quarta-feira, 31 de julho de 2019

Transgénicos Fora do Prato




Transgénicos Fora do Prato


No ano dois mil foi constituiu-se, em Portugal, uma Plataforma cujo objectivo principal é reunir o maior número possível de assinaturas, tanto de pessoas singulares como de colectivas, de adesão a uma moção sobre Organismos Geneticamente Modificados.

Com o texto de hoje, para além de divulgar a campanha em curso, pretendo dar a conhecer na íntegra o conteúdo da moção que abaixo se transcreve:

“A vida e saúde da nossa espécie e de todas as outras com quem partilhamos o planeta dependem de uma complexa rede de inter-relações ecológicas em grande medida desconhecidas. Qualquer intervenção que possa pôr em causa esse equilíbrio dinâmico, como a libertação no ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM), deve pois ser objecto de análise prévia detalhada e sujeita às regras da democracia participativa. A comunidade científica neste momento está longe de ter demonstrado a segurança ou sequer a necessidade dos OGM, verificando-se grande controvérsia entre pares até na definição dos limites do risco envolvido. Os transgenes não podem ser retomados uma vez libertos na Natureza, mesmo se algo correr mal, pelo que todos os cuidados pecarão sempre por defeito.

Assim, entendemos que:

- a preservação da diversidade planetária, tanto biológica como genética, é um direito inalienável das gerações futuras;

- o Princípio da Precaução tem de informar todas as decisões políticas;

- as autorizações já atribuídas pela União Europeia para circulação e cultivo comercial de OGM devem ser suspensas e posteriormente reavaliadas;

- todas as libertações experimentais devem ser adiadas até à realização de ensaios de longo prazo em laboratório, em estufa e em 'ar livre simulado' que estabeleçam o impacto ecológico potencial de cada OGM para cada tipologia edafoclimática;

- nenhuma autorização futura deverá ser atribuída a OGM que, através de polinização cruzada com variedades convencionais ou outras formas de poluição genética, ponham em risco as opções agrícolas daqueles que não pretendem cultivar OGM ou as opções alimentares dos que não pretendam consumi-los;

- deve ser financiada a investigação em termos dos eventuais impactos dos OGM na saúde, no ambiente, na economia, na sociedade, na agricultura e no terceiro mundo de modo a garantir a idoneidade dos resultados, e tal deve preceder qualquer autorização;

- tem de ser estudado o papel hegemónico que as empresas de biotecnologia estão a assumir no sistema agro- alimentar, particularmente no que concerne o direito do agricultor a guardar semente, preservação e disponibilização de sementes de variedades convencionais e tradicionais, e auto-suficiência local;

- tem de ser claramente atribuída a responsabilidade legal de risco no caso de um desastre ecológico causado por OGM;

- os genes e outros blocos da vida celular não foram inventados pelos investigadores e como tal não devem poder ser objecto de patente;

- os princípios do comércio livre devem subordinar-se aos princípios de segurança em matéria de ambiente e de saúde e não devem constituir pretexto para os desrespeitar."

Esta moção já foi subscrita por diversas personalidades ligadas ao Meio Universitário e até ao momento conta com a adesão das principais associações nacionais da área do ambiente e da agricultura biológica, com destaque para as seguintes: Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente, Campo Aberto- Associação de defesa do Ambiente, Gaia- Grupo de Acção e Intervenção Ambiental, Quercus- Associação Nacional de Conservação da Natureza, Euronatura- Centro para o Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentado, Agrobio- Associação Portuguesa de Agricultura Biológica e Biocoop- Produtos de Agricultura Biológica, C.R.L..

Por último, apela-se à adesão de todos, pois só assim será possível fazer sentir às entidades governamentais a necessidade de tomarem medidas no sentido de protegerem o ambiente e os consumidores.

(Publicado no Açoriano Oriental, 19 de Fevereiro de 2001)

terça-feira, 30 de julho de 2019

Conservação da Natureza, para quando?


Conservação da Natureza, para quando?


Preocupação muito antiga e inicialmente associada à defesa das espécies animais e vegetais ameaçadas de extinção, a conservação da natureza só terá assumido carácter organizado com o movimento dos “naturalistas”, nos Estados Unidos, por volta de 1872, ano em que foi criado o Parque Nacional de Yellowstone.
Em Portugal, o primeiro movimento organizado, a Liga para a Protecção da Natureza (LPN), só surgiu em 1948 e desde então desempenha um papel fundamental na educação e sensibilização para a conservação da natureza, sendo esta, “entendida, hoje, como a gestão da Biosfera, de modo a que o homem utilize os seus recursos de forma perene, satisfazendo as suas necessidades sem degradar o património, natural e cultural, que é uma herança que não nos pertence, porque pertence às gerações do futuro”.

Para garantir um desenvolvimento sustentado é necessário que a política de conservação abranja todo o território e seja uma componente das várias políticas sectoriais, não sendo de descurar a criação de Áreas Protegidas. Nos Açores, as primeiras Áreas Protegidas, foram criadas em 1974 e, passados 25 anos, a esmagadora maioria continua sem planos de ordenamento, nunca teve Órgaõs de Gestão. Além disso, por força do estipulado no Decreto-Lei nº 19/93, de 23 de Janeiro, todas as áreas protegidas dos Açores aguardam a sua reclassificação.

Para além do referido, a região não possui uma Estratégia Regional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade que promova a conservação das várias componentes da biodiversidade e os elementos da geologia, geomorfologia e palentologia, a utilização de modo sustentável dos recursos da biodiversidade e a partilha de forma justa dos benefícios que advém da utilização daqueles recursos. Sabendo-se que já esteve em discussão uma proposta de Estratégia Nacional de Conservação da Natureza que pretendia estabelecer linhas estratégicas para aplicação no todo nacional, gostaríamos de conhecer qual foi a participação do Governo Regional na elaboração da proposta em causa e se foi solicitada a colaboração da Universidade dos Açores.

É do conhecimento público que a Associação Ecológica Amigos dos Açores apresentou ao longo dos últimos quatro anos quatro propostas de áreas que deverão fazer parte da Rede Regional de Áreas Protegidas, a saber:

1- Zona do Pico das Camarinhas - Ponta da Ferraria, tendo em consideração diversos aspectos, designadamente históricos, geográficos, geológicos, biofísicos, paisagísticos e sócio – económicos;

2- A Caldeira Velha, um local com aspectos únicos em toda a Região, possuindo interesse múltiplo: científico, paisagístico, turístico, recreativo e cultural, sendo, além disso detentora de motivos abundantes para o ensino da Geologia, Vulcanologia, História Natural, Botânica e Zoologia, que podem ser devidamente explorados e desenvolvidos.

3- Lagoas do Congro e Nenúfares, dado o valor paisagístico, a diversidade biológica e a singularidade da geologia do local que atribuem ao mesmo uma grande importância científica, pedagógica e de lazer e um acentuado potencial turístico.

4- Gruta do Carvão, o maior tubo lávico da Ilha de S. Miguel e um dos mais importantes do arquipélago como Monumento Natural Regional.

Atendendo a que os locais referidos estão perfeitamente enquadrados nos princípios gerais da legislação que a nível nacional regulamenta a classificação das áreas protegidas, não se percebe a razão pela qual ainda nada foi feito naquele sentido.

Aceitamos que tal não seja considerado prioritário em termos do programa do Governo Regional dos Açores, o que não podemos admitir é que se abandone as nossas Áreas Protegidas com a desculpa da necessidade de investir na Rede Europeia Natura 2000 que, não temos dúvida, é um importante instrumento de conservação da natureza pois visa a gestão e a conservação in situ das espécies faunísticas e florísticas e dos habitats mais importantes na União Europeia.

Teófilo Braga

(Açoriano Oriental, 12 de Fevereiro de 2001)


Educação Ambiental e Percursos Pedestres



Educação Ambiental e Percursos Pedestres

“Os povos civilizados dependem demasiado da página impressa. Eu voltei-me para o livro do Grande Espírito, que é o conjunto da sua criação. Podeis ler uma grande parte desse livro estudando a natureza. Se tomardes todos os vossos livros e os estenderdes ao sol, deixando durante algum tempo a chuva, a neve, os insectos fazerem a sua obra, nada mais restará. Mas o Grande Espírito fornece-nos a possibilidade de estudar na universidade da natureza: as florestas, os rios, as montanhas e os animais” ( Tatanga Mani dos Stoney)

O caminho percorrido pela Educação Ambiental como procura de respostas para os problemas da biosfera teve início, em Junho de 1972, com a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, conhecida como Conferência de Estocolmo. Com efeito, a Declaração sobre o Ambiente Humano recomenda o estabelecimento de um programa internacional de Educação Ambiental e reconheceu a esta o seu papel crítico para combate à crise ambiental no mundo.

Outro marco histórico de enorme importância para o desenvolvimento da Educação Ambiental, talvez o mais decisivo, foi a Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental (Conferência de Tbilisi), que se realizou, entre 14 e 26 de Outubro, na Geórgia (Ex- URSS). A Declaração sobre Educação Ambiental, aprovada em Tbilisi, precisou a natureza da educação ambiental, definiu os seus objectivos e as suas características, assim como as estratégias para o seu desenvolvimento. O princípio geral da Educação Ambiental aprovado na Declaração de Tbilisi pode ser enunciado do seguinte modo:

Fazer compreender às pessoas e à comunidade a natureza complexa resultante dos factores físicos, biológicos, sociais, económicos e culturais, do ambiente natural e urbano e dar a estas pessoas ou comunidades a oportunidade de adquirir os conhecimentos, os valores as atitudes e as aptidões práticas que lhes permitam ajudar de uma maneira responsável e eficaz a prever e resolver os problemas ecológicos e gerir a qualidade do ambiente.
Para alcançar aquele princípio, a Educação Ambiental deverá respeitar, entre outros pontos, os seguintes:

- considerar o ambiente no seu todo (natural, social, económico, político, moral, estético, histórico-cultural);
- constituir um processo contínuo, iniciando-se ao nível do ensino pré- escolar e prosseguir através de todas a s etapas da educação formal e não- formal;
- adoptar uma abordagem eminentemente interdisciplinar orientada para a resolução de problemas locais;
- desenvolver o espírito crítico;
- procurar a autonomia e a participação dos educandos na organização da aprendizagem;

Em 1992, subscrito por 34 associações de defesa do ambiente, entre as quais os Amigos dos Açores, foi aprovado em Évora o “Contributo das Associações de Defesa do Ambiente para uma Estratégia Nacional de Educação Ambiental”. Um dos objectivos definidos naquela proposta foi o de potenciar a participação das populações locais na Educação Ambiental formal e não formal. Para a sua concretização aponta-se a criação de Centros de Iniciação ao Ambiente, bem como de Espaços Educativos de Suporte à Educação Ambiental e o estabelecimento de percursos pedestres de descoberta.

