sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

A Sumaúma-bastarda, uma cruel invasora

A Sumaúma-bastarda, uma cruel invasora

A sumaúma-bastarda (Araujia sericifera Brot.) também conhecida por seda, pepino-de-seda, planta-cruel, etc., é uma planta trepadora, pertencente à família Apocynaceae,, que pode atingir 6 metros, originária da América do Sul.

A sumaúma-bastarda foi descrita por Félix de Avelar Botero (1744-1828), lente de Botânica e Agricultura na Universidade de Coimbra. O nome genérico Araujia, foi dado em homenagem ao botânico amador António de Araújo e Azevedo, o 1º conde da Barca, e o “apelido” específico sericifera está relacionado com os filamentos sedosos que rodeiam as sementes.

Não se sabe, é sempre difícil conhecer, quando e quem introduziu a sumaúma-bastarda nos Açores. Sabe-se que chegou à Europa no século XIX como ornamental e têxtil, para aproveitamento da fibra do fruto, e que a espécie já estava presente, em 1856, no Jardim José do Canto, em Ponta Delgada.

Em 1966, no seu “Catálogo das Plantas Vasculares dos Açores”, Ruy Telles Palhinha considerava a sumaúma-bastarda subespontânea em São Miguel e na Terceira. Hoje, a espécie pode ser encontrada em todas as ilhas dos Açores, exceto em São Jorge e no Corvo.

De acordo com informação colhida no livro “Flora Terrestre dos Açores”, de Virgílio Vieira, Mónica Moura e Luís Silva, a sumaúma-bastarda que é utilizada como ornamental escapou-se da cultura e tornou-se uma espécie invasora, sendo “frequente em arribas, matos de Morella e Pittosporum, sebes, terrenos abandonados, muros nas margens de matas e beiras de estradas; geralmente até 300 m de altitude.”

Embora se desconheça qualquer uso da planta na medicina popular e na alimentação nos Açores, a sumaúma-bastarda possui propriedades medicinais, sendo muito usada pelos nativos das regiões de onde é originária. As folhas, os frutos e sobretudo as sementes são também usadas na alimentação humana.

As folhas da sumaúma-bastarda constituem uma alternativa às da planta-da-seda (Gomphocarpus physocarpus E. Mey.) como fonte de alimento para as lagartas das borboletas monarca.

Pico da Pedra, 30 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

(Membro do Núcleo Regional dos Açores da IRIS-Associação Nacional de Ambiente)

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Onde residiu Alice Moderno em Ponta Delgada?

Onde residiu Alice Moderno em Ponta Delgada?

Desconhecemos onde morou Alice Moderno quando vivia com os pais em Ponta Delgada. Sabe-se que, em 1883, o pai possuía o consultório na Rua do Colégio, nº 65 (atual rua Carvalho Araújo). Não sabemos se o consultório se localizava no mesmo edifício da moradia.

Foto1- Rua do Colégio, 65 (porta da direita)
Em 1887, quando a família foi viver para a Achada do Nordeste, Alice Moderno fica, em Ponta Delgada, em casa da Dona Rosa Emília de Sequeira Morais, localizada na Rua dos Mercadores, nº 21, 2º andar.

Foto 2- Rua dos Mercadores, nº 19 (o nº 21 não existe atualmente, a porta a meio tem o número 19)

Em princípios de 1893, Alice Moderno já se encontrava a viver no número 69 da Rua dos Mercadores, em casa da senhora Maria Augusta de Morais.

Foto 3- Rua dos Mercadores, 69 (porta à direita)

Ainda no ano de 1893, Alice Moderno começa a viver em casa de D. Maria Emília Borges de Medeiros, na Rua da Fonte Velha, nº 36 (atual Rua Manuel da Ponte). Viveu nesta casa, cujo usufruto vitalício lhe fora legado por aquela senhora, até ao fim da sua vida em 1946.

Foto 4- Rua Manuel da Ponte, 36 (porta ao centro debaixo da placa)

Todas as imagens estarão corretas se não foram, ao longo do tempo, alterados os números de polícia.

Fonte: Vilhena. M. (1987). Alice Moderno: A mulher e a obra. Angra do Heroísmo. Direção Regional dos Assuntos Culturais-Secretaria Regional de Educação e Cultura

Pico da Pedra, 21 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

sábado, 17 de dezembro de 2022

Uma palmeira-da-geleia, uma brassaia e algumas mélias no Pico da Pedra


Uma palmeira-da-geleia, uma brassaia e algumas mélias no Pico da Pedra

Ao contrário dos textos anteriores em que fiz menção a plantas existentes em ruas do Pico da Pedra ou em espaços públicos, hoje faço referência a três plantas existentes em espaços privados, mas visíveis para todos os transeuntes que passem na Rua Fernando Dias Martins Carreiro, na Avenida da Paz e na Rua da Saudade.

Na Rua Fernando Dias Martins Carreiro podem ser vistas duas palmeiras-da-geleia (Butia capitata).

A palmeira da-geleia é uma planta da família Arecaceae, originária do Brasil, Uruguai e Argentina que floresce geralmente nos meses de maio a agosto.

A palmeira-da-geleia, que normalmente possui uma altura com 3 a 5 m, é uma bonita planta ornamental que produz uns frutos comestíveis, chamados coquinhos, ricos em vitaminas A e C, que podem ser utilizados para o fabrico de sumos, gelados, compotas, geleias e licores.

Embora haja várias receitas para o fabrico do doce de coquinho, abaixo transcrevo uma delas, retirada o blogue O Avental da Ana (https://oaventaldaana.blogspot.com/):

Ingredientes: 800 g de frutos (pesados sem caroço) e 400 g de açúcar

Preparação: Colocam-se numa panela os frutos e o açúcar, leva-se ao lume até a fruta cozer. A seguir, com o auxílio de uma varinha mágica desfaz-se até ficar numa pasta grossa.

No passado dia 1 de novembro, ao passar na referida rua vi que os proprietários das palmeiras-da-geleia ofereciam a todos os interessados os frutos daquela planta, os coquinhos. A generosidade era tanta que também cediam sacos para o transporte. Uma brilhante ideia, que embora comum em alguns países sobretudo nórdicos, é rara entre nós, sendo por isso louvável.

Na Avenida da Paz, encontra-se uma planta ornamental muito bonita, sobretudo quando está no período de floração, denominada brassaia ou árvore-guarda-chuva (Schefflera actinophylla).

Pertencente à família Araliaceae, a brassaia é uma planta oriunda da Austrália e da Nova Guiné que floresce nos meses de agosto, setembro e outubro. Podendo crescer até 15 m de altura, a brassaia pode produzir até 1000 flores que dão origem a grandes quantidades de néctar.

Muito rara na ilha de São Miguel, para além do exemplar existente no Pico da Pedra, apenas conhecemos outras brassaias na Avenida Gaspar Frutuoso, em Ponta Delgada, e na Rua do Passal, na cidade da Ribeira Grande.

Na Rua da Saudade, é possível observar mais do que uma mélia, também conhecida por amargoseira, lilás-da-índia ou sicómoro (Melia azederach).

Pertencente à família Meliaceae, a mélia, que pode atingir 20 m de altura ou mais, é originária da Ásia-Sul e Oriente, e está em flor, entre nós, nos meses de abril e maio.

A mélia é cultivada como ornamental em quase todo o mundo e é usada em jardins ou em arruamentos. As suas folhas são usadas com fins medicinais e as flores são muito aromáticas e muito visitadas pelas abelhas e outros polinizadores. A sua madeira é muito fácil de trabalhar pelo que pode ser usada em carpintaria.

Pico da Pedra, 19 de novembro de 2022

(Voz Popular, 202, dezembro de 2022)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

Luís Rocha Monteiro: Biólogo, cientista e ambientalista notável

Luís Rocha Monteiro: Biólogo, cientista e ambientalista notável

A 11 de dezembro faz 23 anos que faleceu, no acidente aéreo ocorrido na ilha de São Jorge, o biólogo e investigador do Departamento de Oceanografia e Pescas (DOP) da Universidade dos Açores, Luís Manuel Ribeiro da Rocha Monteiro.

Luís Monteiro, que tem o seu nome perpetuado através do painho-de monteiro (Oceanodroma monteiroi), uma nova espécie de ave marinha que descobriu e estudou, foi muito mais do que um mero investigador universitário. Com efeito, nos seus curtos 37 anos de vida, desenvolveu uma atividade cívica digna de registo, quer através da sua participação associativa, quer através das campanhas de defesa do património natural que implementou.

No que diz respeito ao associativismo ambiental, Luís Monteiro foi o principal dinamizador do Núcleo do Faial da Quercus e foi membro dos Amigos dos Açores-Associação Ecológica.

No que concerne a ações de sensibilização e educação ambientais e de pressão política, destacamos o “Projeto Azorica”, a campanha “Um espaço para os Garajaus” e “A Escola e o Cagarro/SOS Cagarro”.

