sexta-feira, 30 de junho de 2017

Percurso Pedestre da Serra Devassa


Percurso Pedestre da Serra Devassa

O trilho da Serra Devassa foi, desde a criação dos Amigos dos Açores (então com, a designação de Núcleo dos Açores dos Amigos da Terra- Associação Portuguesa de Ecologistas), em 1894, um dos mais visitados por aquela associação e um dos preferidos para acompanhamento de grupos escolares, não só devido à sua curta extensão mas também pela sua localização geográfica a pouca distância, cerca de 17 km, de Ponta Delgada.

Na história do trilho da Serra Devassa, destacamos o ano de 1994. Em janeiro de 1994, os Amigos dos Açores organizaram um passeio pedestre que contou com a presença de 65 pessoas, entre elas o presidente do Governo dos Açores, Doutor João Bosco da Mota Amaral. No mesmo ano, no mês de Maio, por iniciativa dos Amigos dos Açores foi publicada a primeira edição do roteiro do percurso pedestre da Serra Devassa.

No ano 2000, a 23 de setembro, realizou-se a abertura simbólica do primeiro percurso pedestre sinalizado dos Açores, o da Serra Devassa, que contou com a presença do Secretário Regional da Economia, Prof. Doutor Duarte Ponte.

Para se chegar à Serra Devassa, a partir de Ponta Delgada, aconselha-se que os interessados atravessem a freguesia da Relva, depois passem pela Covoada, pelo Pico do Carvão e pelo Muro das Nove Janelas e comecem o trilho mesmo em frente à Lagoa do Canário.

O trilho da Serra Devassa está implantado no também denominado Maciço das Lagoas que tem o ponto mais alto no Pico das Éguas, com 847 m de altitude. É neste maciço que se encontra a maior parte das lagoas de São Miguel, como a do Canário, a do Pau Pique, a Rasa, as duas das Éguas, as duas Empadadas e o Caldeirão Grande.

Antes ou depois de percorrer o trilho que é circular e que tem pouco mais de 4,5 km, recomendamos uma visita à Lagoa do Canário que está instalada numa mata de criptomérias. Nas suas margens podemos observar, em quase toda a volta, entre outras as seguintes espécies vegetais: fetos reais, queirós, malfuradas e hortênsias.

Depois da visita à Lagoa do Canário, atravessa-se a estrada e segue-se o trilho que está sinalizado e sobe-se o Pico das Éguas que foi descrito por Gaspar Frutuoso do seguinte modo: “o pico das Éguas, que por ser alto o vão buscar as éguas no Verão para seu refresco, donde cobrou o nome delas, ou (segundo outros dizem) porque o dito pico sempre foi e ainda é agora do concelho, comum a todos, pelo que por outro nome se chama a terra devassa, em que as éguas e mais gados, corridos dos outros sarrados, tem seu couto”. No cimo do Pico avista-se as duas lagoas das Éguas, a da Vaca Branca, uma das Empadadas, o Pico do Carvão, a Serra Gorda, etc. Também é possível avistar, em dia limpo de nevoeiros, alguns troços das costas norte e sul da ilha de São Miguel.

Continuando a caminhar, chega-se à Lagoa Rasa, situada a uma altitude aproximada de 800 metros, que tem cerca de 400m de comprimento por 60 de largura e uma profundidade máxima de 6 a 7 metros. As suas águas foram captadas e alimentavam uma antiga fábrica de álcool instalada em Santa Clara.

Contornando a Lagoa Rasa chega-se a uma bifurcação. Quem virar à esquerda regressa ao Ponto de Partida, quem virar à direita, depois de uma pequena descida, chega às duas Lagoas Empadadas.

As encostas da cratera onde se instalaram as lagoas estão cobertas por criptomérias, o carreiro que as circunda está bordado de azáleas e nas margens podemos observar algumas hortências, queirós e fetos reais. Nas suas águas vivem rãs, o ruivo e o lúcio, este último peixe introduzido pelos Serviços Florestais depois de 1978.

Embora fosse possível prosseguir a caminhar em direção à Lagoa do Carvão e depois ao Caldeirão Grande, sugere-se o regresso ao ponto de partida.