Desde 1985, data da sua fundação, os Amigos dos Açores já promoveram mais de uma centena de passeios pedestres/ visitas de estudo destinadas a adultos e a jovens em idade escolar, já editaram e reeditaram 11 roteiros de percursos pedestres, num total de cerca de 20.000 exemplares publicados, sempre com o objectivo de promover o contacto mais estreito entre o homem e a natureza, possibilitando o conhecimento das espécies animais e vegetais, da história local, da geologia, etc. Para além do referido, os percursos pedestres, não só constituem um importante instrumento pedagógico para a implementação da educação ambiental, mas também têm um papel importante na promoção do turismo e do lazer.

BIBLIOGRAFIA

CONTENTE, J., BRAGA, T. (1996). Educação para o Ambiente, polic
DIAS, G., (1992). Educação Ambiental: princípios e práticas, São Paulo, Editora Gaia, Ltda.
MELO, J., (1999). Os 500 Anos do Brasil e a Educação Ambiental, polic.
OSTOLAZA, M. (1996). Eco- Auditoria Escolar, Vitória- Gasteiz, Servicio Central de Publicaciones del Gobierno Vasco
ROCHA, P., (1999). Arte Educação Ambiental para uma Cidadania Político- Participativa, polic.
-------- (1992), Contributo das Associações de Defesa do Ambiente para a Estratégia Nacional de Educação Ambiental, Évora, Centro de Iniciação ao Ambiente- Liga para a Protecção da Natureza

Teófilo Braga, Presidente da Direcção dos Amigos dos Açores- Associação Ecológica
(Açoriano Oriental, 5 de junho de 2000)

segunda-feira, 29 de julho de 2019

Podas?


Podas?

Quase todos os anos com a aproximação da Primavera, ou mesmo em pleno Inverno, nas várias ilhas dos Açores, assiste-se a um autêntico massacre promovido pelas mais diversas entidades oficiais, sobretudo por alguns departamentos do Governo Regional dos Açores e por autarquias locais.
São as impropriamente chamadas podas radicais que são sempre justificadas em nome da segurança de pessoas e bens. Entre nós, é sobretudo nas bermas das estradas que, em nome da pretensa segurança, que deve ser garantida a todos os utilizadores, são cometidos verdadeiros abusos que consistem no corte de ramos saudáveis ou mesmo na retirada de toda a copa.
Esquecem-se, os responsáveis pelas podas que uma árvore saudável e bem escolhida para um determinado lugar não tem necessidade de ser podada, sendo mais do que suficiente a eliminação de ramos mortos e de outros que pela sua inserção são mais vulneráveis à queda.
Se é verdade que se podem fazer podas por razões de saúde das árvores, como para travar um ataque de parasitas, ou por razões estéticas, também não deixa de ser verdade que, como escreveu Emmanuel Michau: “O homem não pode ter para com um ser vivo a mesma atitude que tem face aos materiais inertes. A gestão das árvores não se deve fazer com menosprezo da sua saúde e da sua estética”.
Penso que é no mínimo uma autêntica falta de sensibilidade o decapitar árvores a torto e a direito como se tem visto em algumas das nossas estradas. Contudo, se as malfadadas podas ou mais propriamente decapitações são feitas em locais onde se deviam estar a formar jovens, como são as escolas, considero-as um verdadeiro crime, sobretudo quando os responsáveis forem os próprios professores.
Depois de tantos protestos, depois de algumas formações que se têm realizado, não é compreensível que, ano após ano, e por mais promessas que têm sido feitas de rever posições e comportamentos, se continuem a cometer os mesmos erros.
Teimosia, memória curta, ausência de bom gosto ou incompetência?
T. Braga
(Terra Nostra, nº 607, 29 de Março de 2013, p.19)

O meu contributo


O meu contributo

Desde muito jovem aprendi que é com trabalho, muito trabalho, com determinação, não virando a cara à luta por maiores que sejam as contrariedades, que quem não nasceu em berço de ouro consegue singrar na vida, sem espezinhar os seus semelhantes.
Aprendi com o exemplo de familiares meus que na sua maioria teve que emigrar para poder sobreviver com alguma dignidade porque este país não trata com equidade os seus filhos. Também, fui aprendendo, através da minha participação em diversos movimentos sociais, como o sindical, o cooperativo, o ecologista, o ambientalista e o de defesa dos direitos dos animais que os de cima nada oferecem se não forem obrigados a isso.
Face às derrotas, em maior número do que as vitórias, habituei-me a não desistir. Ao longo da vida aprendi que, a maior parte das vezes, a razão só nos é dada passadas uma ou mais décadas.
Hoje, face à situação em que o país se encontra, penso que já não há espaço para os movimentos sociais, para o protesto, para manifestações, para greves, mesmo que só de um dia, pois prejudicam a economia nacional mais do que um mau governo a desgovernar todos os dias, ou para simples petições.
Hoje, temos que nos unir todos e colaborar com os nossos governantes para salvar Portugal.
Plagiando o notável e injustamente esquecido, nos Açores, jornalista e escritor terceirense Jaime Brasil, quero afirmar publicamente que não só estou disposto a que me reduzam o vencimento como também, se preciso for, a trabalhar de graça só pelo prazer de ver os meus governantes felizes.
Além disso, como já se fala em aumento do número de horas de trabalho semanal, quero declarar que os horários existentes em Portugal são horários reduzidos, mais adequados a malandros. Assim, apesar dos meus problemas de saúde, terei todo o gosto em trabalhar no mínimo catorze ou quinze horas por dia para que a pátria, que tanto amo, não seja vista aos olhos do mundo como caloteira, embora as dívidas tenham sido feitas em meu nome sem o meu consentimento.
Espero que outros sigam o meu exemplo e que a minha colaboração seja, superiormente, aceite.
Teófilo Braga
(Terra Nostra, nº 590, 30 de Novembro de 2012, p.19)

A Comunicação Social Hoje


A Comunicação Social Hoje

Hoje, a crise que ameaça a Terra, intimamente ligada à delapidação dos seus recursos e à subjugação da humanidade aos interesses de muito poucos, é uma crise diferente de todas as anteriores, pois a ela está associada a “ameaça da extinção da própria espécie humana”.
Esta crise que é simultaneamente do ambiente, do desenvolvimento e da energia, poderia ser facilmente resolvida se, como escreveu Tolstói, os homens não andassem a correr como que perseguidos por cães, sem serem “capazes de pensar em outra coisa a não ser enganar-se mutuamente para aumentar as suas riquezas”.
No caso específico dos problemas ambientais, que são problemas sociais, a solução terá de passar por alterações comportamentais tanto a nível individual como a grande escala. A corroborar esta afirmação, o sociólogo espanhol Manuel Castells afirmou, em 2003, que a maioria dos problemas ambientais mais elementares ainda não foi resolvida porque o “seu tratamento requer uma mudança nos meios de produção e de consumo bem como da nossa organização social e das nossas vidas pessoais”.
Durante algum tempo acreditei que seria possível construir uma Terra melhor para todos os seus habitantes, através da instrução e da educação e que um dos meios imprescindíveis para tal seriam, para além das escolas, os jornais, a rádio, a televisão e mais recentemente a internet.
Se antes pensava assim, atualmente tenho muitas dúvidas acerca do possível contributo da comunicação social para a ultrapassagem da crise em que estamos atolados, pois como refere J.H., numa nota à edição portuguesa do livro de Jerry Mander “Quatro argumentos para acabar com a televisão”, aquela deveria sugerir “a ideia duma grande liberdade e duma comunicação recíproca” mas na prática apresenta um carácter unilateral, sendo “uma “voz do dono” emanando de um centro incontestado”.
A nível internacional, nacional e regional, para além de se assistir à concentração das empresas proprietárias dos mais diversos meios de comunicação, como jornais, revistas, rádios, etc., verifica-se que, pelo menos, há a tentativa de controlo daqueles por parte dos detentores do poder político ou das oposições.
Mas, no meio de toda a minha descrença há alguma, ainda que pouca, esperança: a de que os pequenos jornais regionais ou locais, como o “Terra Nostra”, continuem, imunes a pressões, a informar, sem parcialidade, e a formar os seus leitores, dando espaço às mais diversas correntes de opinião.
Teófilo Braga
(Terra Nostra, nº 563, 25 de Maio de 2012, p.21)

