segunda-feira, 31 de agosto de 2020

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Santos Barros para além da poesia

 


Santos Barros para além da poesia

 

José Henrique Santos Barros (1946-1983) foi um poeta açoriano, natural de Angra do Heroísmo, que não cheguei a conhecer, pois só cheguei à Terceira para exercer a minha profissão de professor em outubro de 1980 e o mesmo já havia sido forçado a sair da sua terra em 1975.

 

A propósito da sua saída dos Açores, primeiro para Lisboa e depois para Grândola, António Brandão Moniz, num texto intitulado “Santos Barros: poeta da minoria”, publicado na revista “A Ideia”, nº 30 e 31 de outubro de 1983, escreveu: “sofreu a guerra colonial, o miopismo político e extremista do separatismo e o «cortejo de misérias que são inerentes às do intelectual cada vez mais mecanizável mesmo quando simula o contrário»”.

 

Estava ainda a trabalhar na Escola Secundária de Angra do Heroísmo quando tomei conhecimento do seu falecimento em Espanha vítima, tal como sua mulher Ivone Chinita, de um acidente de viação, no dia 20 de maio de 1983.

 

Sobre a sua vida profissional e a sua atividade política pouco tem sido escrito. Num texto de João de Melo publicado na Enciclopédia Açoriana apenas se fica a saber que, depois de concluir o ensino secundário, foi funcionário público e que “animou cooperativas, sindicatos, rádios e jornais”.

 

Militante do MES – Movimento da Esquerda Socialista, José Henrique Santos Barros esteve presente no primeiro comício nacional daquele partido realizado, a 21 de agosto de 1974, no Clube Atlético de Campo de Ourique, onde falou dos problemas do povo açoriano.

 

De acordo com uma curta notícia publicada no Diário Insular de 25 de agosto de 1974, Santos Barros, depois de enumerar as múltiplas facetas de exploração de que têm sido vítimas, salientou que os açorianos foram uma das maiores reservas da guerra colonial” e defendeu “o fim imediato da concessão de bases aos Estados Unidos, França e NATO, frisando a propósito: “A burguesia tem influenciado no povo a ideia de que as Lajes estão ali para nosso bem e para “defesa do mundo”, para afastar o que chamam “perigo comunista…”

 

No chamado PREC esteve ligado ao jornal “O Trabalhador” que se publicou em Angra do Heroísmo em 1974 e 1975. Aquele órgão de informação “do povo para o povo” pretendeu ser “um jornal de trabalhadores açorianos ao serviço da sua libertação, pois que só os trabalhadores libertarão os trabalhadores”.

 

Tal como as sedes do PCP, do MDP/CDE e do MES, no dia 17 de agosto de 1975, a sede do jornal “O Trabalhador” foi assaltada por “lavradores” que destruíram todo o seu recheio e atiraram para a rua (Rua de São João) mobiliário, documentação e arquivos. No mesmo dia, em reunião de “lavradores” foi exigida a transferência dos padres, ligados àquele jornal, Avelino Soares, Olegário Paz, Manuel António e António Moniz “por estarem a fomentar o ódio no seio da comunidade católica desta terra”.

 

A leitura da revista “Memória da água-viva” de que foi diretor mostra-nos um Santos Barros interessado em conhecer a história dos Açores para a partir dela tirar lições para o presente.

 

No número zero da revista, de março de 1978, da responsabilidade de Santos Barros há a divulgação de uma carta do Capitão-General das ilhas dos Açores e Barão da Vila da Praia ao Bispo de Angra, D. Fr, Manuel de Almeida, onde se nota uma semelhança entre as atitudes da igreja em épocas diferentes, a da revolução liberal e da “revolução” dos cravos.

 

Outro texto de Santos Barros que merece ser lido intitula-se “As ideias autonomistas nos Açores segundo Faria e Maia”.  Antes de se se referir à obra mencionada, Santos Barros considera que “levantada ao sabor dos ventos políticos, usada como estratégia de pressão ou integrada abstratamente nas campanhas eleitorais , a autonomia breve descambou em separatismo…”e acrescenta que “o uso e abuso autonómico, reduzido ao simplismo da sua ambiguidade… não tem permitido a apreensão do fenómeno, o seu correto equacionamento em termos históricos e políticos”

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32217, 26 de agosto de 2020, p.9)

terça-feira, 25 de agosto de 2020

O que visitar em Vila Franca do Campo?