Entre 1990 e 1995, Luís Monteiro foi o criador e principal dinamizador do “Projeto Azorica” que consistiu numa petição intitulada “Pela Sobrevivência da Vegetação Autóctone dos Açores”. A petição tornada pública em março de 1990, recolheu 6527 assinaturas, tendo sido entregue, em 1992, aos órgãos de soberania regionais, nacionais e comunitários. Como resultado desta petição, em 1995, a Assembleia Legislativa Regional aprovou uma Resolução (nº 13/95/A) onde recomendava que o governo implementasse um plano visando a proteção e conservação efetiva das zonas ecologicamente mais valiosas do Arquipélago, do ponto de vista botânico.

Em março de 1993, por iniciativa de Luís Monteiro e com a colaboração dos Amigos dos Açores, foi lançada a campanha “Um espaço para os garajaus”, em defesa dos garajaus, comum e rosado, tendo naquele ano e nos seguintes sido editados milhares de folhetos sobre as duas espécies, que foram distribuídos essencialmente nas escolas, e foram promovidas pequenas exposições, também em escolas e em sedes de juntas de freguesia.

Por iniciativa de Luís Monteiro as ações em defesa dos cagarros começaram em novembro de 1993, altura em que foi lançada a campanha “A escola e o cagarro” no âmbito da qual foi aplicado um inquérito, sobre a espécie, destinado a alunos das escolas, nomeadamente do 1º e 2º ciclos do ensino básico e distribuídos 10 mil folhetos informativos sobre a espécie.

Dois anos depois também por iniciativa de Luís Monteiro, surgiu a campanha “SOS Cagarro”, no âmbito do projeto LIFE “Conservação das comunidades de aves marinhas dos Açores”. Para a concretização do projeto a Direção Regional do Ambiente colaboraria com o DOP na coordenação e execução das ações de conservação direta e participaria nas ações de inventariação e monitorização de espécies. Por seu turno, os Amigos dos Açores apoiariam as ações de conservação direta, nomeadamente informação e sensibilização.

Com a sua morte prematura a Ciência e a sociedade perderam um grande investigador e um ativista ambiental que muito teria a dar para a construção de uma sociedade açoriana mais respeitadora de todos os seres vivos.

O Núcleo Regional dos Açores da IRIS-Associação Nacional de Ambiente recorda-o com saudade e não o esquecerá.

Açores, 10 de dezembro de 2022

P'lo Núcleo Regional dos Açores da IRIS

Teófilo Braga

Fotografia: http://siaram.azores.gov.pt/.../luis-rocha.../galeria/2.html

domingo, 4 de dezembro de 2022

Alice Moderno e o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais

Alice Moderno e o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais

No dia 11 de abril de 1915, Alice Moderno publicou, no seu jornal “A Folha”, o Hino das Sociedades Protetoras dos Animais.

A letra é do jornalista Alberto Bessa (1861-1930) e a música da autoria de Thomaz de Lima (1887-1950). Alberto Bessa foi escritor e jornalista e António Thomaz de Lima foi violinista, compositor, maestro e professor no Conservatório Nacional de Lisboa, tendo residido em São Miguel, onde nasceu o seu filho Eurico Thomaz de Lima, na cidade de Ponta Delgada, em 1908.

Embora, hoje, o entendimento que se tem do “papel” dos animais no mundo seja bastante diferente do que havia no início do século XX, a letra do hino é clara ao afirmar que devemos amar e proteger todos os seres vivos, como se pode concluir através da leitura dos dois últimos versos:

“Sejamos todos bons para tudo o que é vivente:

- Árvore ou animal, insetos ou passarinho.”

Hino das Associações Protetoras dos Animais

Se o homem foi fadado o rei da criação,

E à frente dos mais seres a natureza o pôs,

É seu dever prestar aos outros proteção,

Sem ter jamais direito a ser o seu algoz.

Um povo civilizado

Só é o que souber

A tudo o que é criado

Amar e proteger

No mundo os animais são nossos companheiros,

E embora a natureza os fizesse inferiores,

É certo que lhes deu afetos verdadeiros,

Tornando muitos deles em nossos servidores.

Um povo civilizado

Só é o que souber

A tudo o que é criado

Amar e proteger

Devemos todos, pois, tratá-los com piedade,

Que há uma só justiça, com uma só razão,

Ambas a condenar toda a barbaridade,

Ambas a reclamar para eles compaixão.

Ser bom é uma virtude augusta e resplandecente,

Da qual cumpre seguir o largo e bom caminho,

Sejamos todos bons para tudo o que é vivente:

-Árvores ou animal, inseto ou passarinho.

Pico da Pedra, 4 de dezembro de 2022

Teófilo Braga

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Archontophoenix cunninghamiana (H. Wendl.) H. Wendl. & Drude

Archontophoenix cunninghamiana (H. Wendl.) H. Wendl. & Drude
Nome comum: Palmeira-elegante
Família: Arecaceae
Origem: Austrália
Local: Mata do Dr. Fraga (Maia)
21 de fevereiro de 2022

terça-feira, 22 de novembro de 2022

EM DEFESA DAS PLANTAS DOS AÇORES NO DIA DA FLORESTA AUTÓCTONE


EM DEFESA DAS PLANTAS DOS AÇORES NO DIA DA FLORESTA AUTÓCTONE

Introdução

Celebrado anualmente e em geral através de sementeiras e plantações de espécies da flora autóctone de uma dada região, o dia 23 de novembro- Dia da Floresta Autóctone foi escolhido como alternativa ao Dia Mundial da Floresta (Dia 21 de Março) porque na Península Ibérica o mês de novembro apresenta melhores condições climatéricas para a plantação de árvores.

O Dia da Floresta Autóctone surgiu, em Espanha, por iniciativa da ARBA – Associacón para la Recuperación del Bosque Autoctóno (https://arba-s.org/)– que integra mais de 50 associações para a recuperação dos bosques autóctones da Península Ibérica- e teve a adesão, em Portugal, por parte da Quercus (https://quercus.pt/) e recentemente, da ÍRIS- Associação Nacional de Ambiente (https://irisambiente.org/). Apesar de não ser uma data oficial, o ICNF- Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas também a tem celebrado.

A 23 de novembro de 2022, o Núcleo Regional dos Açores da ÍRIS- Associação Nacional do Ambiente, para além de apelar publicamente a todos os açorianos amigos da natureza para a participação em ações de defesa da flora autóctone dos Açores (plantas endémicas e nativas) a realizar ao longo de todo o ano, irá colaborar com a Escola Secundária das Laranjeiras através da apresentação de uma comunicação sobre a flora endémica dos açores, onde serão homenageadas personalidades e instituições que ao longo dos tempos contribuíram para o seu melhor conhecimento e proteção e serão apresentadas algumas causas para a destruição do património natural dos Açores e apresentadas algumas medidas para a sua recuperação.

Contributos para o conhecimento/proteção da flora açoriana

No ano em que se comemoram os 500 anos do nascimento de Gaspar Frutuoso (P. Delgada, 1522- R. Grande, 1591), o primeiro cronista dos Açores, não podíamos ignorar a sua obra “Saudades da Terra”, onde aquele historiador faz referência às espécies da flora e também da fauna existentes nos Açores aquando da sua descoberta.

A título de exemplo, abaixo citamos um excerto sobre a chegada dos primeiros povoadores à Povoação:

“…e, desembarcando antre duas frescas ribeiras de claras, doces e frias águas, antre rochas e terras altas, todas cobertas de alto e espesso arvoredo de cedros, louros, ginjas e faias, e outras diversas árvores, deram todos, com muito contentamento e festa…”

De entre as espécies nativas mencionadas por Frutuoso, destacamos as seguintes:

• Cedro-do-mato – Juniperus brevifolia

• Sanguinho – Frangula azorica

• Faia – Morella faya

• Louro – Laurus azorica

• Ginja – Prunus azorica

• Azevinho – Ilex azorica

• Urze – Erica azorica

• Tamujo – Myrsine africana

• Uveira ou Uva-da-Serra – Vaccinium cylindraceum

• Pau-branco – Picconia azorica

• Folhado – Viburnum treleasei

• Queiró – Calluna vulgaris

O terceirense Rui Teles Palhinha (1871-1957), que foi professor em várias escolas superiores e na Universidade de Lisboa, fez várias excursões botânicas aos Açores, tendo escrito diversos textos sobre a flora do nosso arquipélago em revistas científicas portuguesas e estrangeiras. Foi autor do livro “Catálogo das Plantas Vasculares dos Açores”, editado, em 1966, pela Sociedade de Estudos Açorianos Afonso Chaves.

O padre Manuel Ernesto Ferreira (1880-1943) foi um sábio vila-franquense que foi professor no Instituto de Vila Franca que de acordo com o seu aluno António Emiliano Costa, “classificava sem dificuldade qualquer planta, como sabia da utilidade ou origem duma pequena erva ou ainda palestrava horas seguidas sobre a vida dum determinado peixe, oração sempre vestida de alegres e interessantes deambulações” foi um dos pioneiros na defesa da “flora indígena” dos Açores. Com efeito, em 1903, na revista “A Phenix” defendeu a criação de “viveiros” ou a existência de coleções de plantas açorianas em jardins já existentes. Segundo ele tal “prestaria um belo serviço à ciência e ofereceria momentos de agradável prazer à maior parte dos continentais e estrangeiros, que continuamente nos visitam e a quem, sem dúvida, interessa, mais do que a estranha, a flora que nos é própria”.

