado, intitulado “A ideia de escola para todos no pensamento pedagógico português”, para além de Mário de Oliveira e Adolfo Lima, também defenderam a escola única, entre outros, Bento de Jesus Caraça e Álvaro Sampaio.

Antes de darmos a conhecer alguns extratos da publicação referida de Mário de Oliveira, esclarecemos o que se entende por escola única, recorrendo aos autores citados no parágrafo anterior. Assim, segundo eles:

“A Escola Única representa, em geral (e abstraindo-nos das interpretações diversas de que é alvo) uma forma de organização da escola de modo a que ela seja acessível a todos os seus membros em igualdade de condições, segundo as suas aptidões e competências e não segundo a sua situação económica e social. A Escola Única implica a unificação do sistema de ensino até uma idade considerada adequada para o aparecimento de quaisquer especializações, designadamente as de natureza profissional.”

Por não conhecermos o texto completo da brochura do professor Mário de Oliveira, as citações seguintes só foram possíveis através de um extrato do mesmo, publicado na revista “Letra a Letra”, nº 5, de setembro de 2016, editada pela Modos de Ser-Associação Livre”.

Sobre o estado da educação em Portugal, Mário de Oliveira escreveu o seguinte: “Só um patriotismo fanático, doente, pode negar os nossos 65% de analfabetos, a par dum sem número de factos que mostram claramente o atraso, a pobreza de todos os nossos recursos coletivos e fontes de valorização social”.

Sobre a Escola Única, depois de afirmar que a mesma “não atende a privilégios, a preconceitos ou favoritismos e aproveita-se das competências onde elas estiverem”, não se perdendo “valores”, nem elevando “nulidades”, Mário de Oliveira acrescenta o seguinte:

“A Escola Única nivela a todos perante a educação e organiza o ensino sob o ponto de vista da humanidade, do bem comum, dos interesses do indivíduo e da colectividade, sem prejuízo mútuo, e pretende elevar à máxima valia as aptidões técnicas e os sentimentos de fraternidade e de solidariedade humanas”.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31478 de 15 de março de 2018, p.13)
http://www.elsgnoms.com/imageneslibros/29431.jpg

quarta-feira, 14 de março de 2018

Memória

terça-feira, 6 de março de 2018

Alguns marcos históricos da educação ambiental e da defesa do ambiente (4)


Alguns marcos históricos da educação ambiental e da defesa do ambiente (4)

Hoje, publicamos o quarto texto dedicado a marcos importantes, tanto internacionais como nacionais, relacionados com a defesa do ambiente e a educação ambiental que ocorreram entre 1972 e 1974.

Com a presença de 114 países realizou-se, em 1972, em Estocolmo, a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano. Nesta conferência foi criado o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), sediado em Nairobi, Quénia, e aprovada a Declaração do Ambiente que relativamente à educação refere o seguinte:

É essencial ministrar o ensino, em matérias de ambiente, à juventude assim como aos adultos, tendo em devida consideração os menos favorecidos, com o fim de criar as bases que permitam esclarecer a opinião pública e dar aos indivíduos, às empresas e às colectividades o sentido das suas responsabilidades no que respeita à protecção e melhoria do ambiente, em toda a sua dimensão humana.

John McCormick, num texto publicado no Rio de Janeiro intitulado “Rumo ao paraíso: a história do movimento ambientalista”, considerou que aquele evento foi “o acontecimento isolado que mais influiu na evolução do movimento ambientalista internacional” e acrescentou que “o pensamento progrediu das metas limitadas de proteção da natureza e conservação dos recursos naturais para a visão mais abrangente da má utilização da biosferapor parte dos humanos”.