 


O que visitar em Vila Franca do Campo?

 

Pediu-me o Correio dos Açores um texto sobre as principais referências do meu concelho de nascimento, Vila Franca do Campo, a serem visitadas. Dada o meu envolvimento na defesa do ambiente e a minha formação na área ambiental, limitarei o meu texto a aspetos relacionados com a componente natural do ambiente, nomeadamente lagoas, praias, passeios pedestres e jardins.

 

No concelho de Vila Franca do Campo, embora existam outras pequenas lagoas ou lagoeiros, merecem ser visitadas as seguintes: Lagoa do Fogo, Lagoa do Congro e Lagoa do Areeiro.

 

Para a visita à Lagoa do Fogo, que faz parte da Reserva Natural da Lagoa do Fogo, local onde se podem ver alguns exemplares da flora primitiva dos Açores, recomendo a utilização do trilho que tem início na localidade da Praia de Água d’Alto. Nesta localidade recomendo a visita à Central Hidroelétrica da Praia que está musealizada e a realização do percurso pedestre Fábricas da Luz, onde poderão observar o que resta das primeiras centrais hidroelétricas construídas em São Miguel.

 

Nos terrenos adjacentes à Lagoa do Congro cujo espelho de água possui cerca de 0,1 km2 de área, é possível encontramos o que resta da mata ajardinada mandada plantar pelo agricultor, bibliófilo, botânico e paisagista José do Canto com algumas espécies que ele primeiro aclimatou no seu jardim em Ponta Delgada, com destaque para o til, planta endémica dos arquipélagos da Madeira e das Canárias.

 

Para quem já está na Lagoa do Congro aconselha-se uma visita à, infelizmente bastante degradada, Lagoa dos Nenúfares que está muito próxima e à pequena e aprazível Lagoa do Areeiro, situada a noroeste daquelas duas, localizada no interior da cratera do cone vulcânico denominado Pico da Dona Guiomar que não fica muito distante do Monte Escuro.

 

A partir do Monte Escuro, aconselha-se um passeio pedestre até ao Pico da Vela que fica sobranceiro à Lagoa do Fogo. A partir deste pico e ao longo do trilho, tanto Vila Franca do Campo como a Lagoa do Fogo apresentam-se aos nossos olhos com outra fisionomia.

 

No litoral do Concelho de Vila Franca do Campo existem vários locais de fácil acesso onde, sobretudo fora da época balnear é possível, para além de desfrutar do sossego, observar paisagens revitalizantes e contatar com algumas espécies da flora característica das baixas altitudes como a urze, o visgo, o bermim, a erva-leiteira, a diabelha e o bracel, outrora usado pelos caiadores para fazer os pincéis.

 

Como zonas balneares, algumas não “oficiais”, no concelho existem mais de 2,3 km de praias de areia fina que, tal como toda a costa, devem ser mantidas em boas condições de salubridade, evitando a presença de resíduos e impedindo que cheguem ao mar águas residuais não tratadas. Aqui vão, de Oeste para Este, os nomes das praias: Prainha de Água d’Alto, Praia de Água d´Alto, Praia da Pedreira e Praia do Degredo, Praia do Corpo Santo, Praia da Vinha da Areia, Praia da Leopoldina, Calhau da Areia e Praia da Amora.

 

Os apaixonados pelas plantas e por flores não podem perder uma visita aos dois maiores jardins existentes no concelho, o Jardim Dr. António da Silva Cabral, na freguesia de São Pedro, e o Jardim Antero de Quental, na freguesia de São Miguel, que estão a precisar de uma atualização e substituição das placas de identificação das plantas.

 

Com plantas de quase todo o mundo, no Jardim Dr. António da Silva Cabral destaco a presença das seguintes espécies: eucalipto-limão, tulipeiro-arbóreo, cordilina e dragoeiro e no Jardim Antero de Quental merecem uma observação as magnólias, a árvore-do-fogo, a melaleuca, o carvalho-doce e a nolina.

 

Uma visita a Vila Franca do Campo, ficaria incompleta sem uma ida ao mais formoso ilhéu que há nas ilhas, no dizer do cronista Gaspar Frutuoso, e sem ver o panorama que se desfruta a partir do miradouro de Nossa Senhora da Paz.