Em 1986, Gerald Le Grand e Duarte Furtado, principais dirigentes do Núcleo Português de Estudos e Proteção da Vida Selvagem- Delegação dos Açores, lançaram as bases de uma campanha em defesa da flora dos Açores. A campanha referida apresentava três linhas de ação:

1- A criação de jardins botânicos, ao nível das localidades, das instituições ou mesmo da Região, com o objetivo de salvaguardar o maior número de espécies e promovendo a sua divulgação pública;

2- A implementação de uma campanha de educação, com a publicação de material informativo sobre as plantas e a distribuição de plantas a particulares;

3- A inventariação de zonas de vegetação indígena, a sua classificação como área protegida e o seu ordenamento pelas autoridades regionais.

Entre 1990 e 1995, dinamizado por diversas associações de defesa do Ambiente, com destaque para a Quercus (Núcleo do Faial), dirigido pelo Doutor Luís Monteiro (1962-1999) e para os Amigos dos Açores- Associação Ecológica, o Projeto Azorica consistiu numa petição intitulada “Pela Sobrevivência da Vegetação Autóctone dos Açores”. A petição tornada pública em março de 1990, recolheu 6527 assinaturas, tendo sido entregue, em 1992, aos órgãos de soberania regionais, nacionais e comunitários.

Como resultado desta petição, em 1995, a Assembleia Legislativa Regional aprovou uma Resolução (nº 13/95/A) onde recomenda que o governo implemente um plano visando a proteção e conservação efetiva das zonas ecologicamente mais valiosas do Arquipélago, do ponto de vista botânico, tendo em consideração os seguintes pressupostos apresentados pelos peticionários:

- Privilegiar a classificação de áreas de proteção relativamente vastas e com elevado número de espécies endémicas ameaçadas, em que estejam representadas o máximo de comunidades vegetais, em lugar da classificação de numerosas áreas homogéneas, pequenas e isoladas, mas altamente vulneráveis.

- Condicionar a introdução de espécies animais e vegetais exóticos no Arquipélago, devido à fragilidade e vulnerabilidade dos ecossistemas insulares, e iniciar programas de controlo das plantas exóticas invasoras existentes.

Em termos de conservação da flora autóctone, atualmente destaca-se, em São Miguel, a intervenção, coordenada pela SPEA, na Zona de Proteção Especial Pico da Vara/Ribeira do Guilherme que visa a proteção do Priolo e da Floresta Laurissilva.

No que diz respeito à divulgação e de conservação ex-situ, destacamos o Jardim Botânico do Faial e a criação de pequenos núcleos de vegetação nativa e endémica no Parque Terra Nostra, no Jardim Botânico José do Canto e no Jardim do Palácio de Santana, em Ponta Delgada.

A situação da flora nativa dos Açores

A área ocupada pela flora nativa dos Açores começou a diminuir desde o povoamento das ilhas. Com efeito, para a instalação dos primeiros povoadores houve a necessidade de introduzir cultivos diversos, nomeadamente para a produção de alimentos, e de gado e a vegetação primitiva constituiu um obstáculo pelo que teve de ser removida, sofrendo danos de vulto que se prolongaram ao longo dos tempos. A devastação atingiu o seu auge no século XX, com a implantação de pastagens permanentes.

Em 1984, Duarte Furtado mencionou que à flora vascular endémica dos Açores encontrava-se de algum modo ameaçada, pela abertura de caminhos, por plantações de matas de exóticas e pelas espécies invasoras e Gerald Le Grand estimava que a vegetação natural dos Açores cobria apenas 1% do território dos Açores.

Luís Silva, da Universidade dos Açores, em 1919, mencionou que “o número de taxa indígenas sujeitos a algum tipo de ameaça continua a subir, sendo hoje de aproximadamente 90, ou seja, mais 50% do que há duas décadas.

A importância da Floresta Primitiva dos Açores

As plantas que os povoadores encontraram quando chegaram aos Açores tiveram grande importância para a sua sobrevivência. Com efeito terá sido a madeira de cedros-do-mato, azevinhos, paus-brancos, tamujos, urzes, etc. a fonte de energia usada para o seu aquecimento, o cozimento dos seus alimentos e para a sua iluminação.

A seguir, a título de exemplo, apresentamos os principais usos de algumas plantas da flora primitiva dos Açores.

O louro (Laurus azorica) teve uma importância fundamental para os primeiros açorianos, não só devido à sua madeira, que foi usada para o fabrico de carros e arados, charruas e cangas para as juntas de bois, mas também devido às suas bagas. Sobre estas Gaspar Frutuoso escreveu o seguinte:

“… louros (de cuja baga se faz todos os anos que a há muito azeite que, ainda que não presta para comer, serve de alumiar e de mezinhas na terra e fora dela, onde se leva)…”

A faia-da-terra (Morella faya) , ainda hoje usada em sebes, foi utilizada para a produção de um carvão vegetal usado na medicina popular.

A urze (Erica azorica) era usada no fabrico de vassouras e em tinturaria para a obtenção do verde.

A madeira de azevinho (Ilex azorica), sanguinho (Frangula azorica) e ginjeira-do-mato (Prunus azorica) era utilizada em obras de marcenaria

A murta (Myrtus communis) foi utilizada para fins medicinais e de perfumaria e as suas folhas eram usadas na curtimenta de peles.

Os curtos e sedosos filamentos do feto do cabelinho (Culcita macrocarpa) eram empregados no enchimento de almofadas e de colchões.

Os frutos da uva da serra (Vaccinium cylindraceum) eram usados em compota ou para fazer vinagre.

Para além do referido a floresta autóctone é importante do ponto de vista ambiental e na conservação da biodiversidade.

Não sendo exaustivos podemos afirmar que as florestas autóctones podem:

- Contribuir para a redução da poluição do ar e para a purificação da água;

- Capturar e armazenar carbono atmosférico

- Reduzir a probabilidade de cheias e influenciar a precipitação a nível local e regional.

- Ser um espaço de lazer e recreio e melhorar a qualidade estética da paisagem;

- Ter uma importância educacional e científica, proporcionando atividades escolares e o desenvolvimento do conhecimento em diversas áreas do saber.

Medidas para a recuperação da floresta autóctone dos Açores

Para além da reconversão de algumas áreas degradadas, nomeadamente de pastagens improdutivas de altitude, a plantação de nativas e endémicas em zonas ocupadas por invasoras, nomeadamente incensos, de uma efetiva gestão das áreas protegidas, é importante um combate generalizado às espécies invasoras em todo o território, sobretudo nas áreas protegidas.

Atendendo a que este texto tem como público-alvo principal a comunidade educativa, nomeadamente alunos, a seguir fazemos menção às principais espécies que devem ser alvo de controlo.

Da lista de plantas prioritárias para controlo ou erradicação de acordo com o Decreto-Regional nº 15/2012/A, de 2 de abril, apresentamos, abaixo, 11 que foram introduzidas para diversos fins, entre eles como ornamentais: Incenso (Pittosporum undulatum), conteira (Hedychium gardnerianum), cana (Arundo donax), gigante (Gunnera tinctoria), tabaqueira (Solanum mauritianum), lantana (Lantana camara), silva-mansa (Leycesteria formosa), verdenaz (Clethra arbórea), chorão (Carpobrotus edulis), bons-dias (Ipomoea indica) e polígono-de-jardim (Persicaria capitata)
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Bibliografia

Frutuoso, G. (1981). Saudades da Terra. Livro IV, Vol II. Ponta Delgada: Instituto Cultural de Ponta Delgada. 397 pp.

Gabriel, R. (2019). Não há rosas sem espinhos: o papel dos jardins na disseminação de espécies exóticas e invasoras-13 plantas prioritárias para o controlo ou erradicação nos Açores. In Plantas e Jardins: A paixão pela horticultura ornamental na ilha de São Miguel. Albergaria, Isabel (Coord.). Green Gardens Azores/Direção Regional da Cultura-Biblioteca Pública e Arquivo de Ponta Delgada, Ponta Delgada:55-67.

Quintal, R., Braga. T. (2021). Árvores dos Açores. Ponta Delgada: Letras Lavadas. 237 pp.

Moreira, J. (1987). Alguns aspectos de intervenção humana na evolução da paisagem da ilha de S. Miguel (Açores). Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza, Lisboa. 83 pp.

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

Alunos do Liceu Nacional de Ponta Delgada (Escola Secundária Antero de Quental) 1974-1975

Alunos do Liceu Nacional de Ponta Delgada (Escola Secundária Antero de Quental) 1974-1975

terça-feira, 1 de novembro de 2022

CARIDADE E SOLIDARIEDADE


CARIDADE E SOLIDARIEDADE

Dividi este texto em duas partes: na primeira dou a conhecer uma campanha de auxílio aos pobres, prática que contrariava os princípios cristãs que eram defendidos pelo Estado Novo e na segunda divulgo duas reflexões sobre caridade.
1
No dia 25 de fevereiro de 1940, o Correio dos Açores, através do seu correspondente em Ponta Garça, freguesia do concelho de Vila Franca do Campo, localizada na ilha de São Miguel, nos Açores, noticiou que naquela localidade rural a Comissão Paroquial havia recebido do administrador do concelho 13 xailes e 5 casacos para serem distribuídos pelos pobres que eram em número de 75 e em seguida escarrapachou o nome das pessoas que receberam a esmola.