No mesmo ano, a nível internacional, foi publicado o primeiro relatório do Clube de Roma que segundo Charles-Henri Favrod, “em vésperas da crise do petróleo que rebentará no ano seguinte, convida a opinião pública mundial, geralmente embalada por promessas expansionistas, a ganhar consciência dos «limites do crescimento». A sua repercussão imediata (45 000 leitores em França. 300 000 na Alemanha Federal, quase outros tantos nos Países Baixos) prova uma inquietação latente do público perante os «milagres económicos» e coloca em primeiro plano de atualidade um organismo até ali pouco conhecido”. Embora se possa considerar que o relatório foi alarmista, uma coisa é certa os “milagres económicos” têm acontecido à custa da delapidação de recursos não renováveis e a riqueza criada não tem chegado a todos os seres humanos, sobretudo aos seus principais criadores

A nível nacional foi criada a Subsecretaria de Estado do Ambiente, e apresentado na televisão o programa “Há só uma Terra”, da responsabilidade da Comissão Nacional do Ambiente.

Em 1973, o economista inglês Ernest Friedrich Schumacher (1911-1977) publica o livro “Small is Beautiful: um estudo de economia em que as pessoas também contam”, onde desenvolve o conceito de Tecnologia Intermédia e critica as economias ocidentais. No mesmo ano o engenheiro agrónomo francês René Dumont (1904-2001) publica o livro “Utopia ou Morte” que foi um marco importante no desenvolvimento do movimento da ecologia política que se opõe à “ideologia do crescimento ilimitado e à acumulação infindável de bens em que assenta a sociedade de consumo atual”.

A nível nacional, no ano de 1973, foi comemorado oficialmente, a 5 de junho, o Dia Mundial do Ambiente.

Em 1974, o químico dos EUA Sherwood Rowland (1927-2012) e o químico mexicano Mário Molina, nascido em 1943, descobrem que os clorofluorcarbonetos (CFCs) podem destruir a camada de ozono. No mesmo ano ocorre a primeira crise petrolífera. A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) impõe um embargo do precioso líquido aos Estados Unidos pelo seu apoio a Israel na Guerra contra o Egipto e a Síria, catapultando os preços e originando uma crise energética e económica mundial.

Em Portugal com a implantação de um regime democrático a 25 de abril, foram criadas duas associações ligadas ao ambiente, o Movimento Ecológico Português, com sede em Lisboa, que foi dinamizado, entre outros, por Afonso Cautela e o Núcleo Português de Estudos e Proteção da Vida Selvagem, com sede no Porto.

Esta última organização tinha, de acordo com os seus estatutos, como objetivo prioritário a proteção da natureza, em especial da fauna e da flora, teve a sua sede localizada na rua Padre Manuel José Pires, localizada na freguesia de São Pedro, no concelho de Vila Franca do Campo. Foram seus principais dinamizadores, o francês Gerald le Grand e o vila-franquense Duarte Soares Furtado,

(continua)
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31471, 7 de março de 2018, p. 17)

Memórias de infância



Cortejo de Oferendas a favor do Salão Paroquial em 1969

No dia 16 de novembro de 1969 realizou-se, em Vila Franca do Campo, um cortejo de oferendas a favor da construção do Salão Paroquial da paróquia de São Miguel. Para o efeito foram criadas várias comissões que se responsabilizaram pela organização do cortejo em determinadas ruas da freguesia.

Na Ribeira Seca existiram as seguintes três comissões:

Rua da Grota dos Novais, Calçada, rua do Jogo e Rua da Palmeira, constituída pelo prof. José Cabral, José Santo Cristo Verdadeiro, António Rocha de Andrade, Manuel Carreiro, Manuel Medeiros Bolota, Mário Roberto de Oliveira, Daniel de Jesus Couto, José de Sousa, Teófilo Braga, Floriano Soares, José Jacinto de Andrade, José de Lima Carvalho, José Soares do Rego, José da Costa Pacheco, José Joaquim Dias Marques, Arcádio Teixeira de Sousa, José Furtado Brum e José de Sousa Batata.

Rua do Arco, Rua da Cruz Formosa, Moinhos e Rua Nova, constituída por João Jacinto Batista, Manuel Pacheco Toste, José Inácio Carreiro, José Furtado Braga, João Norberto Salema, Albino Raposo de Amaral, Manuel da Costa Pacheco, Manuel de Lima Carvalho, Viriato Madeira da Ponte, Dinis Furtado Brum, Manuel da Costa esteves, José de Lima Carvalho Jr., Lino Pacheco dos Santos, Miguel Furtado Lima, João da Costa Pacheco, Manuel Pimentel Calouro e Jeremias de Medeiros Verdadeiro.