 

Teófilo Braga

 

(Concelhos especial Correio dos Açores, 32216, 25 de agosto de 2020, p. 15)

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

O Dr. Botelho e a medicina para todos

 

O Dr. Botelho e a medicina para todos

 

Ao longo da sua vida de médico o Dr. José Pereira Botelho no exercício da sua profissão esteve ao serviço de todos, quer fossem pobres, quer fossem ricos, tendo discriminado positivamente quem não podia pagar.

 

O Dr. José Pereira Botelho, ao chegar a São Miguel, depois de concluir o curso em Paris, em 1840, e de ter obtido o diploma de aprovação na “Eschola Médico-Cirúrgica de Lisboa”, no mesmo ano, ao fim de pouco tempo, no dizer do Dr. António Augusto Riley da Mota, alcançou “a melhor clientela da Cidade”. Segundo a mesma fonte, “era o médico da moda, fresco de Paris!” que possuía “clientes que o adoravam. Daqui e de fora da Ilha!”.

 

Entre os seus pacientes de São Miguel, O Dr. Riley da Mota, cita os seguintes: “morgado Barbosa, Ve. de Faria e Maia, Barão de Nossa Senhora da Oliveira, Dr. Caetano de Andrade Albuquerque, António do Canto Brum, etc.”. Dos de fora da ilha o mesmo autor destaca os seguintes: “Francisco Gomes de Amorim, o conhecido biógrafo de Garrett, que viera experimentar (aliás sem resultado) as águas termais das Furnas; António Augusto Coelho de Magalhães, irmão de José Estevam; Conselheiro F.J. da Costa Lobo, par do reino, do contracto do tabaco; Visconde da Luz, etc..”

 

O poeta Gomes de Amorim que, depois de ter estado nas Furnas, foi acolhido pelo dr. Botelho em sua casa, onde foi muito bem tratado, sobre o Dr. Botelho escreveu o seguinte: “…um médico, ilustre pelo saber e grande pelo coração, que pratica a virtude com simplicidade antiga e que professa a medicina por amor do género humano” e acrescentou: “aquele bom doutor…dá aos pobres metade do que recebe dos ricos”. O dr. Riley da Mota, acrescenta que “para o fim da vida, mas ainda muito válido, não exercia clínica, mas atendia os velhos amigos e os pobres, de graça.”

 

Francisco Maria Supico, no Almanaque para 1886, escreveu uma pequena biografia do Dr. Botelho onde corrobora o acima escrito nos seguintes termos:

“A pobreza escrevia-lhe o nome com lágrimas de gratidão. Era para ela mais do que médico cuidadoso e desvelado: era seu protetor assíduo e sempre generoso. Onde a miséria punha a ausência de todo o conforto, punha a Providência, personalizada no sr. Dr. Botelho, os sorrisos do conchego, as alvoradas da esperança e as alegrias da saúde restabelecida.

 

E quando para isso lhe não bastavam os recursos próprios, esmolava-os por tal arte, que sempre lhe ficavam cativos os corações daqueles que associava a esta santa missão de bem-fazer.”

 

O Dr. Botelho foi médico municipal, tendo estado envolvido no combate a epidemias em várias localidades, tendo inclusive se oferecido para tratar os doentes.

 

Não foram apenas as pessoas ou as famílias desfavorecidas que beneficiaram dos seus préstimos, as instituições beneficentes também puderam contar com ele. Assim, a título de exemplo, em 1856/7, registo a sua dedicação às crianças do Asilo da Infância Desvalida, instituição que atacadas durante muito tempo por uma “moléstia cutânea” foram socorridas gratuitamente pelo Dr. Botelho.

 

Ao Asilo da Infância Desvalida, que estiveram associados, entre outros José do Canto e sua irmã Maria Teresa do Canto, o Dr. Botelho também dedicou parte do seu tempo, pois foi membro da sua direção, na companhia de Eusébio Poças Falcão, Ernesto do Canto, Vicente Borges de Sousa e César Augusto Ferreira Cabido (padre).