A comissão paroquial esqueceu-se do que, segundo o diácono Joaquim Armindo, São Mateus terá dito: “Quando, pois, deres esmola, não permitas que toquem trombetas diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, a fim de serem louvados pelos homens. Em verdade vos digo: Já receberam a sua recompensa. Quando deres esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua direita, a fim de que a tua esmola permaneça em segredo; e o teu Pai, que vê o oculto, há-de permear-te.”

Para além do esquecimento, a referida comissão pretendeu tirar dividendos políticos ao afirmar que “nunca houve governo que se lembrasse dos pobres e lhes distribuísse esmolas. Fê-lo o Governo do sr. Dr. Oliveira Salazar, que tem olhado com amor e carinho pelos desprotegidos da sorte”.

Curioso é também o relato de como as esmolas eram recebidas. Assim, na notícia que vimos citando pode ler-se o seguinte: “Quando fizemos a distribuição dos donativos, os comtemplados diziam: “Deus dê saúde ao grande benfeitor Sr. Dr. Oliveira Salazar” “Eu peço nas minhas orações a Deus que lhe conserve a vida por muitos anos”. “É um Santo Homem” “não se esquece dos pobres” “Deus há-de recompensá-lo disso.”
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Caridade e solidariedade são palavras que por vezes são usadas como sinónimas. Contudo, há quem pense que tal não é correto, isto é, as duas palavras apresentam significados bastante diferentes.

O geógrafo brasileiro Amir El Hakim considera que só há solidariedade entre iguais, por exemplo quando numa comunidade vítima de umas cheias as pessoas perante o sofrimento dos seus vizinhos procuram de algum modo minimizá-lo. A caridade, por outro lado, é exercida entre desiguais. No ato de caridade, há um agente, que está acima na hierarquia social, que doa algo e ao que está num patamar inferior apenas lhe resta agradecer.

Ainda sobre o assunto, o autor acima citado escreveu o seguinte: “A caridade cristã não discute os pormenores, as profundezas de uma sociedade cindida pelo dinheiro, muito menos as gritantes diferenças sociais existentes em um país capitalista de terceiro mundo, ou para os mais apressadinhos “emergentes”. Esta sublima essa relação. Faz de conta que a pobreza e a riqueza são traços naturais de uma sociedade pautada pela chamada meritocracia”.

O escritor José Rodrigues Miguéis também aborda a questão da caridade no seu livro “É Proibido Apontar- reflexões de um burguês-I”, que foi publicado pela primeira vez em 1974 pela Editorial Estampa. De entre o que ele escreveu destaco o seguinte: “Chego a perguntar se a caridade não será um traço de carácter peculiar do meu atraso; indício de incultura, ou pior, o tapa-culpas da minha inação, impotência ou indesejo de remediar os males que me afligem; mecanismo mental de ajustamento à miséria, compensador do remorso ou mal-estar que nos dá o sofrimento alheio; a “bula” ou salvatério espiritual que me dispensa da intranquilidade de consciência , dando-me a ilusão da minha bondade pessoal, a satisfação legítima e sincera de socorrer o meu semelhante; e, sempre, a certeza de que salvo a minha própria alma! Porque enfim, apiedar-se é arrepender-se, penitenciar-se: e, portanto, muito nos será perdoado. Quem dá aos pobres empresta a Deus (com juros compostos?), e que mais pode um homem de boas contas ambicionar do que ser credor do Eterno?”.
Teófilo Braga
(Letra a Letra, nº12, novembro de 2022)

domingo, 30 de outubro de 2022

O que observar no passeio pedestre “Margens da Lagoa das Furnas e Mata Jardim José do Canto”?


O que observar no passeio pedestre “Margens da Lagoa das Furnas e Mata Jardim José do Canto”?

Nas margens da Lagoa das Furnas, ao longo do caminho que a circunda é possivel observar várias espécies da flora nativa e introduzida, nos Açores, sendo predominante a presença de criptomérias (Cryptomeria japonica) e incensos (Pittosporum undulatum).

Próximo da linha de água encontram-se amieiros (Alnus glutinosa). Num recanto noroeste da Lagoa das Furnas é possivel encontrar um núcleo de ciprestes-dos-pântanos (Taxodium distichum), mais adiante uma araucaria (Araucaria heterophylla) com 50 m de altura e próximo da entrada para a Lagoa Seca estão presentes alguns eucaliptos da espécie Eucalyptus robusta.

Na Mata-Jardim José do Canto, entre outras espécies, destacamos, para além da sequoia monumental (Sequoia sempervirens), o tulipeiro-arbóreo (Liriodendron tulipifera), a azinheira (Quercus rotundifolia), o ginco (Ginkgo biloba), o ácer ou sicómoro (Acer pseudoplatanus), o castanheiro-da-índia ( Aexulus hippocastanum e Aesculus x carnea), o podocarpo (Afrocarpus falcatus e Podocarpus macrophyllus), a faia (Fagus sylvatica), a árvore dos mimos (Halleria lucida), o nogão (Juglans nigra), a nogueira (Juglans regia), o liquidambar (Liquidambar styracifflua), a nogueira-do-caucaso (Pterocarya fraxinifolia), o carvalho-aquático (Quercus nigra), o carvalho-brasileiro (Roupala brasiliensis) e o feto-craca (Angiopteris evecta).

De entre as espécies da avifauna que podem ser observadas realçam-se-se, entre outras, as seguintes: tentilhão (Fringilla coelebs moreletti), estrelinha (Regulus regulus azoricus), Pombo-torcaz (Columba palumbus azorica), alvéola (Motacilla cinerea patriciae), pato-real (Anas platyrhynchos), garça-real (Ardea cinerea) e garça-branca-pequena (Egretta garzeta). No passado, era possível encontrar o priolo (Pyrrula murina), ave endémica dos Açores, que ocorre apenas numa pequena área nos concelhos do Nordeste e da Povoação.

T. Braga

Bibliografia

Constância, J., Braga, T., Nunes, J., Machado, E., Silva, L. (2008). Lagoas e Lagoeiros da Ilha de São Miguel. Ponta Delgada: Amigos dos Açores. 157 pp.

Quintal, R., Braga, T. (2021). Árvores dos Açores - Ilha de São Miguel. Letras Lavadas , edições, Ponta Delgada. 240 pp.

domingo, 16 de outubro de 2022

MEMÓRIA HISTÓRICA A PRESERVAR

MEMÓRIA HISTÓRICA A PRESERVAR

A denominada esquerda revolucionária, que desempenhou em Portugal um papel importante nos anos de 1960-70, constituiu um fenómeno comum a nível global, designadamente na Europa e na América Latina, fruto do dissídio sino-soviético, da experiência cubana, da Revolução Cultural Chinesa, da rebelião planetária da juventude em 1968 e da crescente afirmação do Terceiro Mundo.

Em Portugal, essa dinâmica internacional cruzou-se com a eternização da guerra colonial e do regime de Salazar-Caetano. A sua expressão plural em cerca de duas dezenas de grupos e movimentos foi particularmente intensa na denúncia do colonialismo e na oposição à guerra colonial, sendo incontestável o seu contributo, nos últimos anos do regime da ditadura, para erosão da ditadura, na solidariedade com os movimentos de libertação das colónias.

Com o 25 de Abril, cujo cinquentenário se comemora em breve, contribuiu para o fim da guerra colonial e para o subsequente processo de descolonização. No processo revolucionário que se seguiu, a sua presença foi incontornável nas movimentações de massas, nas fábricas, nos bairros e quartéis e na paisagem política. Coube à esquerda revolucionária portuguesa a única representação parlamentar no quadro da Europa capitalista. Mesmo encerrado o processo revolucionário de 1974-75 1974-74, nos anos subsequentes, a sua presença manteve-se, só vindo a declinar após a queda do Muro de Berlim.

Os historiadores e outros cientistas sociais necessitam de documentos para poder estudar o passado. Nos arquivos nacionais encontra-se atualmente apenas uma pequena parte do património documental destes partidos e movimentos, que, em benefício da memória colectiva futura, é preciso preservar.

Apelamos aos particulares, antigos dirigentes e militantes que disponham ainda de documentação dessas organizações a que pertenceram que a depositem ou doem ao Centro de Documentação 25 de Abril, instituição pública idónea, prestigiada e com provas dadas na salvaguarda dos materiais de memória, para que sejam disponibilizados à consulta pela comunidade científica e por todos os interessados, evitando assim que se perca tão frágil acervo nas imprevisíveis circunstâncias do desenrolar do tempo.

Este é o apelo que fazemos, enquanto estudiosos dos temas da esquerda revolucionária, antigos dirigentes e militantes de organizações dessa área política.