domingo, 28 de julho de 2019

SOS LAGOA DAS FURNAS



SOS LAGOA DAS FURNAS

A cor amarelada das águas da Lagoa das Furnas fez com que voltasse à baila a necessidade de se fazer algo para a salvar. Assim, aproveitando as potencialidades que oferece a internet e as redes sociais foi criado um evento público que é intitulado “A Lagoa das minhas Furnas está a morrer e ninguém faz nada”.
O apelo à presença de todos na Lagoa das Furnas no dia 11 de Setembro que é feito, mais com o coração do que com a razão, por parte de Miguel Bettencourt, “cidadão das Furnas” que “não é de esquerda, nem de direita”, até ao momento em que escrevo este texto, não reivindica nada, não propõe quaisquer medidas, nem aponta o dedo aos eventuais culpados pela não resolução de um problema que já foi detectado há décadas.
Tentando fazer o paralelismo com o movimento surgido há mais de duas décadas, verifico que na altura o movimento estava (ou parecia) mais organizado, pois era constituído por duas associações ambientalistas, os Amigos dos Açores e mais tarde a Quercus e por uma organização não formal o SOS LAGOAS e possuía uma forte componente “bairrista” (não uso o termo em sentido depreciativo) e emocional como se pode comprovar através da leitura deste extracto de um texto, de 1992, de José Manuel Oliveira Melo: “…que colocaram o signatário mergulhado numa dor de profunda tristeza, pelo estado da sua querida Lagoa das Furnas, que momentos antes tinha observado como sendo o maior espectáculo que a natureza privilegiou, a humanidade em especial os nascidos na sala de visita dos Açores”. Hoje, parece-nos que apenas está presente a segunda componente.
Reflectindo um pouco sobre todo o processo, creio que, ou os especialistas pensaram, pelo menos numa primeira fase, que conseguiam fazer reverter a situação com pequenas medidas na envolvente da lagoa, sem por em causa a principal ocupação dos solos, a agropecuária, ou então limitaram-se a fazer (má) política, isto é, a ajudar os governantes a empurrar o problema para o mandato seguinte.
Pico da Pedra, 5 de Setembro de 2011
Teófilo José Soares de Braga
Terra Nostra, 9 de Setembro de 2011

sábado, 27 de julho de 2019

A propósito da energia nuclear


A propósito da energia nuclear

No passado dia 11, um sismo e o tsunami a ele associado, ocorridos no Japão, fizeram voltar à ordem do dia a questão do uso da energia nuclear de fissão para fins pacíficos, isto é para a produção de electricidade.
Não faremos, neste texto, qualquer menção ao seu uso para fins militares pois pensamos ser consensual a sua condenação por parte de todos, embora exista quem se preocupe com o facto de alguns países possuírem armas nucleares e não verem qualquer inconveniente em outros as terem. Isto independentemente de se tratar de democracias ou ditaduras, pois como temos constatado, nos últimos tempos, os ditadores, enquanto não caem em desgraça, são equiparados a democratas desde que sejam “nossos” amigos.
Apresentada como solução para o nosso país fortemente dependente dos derivados do petróleo, quer para os transportes quer para a produção de electricidade, e como o melhor processo de combater o agravamento do efeito de estufa, a nível mundial, pois segundo os seus defensores seria a verdadeira alternativa aos combustíveis fósseis, a energia nuclear apresenta problemas que são escondidos pelo discurso dos tecnocratas.
Segundo aqueles, o desenvolvimento científico e tecnológico já havia feito com que os riscos associados às centras nucleares se tornassem quase nulos e mesmo assim perfeitamente controláveis. Como nos mostra o recente acidente ocorrido nas duas centrais nucleares japonesas, as referidas afirmações não correspondem à verdade nem foi apresentada, até hoje, uma solução segura para o depósito final dos resíduos nucleares.
Face ao exposto, não podemos continuar a apostar na energia nuclear de fissão, vulnerável a catástrofes naturais e a ataques terroristas, para produzir electricidade, mas sim optar por formas mais limpas e seguras, como o são as energias renováveis e, antes disso, apostar na sua utilização racional, pois a energia mais limpa é a que não se produz/consome.
Nos Açores, não podemos ficar satisfeitos e muito menos atirar “roqueiras” com o aumento que se tem verificado na produção de energia eléctrica através das fontes renováveis. É importante, também, saber se esta produção está aberta a todos os interessados ou se é beneficiado, apenas, algum grupo económico e se o aumento do consumo se traduz em melhor qualidade de vida ou em produção de riqueza.
Por último, deixamos aqui uma questão: Será que a ilha de São Miguel precisa da energia eléctrica que pretendem produzir com a queima dos resíduos sólidos urbanos? Ou, em nome do desenvolvimento sustentável, vai ser fomentada, mais do que até aqui, a irresponsabilidade e o desperdício?
Pico da Pedra, 13 de Março de 2011
Teófilo Braga

sexta-feira, 26 de julho de 2019

“Charcos com Vida” uma campanha com potencialidades


“Charcos com Vida” uma campanha com potencialidades

Com já escrevi em textos anteriores, a educação ambiental deixou de ser prioridade nos Açores, pelo menos a nível oficial, primeiro com as dificuldades criadas à participação dos professores nos encontros anuais de educação ambiental, depois com o desaparecimento destes e mais recentemente com o desmantelamento da Rede Regional de Ecotecas.
Por parte das associações de ambiente a situação não é melhor, com efeito, tendo apenas em conta as informações que nos chegam através da comunicação social ou as constantes nas suas páginas internet ou blogues, a maioria das associações tem uma actividade muito reduzida, concentrando a sua actividade na campanha SOS Cagarro, ou está mesmo inactiva. Para as mais interventivas, o grosso das actividades está relacionado com o lazer, como são os percursos pedestres organizados pelo que penso serem as maiores associações dos Açores, os Amigos dos Açores e os Montanheiros ou com a prestação e serviços.
Vem esta introdução a propósito do desaparecimento (?), pelo menos em São Miguel, da campanha “Coastwatch Europe”, que durante algum tempo envolveu algumas escolas, alguns professores, muitos alunos e um número razoável de voluntários e cujo objectivo era “alertar para os principais problemas do litoral, através da sua observação directa, nomeadamente aqueles que resultam da ocupação humana ao longo de várias gerações”, e do surgimento da campanha “Charcos com Vida”.
A Campanha “Charcos com Vida”, iniciativa do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da Universidade do Porto, unidade de Investigação e Desenvolvimento “que desenvolve investigação básica e aplicada em todas as componentes da biodiversidade: genes, espécies e ecossistemas”, pretende, através da realização de um conjunto variado de actividades, descobrir, valorizar e investigar os charcos e a sua biodiversidade.
Dadas as potencialidades da Campanha “Charcos com Vida”, tanto em termos da promoção da curiosidade científica, como pelo facto de ser um meio de implementar a educação ambiental, seria uma pena que a mesma não se estendesse a todo o território nacional, designadamente ao arquipélago dos Açores.
Assim, em virtude da campanha referida ser direccionada para todas as escolas do ensino básico e secundário e estar aberta à participação de outros interessados, como autarquias, centros de educação ambiental e associações, deixamos aqui o desafio, nomeadamente às associações escutistas e às associações de defesa do ambiente, para que adiram à mesma.
De igual modo, o desafio é extensivo a todas as Eco-escolas dos Açores. A sua participação na Campanha “Charcos com Vida”, para além de não sobrecarregar muito mais o trabalho voluntário que já é realizado pelos docentes, poderá constituir um valioso complemento às actividades já realizadas quando o tema em estudo é o da água.

Pico da Pedra, 9 de Janeiro de 2011
Teófilo Braga
(Publicado no jornal Terra Nostra, nº 493, p.22, 21 de Janeiro de 2011)

quinta-feira, 25 de julho de 2019

A propósito (ou não) de um Congresso sobre Educação


A propósito (ou não) de um Congresso sobre Educação

Na semana passada, entre os dias 18 e 20 de julho, realizou-se no Instituto de Educação da Universidade de Lisboa o 41º Congresso do Movimento da Escola Moderna (MEM), uma associação pedagógica de professores e de outros profissionais da educação com dois núcleos nos Açores, um na ilha Terceira e outro em São Miguel.

No texto de hoje, para além de algumas impressões sobre o evento, apresentarei algumas preocupações relativas ao ano escolar que se avizinha, onde pela primeira vez se vai generalizar a todas as turmas de início de ciclo novas matrizes curriculares para o ensino básico.

Relativamente ao número de participantes no congresso, é impressionante que, depois de um ano letivo de muito trabalho e cansaço, mais de quinhentos professores e educadores se disponibilizaram para estar presentes e alguns (mais de 80) para partilhar as suas práticas durante três longos dias.

Digna de registo é a idade da grande maioria dos participantes que, sendo baixa, revela que há razões para se ter esperança no futuro da educação no que diz respeito ao empenhamento e alteração de práticas nas salas de aula, onde os meios pedagógicos passem a vincular os fins democráticos da educação e o professor deixe de ser o único detentor da “verdade” e passe a ser o organizador das aprendizagens.

Outra informação que colhemos e que é preocupante é a inadmissível ingerência de alguns dirigentes de escolas sobretudo particulares e dos pais nas salas de aula, obrigando os professores a não usar estratégias inovadoras e fazendo-os a regressar às aulas expositivas. Para além disso, numa altura em que se apela à participação e à cooperação é uma aberração inqualificável alguns pais impedirem que os seus educandos ajudem colegas com mais dificuldades.

Para além do referido, o contato com alguns colegas de várias regiões do país leva-me a concluir que há um forte desejo de mudança, mas que uma das principais causas de não avançarem é o seu isolamento. Não estando o movimento implantado em muitas localidades, a solução só pode passar pelo recurso às novas tecnologias de informação e comunicação, através da criação de grupos cooperativos com membros de vários núcleos regionais ou da partilha de informações, materiais pedagógicos ou instrumentos de pilotagem.

Nas conversas mantidas com outros colegas, também, fiquei a saber que em alguns locais há quem frequente os Sábados Pedagógicos com o objetivo único de replicar ou adaptar as estratégias ou os instrumentos de pilotagem usados no MEM para uso em contextos onde se pretende apenas obter bons resultados em termos de aquisição de conhecimentos e não a formação integral dos alunos.