Por último, recomenda-se uma visita às captações de água, onde é possível encontrar algumas espécies da flora endémica e ao Miradouro da Grota do Inferno de onde se pode observar o Pico da Cruz, com 856 metros, a elevação mais alta do Maciço das Sete Cidades, a imponente Grota do Inferno, a Lagoa Azul, o povoado e a Lagoa de Santiago.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31266, 30 de junho de 2017, p. 14)

quinta-feira, 29 de junho de 2017

Faleceu ontem, 29 de junho, O professor EDUARDO CALISTO


Faleceu ontem, 29 de junho, O professor EDUARDO CALISTO

Eduardo Calisto Soares de Amaral nasceu, na Ribeira das Tainhas, a 13 de Outubro de 1936, tendo-se formado na Escola do Magistério Primário, de Ponta Delgada, em 1955, depois de ter frequentado a Escola Primária Masculina, da sua terra natal, o Externato de Vila Franca.
Professor do primeiro ciclo do ensino básico durante 37 anos, para além de ter lecionado na Ribeira Seca, foi docente nas seguintes escolas primárias: São Miguel, de Vila Franca do Campo, Porto Formoso, Água de Pau, Ponta Garça e Ribeira das Tainhas. Em simultâneo, durante 12 anos, foi professor no Externato de Vila Franca do Campo.
Amante do desporto, foi jogador de futebol e membro da Direção do Clube Desportivo de Vila Franca do Campo.
Foi, também, membro da Direção de Caixa Agrícola e pertenceu à Comissão de Festas do Bom Jesus da Pedra, durante 4 anos.
Na área do associativismo cultural, foi Presidente da Banda da Lealdade durante 6 anos. e fez parte do Grupo de Cantares “Vozes ao Luar”.
O professor Eduardo Calisto Soares de Amaral também tem dedicado a sua vida à escrita, tendo no âmbito do teatro si autor de três revistas, duas na Escola do Porto Formoso e uma na Escola da Ribeira Seca que foi exibida no final de um ano letivo. (Se não me falha a memória, 1965)
Ainda no que diz respeito à escrita, se se consultar os Jornais “A Vila” e “A Crença” constatar-se-á que da sua autoria existem muitas dezenas de textos publicados sobre o ensino, as viagens que fez, sobre como se vivia antigamente, as brincadeiras dos mais novos, as festas de São João, etc.
A 1 de Dezembro de 1966, fruto de um trabalho de uma equipa que o professor Eduardo Calisto Soares de Amaral soube coordenar, realizou-se a bênção do nicho dedicado a Nossa Senhora da Conceição e foi inaugurado um pequeno tanque de natação, a nossa piscina, que pelo seu ineditismo foi motivo de muita admiração. (Faço um aparte para mencionar os nomes dos restantes professores da escola naquela data: Adelaide Soares, Margarida Simas Borges, Claudete Marques, Válter Soares Ferreira e Octávio da Silva Costa).
Foi um dos elementos da equipa que liderada, pelo padre Lucindo Andrade, se responsabilizou pela montagem de um presépio movimentado, iniciado em 1967 com o objetivo de recolher fundos para a Igreja de São Pedro e que atraia, anualmente, milhares de pessoas ao concelho durante a época natalícia.