SUBSCRITORES
Albérico Afonso Costa
Alcídio Torres
Amélia Resende
Ana Barradas
Ana Gomes
Ana Sofia Ferreira
António Louçã
Carlos Marques
Carlos Maurício
Constantino Piçarra
Domicília Costa
Fernando Rosas
João Madeira
José Alves
José Manuel Lopes Cordeiro
José Neves
Hugo Castro
Manuela Tavares
Manuel Monteiro
Manuel Raposo
Manuel Rodrigues
Marcelo Novello
Mário Tomé
Miguel Cardina
Miguel Perez
Pamela Cabreira
Pedro Caldeira Rodrigues
Ricardo Andrade
Ricardo Cabral Fernandes
Rui Bebiano
Rui Jacinto
Saul Nunes
Teófilo Braga
Virgínia Baptista

A crise do sindicalismo de professores nos Açores

A crise do sindicalismo de professores nos Açores

Os professores dos Açores, com exceção de muito poucos que mantêm o seu vínculo a estruturas nacionais, estão organizados em dois sindicatos, o SPRA-Sindicatos dos Professores da Região Autónoma dos Açores, filiado na FENPROF e o SDPA- Sindicato Democrático dos Professores dos Açores, filiado na FNE.

O SPRA, que surgiu após a implantação da democracia com o 25 de Abril de 1974, sempre esteve mais próximo do partido socialista e dos seus governos, como prova a troca da presidência da Direção do Sindicato pelo cargo de deputado regional eleito pelo Partido Socialista do seu carismático ex- presidente Francisco de Sousa.

Por sua vez, o SDPA, que só foi fundado em 1989 por iniciativa de pessoas ligadas aos TSD-Trabalhadores Sociais-Democratas, embora tenha procurado manter a sua independência, ao longo dos tempos, está, pelo menos em termos de pessoas que têm ocupado os órgãos sociais, mais próximo do Partido Social Democrata. Os exemplos mais gritantes são o do antepenúltimo presidente que hoje é vice-presidente da Câmara Municipal de Ponta Delgada, eleito em lista do Partido Social Democrata, e o da penúltima presidente que é deputada europeia, eleita em lista da coligação PSD/CDS-PP.

Para o bem e para o mal, até 2007, os professores dos Açores possuíam o mesmo Estatuto da Carreira Docente que os seus colegas do continente português, o que os beneficiavam, em termos das lutas que travaram em defesa de uma carreira docente digna e por melhores condições de trabalho, pois a sua capacidade de mobilização sempre ficou aquém da que existia a nível nacional.

A situação alterou-se quando, a 30 de agosto de 2007, foi publicado o Estatuto da Carreira Docente na Região Autónoma dos Açores, iniciativa peregrina do governo socialista que contou com o apoio do SPRA, alegando que era possível os professores dos Açores terem uma melhor carreira do que os restantes.

Se não houve melhorias significativas para os professores a trabalhar nos Açores, o estatuto regional só veio lançar a confusão e a fomentar a apatia, o desinteresse e a desmobilização, de tal modo que hoje não sei se existirá algum delegado sindical eleito diretamente pelos professores, em assembleias de escola.

Sem participação digna de registo, sem qualquer discussão nas escolas, o “magnífico” Estatuto Regional da Carreira Docente foi alterado recentemente com a publicação, a 17 de dezembro de 2015, no Diário da República, do Decreto Legislativo Regional n.º 25/2015/A que altera o Estatuto do Pessoal Docente da Educação Pré -Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário na Região Autónoma dos Açores, introduzindo alterações na estrutura, duração global e escalões com vista a manter a paridade entre a carreira docente nacional e a regional.

Dentro ou fora dos sindicatos, os professores não podem baixar os braços. A desmobilização e o desinteresse pela coisa pública, que é fomentada pelos detentores do poder político e económico para poderem reinar a seu bel-prazer, não podem continuar.

A alteração da situação atual, o combate às investidas dos sucessivos ministérios e secretarias regionais e a luta por um ensino público de qualidade poderá passar pela criação de pequenos núcleos de professores, nas escolas, e/ou formação de grupos de discussão nas redes sociais, blogues ou páginas web.

Janeiro de 2015

(Enviado para uma publicação de professores a pedido dos responsáveis e não publicado sem qualquer justificação)

Teófilo Braga

terça-feira, 11 de outubro de 2022

Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa- Cronologia da sua intervenção em defesa dos Animais

Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa- Cronologia da sua intervenção em defesa dos Animais
“Caridade não é apenas a que se exerce de homem para homem: é a que abrange todos os seres da Criação, visto que a sua qualidade de inferiores não lhes tira o direito aos mesmos sentimentos de piedade e de justiça que prodigalizamos aos nossos semelhantes” (Alice Moderno)

26 de novembro de 1908- por iniciativa de Alice Moderno realizou-se uma reunião que também contou com a participação de representantes do Diário dos Açores e de Maria Evelina de Sousa, da Revista Pedagógica. Foi decidido elaborar os estatutos da futura Sociedade Micaelense Protetora dos Animais.

15 de agosto de 1910- João Anglin, no jornal “Vida Nova” publicou um texto a apelar à criação de uma associação de proteção dos animais. Alice Moderno transcreveu o texto no seu jornal “A Folha”.

6 de outubro de 1910- Maria Evelina de Sousa na Revista Pedagógica anuncia que já havia encetado alguns trabalhos, mas havia suspendido por falta de coadjuvação da parte dos restantes membros da comissão que iria criar a associação.

27 de abril de 1911- Maria Evelina de Sousa anuncia a criação em breve da SMPA, cujos estatutos foram redigidos por ela, tendo como modelo os da Sociedade Protectora dos Animais de Lisboa. “O Sr. Henrique Xavier de Sousa, que é um calígrafo muito hábil” ficou incumbido “de os copiar em conformidade com a lei”.

13 de setembro de 1911- Foi legalizada a SMPA. Foram seus fundadores: Caetano Moniz de Vasconcelos (governador civil), Alfredo da Câmara (diretor de O Repórter), Amâncio Rocha, Augusto da Silva Moreira, Fernando de Alcântara, Francisco Soares Silva (director do jornal anarquista Vida Nova), José Inácio de Sousa, Joviano Lopes, Manuel Botelho de Sousa, Manuel Resende Carreiro, Marquês de Jácome Correia, Miguel de Sousa Alvim, Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa.

14 de novembro de 1912 - a Revista Pedagógica publicou um texto onde o seu autor dá a conhecer que a SMPA já estava a cobrar as quotas dos seus associados e que a sede da mesma continuava a ser nas instalações dos Bombeiros Voluntários de Ponta Delgada até à sua passagem para a rua da Fonte Velha (casa de Alice Moderno?).

28 de novembro de 1912- Em reunião da SMPA foi decidido oficiar à Câmara Municipal de Ponta Delgada “a regulamentação das carroças puxadas por carneiros” e “oficiar à corporação competente para que seja modificada a rampa no início da rua dos Mercadores, rampa que é um verdadeiro tormento para os pobres animais”.

29 de junho de 1913- noticia que, após diligências efetuadas pela SMPA, a Câmara Municipal de Ponta Delgada decidiu criar “uma nova postura proibindo que carneiros e animais congéneres sejam considerados como de tiro”.

1914- Alice Moderno é eleita presidente e sob a sua presidência a vida da SMPA alterou-se por completo, tanto no que diz respeito à tomada de medidas conducentes a acabar com os maus tratos que eram alvo os animais usados no transporte de cargas diversas, nomeadamente os que transportavam beterraba para a fábrica do açúcar, à educação dos mais novos através do envio de uma comunicação aos professores “pedindo-lhes para que, mensalmente, façam uma prelecção aos seus alunos, incutindo no espírito dos mesmos a bondade para com os animais, que não é mais do que um coeficiente da bondade universal”e à criação de condições para o seu funcionamento, como foi a aquisição de uma sede e mobiliário.

25 de março de 1914- reunião da direção da SMPA no palácio do Governo Civil com a presença do Marquês de Jácome Correia, presidente da Assembleia Geral, com o chefe do distrito, Dr. João Francisco de Sousa, que deu a conhecer “O projeto do Regulamento Policial, cuja introdução foi da autoria de Alice Moderno, que definirá os direitos dos sócios e os deveres dos agentes da autoridade”.

1 de abril de 1914- Foi inaugurada a sede da SMPA na Rua Pedro Homem nº 15.

5 de novembro de 1914- em reunião de direção da SMPA foi deliberado elevar o Marquês de Jácome Correia, à categoria de sócio protetor, pelo facto de haver concedido à Associação o subsídio anual de cem escudos”.

De 1914 a 1931 - a SMPA passou por um período de inatividade.

7 de julho de 1931- reunião da Comissão Reorganizadora da SMPA composta pelo Dr. Aires Tavares da Silva, Alice Moderno, Gil Afonso Andrade Botelho, Dr. José Jacinto Pereira da Câmara, Dr. Manuel da Silva Carreiro, Maria Evelina de Sousa, Marquês de Jácome Correia e Dr. Victor Machado Faria e Maia com o objetivo de eleger uma nova direção e estudar os meios a usar para intensificar a proteção aos animais. Foi prestada homenagem aos sócios instaladores, em especial a Alice Moderno.