Embora considere que ninguém é obrigado a seguir o modelo pedagógico daquele movimento e saiba que há outros modelos e correntes pedagógicas que com toda a legitimidade possam ser seguidos pelos meus colegas, recordo o que sobre o assunto escreveu Maria Gutierrez: “Nem os instrumentos nem as técnicas têm sentido em si mesmos, pois pode-se muito bem conhecer e aplicar uma técnica e continuar a utilizá-la num contexto tradicional baseado na passividade do aluno”.

Não podendo comentar todas as sessões a que assisti, optei por fazer uma referência ao painel “Educação, sustentabilidade e economia circular” onde destaco um conjunto de informações importantes acerca dos desperdícios de recursos nas nossas sociedades e a experiência da construção de uma horta numa escola.

Não vou debruçar-me sobre o conceito de economia circular, mas parece-me que será ou poderá ser outro chavão a juntar ao de desenvolvimento sustentável usado pelos nossos políticos para continuarem a destruir o nosso planeta.

Por último, um aviso à navegação. A escola sozinha não muda a sociedade e a educação nunca é neutra. Como muito bem escreveu Paulo Freire, a atividade dos educadores “desenvolve-se ou para a libertação dos homens - a sua humanização -, ou para a sua domesticação - o domínio sobre eles”.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31885, 25 de agosto de 2019, p.16)

terça-feira, 23 de julho de 2019

A Batalha madeirense e a Revolta da Madeira


A Batalha madeirense e a Revolta da Madeira

Na ilha da Madeira, publicou-se entre 1926 e 1932 o jornal A Batalha que era propriedade das Associações de Classe: carpinteiros, pedreiros, pintores, fabricantes de calçado e manipuladores de pão, apresentando-se como órgão defensor do povo dos consumidores e das vítimas dos homens.

O ano de 1931 foi um ano negro para o regime que sucedeu à Primeira República, tendo ocorrido várias tentativas de derrubar a ditadura nacional. De entre as insurreições havidas, destacamos a Revolta da Madeira, que também se estendeu aos Açores e que durou quase um mês, de 4 de abril a 2 de maio.

Neste texto, damos a conhecer o eco da chamada Revolta da Madeira, no referido jornal “A Batalha”, salientando o facto de, ao contrário do que aconteceu nos Açores, a revolta não se ter limitado aos militares e deportados, tendo obtido amplo apoio da população madeirense, sobretudo a urbana, em virtude daquela ilha estar “mergulhada num clima pré-insurrecional a que não faltava nenhum dos ingredientes da revolução social: crise económica e social, movimento de massas, com o operariado atingido por um forte desemprego e as classes médias descontentes pelo alegado abandono a que eram votadas pela Ditadura” (Farinha, 1988, p.145).

A Revolta da Madeira possuía objetivos bastante limitados, isto é, não tinha programa político e não apresentava uma proposta de governo para substituir o que estava em exercício em Lisboa, limitando-se a restaurar “os verdadeiros princípios republicanos que nortearam o 5 de Outubro” (Farinha, 1988, p. 149).

O anarquista Mário Castelhano que havia chegado à Madeira depois de ter estado deportado nas colónias, segundo Farinha (1988) participou ativamente na Revolta da Madeira e o movimento sindical, também, tomou posição de apoio aos revoltosos, como o demonstram os textos publicados no já referido jornal “A Batalha”.

Mário Castelhano conta no seu livro Quatro Anos de Deportação que chegou à Madeira, proveniente dos Açores, onde estivera deportado, depois de ter estado em Angola, no dia 6 de abril, dois dias depois da revolta da guarnição militar.

Através da leitura do livro Mário Castelhano fica-se a saber que não só todos os partidos republicanos aderiram à revolta como também uma parte significativa da população, tendo-se realizado “manifestações grandiosas que percorreram as ruas da cidade aos vivas à liberdade e morras à tirania” (Castelhano, 1975, p.194).

A posição das organizações operárias foi bem clara de apoio aos revoltosos, como o demonstram vários artigos publicados no jornal A Batalha.

No dia 11 de abril, num texto assinado por Teófilo Rodrigues, podemos ler o seguinte: “Liberdade! Todos viram o nosso jornal dar o primeiro viva à Liberdade, no dia 4, e seremos nós quem, também, manterá a mesma opinião… Agora, mais do que nunca, ponhamos os olhos no futuro, enfrentemos a situação, pela forma mais logica possível, e lutemos porque é chegada a hora que nos fará livres para sempre, como o somos agora…”

No mesmo jornal, no dia 13 de abril, podemos ler o seguinte: “Os trabalhadores da Madeira só têm um caminho a seguir nesta excepcional emergência: unirem-se a todas as vítimas da ditadura e lutarem a seu lado, ao lado da guarnição militar que rompeu fogo contra a mesma e lutar, lutar, até vencer!”

De acordo com Mário Castelhano, a questão não se ficava pelo derrube da ditadura, pois o povo “sabia que a sua vida económica pouco viria a melhorar com a mudança de situação, mas queria pelo menos ter mais liberdade para encaminhar seus passos a destinos mais vastos” (Castelhano, 1975, p. 202).

A opinião de Mário Castelhano é corroborada por um texto publicado n´A Batalha, a 18 de abril, onde o autor depois de referir a situação dramática em que viviam os madeirenses e os demais portugueses sob a ditadura termina do seguinte modo: “Prossigamos, pois na luta atá à queda da ditadura. Depois, colaboraremos com o restante proletariado, na conquista de direitos insofismáveis, no adento de princípios sociais mais justos e equilibrados”.
No primeiro número d’A Batalha publicado após a derrota da Revolta da Madeira, no dia 9 de maio de 1931, não há qualquer referência explicita ao ocorrido, destacando-se na primeira página em letras grandes o seguinte texto:
“SERENAMENTE
A vida é uma ilusão. O egoísmo é quem predomina em todos os campos, a sua ação é violável. A maldade sua companheira acompanha a passos lentos este tributar da vida em que todos nós estamos empenhados. Ai dos homens, desde o sábio ao plebe, que por caminhos diversos querem chegar ao fim da estrada da vida sem uma mácula.
Para estes as nossas saudações. Para os que erram o nosso desprezo.”

No mesmo número do jornal, destacamos dois textos “Exortação ao Trabalhador Rural” de Neno Vasco e “O 1º de Maio do ano Cincoenta (sonho)” de Leon Kobrin.



Bibliografia

Castelhano, M. (1975). Quatro anos de deportação. Lisboa: Seara Nova

Farinha, L. (1988). O Reviralho- Revoltas Republicanas contra a Ditadura e o Estado Novo 1926-1940. Lisboa: Editorial Estampa.

Teófilo Braga
26 de janeiro de 2019
(A Batalha, VI Série, Ano XLV, nº 284-285, Mar/Jun 2019)

segunda-feira, 22 de julho de 2019

A proposta de classificar a Festa Brava, Património Imaterial da Humanidade nem é digna de ser apreciada


A proposta de classificar a Festa Brava, Património Imaterial da Humanidade nem é digna de ser apreciada

A Candidatura da denominada Festa Brava a Património Imaterial da Humanidade, alegadamente apresentada pela Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, à UNESCO, não é nada original, não terá apanhado ninguém de surpresa e peca pelo facto do anúncio público surgir associado a um evento, um congresso de ganadeiros de touros de lide, onde, ou à margem do qual, foram lançados vários apelos ao incremento do sofrimento animal, através da legalização da sorte de varas, primeiro passo para os tão ambicionados, para uns poucos, touros de morte.

A iniciativa referida não tem nada de original, pois não é mais do que a cópia do que tem sido feito, a nível mundial, pelo cada vez mais encurralado mundo da indústria tauromáquica que, actualmente, só consegue sobreviver à custa de dinheiros públicos, veja-se o apoio concedido pelo Governo Regional dos Açores e por algumas autarquias, e que pretende encontrar junto da UNESCO uma tábua de salvação.

Considerando que as touradas em nada contribuem para EDUCAR os cidadãos e cidadãs para o respeito para com os animais, para além de causarem sofrimento aos mesmos e porem em risco a vida das pessoas e dos próprios animais, não se coadunando com os valores humanistas do mundo de hoje, considero que a proposta de classificar as touradas como património imaterial da humanidade nem sequer é digna de ser apreciada.

Teófilo Soares Braga

(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 482, p. 15, 5 de Novembro de 2010)