A abertura da escola à comunidade que já se iniciara nos últimos anos do antigo-regime, foi alargada, após o 25 de Abril de 1974. Com efeito, o professor Eduardo Calisto de Amaral, na qualidade de diretor da Escola da Ribeira Seca, foi pioneiro na abertura das instalações da mesma para a prática desportiva e recreativa dos jovens (que nem sempre souberam corresponder à confiança depositada). Assim, foi cedido, num dos alpendres fechados, um espaço para reuniões da Associação Desportiva e Cultural da Ribeira Seca, a primeira associação de juventude da localidade, que possuidora de uma chave da escola, abria-a e organizava jogos diversos com destaque para o futebol.
Respeitador das nossas tradições, empenhou-se na sua manutenção, tendo, em 1968, organizado a 1ª Marcha as Hortas e sido líder da Marcha da Ribeira Seca durante 30 anos.
Sendo fastidioso mencionar tudo o que o professor Eduardo Calisto de Amaral fez relacionado com as festas de São João, acrescento apenas que, em 1972 fez parte da equipa que organizou as festas em Vila Franca do Campo, em 1992 foi o autor da letra da Marcha da Ribeira Seca e em 2007 foi um dos responsáveis pela coreografia da Marcha da Rua.
Mas, para a Ribeira Seca o ponto alto foi em 1975. Vejamos o que disse o senhor Manuel Soares Ferreira sobre o assunto: “Em 1974, parou. Houve o 25 de Abril. Parou na vila, porque na escola da Ribeira Seca, o professor Calisto fez sempre a festa.”
Em 1975, no recreio da Escola da Ribeira Seca desfilaram três vistosas marchas populares, realizaram-se jogos de voleibol, entre jovens e adultos, e jogos de miniandebol com uma das equipas orientada pelo Emanuel Batista.
Foi também nesta altura, com a anuência do professor Eduardo Calisto de Amaral, que a Ribeira Seca teve vários autores e atores teatrais. Com efeito, por iniciativa de um grupo de habitantes foi ensaiada, na casa do Sr. Álvaro Sardinha, na Rua Nova, uma lição do Menino Tonecas em que os principais intérpretes foram o António José Pacheco, da Rua Nova, e o Eduardo Vicente, do Quartel de São João.
Estávamos muito longe dos currículos regionais, das áreas-escola ou de outras inovações e na Ribeira Seca já se faziam experiências pedagógicas que eram referência para as demais escolas. Assim para além da jardinagem, da criação de animais, menciono a realização durante cerca de 30 anos de uma visita de estudo anual para que as crianças contatassem com a realidade da ilha, nomeadamente instalações fabris e serviços diversos.
Mas, se todas estas realizações, que tiveram a mão e a coordenação do professor Eduardo Calisto de Amaral foram gigantescas, atendendo à dificuldades com que se vivia na época e ao facto da escola ser o único elemento dinamizador da cultura na localidade, só por si justificavam esta justa homenagem que tardou, não devemos esquecer a pessoa em si.
Diria que o professor Eduardo Calisto Amaral, pela maneira de ser, marcou profundamente os seus alunos e pela sua facilidade em se relacionar com os outros granjeou a simpatia da comunidade que tão bem soube servir. Mas, mais importante do que as minhas palavras aqui segue um dos vários depoimentos possíveis:
“ O sr. Calisto, este, de coração grande, mais que mestre era o Pai de todos nós; sempre de sorriso, a todos nos acolhia, ouvindo tudo com atenção, mesmo a queixa mais insignificante do aluno mais humilde” (Maria da Graça Flor de Lima, 15 de Junho de 1992).
A todos os familiares os nossos sentidos pêsames.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Ainda a propósito do trabalho de projeto no ensino da Química