Rua da Cruz à Ribeira, Além da Ponte, Calçada do Caminho Velho, Caminho do Mato e São João, que era composta por Manuel Furtado Garoupa, António Furtado Braga, Manuel Pacheco Henrique, Artur Gabriel Couto, João José Sardinha, Virgínio Carlos Sardinha, Manuel Luís da Mota Sardinha, Álvaro José Sardinha, Ângelo José Verdadeiro, José da Pedra Correia, Manuel de Sousa batata Jr., Miguel de Lima Carvalho, Manuel Verdadeiro, Miguel Camelo e José do Santo Cristo Correia.

De acordo com o jornal “A Vila”, os resultados obtidos excederam todas as espectativas. Com efeito, o cortejo “bateu o recorde a todos os seus anteriores pelo valor em dinheiro que recolheu: - 40 000 $00”. O mesmo jornal estimou o valor total das oferendas em cerca de sessenta contos, tendo enaltecido o facto, “atendendo ao meio pobre em que tal importância foi recebida”.

Pico da Pedra, 6 de março de 2018
Teófilo Braga

sexta-feira, 2 de março de 2018

Adriano Botelho, uma anarquista açoriano desconhecido na sua terra


Adriano Botelho, uma anarquista açoriano desconhecido na sua terra

No dia 26 de julho de 1989, o jornal Correio dos Açores noticiou o surgimento de uma nova edição da Secretaria Regional da Educação e Cultura, da Região Autónoma dos Açores: o livro “Adriano Botelho – Memória e Ideário”, uma antologia de textos organizada e prefaciada por Carlos Abreu e João Freire.

A notícia referida, talvez a única num jornal açoriano em que nome de Adriano Botelho é mencionado e uma pequena nota biográfica, da autoria de Carlos Enes, inserida na Enciclopédia Açoriana (1) são a prova de que os poderes instituídos estão mais interessados em dar a conhecer intelectuais amorfos, políticos retrógrados, pretensos fidalgos e quejandos, esquecendo-se de gente séria, modesta e boa e de quem perfilha ideias progressistas e/ou age para acabar com uma sociedade injusta.

Nesta pequena nota, pretende-se por um lado homenagear o anarquista açoriano que não traiu os seus ideais e dar a conhecer um pouco da sua vida e obra para que não caiam no esquecimento e sirvam de exemplo às novas gerações.

Adriano Inácio Botelho nasceu em Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, a 12 de setembro de 1892, tendo lá residido até 1907, ano em que foi viver para Ponta Delgada, ilha de São Miguel, onde completou o curso dos liceus, em junho de 1909.

Embora tenha ouvido falar, por volta dos seus 12 ou 13 anos, através do seu professor de História, Geografia e Francês do liceu de Angra do Heroísmo, onde frequentou os primeiros cinco anos, de socialismo que era segundo aquele “a doutrina da igualdade económica” e se ter sentido “entusiasmado por esse sociedade, em que não haveria pobres e ricos”, até 1909, ano em que saiu de São Miguel não tinha “ideias político-sociais assentes”.

Chegou a Lisboa em outubro de 1910, onde se matriculou na Escola Politécnica com o objetivo de concorrer à Escola de Guerra. Como os estudos não correram bem, foi para Coimbra pouco depois da instauração da República, tendo aí acompanhado a agitação que “reclamava os cursos livres e a criação duma faculdade de Direito em Lisboa”. Foi nessa ocasião que aderiu ao anarquismo, tendo lido “o livro do Dr. Eltzbacher sobre as doutrinas anarquistas” bem como vários livros de Pedro Kropotkine que adquiriu e que Aurélio Quintanilha lhe emprestou.

Em junho de 1914 abandona Coimbra sem ter terminado a licenciatura em Ciências e foi para Lisboa. Como encontrou dificuldades em conseguir um emprego pensou ir para Paris e depois para os Estados Unidos da América, onde tinha familiares, tendo para tal regressado nos fins de 1914 para os Açores para dali seguir para a América do Norte.