domingo, 21 de julho de 2019

João Carlos Scholtz, o Jardim José do Canto e as plantas


João Carlos Scholtz, o Jardim José do Canto e as plantas

No passado dia 2 de julho, no âmbito de uma ação de formação do pessoal docente promovida pela Escola Secundária das Laranjeiras, depois de, numa sala da escola, ter sido abordada, pelo formador, a vida e a obra daquele vulto da sociedade micaelense, realizou-se uma visita de estudo ao Jardim José do Canto.
Antes da realização da primeira atividade que constou de um “peddy paper”, um dos participantes chamou-me a atenção para o nome da rua que fica ao lado da Escola EB1/ JI de Matriz (Anexas), o qual contradizia o que havia sido afirmado na formação. Com efeito, o formador havia dito que a construção do Jardim José do Canto havia começado em setembro de 1846 e na placa do nome da rua pode ler-se o seguinte: João Carlos Scholtz – impulsionador do Jardim José do Canto no século XVIII.
Tendo em conta que João Carlos Scholtz (1741-1823) faleceu três anos depois do nascimento de José do Canto e vinte e três anos antes daquele ter criado o seu jardim, a informação constante na placa não pode estar correta.
Podia ter ficado por aquela constatação, mas como aquele nome não me dizia nada, decidi tentar saber quem fora João Carlos Schotz e se o mesmo tinha alguma ligação a jardins ou à botânica.
João Carlos Scholtz que foi comerciante e cônsul da Rússia e da Prússia possuiu uma casa numa Quinta na Arquinha, onde era possível encontrar uma grande variedade de plantas.
Recorrendo ao livro “Quintas, Jardins e Parques da Ilha de São Miguel (1785-1885) da investigadora da Universidade dos Açores, Isabel Albergaria, fica-se a saber que a João Carlos Scholtz é atribuída a introdução do incenso (Pittoporum undulatum), espécie oriunda do sudoeste da Austrália, hoje, muito usada em sebes e que na sua quinta era possível encontrar um tulipeiro (Liriodendron tulipífera), oriundo da América do Norte, e um Laurus canariensis, “o primeiro exemplar de uma espécie erradamente popularizada na ilha como árvore da cânfora”. Para além do referido, também, existia uma magnólia e palmeiras.
Relativamente a esta última espécie a questão levantada tem razão de ser pois Laurus canarienses é o nome científico, não atual, do louro ou loureiro, não se tratando, portanto de uma canforeira.
Ainda em relação a esta última espécie referida, que em meados do século XIX atingia a altura de 30 metros e que necessitava de quatro homens para a abraçar, poderá ter havido um erro na sua classificação pelo naturalista Drouët.
Na publicação “Observações sobre a ilha de São Miguel recolhidas pela Comissão enviada à mesma ilha em agosto de 1825 e regressada em outubro do mesmo ano”, Luís Mouzinho da Silva Albuquerque e o seu ajudante Ignacio Menezes referem o seguinte:
“…A esta parte da cultura da ilha prestou importantes serviços o falecido prussiano João Carlos Scholtz, aclimatando nela diferentes árvores exóticas, propriíssimas para servirem de abrigo às laranjeiras, entre as quais se nota o Laurus camphora, que hoje é assaz comum na ilha, e cujo primeiro tronco se conserva na quinta…”
Será que estavam a referir-se à mesma árvore a que Drouët atribuiu uma classificação diferente?
A Laurus camphora que atualmente é denominada de Cinnamomum camphora é a canforeira e não sendo muito comum pode ser encontrada em alguns jardins, existindo no Jardim José do Canto alguns exemplares de um porte digno de registo.
Relativamente ao uso da canforeira, até agora não tenho qualquer referência que mencione a sua utilização em sebes. Para além do seu uso, entre nós, como planta ornamental, Alfredo da Silva Sampaio, na sua “Memória sobre a Ilha Terceira”, publicada em 1904, inclui a canforeira numa lista de plantas empregadas em construções e na marcenaria.
João Carlos Scholtz que, segundo Francisco Maria Supico, teve uma “opulenta posição comercial e correspondente representação na sociedade”, foi também um apaixonado pela botânica, tendo, de acordo com Briant Barret, numa propriedade sua existente nas Socas introduzido “…as melhores flores da Europa, árvores de boa madeira, bem como outras plantas, ainda não existentes nas outras ilhas”.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores 31879 de 18 de julho de 2019 p. 16)

terça-feira, 16 de julho de 2019

A PROPÓSITO DO DIA DO ANIMAL


A PROPÓSITO DO DIA DO ANIMAL

“É bendita a propaganda que se faça a favor dos animais; e é bendita, porque significa Bondade, porque sobretudo tende a minorar o sofrimento dos maiores amigos do homem” (Alice Moderno)
No próximo dia 4 de Outubro celebra-se o Dia Mundial do Animal que, de acordo com algumas fontes, terá sido declarado em 1929, num Congresso de Protecção Animal realizado na Áustria. A escolha do dia está relacionada com a data da morte de São Francisco de Assis, 4 de Outubro de 1226, que em sua vida amou e protegeu os animais, tendo chegado a comprar aves engaioladas apenas com o objectivo de as soltar e as ver de novo em liberdade.
Nos Açores, a comemoração do Dia do Animal tem de estar associada à homenagem a todos os que ao longo da sua vida tudo fizeram para que os animais tivessem uma vida mais digna. Entre estas pessoas, destaca-se a figura de Alice Moderno, fundadora e grande dinamizadora da SMPA- Sociedade Micaelense Protectora dos Animais.
Durante a presidência de Alice Moderno, entre 1914 e 1946, foram criadas as condições para o funcionamento da SMPA, como a aquisição de uma sede e de mobiliário e foram tomadas medidas conducentes a acabar com os maus tratos que eram alvo os animais usados no transporte de cargas diversas, nomeadamente os que transportavam beterraba para a fábrica do açúcar e para a educação dos mais novos, através do envio de uma comunicação aos professores “pedindo-lhes para que, mensalmente, façam uma prelecção aos seus alunos, incutindo no espírito dos mesmos a bondade para com os animais, que não é mais do que um coeficiente da bondade universal”.
Outra das preocupações de Alice Moderno foi a criação de um posto veterinário para tratamento de todos os animais o que se veio a concretizar dois anos após a sua morte.
Hoje, praticamente ultrapassados os problemas com os animais de tiro, há situações que continuam a merecer a nossa atenção, como a tentativa de incrementar as touradas onde não são tradicionais, a pretensão de legalizar as touradas picadas e os touros de morte e o abandono de animais de companhia.
Para tentar acabar ou pelo menos minimizar o problema e por não ser aceitável a política seguida actualmente para combater o abandono, que tem por principal pilar os abates dos animais que entram nos canis e que não conseguem ser adoptados, propomos que a nível regional, seja lançada uma campanha de esterilização com vista a adequar o número de animais de companhia ao dos donos responsáveis. Esta campanha, tal como é defendido a nível nacional, deverá assentar em três pontos:
1.Esterilização obrigatória de todos os animais que os canis municipais dão em adopção;
2. Celebração de protocolos entre as Câmaras Municipais e as associações de protecção animal com vista à esterilização dos animais abandonados que estas recolhem;
3. Esterilização gratuita dos animais para as famílias com dificuldades económicas, por parte das Câmaras Municipais.

Pico da Pedra, 26 de Setembro de 2010

Teófilo Braga

(Publicado no jornal Terra Nostra, nº 477, 1 de Outubro de 2010)

segunda-feira, 15 de julho de 2019

Deseducar para incinerar o futuro


DESEDUCAR PARA INCINERAR O FUTURO

A questão da gestão dos resíduos sólidos urbanos nunca foi devidamente tratada na Região Autónoma dos Açores. Com efeito, não se percebe (ou percebe-se?) que numa região constituída por nove ilhas, com um território limitado, nunca se tenha apostado no primeiro R- reduzir, tendo-se ficado e digamos, mal, pelo segundo R- o reciclar, sabendo-se que por aqui parece não ser viável a instalação de qualquer instalação industrial para o efeito.
Ainda no que se refere ao arremedo de sistema de recolha selectiva de resíduos, levou pelo menos duas décadas a ser implementado, depois de serem lançados os primeiros alertas, e nunca foi generalizado a todos os concelhos e a todas as ilhas. Ainda hoje, recebemos denúncias da mistura dos resíduos por parte dos serviços de recolha e não há dia em que não encontramos vazadouros ilegais.
Mais recentemente, voltou à baila a solução milagrosa, a incineração, que irá de uma vez por todas acabar com os resíduos, esquecendo-se que nenhum processo de tratamento tem capacidade para reduzi-los a zero ou enviá-los todos para o espaço, através das chaminés.
Outro argumento usado é o da produção de energia. Trata-se de mais uma cenoura que é posta à frente do burro, mas que não funciona. Com efeito, uma análise detalhada do ciclo de actividade revela que as incineradoras gastam mais energia do que produzem. Isto é, com a reciclagem dos materiais queimados poupar-se-ia mais energia do que a que é libertada pela queima dos mesmos.
Mas, o que mais nos repugna são as atoardas, para não dizer outras coisas, que têm vindo a público nos últimos dias. Vejamos algumas:
- Em vez de se dizer que a incineração é uma tecnologia que está sujeita a controvérsia científica ou compará-la com outras e explicar a opção por ela, diz-se que a mesma é melhor do que um aterro (tolice, aterros sempre existirão, mesmo com incineradora, a não ser que se exporte para a Lua o que ficará após a queima) ou afirma-se que ela polui menos que uma noite de fogo-de-artifício, será que se está a falar em poluição luminosa? Ou que polui menos que uma central geotérmica, será que com esta afirmação pretende-se fechar uma das que está em funcionamento em São Miguel?
- Outra afirmação que ouvimos, é de que é muito mais fácil falar mal da incineração do que defendê-la. Puro engano, com efeito de entre as respostas que tenho ouvido para a não tomada de posição contra, as mais comuns são o trabalhar numa autarquia ou num organismo governamental. Tenho a certeza de que se a presidência da AMISM fosse de um autarca PSD e se o Governo continuasse a opor-se à incineração muitas mais vozes se fariam ouvir a defender uma solução “amiga” do ambiente.
Por último, relativamente ao estudo de impacto ambiental, que diz-se já estar em curso, já podemos divulgar a conclusão: não haverá qualquer problema para a saúde e para o ambiente.
Siga a procissão!
Teófilo Braga
29 de Junho de 2010