 

Apesar de ter um currículo exemplar, as tricas partidárias de então, que parece serem como as de hoje, impediram com que, em 1846, a sua candidatura a médico na Estação de Saúde do Porto de Ponta Delgada fosse aceite. Sobre o assunto, Francisco Maria Supico escreveu o seguinte:

 

“O ilustre médico não foi despachado. Costa Cabral reassumira o poder como chefe do governo, e proposto o proponente não lhe mereciam confiança política.

O pundonoroso e abalizado médico nunca mais requereu nem exerceu cargo público remunerado.”

 

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32211, 19 de agosto de 2020, p.8)

quarta-feira, 12 de agosto de 2020

Em defesa das plantas exige-se mais ação e formação

 

Em defesa das plantas exige-se mais ação e formação

 

No passado nês de julho visitámos vários espaços verdes, nomeadamente os dois jardins de Vila Franca do Campo e várias ruas de Ponta Delgada, bem como, nesta cidade, o Parque Urbano, os Jardins Antero de Quental, Padre Sena Freitas e António Borges.

 

Nas visitas, impressionou-nos a riqueza em termos de número de espécies diferentes existentes não só nos jardins públicos, mas também nos pequenos jardins localizados em frente a algumas moradias.

 

Durante estas visitas, fomos interpelados por alguns transeuntes e por moradores que nos faziam várias questões e apresentavam algumas queixas.

 

No que diz respeito às queixas, na sua maioria estavam relacionadas com a afixação de uma numeração com pregos nos plátanos da Avenida Gaspar Frutuoso ou as podas exageradas na rua Antero de Quental, devido à escolha desadequada das espécies para o espaço disponível.

 

Um morador queixou-se do corte do tronco das plantas pelas roçadoras que terá levado à morte de muitas delas, situação que também observamos no Jardim Antero de Quental e no Parque Urbano. Segundo uma contagem que ele fez num ano foram mais de 20 o número de árvores que morreram, o que poderia ter sido evitado se à volta delas fosse feita uma caldeira e se não fosse esquecida a formação a quem faz os trabalhos de manutenção dos vários espaços.

 

Mas se houve quem se mostrou preocupado com o desrespeito pelas plantas e que manifestou curiosidade por saber que espécies estavam nas suas casas, também houve um caso em que uma pessoa se mostrou muito indignada por termos tirado uma fotografia a um arbusto.

 

Mesmo depois da explicação de que a fotografia, tirada da rua, era apenas da planta, não nos interessando o resto, a pessoa em questão não arredava pé, dizendo que a planta era dela e que não queria que tirassem fotografias ao que lhe pertencia. Primeiro ainda pensámos que poderia ser por uma questão de privacidade, mas sabendo que imagens de todas as casas estão escarrapachadas na internet (no Google Street View) com o desenrolar da conversa chegámos à conclusão de que o que estava em questão não era a privacidade, mas sim o ódio a todos os que em regime de voluntariado se dedicam a uma causa, pois ouvimos o seguinte: “são os defensores da ecologia, têm a mania que são os donos do mundo”.

 

No que diz respeito aos nossos políticos, infelizmente não temos razões para estarmos satisfeitos. Com efeito, não utilizam a autonomia que a Região tem para criar e aplicar legislação que proteja as plantas e quando o fizerem será a reboque do que é feito a nível nacional.

 

Oito anos depois de ter sido aprovada, a nível nacional, legislação que protege todos os exemplares e conjuntos arbóreos que pelo seu porte, raridade ou história carecem de cuidados redobrados de conservação e depois de ter sido recebida, em 2019, positivamente, pela ALRA, uma petição nesse sentido, até hoje, nada terá sido feito

 

Por último, enquanto por cá estão entretidos com outros assuntos ou preocupados em saber se continuarão nas listas de candidatos a deputados, no passado dia 3 de julho, a Assembleia da República recomendou ao governo a criação de uma estratégia nacional para o fomento do arvoredo urbano que tenha como fim “a preservação e alargamento de corredores e espaços verdes, articulados com as infraestruturas verdes e as estruturas ecológicas urbanas e não urbanas, em alinhamento com estratégias e planos de conservação e preservação, na prossecução de metas e objetivos ambientais.”