Terminada a Guerra e cansado de esperar pela ida para os Estados Unidos, regressou a Lisboa em setembro de 1919. Foi aí que, através de Aurélio Quintanilha, também natural de Angra do Heroísmo e seu colega no liceu e na Universidade de Coimbra, que contatou com Alexandre Vieira, diretor do jornal “A Batalha”, tendo passado a colaborar com aquele jornal numa secção sobre o movimento sindical e libertário estrangeiro.

A sua maneira de ser fazia com que tivesse dificuldade em manter relações sociais e mesmo conversar só o fazia e pouco com quem se entendia bem. Além disso, a sua entrada para organizações libertárias, onde segundo ele “a principal colaboração foi dada por escrito, atirando como o semeador com o grão à terra, mas deixando que este se desenvolvesse por si, onde encontrasse terreno propício”, deu-se forçando-se um pouco a si próprio.

Após a Primeira Conferência Anarquista da Região Portuguesa que se realizou em maio de 1923, em Alenquer, e onde foi constituída a UAP – União Anarquista Portuguesa, foi constituído um grupo de que Adriano Botelho fez parte, por sugestão de outro açoriano, também natural de Angra do Heroísmo, António José de Ávila, que mais tarde se designou O Semeador. Adriano Botelho, também, fez parte do C. R. da Federação Anarquista da Região Centro, uma das federações regionais em que a UAP estava organizada.

Em 1926, Adriano Botelho foi nomeado para o Conselho Confederal da CGT – Confederação Geral do Trabalho, organização anarco-sindicalista criada a 13 de setembro de 1919, onde se manteve até 1931, ano em que pediu a demissão e escreveu o folheto “Da Conquista do Poder”.

Francisco Quintal, na nota introdutória à reedição do folheto feita, em 1979, pelo Grupo Cultura e Ação Libertária (2), justifica a mesma pelo facto de constituir “uma demonstração clara e eficiente da inutilidade do Estado” e pela sua atualidade então, e dizemos nós ainda hoje, pois vivia-se “numa época em que o corpo do Estado, em plena decomposição, está a ser assaltado por uma multidão de necrófilos constituída por aqueles que, hoje mais assanhados do que nunca e ostentando rótulos que não correspondem às suas ambições, pretendem conquistá-lo […] procurando assim reviver o estafado lema de que o poder é necessário como guia orientador dos povos”.

Em 1932, Adriano Botelho, a pedido de Mário Castelhano voltou para o Comité Confederal, sendo este responsável pela criação do comité que preparou a Greve Geral de 18 de janeiro de 1934, que não contou com a sua presença.

A entrada de anarquistas espanhóis para o governo, durante a Revolução Espanhola de 1936-1939 causou, em Adriano Botelho, “uma profunda revolta, cheia de ódio contra os prevaricadores e seus defensores que se convenceu “de que o que era mais necessário era a divulgação das doutrinas anarquistas” e convencido que não assistiria ao derrube do regime fascista começou “a distribuir jornais e folhetos, entregando alguns a camaradas de Almada e enviando outros para Edgar Rodrigues, no Brasil”.

Embora sempre dissesse que não queria voltar a participar na atividade da CGT, acabou por aceitar pertencer ao grupo que tentou a sua reconstituição, quando os resultados da Guerra de 1939-1945 começaram a ser favoráveis às “democracias”, tendo feito parte dos comités confederais até ao seu desaparecimento por volta de 1965.

Adriano Botelho que sempre preferiu no movimento específico anarquista dedicou quase toda a sua vida a divulgar os ideais em que acreditava, tendo sido, segundo Correia Pires (3), um “excelente jornalista e não houve nenhum jornal anarquista no tempo que não colaborasse e até nos jornais operários como “A Batalha”, “A Comuna”, a “Aurora” e muitos outros”.

