quarta-feira, 19 de agosto de 2020

O Dr. Botelho e a medicina para todos

 

O Dr. Botelho e a medicina para todos

 

Ao longo da sua vida de médico o Dr. José Pereira Botelho no exercício da sua profissão esteve ao serviço de todos, quer fossem pobres, quer fossem ricos, tendo discriminado positivamente quem não podia pagar.

 

O Dr. José Pereira Botelho, ao chegar a São Miguel, depois de concluir o curso em Paris, em 1840, e de ter obtido o diploma de aprovação na “Eschola Médico-Cirúrgica de Lisboa”, no mesmo ano, ao fim de pouco tempo, no dizer do Dr. António Augusto Riley da Mota, alcançou “a melhor clientela da Cidade”. Segundo a mesma fonte, “era o médico da moda, fresco de Paris!” que possuía “clientes que o adoravam. Daqui e de fora da Ilha!”.

 

Entre os seus pacientes de São Miguel, O Dr. Riley da Mota, cita os seguintes: “morgado Barbosa, Ve. de Faria e Maia, Barão de Nossa Senhora da Oliveira, Dr. Caetano de Andrade Albuquerque, António do Canto Brum, etc.”. Dos de fora da ilha o mesmo autor destaca os seguintes: “Francisco Gomes de Amorim, o conhecido biógrafo de Garrett, que viera experimentar (aliás sem resultado) as águas termais das Furnas; António Augusto Coelho de Magalhães, irmão de José Estevam; Conselheiro F.J. da Costa Lobo, par do reino, do contracto do tabaco; Visconde da Luz, etc..”

 

O poeta Gomes de Amorim que, depois de ter estado nas Furnas, foi acolhido pelo dr. Botelho em sua casa, onde foi muito bem tratado, sobre o Dr. Botelho escreveu o seguinte: “…um médico, ilustre pelo saber e grande pelo coração, que pratica a virtude com simplicidade antiga e que professa a medicina por amor do género humano” e acrescentou: “aquele bom doutor…dá aos pobres metade do que recebe dos ricos”. O dr. Riley da Mota, acrescenta que “para o fim da vida, mas ainda muito válido, não exercia clínica, mas atendia os velhos amigos e os pobres, de graça.”

 

Francisco Maria Supico, no Almanaque para 1886, escreveu uma pequena biografia do Dr. Botelho onde corrobora o acima escrito nos seguintes termos:

“A pobreza escrevia-lhe o nome com lágrimas de gratidão. Era para ela mais do que médico cuidadoso e desvelado: era seu protetor assíduo e sempre generoso. Onde a miséria punha a ausência de todo o conforto, punha a Providência, personalizada no sr. Dr. Botelho, os sorrisos do conchego, as alvoradas da esperança e as alegrias da saúde restabelecida.

 

E quando para isso lhe não bastavam os recursos próprios, esmolava-os por tal arte, que sempre lhe ficavam cativos os corações daqueles que associava a esta santa missão de bem-fazer.”

 

O Dr. Botelho foi médico municipal, tendo estado envolvido no combate a epidemias em várias localidades, tendo inclusive se oferecido para tratar os doentes.

 

Não foram apenas as pessoas ou as famílias desfavorecidas que beneficiaram dos seus préstimos, as instituições beneficentes também puderam contar com ele. Assim, a título de exemplo, em 1856/7, registo a sua dedicação às crianças do Asilo da Infância Desvalida, instituição que atacadas durante muito tempo por uma “moléstia cutânea” foram socorridas gratuitamente pelo Dr. Botelho.

 

Ao Asilo da Infância Desvalida, que estiveram associados, entre outros José do Canto e sua irmã Maria Teresa do Canto, o Dr. Botelho também dedicou parte do seu tempo, pois foi membro da sua direção, na companhia de Eusébio Poças Falcão, Ernesto do Canto, Vicente Borges de Sousa e César Augusto Ferreira Cabido (padre).

 

Apesar de ter um currículo exemplar, as tricas partidárias de então, que parece serem como as de hoje, impediram com que, em 1846, a sua candidatura a médico na Estação de Saúde do Porto de Ponta Delgada fosse aceite. Sobre o assunto, Francisco Maria Supico escreveu o seguinte:

 

“O ilustre médico não foi despachado. Costa Cabral reassumira o poder como chefe do governo, e proposto o proponente não lhe mereciam confiança política.

O pundonoroso e abalizado médico nunca mais requereu nem exerceu cargo público remunerado.”

 

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32211, 19 de agosto de 2020, p.8)

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