23 de abril de 1933- reuniu, na casa de Alice Moderno, a direção da Sociedade Micaelense Protetora dos Animais para manifestar ao governo a sua oposição aos touros de morte. Foi também decidido solicitar à Junta Geral de Ponta Delgada, a cedência de uma dependência do Posto Zootécnico desta cidade em que pudessem ser alojados o mobiliário da Sociedade e respetivo arquivo, e também do local onde pudesse ser instalado o Posto Zootécnico”.

25 de agosto de 1934 - o Correio dos Açores regista “a justíssima homenagem prestada à sra. D. Alice Moderno” por parte da Direção da Sociedade Protetora dos Animais, de Lisboa, ao conferir-lhe a medalha de prata daquela instituição. Tal facto deveu-se “não só à sua exemplaríssima dedicação pelos animais, mas também pela propaganda jornalística” a favor da causa zoófila.

1941- Segundo o “Correio dos Açores” de 8 de março, com a devida autorização da Junta Geral e a solicitação da SMPA, o Posto Zootécnico de Ponta Delgada, passou a receber todos os animais feridos ou doentes encontrados na via pública que podiam ser entregues a qualquer hora do dia, pois no mesmo pernoitava um guarda.

14 de maio de 1941- o Correio dos Açores, noticia a abertura para breve de um Posto Veterinário que passaria a funcionar no Posto Zootécnico, dirigido pelo Dr. Vitor Machado Faria e Maia. A SMPA colaborou com o referido posto através da oferta de medicamentos e da cedência de algum mobiliário e subsidiava “monetariamente alguns animais abandonados, que tem sido necessário hospitalizar e a que é preciso fornecer alimento, enquanto não se lhes dá destino adequado”.

24 de janeiro de 1945- A direção da SMPA encontrava-se a “reunir fundos suficientes para a construção de um Hospital Veterinário, e das quotas pagas pelos sócios fornecia os medicamentos solicitados pelo Dr. Vitor Faria e Maia para colmatar as necessidades do Posto Veterinário, para além de subsidiar o enfermeiro-veterinário em serviço no Posto,

Agosto de 1945- ter-se-á realizado a última reunião assistida por Alice Moderno, onde foi debatido o problema que preocupou a sociedade desde o início, o peso excessivo da carga que os animais eram obrigados a suportar.

31 de janeiro de 1946- No seu testamento Alice Moderno deixa alguns bens à Junta Geral Autónoma do Distrito de Ponta Delgada com a condição desta, no prazo de dois anos, criar um hospital para animais.

Janeiro de 1948- Começou a funcionar no canto norte da rua coronel Chaves um hospital que mais parecia um canil. O intendente de pecuária, Dr. Vitor Machado de Fraia e Maia não o considerou digno de ser inaugurado.

Mais tarde, em data que não conseguimos apurar, foi construído um Hospital Veterinário na Estação Agrária, em São Gonçalo.

Para além da sua imprescindível contribuição para a SMPA, onde foi presidente de 1914 a 1946 (32 anos), Alice Moderno escreveu sobre a causa animal nos mais diversos órgãos da Comunicação Social, com destaque para o seu jornal “A Folha” (1902-1917), a “Revista Pedagógica” (1906-1916) de Maria Evelina de Sousa e o Correio dos Açores, onde manteve a rubrica “Notas Zoófilas” entre 19 de março de 1939 e 25 de fevereiro de 1944, tendo publicado 42 textos.

Teófilo Braga
7 de outubro de 2022

segunda-feira, 3 de outubro de 2022

QUEM QUER APAGAR O LEGADO DE ALICE MODERNO?

QUEM QUER APAGAR O LEGADO DE ALICE MODERNO?

(Pela reposição da placa existente no antigo Hospital Veterinário Alice Moderno)

Alice Moderno deixou grande parte dos seus bens à Junta Geral na condição de esta no prazo de um ano construir um hospital veterinário.

Apesar de alguns atropelos, o mesmo foi contruído onde hoje se localizam os Serviços de Desenvolvimento Agrário de São Miguel, em Ponta Delgada, e do edifício constava uma placa que recordava a benemérita, amiga dos animais e pioneira da defesa do património natural dos Açores, Alice Moderno.

Durante muitos anos apesar de o edifício já não ter as funções para que foi criado nele funcionou um consultório veterinário que mais recentemente foi substituído por um Centro de Reabilitação de Aves Selvagens.

Com a criação deste centro, os responsáveis entenderam, do nosso ponto de vista mal, retirar a placa inicial, que homenageava Alice Moderno.

Depois de vendido e retirado o seu nome do jazigo que mandou construir no Cemitério de São Joaquim, a retirada da placa no hospital que ostentava o seu nome parece ser um indício da intenção de apagar o nome de Alice Moderno da História dos Açores

O Coletivo Alice Moderno, que pretende dar continuidade aos estudos sobre a vida e a obra de Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa, dando-os a conhecer à sociedade através dos diversos meios ao seu dispor, considera que deverá ser reposta a placa no antigo hospital Alice Moderno e homenageando e tendo por base o trabalho por ela já iniciado propõe-se refletir para apresentar propostas no que respeita às mais diversas componentes da vida social, nomeadamente na relação da sociedade com o ambiente e no modo como a mesma trata os animais.

Dia do Animal, 4 de outubro de 2022

Coletivo Alice Moderno
(Anexo- imagens do edifício com e sem a placa (letras a vermelho) em que Alice Moderno era homenageada)

sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Apitoxina

APITOXINA

“Se as abelhas desaparecerem da face da Terra, a humanidade terá apenas mais quatro anos de existência. Sem abelhas não há polinização, não há reprodução da flora, sem flora não há animais, sem animais, não haverá raça humana.” Albert Einstein

Nos Açores existem 18 espécies selvagens de abelhas e a abelha do mel (género Apis) que foi introduzida nos primeiros anos do povoamento do arquipélago.

É por demais conhecida a importância das abelhas e de outros polinizadores para a conservação da biodiversidade dos ecossistemas e o seu papel polinizador na agricultura. Para além do referido, os apicultores dos seus enxames, podem extrair o mel, o pólen, o própolis, a cera, a geleia-real e a apitoxina.

A apitoxina, o veneno da abelha, que é utilizado pelas abelhas para defender a sua colónia, em certas pessoas pode ser fatal, mas na maioria apenas provoca pequenas reações alérgicas.

Sabendo-se que a gravidade do envenenamento depende da idade, do peso, do número de picadas e de características de cada pessoa, como por exemplo do seu sistema imunitário e tendo em conta que em cada picada a abelha deposita, em média, 140µg a 150µg de veneno e que a DL50 (1) da apitoxina “varia entre 2,8 e 3,5 mg de veneno por quilograma de peso corporal. Isto significa que uma pessoa não-alérgica que pese entre 60 kg a 70 kg tem 50 % de hipóteses de sobreviver às picadas de 1000 a 1500 abelhas”.

Embora o potencial terapêutico da apitoxina esteja longe de estar suficientemente estudado, sabe-se que a mesma apresenta propriedades anti-inflamatórias e neuro-protetoras e o seu principal componente, a melitina, parece possuir propriedades anticancerígenas.

De acordo com o Programa Apícola Nacional (2017-2019), o valor de mercado da apitoxina era, em 2009, superior a 23 mil €/Kg.

Teófilo de Braga

(atualizado a 30 de setembro de 2022)

(1) dose letal mediana (DL50) é a dose necessária de uma dada substância ou tipo de radiação para matar 50% de uma população em teste. Expressa-se normalmente em miligramas de substância por quilograma de massa corporal dos indivíduos testados

Exemplo:

Quantas picadas poderia receber uma pessoa de 80 kg para ter 50% de hipóteses de sobreviver?

Supondo que a DL50 é 3mg/kg, a massa máxima de apitoxina que a pessoa pode receber é 240 mg (3x80).

Se em cada picada uma abelha deposita 150µg (0,15mg), então seriam necessárias 1600 picadas (240:0,15)

Bibliografia

Ascenção, J. (2020). Apitoxina: toxicidade e potencial terapêutico. Coimbra: Universidade de Coimbra (Monografia de Mestrado Integrado em Ciências Farnacêuticas)

Weissmann JA, Picanço A, Borges PAV, Schaefer H (2017) Bees of the Azores: an annotated checklist (Apidae, Hymenoptera). ZooKeys 642: 63–95. https://doi.org/10.3897/zookeys.642.10773

terça-feira, 13 de setembro de 2022

Quatro plantas da Rua Capitão Manuel Cordeiro- 1ª parte


Ao longo dos últimos anos, tenho feito o levantamento das plantas, espontâneas ou não, existentes nas diversas ruas do Pico da Pedra. Neste número do boletim “Voz Popular” dou a conhecer quatro plantas da Rua Capitão Manuel Cordeiro- 1ª parte.

Este ano, se não estou em erro, a Câmara Municipal da Ribeira Grande mandou plantar magnólias e paus-brancos para substituir as tílias lá existentes. Estando as plantas ainda muito pequenas, carecem de cuidados especiais, nomeadamente de uma proteção para evitar que sejam esmagadas pelos automóveis que entram ou saem dos estacionamentos.

A magnólia (Magnolia grandiflora) é uma árvore da família Magnoliaceae, de folha persistente, originária do sudeste dos Estados Unidos da América (Texas, Virgínia e Flórida).