Depois do 25 de abril de 1974, Adriano Botelho continuou a sua labuta, tendo colaborado com a “Voz Anarquista” e em maio de 1974 escreveu o texto “Ao Povo Português”, onde mostra alguma esperança na construção da sociedade que ele tanto almejou, uma “sociedade baseada na completa liberdade dos indivíduos, simplesmente limitada pela liberdade igual dos restantes.” Segundo ele, na sociedade pretendida haverá a “socialização (não nacionalização) de todos os meios de produção (terras, fábricas, minas), entregues aos próprios trabalhadores, para serem utilizados em benefício da coletividade e não de minorias parasitárias” e onde “será abolido o escravizante regime do salariato e cada um produzirá, segundo as suas forças e consumirá segundo as suas necessidades. Aliás esta é a forma praticada no seio de todas as famílias moralmente constituídas”.

Nos seus escritos, Adriano Botelho abordou os mais diversos temas de que são exemplo, a história do movimento operário e anarquista em Portugal, a luta contra o salazarismo, os acontecimentos no estrangeiro, nomeadamente os associados à Revolução Russa e à Guerra de 1936-39 em Espanha, a organização e a propaganda anarquista, o sindicalismo, a religião e a ciência, os espetáculos imorais, etc., etc.

Sobre as touradas de praça, um dos espetáculos imorais referidos, Adriano Botelho escreveu, a 10 de agosto de 1925, no suplemento ilustrado d’A Batalha, o seguinte: ”…fazem-se por outro lado, reclames entusiastas de espetáculos, como as touradas de praça onde por simples prazer se martirizam animais e onde os jorros de sangue quente, os urros de raiva e dor e os estertores da agonia só podem servir para perverter cada vez mais aqueles que se deleitam com o aparato dessa luta bruta e violenta, sem qualquer razão que a justifique” e acrescentou: “E - caso assombroso! – já se chegou até ao arrojo de se condecorar por atos de filantropia um toureiro qualquer, digno filho da Espanha fradesca e reacionária, como se na arte de atormentar barbaramente animais – quase sempre colocados em desigualdade de circunstâncias para a defesa – pudesse haver algo de generoso e altruísta”.

Tendo vivido apenas cerca da quinta-parte da sua vida nos Açores, Adriano Botelho escreveu muito pouco sobre a sua terra natal. Com efeito, sobre os Açores apenas conhecemos o texto “Independência dos Povos” que foi publicado pela primeira vez no número 24 da “Voz Anarquista, de Agosto de 1977.

No texto mencionado, depois de mencionar que a situação dos Açores é diferente da “dos outros povos colonizados por Portugal, na África, Ásia e América”, onde os seus habitantes foram escravizados e alguns vendidos “como animais de carga”, Adriano Botelho afirmou que “nas camadas populares não existem, em geral, ideias de integração na república norte-americana e muito menos aspirações separatistas”.

Segundo Adriano Botelho, apenas “alguns magnatas da ilha de S. Miguel, preocupados sobretudo com a situação que lhes possa melhor garantir a sua privilegiada posição”, sem muitos seguidores nas outras ilhas, terão aspirações separatistas. O povo, por seu turno, escreve Adriano Botelho” continuará explorado e oprimido, evidentemente enquanto estiver sob o domínio de qualquer Estado: Açoriano, Português ou Norte-Americano, pois só com o desaparecimento desta instituição, como aliás em todo o mundo, é que ele conseguirá libertar-se integralmente”.

São Miguel (Açores), 1 de maio de 2017
Teófilo Braga

(1) http://www.culturacores.azores.gov.pt/ea/pesquisa/?id=7376
(2) http://mosca-servidor.xdi.uevora.pt/projecto/components/com_library/texts/14_BNP_AHS3813.pdf
(3) Introdução ao folheto “Ao Povo Português”.

BIBLIOGRAFIA

Abreu, C., Freire, J. (1989). Adriano Botelho memória e ideário (antologia de textos). Angra do Heroísmo: Direção Regional dos Assuntos Culturais.
Botelho, A. (1974). Ao Povo Português. Almada: Delegação de Almada do Movimento Libertário Português.

(A Ideia, 81/83, outono de 2017, p: 250 e 251)