(Publicado no jornal “Terra Nostra”, nº 464, 2 de Julho de 2010, p.23)

sexta-feira, 12 de julho de 2019

quinta-feira, 11 de julho de 2019

A Campanha SOS- Cagarro e os Ambientalistas de Alcatifa



A Campanha SOS- Cagarro e os Ambientalistas de Alcatifa

Em Novembro de 1993, coordenada pelos Amigos dos Açores, teve inicio a campanha "A Escola e o Cagarro", no âmbito da qual foi aplicado um inquérito, sobre a espécie, destinado a alunos das escolas, nomeadamente do 1º e 2º ciclos do ensino básico, e distribuídos 10 mil folhetos.
Foi esta iniciativa, que teve como principal mentor o Eng. Luís Monteiro, do Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores, que deu origem à actual campanha “SOS- Cagarro”. Esta tem como objectivo principal salvar o maior número possível de cagarros, a ave marinha mais abundante dos Açores, cujo número se encontra em regressão a nível mundial.
Não sendo o cagarro propriedade de ninguém, das entidades oficiais espera-se, apenas, a disponibilização de informação e meios ao cada vez maior número de voluntários que todas as noites, nos meses de Outubro e de Novembro, se disponibilizam para participar nas brigadas que se têm constituído para a recolha de cagarros e sua posterior devolução ao mar.
Para além dos voluntários já referidos, é de louvar o papel de algumas associações ou grupos informais, como os Amigos dos Açores e os Amigos do Calhau, de São Miguel, e o CADEP, de Santa Maria, que têm coordenado o trabalho voluntário e promovido a defesa daquela espécie sobretudo no Grupo Oriental dos Açores.
De igual modo, embora não seja de estranhar, as mais de trinta associações reconhecidas como tal pela Assembleia Legislativa Regional dos Açores mantêm um silêncio absoluto sobre o assunto e têm-se abstido de qualquer participação activa nesta campanha.
Embora respeitemos a pluralidade do denominado movimento ambientalista, não compreendemos a sua descoordenação e muito menos a tentativa periódica, de alguns, de criar estruturas que têm apenas como o objectivo de lá se colocarem com vista a tornarem-se visíveis para posteriores voos.
A obsessão em serem representantes de outros em comissões ou nos variados conselhos consultivos e a fobia em trabalharem no terreno, junto das populações, onde estão localizados os problemas ambientais, que mais não são do que problemas sociais, faz com que eles pertençam a uma tipologia especial: a dos ambientalistas de alcatifa.
T.Braga
(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 429, p.20, 30 de outubro de 2009)

quarta-feira, 10 de julho de 2019

CINCO PELO AMBIENTE



CINCO PELO AMBIENTE

No nosso país muitas são as pessoas que lutam por um melhor ambiente, por uma Terra onde todos possam viver com melhor qualidade de vida.

Embora ache que é coletivamente que podemos intervir na sociedade, considero que não são de desprezar atitudes e comportamentos individuais pelo que, no texto de hoje, darei a conhecer um pouco cinco personalidades que pelo seu pioneirismo muito deram e alguns continuam a dar em defesa do nosso planeta.

Afonso Cautela (1933-2018), nascido em Ferreira do Alentejo, foi o fundador da primeira organização ecologista portuguesa o MEP-Movimento Ecológico Português, em junho de 1974.

Com ideias próprias, inspirando- se em pensadores como “Ivan Illich, Michel Bosquet, Emanuel Mounier, Paulo Freire, Hélder Câmara e outros … profetas da Sociedade Pós- Industrial”, Afonso Cautela foi professor do primeiro ciclo e jornalista, tendo sido autor de vários livros e brochuras de que destaco as seguintes: “Contributo à Revolução Ecológica”, “Manifesto Ecológico Contra a Inflação e o Custo de Vida: Ecomania ou Ecologia?”, “Luta Ecológica e Luta de Classes”, “Essa Ecologia de que Somos Cobaia”, “Viva a Doença Abaixo a Medicina” e “Ecologia e Informação: Como os jornalistas nos lavam o cérebro”.

Afonso Cautela foi também um poeta distinto, tendo publicado entre outras o livro “Lama e Alvorada” cujo primeiro volume foi editado em 2017.

Gonçalo Ribeiro Teles (1922-), o mais conhecido de todos, é engenheiro agrónomo, arquiteto paisagista e ambientalista, tendo tido uma atividade política digna de registo. Com efeito depois de combater o Estado Novo chegou a ser Ministro de Estado e da Qualidade de Vida, depois do 25 de abril de 1974.

A criação, entre outras, da Reserva Agrícola Nacional e da Reserva Ecológica Nacional bem como os projetos de vários jardins urbanos, de que destacamos o da Fundação Calouste Gulbenkian e o Amália Rodrigues a ele se devem.

Os seus livros, “Para Além da Revolução”, de 1985, e “A Árvore em Portugal”, publicado em 1999, são de leitura obrigatória para quem quiser conhecer o seu pensamento.

Jacinto Rodrigues (1939-) esteve exilado em vários países europeus durante o Estado Novo para onde fugiu 12 anos antes do 25 de abril de 1974. Tendo por formação base a filosofia, em França licenciou-se em Sociologia e fez o mestrado em Urbanismo. Foi professor na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto.

É autor de uma vasta bibliografia científica e de intervenção social. De entre os livros publicados destaco "A Conspiração Solar do Padre Himalaya", sobre a vida e obra de um dos mais visionários cientistas portugueses, o Padre Manuel António Gomes que foi considerado, pelo Dr. José Crespo, como sendo um misto de Júlio Verno e de Edison.

José Carlos Costa Marques (1945-) nasceu no Porto. Foi professor, tradutor e assistente editorial. Neste momento é pequeno editor e presidente da direção da associação de defesa do ambiente Campo Aberto.

Um dos pioneiros do ecologismo português, José Calos Marques, mantém uma intervenção no movimento de defesa do ambiente desde 1974.

Poeta de mérito reconhecido, é autor do livro “Flor de um dia”, onde é reunida a sua poesia inédita e a alguma publicada.

Nuno Gomes de Oliveira (1956-) é biólogo e ambientalista, fundador do NEPVS- Núcleo de Estudos e Proteção da Vida Selvagem, organização fundada em agosto de 1974. Foi, também, fundador do Parque Biológico da Gaia

Teófilo Braga

(Correio dos Açores 31873 de 11 de julho de 2019, p. 16)

GRUTA DO CARVÃO- UMA PROMESSA QUE URGE CUMPRIR



GRUTA DO CARVÃO- UMA PROMESSA QUE URGE CUMPRIR

Ao pobre não prometas…

Na primeira metade da década de oitenta do século passado, incentivado pelo Dr. George Hayes e com a sua imprescindível companhia e de outros amigos e familiares, iniciámos a exploração de grutas vulcânicas da ilha de São Miguel, entre elas a Gruta do Carvão.
Após aquela data e quase até hoje, temos investido muito do nosso tempo naquela cavidade vulcânica, através do seu estudo, da inventariação da sua riqueza em termos de estruturas, no acompanhamento de dezenas de visitas de estudo com alunos de diversas escolas, na elaboração de uma proposta de classificação da mesma como área protegida, em trabalhos de limpeza de que resultaram a retirada de algumas toneladas de lixos e entulhos, etc.
Em ofícios recebidos pela Associação Amigos dos Açores, da qual fomos presidente da direcção, o então Secretário Regional da Habitação e Equipamentos, Dr. José Contente, comunicou que, após a construção do abrigo de acesso situado na “Variante à ER 1-1ª em Ponta Delgada, Trecho Nó de São Gonçalo - Aeroporto” entregaria a posse útil do mesmo à Associação Amigos dos Açores.
Ainda na qualidade de presidente da direcção dos Amigos dos Açores efectuamos diligências, junto da Vice-Presidência do Governo Regional dos Açores, com a concordância da Senhora Secretária Regional do Ambiente, Dr.ª Ana Paula Marques, com vista a que aquela promessa fosse cumprida.
Já não tendo quaisquer funções de direcção nos Amigos dos Açores, tomei conhecimento que contrariando o que anteriormente estava acordado a actual tutela do ambiente não pretende cumprir o anteriormente prometido.
Hoje, desencantado com quem gere a coisa pública e com a chamada sociedade civil que está apática perante as injustiças e não participa, como seria seu dever, quer na denúncia de todas as irregularidades e mesmo ilegalidades, quer na construção de alternativas, pouco me resta senão continuar a exigir publicamente que o uso do abrigo de acesso da Gruta do Carvão seja cedido aos Amigos dos Açores.
Teófilo Braga
(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 418, p.23, 21 de agosto de 2009)

terça-feira, 9 de julho de 2019

BEM-ESTAR ANIMAL



BEM-ESTAR ANIMAL

“A grandeza de uma nação e o seu progresso moral podem ser medidos pelo modo como os seus animais são tratados”(Gandhi)
A nossa recente participação num movimento cívico de oposição à introdução da sorte de varas e nos movimentos de contestação às anteriores tentativas, bem como a colaboração na campanha anual em prol do salvamento de cagarros e na recolha e tratamento, pontuais, de outros animais selvagens, leva-nos a chegar à conclusão de que a sociedade açoriana evoluiu no que diz respeito à preocupação com o bem-estar animal.
Hoje, cada vez mais encontramos pessoas, dos mais diversos estratos sociais, que participam na campanha SOS- Cagarro e que recolhem milhafres, mochos e outras espécies e se preocupam com a sua recuperação e devolução à natureza. Na campanha referida, anteriormente, confirmamos que, sobretudo na ilha Terceira, as pessoas que gostam das touradas à corda têm um respeito para com o touro, sendo muito sensíveis ao modo como aquele é tratado, não admitindo os maus tratos que os animais sofrem noutro tipo de actividades tauromáquicas e pugnando pela introdução de melhorias nos regulamentos daquelas de modo a garantir um melhor tratamento dos touros e a diminuição dos riscos para as pessoas.
Face ao querer e sentir dos açorianos, a ALRA- Assembleia Legislativa Regional tem que criar um corpo legislativo que promova o bem-estar animal, fomente a cidadania e tenha por base os princípios constantes da Declaração Universal dos Direitos dos Animais, proclamada pela Unesco em 27 de Janeiro de 1978. A propugnar o referido, recentemente, a Associação dos Amigos dos Animais da Ilha Terceira remeteu à ALRA uma petição com 2121 assinaturas de habitantes daquela ilha.
De igual modo, os Municípios açorianos deverão aprovar e implementar regulamentos concelhios que promovam o bem-estar animal, adoptem princípios de precaução contra actos que inflijam sofrimento aos animais e incentivem o voluntariado e a cooperação com as associações zoófilas existentes ou que se venham a constituir.
Estando em ano de eleições autárquicas, e sabendo que vários municípios têm problemas nomeadamente com animais de companhia abandonados, desafiamos todos os candidatos a apresentarem publicamente o que pensam fazer para promover, nos seus concelhos, o bem-estar animal.
TB
(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 406, p.23, 22 de maio de 2009)