A magnólia pode atingir 27 m de altura e uma copa com 20 m de diâmetro. Começa a florescer entre os 12 e os 20 anos de idade e entre nós o período de floração é entre os meses de junho e setembro.

O pau-branco (Picconia azorica) é um arbusto ou árvore perenifólia da família Oleaceae, endémica dos Açores, existente em todas as ilhas, exceto na Graciosa. O pau-branco, que pode atingir 15 metros de altura, floresce nos meses de março, abril e maio.

No passado, a madeira do pau-branco foi usada como combustível e no fabrico de alfaias agrícolas. Hoje, o pau-branco é raro em algumas ilhas, estando protegido por legislação regional e europeia.

A acácia (Acacia melanoxylon), que é espontânea na Rua Capitão Manuel Cordeiro, é uma árvore de folha persistente que pode atingir 15 metros de altura. O período de floração ocorre entre os meses de fevereiro e maio.

Originária da Austrália, a acácia, que existe em todas as ilhas dos Açores, exceto no Corvo, foi usada na agricultura, em sebes, e a sua madeira foi e é usada como combustível e agora menos na construção civil (traves, tábuas e mobiliário). É uma espécie que se propaga por semente com muita facilidade, sendo invasora em alguns lugares.

Também espontânea na citada rua é o incenso (Pittosporum undulatum), árvore perenifólia originária da Austrália, que pode atingir 25 m de altura.

O incenso que floresce nos meses de março e abril é muito usado em sebes e a sua madeira como combustível. A partir das suas flores obtém-se o afamado mel de incenso.

Apesar da sua utilidade, o incenso é uma planta invasora que ameaça a flora nativa dos Açores, estando incluído na lista de plantas invasoras (Decreto-Lei nº 92/2019).

Termino, manifestando o meu agrado com a tentativa do uso do pau-branco como planta de arruamento e sugiro a retirada das acácias e dos incensos, estes ainda muito pequenos, e a sua substituição por arbustos ornamentais.

Pico da Pedra, 14 de agosto de 2022

Teófilo Braga
Voz Popular, nº 201, setembro de 2022

sábado, 3 de setembro de 2022

Alice Moderno, a revista “Ou vai…ou racha” e “Ai! Menina Rosa!”


Alice Moderno, a revista “Ou vai…ou racha” e “Ai! Menina Rosa!”

A revista “Ou vai…ou racha”, que fazia apologia da República, estreou- se, em Ponta Delgada, no dia 6 de fevereiro de 1909.

A 14 de fevereiro de 1909, Alice Moderno, através do seu jornal, noticia que o último quadro da revista tinha sido alterado, aparecendo, em vez dos retratos do Diretório do Partido Republicano, o do micaelense republicano e futuro presidente da República Teófilo Braga, que igualmente foi muito saudado.

Depois de nove representações em São Miguel e de mais de 200 em Lisboa a revista foi proibida de voltar à cena em Ponta Delgada porque, de acordo com “A Mocidade” de 24 de março de 1911, “n’ela aparecer a figura de João Franco, esse cons.º em cuja envergadura, que não tinha, um rei confiara, entregando-lhe o ofício de remendão da manta esfacelada e imunda que cobria Portugal inteiro- sob o título fictício de justiça e de paz!”

Durante a manhã do dia 20 de março, em diversos locais de Ponta Delgada os estudantes manifestaram o seu desagrado pela proibição da revista e cantaram a canção “Aí! Menina Rosa!” que fazia parte da mesma.

Ai! Menina Rosa…

Quem será esta dama misteriosa

Que, entre nós, tanto há dado que falar

E a quem dizemos-ai! Menina Rosa

Tenho uma coisa rica p’rate dar?!

Decerto alguma ninfa primorosa

A quem todos pretendem conquistar

E que altiva, repele, desdenhosa

As coisas que nós temos para lhe dar

Ninguém jamais a viu, nem o prazer

Nos concedeu ainda de aparecer

Com a resplandecente imagem sua!

Mas, conservai fechada a vossa porta

E fazer companhia ao João da Horta

Que há tantos meses não sai à rua

Outro Solla-Grossa

Anos mais tarde, segundo Alice Moderno, a Menina Rosa passou a ser a filha do comissário da polícia, Capitão Francisco José Silveira Júnior, responsável pela proibição da revista e por ter dado ordem ao chefe da esquadra para proceder a prisões de estudantes.

No mesmo dia 20 de março, ainda como forma de manifestar o seu desagrado com o ocorrido, os estudantes depois de se concentrarem no Largo da Matriz pelas 20h 30 min foram apresentar cumprimentos ao jornal “Diário dos Açores” e ao jornal “A Folha” de Alice Moderno, cuja redação se situava na Rua do Castilho, mesmo em frente da esquadra da polícia civil.

Pouco depois de terem sido avisados pelo chefe da esquadra de que não queria manifestações e que deviam dispersar, ocorreu a prisão de 11 pessoas, entre as quais a do Dr. Luiz Francisco Bicudo.

A 21 de março de 1909, Alice Moderno, n’ “A Folha” publica várias coplas do primeiro ato da revista. Aqui deixamos três delas, que não perderam de todo atualidade:

Dizem que eu sou pobrezinho,

Que a respeito de baguinho,

Já não tenho nem sinais.

Mas não sei por que razões

Sempre há mais contribuições,

Cada vez eu pago mais.

Pago bródios e festanças,

Pago viagens, pago danças,

Pago toda a trapalhada;

E afinal, p’ra meu agouro,

Pago em prata, pago em ouro,

Dão-me o troco em peixe-espada.

Mas em se acabando a massa,

Quando eu não tiver nem raça,

Perco a bola, fico cego.

E não tendo outros valores,

Deito a mão aos ditadores (1)

Ferro com eles no prego!

(1) A censura prévia mudou esta palavra para cobradores

Alice Moderno esteve associada à revista, quer através da divulgação das apresentações no Teatro Micaelense, quer através do seu contributo com algumas coplas escritas a propósito da festa artística da atriz Maria Dolores que abaixo se transcrevem:

Levarei funda saudade,

Quando me for a embarcar,

Senhoras desta cidade

A quem venho hoje saudar

E em prova do meu respeito

E estima bem manifesta,

Desejei singelo preito,

Sagrar-vos a minha festa

E assim, tendo o aquiescimento

Do vosso riso leal

Vou cantar, com sentimento,

Os fados de Portugal

Não estando presente aquando da visita dos estudantes ao seu jornal, onde foram recebidos pela senhora Maria Emília Borges de Medeiros, Alice Moderno em carta datada de 22 de março agradeceu aos estudantes. Da sua missiva, destacamos o seguinte: “A manifestação de que fui alvo […] vem mais uma vez demonstrar que pode existir entre os que aprendem e os que ensinam perfeita coesão de ideias, desde o momento em que os segundos acompanhem os primeiros nas legitimas e sempre insatisfeitas aspirações do pensamento humano, a cuja evolução progressiva e racional ninguém pôde nem poderá nunca, a não ser muito momentaneamente, pôr entraves”.

Dois anos depois, Alice Moderno não se esqueceu da proibição da revista “Ou vai…ou racha”, tendo recordado que duas ou três prisões de estudantes foram feitas na redação de “A Folha”. Sobre o facto escreveu: “Contra esta violação de domicílio, protestamos em tempo, pelas vias legais e continua erguido bem alto e bem nítido o nosso protesto”.

Nota- atualizei o português de todas as citações

Pico da Pedra, 4 de setembro de 2022
Teófilo José Soares de Braga

segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Santos Narciso escreve sobre o livro "A Mata do Dr. Fraga"

Santos Narciso escreve sobre o livro "A Mata do Dr. Fraga", Atlântico Expresso, 15 de agosto de 2022

quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Alice Moderno foi uma “adesiva”?


Alice Moderno foi uma “adesiva”?

Adesivos eram considerados, na Primeira República, todos os que sendo anteriormente monárquicos se converteram oportunisticamente ao novo regime.

O historiador Carlos Cordeiro num texto intitulado “Um percurso político. José Bruno Tavares Carreiro /1880-1957): de Abnegado Regenerador a Autonomista Pragmático” a propósito da nomeação do Dr. José Bruno, após o derrube da monarquia, para secretário-geral do Governo Civil de Ponta Delgada dá a entender que Alice Moderna tal como o homenageado seriam adesivistas. Com efeito segundo ele a referida “nomeação receberia apoio, por exemplo, dos jornais Diário dos Açores, e de A Folha, este dirigido por Alice Moderno, ambos já defensores do novo regime. […] Entretanto, decorriam os preparativos para uma recepção condigna aquando do seu regresso a Ponta Delgada. Alice Moderno — que já dedicara trechos poéticos a Suas Majestades, aquando da «visita régia», e também à implantação da República — escreveu a letra de um hino, composto pelo músico….”

É verdade, e a verdade não pode ser ignorada, que Alice Moderno foi monárquica e que dedicou o seu livro “Açores, Pessoas e Coisas”, publicado em 1901, à Rainha Dona Amélia.