Ainda a propósito do trabalho de projeto no ensino da Química

Em texto anterior, comecei por abordar uma tentativa de ensinar alguns conceitos do programa de Física e Química do 7º ano de escolaridade, com recurso ao trabalho de projeto. Embora o tema seja de interesse para os docentes da disciplina, pode ter também interesse para professores de outras disciplinas, bem como para as demais pessoas interessadas com o que se passa nas escolas.

Antes de prosseguir, vou aproveitar para demonstrar publicamente a minha indignação pelo facto dos nossos alunos serem discriminados em relação aos seus colegas do continente português. Com efeito, os conteúdos a lecionar são os mesmos a nível nacional, mas, nos Açores, os alunos têm menos um terço de tempos letivos que os não residentes na região.

A situação descrita já foi denunciada por várias vezes e os políticos que nos governam, desde secretários a diretores regionais, passando pelos deputados, estão ao corrente da situação, mas não mexem uma palha para que a situação se altere. Desconheço a razão da sua apatia, mas as causas poderão estar relacionadas com o não entendimento da gravidade da situação, com a incapacidade para a implementar medidas de fundo, pois a apregoada autonomia dos Açores é muito curta ou com a sua forte aposta na implementação de medidas de mera mitigação, como o ProSucesso.

Ainda sobre o assunto, quero afirmar que os professores também são vítimas da situação mencionada, pois vêm-se aflitos para cumprirem os programas, por vezes, demasiado extensos e não têm outro remédio senão passar por alguns conteúdos como gatos sobre brasas.

Retomando o fio à meada, a opção que fiz pela implementação do trabalho de projeto para o estudo de um conteúdo do programa deveu-se essencialmente ao facto de considerar que as atividades laboratoriais devem ser feitas pelos alunos, respeitando todas as regras de segurança nos laboratórios, sempre com a supervisão do professor.

Mas, tão ou mais importante do que o ensino experimental é o colocar os alunos a participar na organização das tarefas a realizar e a trabalhar em cooperação com os colegas. Não se pode exigir que uma organização ou região seja autónoma quando os cidadãos que a constituem ou nela vivem não aprenderam a usar a liberdade para pensarem pela sua cabeça e as agir por si próprios.

Se há quem tenha muitas dúvidas sobre a implementação do trabalho de projeto, nomeadamente porque possa implicar não seguir a ordem dos conteúdos inscritos nos programas ou por pensar que os alunos não são capazes de fazer pesquisas bibliográficas, por mais simples que sejam, a maior interrogação é a relacionada com a pretensa incapacidade ou imparcialidade por parte dos alunos para avaliarem o trabalho desenvolvido.

Para comprovar que aqueles são capazes de ser autónomos e de avaliar, com justiça o seu trabalho, apresento, abaixo, alguns extratos de uma ficha de autoavaliação.

Sobre como havia decorrido o trabalho, uma das alunas, de 12 anos, sobre a atividade laboratorial escreveu o seguinte: “Inicialmente correu mal, pois tínhamos feito a experiência mal, mas depois repetimos de novo e a experiência foi bem-sucedida”. Relativamente ao trabalho em equipa, a mesma aluna escreveu: “cada uma fez um pouco e depois o meu outro par foi buscar todo o material e conseguimos trabalhar bem”. Em relação à realização da apresentação final, a avaliação da aluna foi: “O trabalho correu bem, mas atrapalhámo-nos um pouco … conseguimos trabalhar bem pois aceitamos todas as ideias que propomos”. Por último, a mesma aluna, analisando a apresentação final, escreveu: “a apresentação correu bem, soubemos planear o que cada uma ia dizer e usamos um vocabulário claro e correto” e acrescentou: “ Acho que em vez de fazermos numa folha de papel, podíamos inovar mais fazendo um vídeo a explicar o procedimento da experiência”

Apesar do cansaço de quase 40 anos de lecionação, de muito desânimo, de muita revolta pelo modo como os sucessivos governos têm tratados os docentes e outras classes profissionais, há momentos em que ainda acreditamos que é possível uma melhor escola inserida num mundo melhor.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31264, 28 de junho de 2017, p, 16)

terça-feira, 27 de junho de 2017

Crise na Sociedade Micaelense Protetora dos Animais


Crise na Sociedade Micaelense Protetora dos Animais

No texto de hoje, teria muito gosto em dar os parabéns aos deputados da ALRA se os mesmos tivessem encurtado o tempo de entrada em vigor da legislação que proíbe o abate como método de controlo dos animais de companhia. Contudo, tal não aconteceu e vamos esperar por 2022, ano em que serão apresentados argumentos para que o prazo seja dilatado até ao dia de São Nunca.

Como não há notícias boas do presente, vou aproveitar a oportunidade para voltar a referir o nome de Maria Evelina de Sousa que, como sabemos, foi uma das principais dirigentes da SMPA-Sociedade Micaelense Protetora dos Animais e uma das suas porta-vozes.

A 10 de dezembro de 1925, o Correio dos Açores denunciou a magreza dos bois municipais e chamou “a atenção da Sociedade Micaelense Protetora dos Animais para este caso que também envergonha o nosso meio social”.

Dois dias depois, Maria Evelina de Sousa escreveu uma carta aberta ao diretor do jornal, Dr. José Bruno Carreiro, desafiando-o a assumir responsabilidades na SMPA que estava inativa ou em crise profunda.

Na carta referida, Maria Evelina de Sousa lembrou que a SMPA “foi fundada pela imprensa local de então, imprensa que generosa e desinteressadamente, defendia os pequenos, os desprotegidos da sorte” e acrescentou que a mesma não havia encontrado “ o apoio com que são geralmente acolhidas nesta terra as iniciativas altruístas”.