segunda-feira, 8 de julho de 2019

Política e touradas



Política e touradas

A recente campanha contra a introdução da sorte de varas e de touradas de morte nos Açores, iniciativa do Blogue Terra Livre/CAES - Colectivo Açoriano de Ecologia Social e que contou, até ao momento, com a adesão de duas das principais associações açorianas, a Associação de Amigos dos Animais da Ilha Terceira e os Amigos dos Açores - Associação Ecológica, e do CADEP, de Santa Maria, tem constituído, para nós, uma surpresa. Surpresa pelo facto de ser um tema que tem unido pessoas de diferentes orientações politico - partidárias e de diferentes organizações de várias ilhas dos Açores, tanto junto dos defensores do bem- estar animal como dos partidários da introdução das práticas bárbaras e não tradicionais que são as touradas picadas e os touros de morte.
Quer através dos depoimentos recebidos por correio electrónico que dos que têm sido publicados na comunicação social constata-se que curiosamente são os terceirenses os que mais veementemente se opõem ao desrespeito da tradição e à introdução de práticas mais bárbaras, havendo alguns que inclusive se opõem a todo o tipo de touradas.
Contra as corridas picadas também se manifestam os aficionados e amantes da corrida à portuguesa que afirmam que a sorte de varas é o prazer de meia dúzia de pseudo - aficionados.
Curiosa, ou talvez não, é a união de alguns conservadores da ala direita e da ala esquerda do espectro político que, por minguarem-lhes os argumentos, consideram que a campanha é obra dos imperialistas micaelenses que querem acabar com a cultura do povo da Terceira.
Embora não sejamos adeptos de qualquer tipo de tourada, achamos que as touradas à corda valem pelo convívio que proporcionam enquanto consideramos imoral a venda, como espectáculo, da tortura infligida ao touro que são as touradas de praça. Assim, achamos que, não só pelos animais, mas também, pelo risco de vida que correm os próprios homens deveriam ser repensadas as primeiras e abolidas as segundas. Felizmente, nesta luta não estamos sós. Basta lermos João Ilhéu que fala na evolução que sofreram as touradas à corda ao longo dos tempos e outro ilustre, mas pouco conhecido, terceirense que foi o libertário Adriano Botelho que afirmou: ”fazem-se por outro lado, reclames entusiastas de espectáculos, como as touradas de praça onde por simples prazer se martirizam animais e onde os jorros de sangue quente, os urros de raiva e dor e os estertores da agonia só podem servir para perverter cada vez mais aqueles que se deleitam como aparato dessa luta bruta e violenta, sem qualquer razão que a justifique”.
A recente investida foi precedida da tentativa de “exportar” para outras ilhas touradas à corda, de que são exemplo algumas touradas realizadas em São Miguel, lideradas por Joaquim Pires e João Ponte.
Em abono da verdade, ambas as investidas, têm em comum o facto de tentar impor o que nem é tradição e tentar expandir um negócio que não estará a correr bem ou que se insere na lógica capitalista de crescer a todo o custo, desrespeitando animais e pessoas.
O silêncio dos deputados, sobretudo os do chamado arco governamental, é sintomático de que nos Açores poderemos assistir em breve a um “retrocesso civilizacional” se não continuarmos a campanha de sensibilização para a necessidade de promover uma educação, cultura e legislação que garantam os direitos dos animais.
Vamos desertar do medo e reforçar a luta pela alteração do modelo actual de produção e consumo que é responsável pela violação dos direitos humanos e ambientais da maior parte da humanidade, sendo também responsável pelo sofrimento infligido aos animais.

Teófilo Braga


(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 398, p.7, 27 de março de 2009)

domingo, 7 de julho de 2019

A Propósito do Programa Eco-escolas e da Educação Ambiental


A Propósito do Programa Eco-escolas e da Educação Ambiental

No passado dia 10 de Janeiro, vários órgãos de comunicação social noticiavam o facto do projecto Eco-escolas atingir nos Açores a maior taxa de implementação do programa em Portugal e uma das mais elevadas na União Europeia.
Para nós, não só este projecto bem como a educação ambiental que se faz nos Açores mereciam uma reflexão aprofundada da parte de todos os interessados, professores e educadores, associações de defesa do ambiente e da tutela da área do ambiente, nos Açores.
Por falta de disponibilidade de tempo e de espaço, a seguir, apenas apresentamos algumas notas soltas.
1-A projecção do Eco-escolas, nos Açores, resulta sobretudo do trabalho voluntário de alguns professores e educadores que tem contado, nos últimos anos, com o apoio e incentivo de alguns directores das ecotecas;
2-O apoio que os professores têm tido da tutela do ambiente contrasta com as dificuldades que têm sido levantadas pela Secretaria Regional da Educação. A prova disto, são os entraves que ao longo dos anos têm sido colocados à participação dos professores nas formações anuais, quer nos Encontros Regionais de Educação Ambiental quer nos Encontros das Eco-escolas, de tal modo que alguns se têm realizado aos fins-de-semana.
3-Em algumas escolas o projecto não é assumido pelos Conselhos Executivos, não passando de uma actividade marginal desenvolvida por um ou dois professores e envolvendo apenas uma ou outra turma;
4-O galardão “Bandeira Verde” está banalizado, já que é atribuído a “qualquer” escola que faça uma ou duas actividades e que apresente um relatório final. Quanto a nós, para que tal acontecesse seria necessário que houvesse um envolvimento significativo na escola e que alguns parâmetros do seu desempenho fossem alterados, como redução do consumo de energia, de papel ou de água, limpeza dos espaços interiores e exteriores, etc. A título de exemplo, no final do ano passado estava a passar junto a um estabelecimento de ensino de Ponta Delgada que tinha hasteada a Bandeira Verde e cujos jardins exteriores pareciam um matagal. Uma situação destas nunca deveria ocorrer.
5-Em relação à Educação Ambiental, desde o início existiu algum voluntarismo na sua implementação, mas nunca houve uma reflexão séria sobre o que se pretende com ela, e nunca se pensou na criação e implementação de uma Estratégia Regional de Educação Ambiental.
O único documento que conhecemos, é um “Plano Estratégico” publicado no boletim Ecológico, nº 10, de Setembro/Outubro de 1999, assinado por Eduarda Goulart (1), que não foi suficientemente divulgado e nunca foi alvo de qualquer discussão pública.
6-A própria Rede Regional de Ecotecas tem sido criada sem estar sujeita a um plano devidamente pensado que tenha em conta as necessidades das populações-alvo. Vejamos dois exemplos:
a. Depois de anunciada a sua abertura para o primeiro trimestre de 1998 (ver “Ecológico nº1, Fev/Mar de 1998), a primeira Ecoteca que estava prevista para Santa Maria, acabou por ser implantada no Pico em 1999. Razões para esta alteração são desconhecidas.

b. Nunca houve qualquer explicação ou justificação aceitável para a instalação da Ecoteca da Lagoa. Com efeito, o concelho da Lagoa, pela sua dimensão, pelo número de crianças em idade escolar, pela sua proximidade a Ponta Delgada não deveria ser uma prioridade. Pelo contrário, já existindo o Centro de Interpretação do Priôlo no Nordeste fazia todo o sentido que a terceira ecoteca em São Miguel, depois da da Ribeira Grande e da de Ponta Delgada, ficasse instalada em Vila Franca do Campo ou na Povoação.

(1) Na altura, Directora Regional do Ambiente e ex-presidente da ONGA, com sede no Faial, “Azórica”

Teófilo Braga

(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 390, p.23, 30 de janeiro de 2009)

sábado, 6 de julho de 2019

"Se queres conhecer o vilão, põe-lhe uma vara na mão!"


"Se queres conhecer o vilão, põe-lhe uma vara na mão!"

Em texto anterior escrevi que só concebo uma associação de defesa do ambiente que tenha por base a participação voluntária dos seus associados. Sou visceralmente contra qualquer profissionalização das associações, o que não quer dizer que estas não possam ter um ou dois profissionais ao seu serviço, desde que aquelas tenham receitas próprias suficientes para o seu pagamento. Contudo uma condição, também, defendo: os profissionais não podem ter qualquer poder de decisão, isto é, não poderão fazer parte dos órgãos sociais e apenas pontualmente poderão representar a associação.

Mas, para poder funcionar na base do voluntariado é condição necessária que os associados que se disponibilizem para desempenhar qualquer cargo ou implementar determinada acção o façam. Caso contrário, todo trabalho recairá sobre as costas de um grupo reduzido, levando ao cansaço que poderá, no limite, levar ao abandono. Além disso, o simples adiar de compromissos poderá comprometer a actividade toda a associação.

Não entendo as associações como espaço para demonstrações de poder pessoal, qualquer que seja a sua fonte, nem teatro para a imposição de preconceitos ou ideologias de cada um, antes pelo contrário devem ser espaços de participação colectiva, de partilha de conhecimentos, de entreajuda e de colaboração com vista à “construção de um mundo mais justo, limpo e pacífico”.

Por último, as associações não podem, em caso algum, transformar-se em organizações trampolim, isto é servirem para alguns indivíduos ganharem visibilidade social para guindarem-se a cargos ao serviço do estado ou das empresas, esquecendo-se, muito rapidamente, dos “ideais” que defendiam. Se têm dúvidas olhem à sua volta e vejam, quantos membros de associações formais ou informais se envolveram em causas ambientais e que ao ocuparem determinados cargos pouco ou nada fizeram para que nos Açores tenhamos um melhor ambiente e uma melhor qualidade de vida.

(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 366, 15 de agosto de 2008, p. 27)

Que modelo Organizacional para as ONGA?