 

A Assembleia da República recomendou ainda que na referida estratégia, seja integrado “um manual de boas práticas na gestão do arvoredo em meio urbano, contendo regras adequadas aos objetivos a prosseguir” que inclua “Requisitos funcionais, operacionais, ambientais e paisagísticos para as intervenções de plantio, poda, limpeza e manutenção, abate e transplante de árvores em meio urbano e nos espaços públicos “ e “informação sobre espécies autóctones mais adaptadas a cada espaço urbano.”

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32205, 12 de agosto de 2020, p.14)

domingo, 9 de agosto de 2020

Jornal Estrela Oriental

 Colaborei com uma rubrica intitulada "Plantas usadas na medicina popular"


terça-feira, 4 de agosto de 2020

EM LOUVOR DOS VILA-FRANQUENSES AMIGOS DAS PLANTAS




EM LOUVOR DOS VILA-FRANQUENSES AMIGOS DAS PLANTAS

Desde o povoamento das nossas ilhas foram muitos aqueles que contribuíram para a conservação da flora nativa dos Açores, para o enriquecimento da diversidade florística do arquipélago e para a criação e manutenção dos seus jardins.

Hoje, recordarei, por ordem alfabética, os vila-franquenses que de algum modo tiveram um papel de destaque na defesa e conservação do nosso património natural e cultural, não só na sua terra natal, Vila Franca do Campo, mas em toda a Região.

O regente florestal António Emiliano Costa (1920-2003) foi o primeiro Administrador Florestal em Santa Maria e um grande impulsionador dos Serviços Florestais naquela ilha. Publicou em dois números do Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores uma listagem de “árvores notáveis de S. Miguel”. A escolha teve em conta facto de serem uma “parte importante do nosso património florestal e também pela beleza, majestade, importância ou singularidade, além do interesse turístico que merecem”

O trabalho pioneiro de António Emiliano Costa terá sido utilizado, como ele sugeriu, para a classificação de algumas árvores como de interesse público e terá servido de inspiração aos promotores da petição “Pela classificação de árvores notáveis nos Açores” que foi entregue, o ano passado, na Assembleia Legislativa Regional dos Açores.

O padre Manuel Ernesto Ferreira (1880-1943), que lecionou no Instituto de Vila Franca, foi um dos pioneiros na defesa da “flora indígena” dos Açores. Com efeito, em 1903, na revista “A Phenix” sugeriu a criação de “viveiros” ou a existência de coleções de plantas açorianas em jardins já existentes.

Como pedagogo estava avançado para o seu tempo, isto é, percebia que era possível ensinar fora das salas de aula, como se pode constatar através do texto, abaixo, do seu aluno António Emiliano Costa:

“Esse meu saudoso e querido professor dava-nos as suas lições, normalmente cursos de verão, à sombra dum sicómoro (Melia azedarach L.), lindo exemplar que ainda hoje existe a nascente da casa onde residiu. Nós, os alunos, geralmente dos cursos liceais, gozando a frescura e serenidade do local, recebíamos os ensinamentos do inglês ou francês, da biologia ou da química, sem esforço, sem temeridade, em alegre, mas sempre elevado colóquio.”

Foi, também, um opositor às podas mal efetuadas, manifestando o seu sofrimento aos seus alunos. Sobre o assunto, António Emiliano Costa, escreveu o seguinte:

“Ainda me lembro muito bem da revolta sofrida no seu Íntimo, pois a sua correção não lhe permitia grandes exteriorizações, quando da poda exagerada feita a dois bonitos exemplares de Tilia argentea D., existentes no pequeno jardim público que lhe ficava fronteiriço e das conjeturas feitas no momento sobre a incompatibilidade na poda sobre esta espécie. Note-se: daqueles dois bonitos exemplares, de copa tão redonda, só um escapou à inutilização sofrida e o outro ficou sempre um espécimen desequilibrado.”

Sebastião do Canto e Castro (1827-1905), criou na rua Eng.º Artur do Canto Resendes um jardim que foi muito elogiado por quem o visitou e que enriqueceu sobretudo com aquisições de plantas que fazia à Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense.

Sobre ele e o seu jardim, o jornalista Emygdio da Silva escreveu o seguinte:

“Dotado de uma verbosidade e de uma vivacidade que desafiam a brancura dos seus cabelos, tem pelas flores uma paixão louca e dentro do seu jardim, as nossas pernas fraquejavam ao fim de uma hora, tal foi a desordenada correria em que ali andámos para poder acompanhar o amável floricultor… Dava senhoria às begónias, às glicineas e aos caládios, excelência às palmeiras, às musas e às bambuseas, alteza às iucas, aos pandanos e às banksias e reserva o tratamento de majestade para os seus magníficos fetos”.