No mesmo texto, Maria Evelina de Sousa referia-se à SMPA como sendo “bem humilde, por sinal, e nunca arrepiava caminho com receio de melindrar potentados”.

Hoje, embora as associações animalistas continuem a não receber o reconhecimento que deviam por parte das entidades oficiais, parece que, por vezes, têm conhecimento de algumas situações irregulares e não as denunciam com medo de represálias para os seus dirigentes ou mesmo para alguns animais.

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 31263, 27 de junho de 2017, p. 16)

sábado, 24 de junho de 2017

Percurso Pedestre Quatro Fábricas da Luz



Percurso Pedestre Quatro Fábricas da Luz

Esta nova rubrica do Correio dos Açores, que se manterá durante o período em que maioritariamente as pessoas gozam as suas férias, surge na sequência de um desafio lançado pelo jornalista João Paz e tem como objetivo dar a conhecer alguns trilhos pedestres da nossa terra, destacando a sua função didática, a sua ligação à proteção ambiental e o seu potencial turístico.

Praticante do pedestrianismo, na ilha de São Miguel, há cerca de 40 anos, foi com a minha participação nas atividades dos Amigos dos Açores- Associação Ecológica, há pouco mais de trinta anos, que passei estudar a atividade e a participar na elaboração de roteiros de percursos pedestres, um dos quais, sobre o trilho que é apresentado hoje, foi editado, no ano 2000, pela associação referida e pela Fundação Eng.º José Cordeiro, no âmbito das Comemorações do 1º Centenário da Luz Elétrica nos Açores.

No ano 2000, o roteiro do percurso pedestre previa a visita a 4 centrais hidroelétricas, de Norte para Sul: a Fábrica Nova, que na altura da sua construção, em 1927, era, no dizer do engenheiro Riley da Motta “a mais poderosa dos Açores”, a Fábrica da Cidade, que foi o segundo aproveitamento hidroelétrico da Ribeira da Praia, tendo entrado em funcionamento em 1903, a Fábrica da Vila que entrou em funcionamento em 1899, para servir Vila Franca do Campo, a primeira localidade dos Açores a receber energia elétrica e a Fábrica da Praia que começou a funcionar em 1911 e que em 1990 foi transformada em Museu pela EDA- Eletricidade dos Açores, com o objetivo de homenagear o engenheiro José Cordeiro, o pioneiro da eletrificação dos Açores.

No roteiro editado pelos Amigos dos Açores a proposta era a da realização de um trilho com cerca de 6,3 km, circular, com início e termo junto à Fábrica da Praia, no local da Praia, que foi habitado desde os primeiros tempos do povoamento da ilha de São Miguel.

Na sua descrição da ilha de São Miguel, Gaspar Frutuoso descreveu a Praia, na segunda metade do século XVI, nos seguintes termos: “...vem entrar no mar a grande ribeira da Praia, que dantes foi muito fresca, com uma fajã que estava ao longo dela, de uma e doutra parte, onde havia muita fruta de figos e uvas, do concelho, para quem quer que as queria; onde havia uma povoação de até sete ou oito casais de nobres e abastados moradores, chamados os Afonsos, da Praia”. Aquele cronista, também, mencionou a existência de “duas casas de moinhos que com ela moem, de duas pedras cada um, que servem de moendas a Vila Franca”.

Entre o casario e a Fábrica da Vila, o visitante pode observar a conduta forçada e a câmara de carga e decantação da fábrica da Praia. Para além de terrenos ainda cultivados ainda são visíveis vestígios de antigos pomares, onde se pode observar um conjunto de castanheiros, algumas laranjeiras, uma ou outra anoneira e azáleas.

Entre a Fábrica da Vila e a da Cidade, é possível observar várias espécies vegetais, com destaque para as conteiras, os incensos, as criptomérias, as acácias e os vinháticos.