Que modelo Organizacional para as ONGA?

Não entendo que a participação das ONGAS- Organizações Não Governamentais de Ambiente deva ser feita segundo a visão e para servir os interesses de quem a permite ou a solicita. Quando tal acontece estamos perante uma simples tentativa de “oxigenação dos sistemas democráticos institucionais”. Pelo contrário, partilho a opinião de Ángel Collado que, num estudo publicado em 2007, defende que a participação deve ser uma fonte de auto-desenvolvimento humano, isto é de educação em valores cívicos, restabelecimento de coordenadas sociais mais próximas e comunitárias, como alternativa política a uma mundialização capitalista.

Qualquer associação que se preze deverá ter sempre presente que embora o capitalismo esteja, pela sua irracionalidade, condenado não é fatal que seja vencido, como advogam algumas correntes políticas. Pelo contrário, o seu triunfo significará a delapidação de todos os recursos do Planeta e a subjugação da humanidade aos interesses de muito poucos.

É por esta razão que o movimento ecológico ou é anti-capitalista, construindo com a sua reflexão e acção uma autêntica sustentabilidade, ou não passará de um “compagnon de route” dos governos neo-liberais, contribuindo com a sua intervenção para a “sustentação” do capital.

Para poderem contribuir para a implementação de uma verdadeira democracia a nível global é imprescindível que a democracia seja praticada na sua vida interna. Assim, para uma pequena organização entendo que o melhor modelo organizacional seja o deliberativo participativo, isto é, todos os membros participam nas decisões e o consenso é procurado.

Era este o modelo (deliberativo participativo) implícito nos Estatutos dos Amigos dos Açores, mas que foi posto em causa com o crescimento do número de associados, com a muito fraca participação dos mesmos nas assembleias-gerais, já que a maioria entendia (entende) a associação como mera prestadora de serviços.

Teófilo Braga

(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 361, 11 de julho de 2008)

sexta-feira, 5 de julho de 2019

A PROPÓSITO DO CONSELHO REGIONAL DO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (CRADS AÇORES)



A PROPÓSITO DO CONSELHO REGIONAL DO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (CRADS AÇORES)

É interessante ler, no Fórum Açores 2003, o que está escrito sobre este órgão: “Uma acção credível e consequente na área do Ambiente tem que ser participada. Assim, é essencial que os órgãos de que fazem parte as organizações de cidadãos sejam informados e ouvidos”.
Não é nada que já não tenha afirmado, por várias vezes, nomeadamente junto dos que acham que os Amigos dos Açores devem estar presentes em todos os órgãos, comissões, grupos de trabalho, reuniões, propostos pelas autoridades regionais ou outras.
A 12 de Dezembro de 2005, os Amigos dos Açores, em ofício dirigido à Secretária Regional do Ambiente e do Mar, depois de afirmarem que “o CRADS tem, até ao momento presente, reunido apenas uma vez por ano, e visto circunscrita a sua actividade apenas a essa sessão, funcionando sobretudo como um órgão de divulgação da Secretaria junto das entidades representadas” propuseram que na próxima reunião daquele órgão fosse discutido o seu funcionamento, eficácia e missão. A proposta terá caído em saco roto e a associação não foi capaz de insistir na sua discussão.
Segundo a proposta do Fórum Açores 2013, o CRADS Açores deveria ter como principais funções:
• Aconselhar as instâncias governamentais (assistindo-as na elaboração das estratégias de desenvolvimento sustentável e publicando relatórios sobre determinadas politicas).
• Acompanhar e controlar os progressos na aplicação das estratégias de desenvolvimento sustentável ou na consecução de objectivos específicos, e chamar a atenção para as lacunas.
• Promover o diálogo e a consulta da sociedade civil (associando representantes da sociedade civil aos seus trabalhos enquanto membros dos conselhos, e encorajando o dialogo entre eles, e entre eles e o Governo).
• Comunicar sobre o desenvolvimento sustentável (organizando eventos públicos e publicando informações sobre o desenvolvimento sustentável em linha com meios de comunicação social).
Como está previsto no documento referido, têm que ser dadas ao CRADS AÇORES outras condições de funcionamento, nomeadamente de independência face ao governo e financeiras. Aos representantes das várias instituições será exigida uma intervenção mais cuidadosa e exigente.
Pouco interesse terá a participação das associações no CRADS se este servir apenas objectivos pré-definidos pelas políticas governamentais como tem acontecido até aqui, o que não é de estranhar dado que, entre nós, quer pelas autoridades regionais quer pela própria comunidade (dita) científica ou técnica, muitas vezes são pouco considerados os contributos dados pela sociedade.
Por último, uma das falhas das associações, entre as quais os Amigos dos Açores, está na ausência de reflexão sobre a sua actividade. Não defendo que haja um pensamento único, pelo contrário devemos expor as nossas ideias, colaborar na implementação de projectos e acções que sejam consensuais já que acredito que é sempre mais o que nos une do que o que nos divide. Mas, a troco de nada (de um assento neste ou naquele órgão, de uma maior proximidade com as entidades regionais, etc.) devemos deixar de sugerir, colaborar, criticar ou denunciar, não esquecendo nunca que “só o peixe morto nada a favor da corrente”.

Teófilo Braga
(publicado no jornal Terra Nostra, nº 355, 30 de Maio de 2008)


Ilhas Oceânicas (II)


Ilhas Oceânicas (II)

São oito os processos promotores de alterações nos ecossistemas açorianos, a saber:

Estrutura e Propriedade das Terras Agrícolas – o facto da maioria dos terrenos agrícolas ser organizada em unidades de pequena dimensão leva que a estrutura da propriedade dos Açores apresente um baixo impacte directo na biodiversidade;

Alterações do Uso do Solo – O processo de adaptação dos povoadores às ilhas levou a que estas deixassem de estar cobertas por densas florestas de Laurissilva, passando a existir, hoje, quatro grandes tipos de novos sistemas ecológicos: pastagens semi-naturais; pastagens intensivas permanentes ou semi-permanentes de média-baixa altitude; povoamentos florestais de exóticas, de criptomérias e eucaliptos., matos mistos (bosques introduzidos) e pomares, vinhedos ou incultos de baixa altitude. As alterações do uso do solo, em termos de alteração dos ecossistemas, têm um nível de importância elevada.

Erupções vulcânicas – que têm uma importância reduzida, não só provocaram alterações do uso do solo, mas também originaram novos habitats, nas ilhas.

Turismo – tem, ainda, uma importância reduzida, embora em São Miguel já se possam observar impactos em termos do consumo de energia e aumento de resíduos sólidos. Nesta ilha, que tem assistido ao aumento do número de turistas, observa-se uma tendência para um turismo de massas, enquanto nas ilhas do grupo Central observa-se uma tendência de crescimento mais sustentável e baseada num turismo (sazonal) de natureza.

Espécies Invasoras - A introdução de espécies exóticas, tem criado nos Açores problemas ecológicos sérios. Como exemplos de situações graves, destacaríamos a invasão da Zona de Protecção Especial (ZPE) do Pico da Vara pela espécie endémica da ilha da Madeira Clectra arbórea ou da ilha das Flores, pela hortênsia e do Pico e S. Miguel, pelo incenso. No que respeita a animais exóticos invasores salienta-se o caso dos ratos e da térmita (Cryptotermes brevis) que muito provavelmente será, por muitos anos, a praga urbana mais grave nos Açores.

Crescimento Económico – embora se tenha notado, depois do 25 de Abril de 1974, com a autonomia política e com a adesão do país à União Europeia, um crescimento económico nos Açores, verifica-se que o ritmo não é o mesmo em todas as ilhas, havendo uma clara distinção entre, sobretudo, São Miguel, mas também Terceira e Faial e as restantes, que se desenvolveram menos. Em termos globais, o crescimento económico que está igualmente associado a alterações do uso do solo históricas e actuais, apresenta uma importância média, sendo elevada em ilhas como o Corvo e a Graciosa, onde a área disponível é limitada.

Distribuição da População Humana - Ao nível do arquipélago a importância da distribuição da população Humana em termos de impacto é baixa. Contudo, como as zonas residenciais estão localizadas geralmente num anel junto à costa, verificam-se alguns impactes nestas, com poluição de arribas e pressão em termos de construção de casas de veraneio em zonas com clima privilegiado.

Legislação Ambiental e Atitudes – o rico património dos Açores foi sendo legalmente protegido, através de vários tipos de legislação. Salienta-se a que cria a Rede Natura 2000 e a que está em revisão relativa às áreas protegidas dos Açores.
Em termos de atitudes ambientais, destaca-se um conjunto de actividades na área da Educação Ambiental, promovidas sobretudo pelo Governo Regional (Ecotecas), pela Universidade dos Açores e por Associações de Defesa do Ambiente. Este factor é de importância alta.
Política e Mercado Agrícola Comum – Embora se desconheça qualquer estudo sobre o impacto ambiental da Política Agrícola Comum, uma coisa é certa, esta provocou alterações na pecuária e na agricultura. No início terá havido uma tendência para a intensificação das pastagens e modernização dos processos através de medidas estruturais (e.g. cursos de formação em empresários agrícola aos agricultores), com impactos reduzidos em ilhas como Pico, Flores e Santa Maria. A aplicação, recente, das políticas Agro-Ambientais, que nos Açores promovem a extensificação da agropecuária, tiveram um sucesso relativo. Nos últimos anos, apesar da subsistência das culturas do chá, da beterraba e da batata, a implementação das culturas forrageiras tem penalizado outras culturas, como as hortícolas.

Nota - este texto é a segunda parte de uma síntese de um capítulo do relatório “Portugal Millenium Ecosystem Assessment”, elaborado por um grupo de investigadores do Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores, liderado pelo Prof. Doutor Paulo Borges.

Teófilo Braga

(Publicado no Jornal Terra Nostra, nº 350, p. 30, 25 de Abril de 2008)