O que não pode ser escamoteado é que Alice Moderno não começou a defender a República apenas após o dia da sua implantação a 5 de outubro de 1910. Bastava para tal ler o seu jornal “A Folha” do ano de 1909 ou então o que escreveu sobre o assunto a Dra. Maria da Conceição Vilhena, no seu livro “Uma Mulher pioneira: Ideias, Intervenção e Acção de Alice Moderno”, publicado, em 2001, pelas Edições Salamandra.

Sobre a questão da adesão de Alice Moderno aos ideais republicanos Conceição Vilhena, na obra referida escreveu o seguinte: “No entanto, com o evoluir da política, a viragem dá-se; e A.M. adere de alma e coração ao partido republicano. Quando, em 1909, a polícia prende onze estudantes que se manifestavam contra a proibição de representar a revista Ou vai …ou racha e por cantarem pelas ruas A Menina Rosa, símbolo da república, A.M. toma abertamente o partido destes, tendo publicado alguns artigos de protesto contra a atitude das autoridades, as quais entraram, na ausência de A.M. na redacção de A Folha, onde os jovens se haviam refugiado.”

Sobre aquele triste episódio que encheu várias páginas dos jornais micaelenses da época, Alice Moderno ao descrever a peça, na edição do seu jornal, “A Folha”, de 7 de fevereiro de 1909, teceu fortes elogios aos republicanos nos seguintes termos:

“No último acto é feita a apoteose do Directorio do partido republicano, o qual é composto, como se sabe, dos homens mais em evidencia pelo seu talento, probidade e dedicação á causa democrática, que é a dos pequenos, dos sofredores, dos eternamente sacrificados- o que bastaria, que mais não fosse, para a tornar sympathica a todos os homens de coração e equidade”.

No mesmo jornal, ainda no tempo da monarquia, Alice Moderno divulgava as iniciativas do Partido Republicano de que é exemplo a notícia, publicada a 9 de maio de 1909, da eleição de Teófilo Braga, futuro presidente da República e amigo de Alice, e de outras personalidades para o diretório daquele partido, num congresso realizado em Setúbal.

Mas, muito antes de 1909 Alice Moderno já havia deixado de estar ao lado dos monárquicos. Com efeito numa carta dirigida a Ana Castro Osório, de 3 de dezembro de 1906, pode-se ler o seguinte: “Então, que me diz ao movimento republicano que se está operando em todo o país? Felicito-o, ou antes, felicitem-nos que eu sou também uma republicana pur sang”.

A desilusão de Alice Moderno com os republicados e com a política em geral viria mais tarde.
Teófilo Braga 11 de agosto de 2022, nos 155 anos do nascimento de Alice Moderno

terça-feira, 9 de agosto de 2022

Projeto de Decreto Legislativo Regional – “Determina o fim das touradas e prevê apoios aos trabalhadores e à reconversão das praças de touros.”

Projeto de Decreto Legislativo Regional – “Determina o fim das touradas e prevê apoios aos trabalhadores e à reconversão das praças de touros.”
Parecer do Núcleo Regional dos Açores da IRIS- Associação Nacional de Ambiente
O Núcleo Regional da Iris-Associação Nacional de Ambiente, Organização Não Governamental de Ambiente que aspira a um mundo em que a Humanidade, com ciência, sabedoria e inteligência saiba partilhar sustentadamente os recursos naturais e respeitar todas as formas de vida, concorda na generalidade com os argumentos apresentados pelo PAN para propor o fim das touradas nos Açores ao mesmo tempo que lamenta que seja por decreto que uma prática de importunar e torturar animais para prazer de quem se diz humano venha a ser abolida.
De todos os argumentos apresentados pelos defensores das touradas, apenas um, o da tradição, do nosso ponto de vista, merece ser tido em conta. Com efeito, a tauromaquia é uma tradição, sobretudo na ilha Terceira, e acabar com uma tradição não é tarefa fácil.
Mas a tauromaquia por ser tradição não significa que seja intocável e tal como outras tradições, como a de matar animais num terreno qualquer, como acontecia, em algumas localidades, com os bovinos durante as festas do Espírito Santo que foi forçada, por lei, a terminar, as touradas têm de respeitar os sinais dos tempos, pois nos nossos dias não há qualquer justificação para agredir e fazer sofrer animais sencientes.
Tendo em consideração que as poucas pessoas envolvidas na atividade facilmente poderão ser reconvertidas para outras, tendo em conta que as touradas não criam riqueza, apenas transferem dinheiro de uns tantos (os assistentes ou as entidades organizadoras) para uns poucos (os ganadeiros- que em geral têm outras fontes de rendimento), o Núcleo Regional da Iris, concorda na generalidade com o projeto de Decreto Legislativo Regional que “Determina o fim das touradas e prevê apoios aos trabalhadores e à reconversão das praças de touros.”
4 de agosto de 2022
Teófilo José Soares de Braga
Coordenador do Núcleo Regional dos Açores da IRIS

sexta-feira, 1 de julho de 2022

Notas sobre José do Canto e as abelhas

Notas sobre José do Canto e as abelhas Até ao momento não me lembro de ter lido nada que indique que o grande proprietário e intelectual José do Canto (1820-1898) tenha sido apicultor. Contudo, tenho a certeza de que se interessou pela apicultura, tendo na sua biblioteca algumas publicações sobre a mesma. De entre as publicações consultadas, destacamos, pelo seu interesse e por não terem perdido de todo atualidade, as seguintes: “Manual dos proprietários de abelhas e o Conservador das abelhas”, “As abelhas, sua cultura, propagação e tratamento adaptado ao clima do Brasil”, Novo methodo da cultura d’abelhas” e “Tratado histórico e fyzico das abelhas”. Na primeira obra referida, há referência a algumas superstições a respeito das abelhas. Abaixo, transcreve-se um pequeno texto: “N´outras partes persuadam-se que elas conhecem o seu proprietário, e que, quando este morre, põem um farrapo preto em todas as colmeias. Enfim há tantas mais, quanto maior é a ignorância o povo” Na última publicação mencionada há um interessante capítulo intitulado “Das plantas, e hervas, mais uteis, para as Abelhas”. Nele o autor, depois de referir o nome de várias plantas, entre elas o trevo branco, destaca o trigo sarraceno que “dá tanto mel, que, indo-lhes o tempo a propósito, e não muito secco, ellas podem recolher em Agosto, e Septembro mais, do que no resto do anno, de modo, que em Alemanha hum bom cortiço, levado a esses campos, donde elle está semeado, recolhe em oito dias talvez a quatro cannadas”. 1 de julho de 2022 Teófilo Braga

segunda-feira, 20 de junho de 2022

Sobre o livro "Mata do Dr. Fraga-Herança Viva de um Madeirense

 

Atlântico Expresso, 20 de junho de 2022

sexta-feira, 17 de junho de 2022

MATA DO DR: Fraga- Um espaço de educação ambiental

 


MATA DO DR: Fraga- Um espaço de educação ambiental

 

Com este livro homenageamos um homem bom, um “dos grandes beneméritos da terra”, no dizer de Carreiro da Costa e “um grande amigo dos pobres e um pai carinhoso dos pequeninos”, segundo Oliveira San-Bento.

 

É também um reconhecimento a um apaixonado pela floricultura e arboricultura, ao homem que esteve na origem da criação da Santa Casa da Misericórdia da Maia, sendo seu provedor, o primeiro, entre 27 de outubro de 1919 e 14 de dezembro de 1941.

 

A Mata do Dr. Fraga, que felizmente foi adquirida pela Junta de Freguesia da Maia, em 2005, e depois aberta ao público em 2008, depois de bem conseguidas obras de requalificação, para além de constituir um excelente espaço de recreio e de poder vir a tornar-se um Pólo de atração turística para a freguesia da Maia, também poderá constituir um imprescindível recurso de educação ambiental para as escolas da Maia e de outras localidades da ilha de São Miguel.

 De acordo com o arquiteto Fernando Pessoa o jardim, por ser um espaço diferenciado de lazer tem a capacidade de despertar a curiosidade sobre as plantas, criando condições próprias à implementação de ações que promovam, junto aos visitantes, grupos escolares e comunidades locais, a perceção dos impactos da ação humana sobre o meio ambiente e a consciência sobre os efeitos negativos da perda da biodiversidade, motivando-os a participarem de um ciclo de desenvolvimento sustentável”, por isso é um dos locais ideais para a educação ambiental não formal.

 

A Mata do Dr. Fraga, pela coleção de plantas que possui, tem o potencial de servir, segundo Júlia Wilison, fora das quatro paredes de uma sala de aula, para o ensino:

- Da incrível diversidade do Reino Vegetal;

- Das relações complexas que as plantas desenvolvem com o ambiente;

- Da importância das plantas em nossas vidas, em termos económicos, culturais e estéticos;

- Das principais ameaças que a flora mundial enfrenta e das consequências da extinção das plantas;

 

Com um pouco de boa vontade, através da interação das instituições locais é possível a criação de um programa educativo que permita que os visitantes apreciem a natureza como um todo, adquiriram habilidades práticas e conceitos teóricos para conservação, reprodução de plantas e desenvolvem atitudes, comportamentos e habilidades necessários para solucionar problemas ambientais e para impedir que eles se repitam no futuro.

 

Teófilo Braga

15 de junho de 2022