Por último, Simplício Gago da Câmara (1808-1888), que esteve na Austrália para explorar jazigos de ouro, de lá trouxe plantas e sementes de, entre outras espécies, eucaliptos, acácias e araucárias. Dos viveiros localizados no seu prédio do Convento, oferecia, às centenas ou aos milhares, plantas e ele próprio plantava em matas em São Brás e na Fajã do Calhau. 

Teófilo Braga
(Correio dos Açores,32199, 5 de agosto de 2020, p.14)

Quem ganha e quem perde com as touradas?





Quem ganha e quem perde com as touradas?

Ao longo dos tempos, na ilha Terceira e não só, houve sempre gente que se insurgiu contra a realização de touradas e quem, não as condenando por completo, considerasse que as mesmas se realizavam em número excessivo.

Um texto publicado no dia 31 de agosto de 1974, no jornal de Angra do Heroísmo, “O Trabalhador” aborda a questão, denunciando quem beneficiava com as touradas e quem eram os principais prejudicados com as mesmas.

Com base no texto referido e fazendo algumas atualizações, abaixo abordamos o assunto.

Quem mais ganha(va) com as touradas à corda?

- Os ganadeiros (donos dos touros);
- Os donos das fábricas de refrigerantes e salgadinhos;
- Os que têm quantidades de vinhos em depósito para venda [Hoje, os vendedores de cerveja, vinda do exterior da Região];
- Os donos da Empresa de Viação Terceirense [Hoje, os donos dos Postos de Combustíveis]

Quem mais perde com as touradas?

A maioria da população com menos recursos (mais pobres), através do dinheiro:
- Gasto no aluguer dos touros;
- Utilizado na compra dos bilhetes das camionetas [Hoje na compra dos combustíveis];
- Usado na compra das bebidas, salgadinhos, etc.

Para além do referido, o jornal denunciava e com toda a razão que quem mais beneficiava com as touradas (os mais ricos) ainda tinham o descaramento de condenar as populações mais desfavorecidas com comentários como os seguintes:

“Malandros não querem fazer nada, só querem é toiros”
“Para isto (touradas) o Povo tem sempre dinheiro”

Hoje, para além das perdas diretas com as touradas, que não criam riqueza nenhuma, apenas transferem dinheiro diretamente de uns ( os que menos têm) para os outros ( os que mais têm), perdem todos os açorianos, pois há verbas dos Serviços de Saúde que são usadas no transporte e  tratamento de feridos,  há dinheiros vindos da Comunidade Europeia que são usados para apoiar a criação de touros usados nas touradas, há subsídios das autarquias para os ganadeiros e há apoios governamentais para as ganadarias que podiam ser usados para fins úteis à sociedade.

José Sousa (MCATA)
Julho de 2020
(Jornal-Eco, nº 2, julho de 2020)

O que se passa no Ilhéu de Vila Franca do Campo?

O que se passa no Ilhéu de Vila Franca do Campo? No passado dia 27 de junho, o Jornal “Açoriano Oriental” noticiou que o Ilhéu de Vila Franca do Campo se encontrava encerrado ao público em virtude da contaminação das águas por “micro-organismos prejudiciais à saúde pública”. De acordo com o delegado de saúde “os riscos para a saúde pública prendem-se, por exemplo, com doenças dermatológicas e gastroenterites.” A contaminação das águas do Ilhéu tem ocorrido por diversas vezes e até agora desconhecemos a justificação para tal. Nas redes sociais há quem levante a hipótese de ser devido à presença de aves marinhas, como o cagarro, à presença humana durante a época balnear ou a falhas no emissário submarino. Esta última hipótese parece ser a mais convincente, mas é importante que se esclareça, de uma vez por todas, as causas do ocorrido e se as águas lançadas ao mar pelo emissário submarino são prévia e devidamente tratadas. O mar não pode ser o tapete onde se esconde o “lixo” que não é devidamente tratado em terra. Vila Franca do campo, 29 de junho de 2020 Manuel Soares (O Jornal-Eco, nº 2, julho de 2020