O vinhático, que terá sido introduzido no nosso arquipélago por causa da sua excelente madeira, segundo Erik Sjogren, está naturalizado “nos Açores pelo menos desde há três séculos”. Conhecido como mogno da Madeira ou mogno das ilhas, a sua madeira foi muito usada em marcenaria e no fabrico de caixotes e a sua casca serviu para curtir peles.
Continuando o percurso, o caminheiro passa por um tanque, construído em 1906, que hoje alimenta a Central da Ribeira da Praia, um aproveitamento hidroelétrico datado de 1991.
Se continuar a caminhar, seguindo a conduta forçada que alimenta o tanque, chega-se a um caminho que liga a estrada regional às margens da Lagoa do Fogo. Virando à esquerda, e caminhando para Sul, chega-se ao ponto de partida.
Para quem quer fazer um percurso mais pequeno, praticamente a descer, sugere-se que inicie o percurso junto ao Parque Escutista dos Lagos. Se assim o fizer percorrerá o trilho com 2,1 km que passa por três das quatro fábricas da luz mencionadas e que está homologado pela Direção Regional de Turismo.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31260, 23 de junho de 2017, p. 15)

quinta-feira, 22 de junho de 2017

José Carlos Tavares escreve sobre meu avô Manuel Soares


A constância de dedicados jornalistas
Categoria: Opinião
Criado em 20-06-2017

Escrito por João Carlos Tavares

Admiramos a constância de muitos assíduos colaboradores que escrevem sobre temas vários para a nossa imprensa. São, eles e os jornais, os cabouqueiros, os “olhos e a língua do corpo social. Por isso privá-los de meios de informação é privar de voz a sociedade”. Foi assim que Luca de Tena, disse certo dia, acerca dos jornais e dos jornalistas.
No nosso Portugal e especificamente nos Açores os jornalistas, redactores profissionais e colaboradores, são muito constantes nas suas apreciadas crónicas, colunas ou secções, uma tradição que vem dos tempos do surgimento dos Media na Região já a caminho dos dois séculos.
Que nos recorde, já lemos jornais há cerca de 60 anos e desde sempre demos com colaboradores constantes a deporem os seus testemunhos, os seus conhecimentos e as suas opiniões no estilo próprio de cada um e dentro dos meandros impostos pela deontologia. Sempre houve muitos e dedicados ao órgão divulgador dos seus escritos e levaram vidas inteiras com muitos e muitos anos de dedicação às suas tribunas e aos que os liam com agrado e atenção.
Dos nossos tempos de jovem lembramo-nos de escritores como Rebelo Bettencourt, Diniz da Luz, Oliveira San-Bento, Alcindo Coutinho e outros, no velho Diário dos Açores. No jornal Açores, de Jorge Falcão, Carreiro da Costa, Cícero Medeiros, António Horácio Borges, etc. E no circunspecto Correio dos Açores, Manuel Ferreira, Ruy Guilherme de Morais, Gaspar Read Henriques, Gustavo Moura e tantos outros, alguns dos quais, felizmente, ainda na conta dos vivos.
Actualmente, dado os modos de vida, os actuais colaboradores, não obstante as suas tarefas profissionais, continuam a ser dedicados e muito assíduos nas suas contribuições jornalísticas cumprindo compromissos com os devotos leitores.
Nas colunas do Correio dos Açores, por exemplo estão a colaborar jornalistas há muitas dezenas de anos, mesmo na sua presente provecta idade. Ocorre-nos o caso do respeitável senhor Ermelindo Ávila, que escreve, desde a sua ilha Montanha , há muitas dezenas de anos. E para não magoar ninguém não vou referir a outros mais que, desde há longos anos escrevem para o jornal fundado por Bruno Carreiro, com aprumo e dedicação sobre as áreas dos seus gostos e predomínio.
Entre esses jornalistas que aparecem varias vezes por semana, incluindo o António Pedro Costa, está o investigador Teófilo Braga, professor no ensino secundário, natural de Vila Franca do Campo, com temas curiosos e que despertam a atenção dos regionalistas que se interessam pelas plantas, animais e a natureza em geral, a sua terra, bem assim como da biografia das pessoas que , a vários níveis, se têm destacado no âmbito das suas profissões . É impressionante o número de trabalhos de levantamento históricos, literários e outros que o ainda jovem Teófilo Braga, de quem me dizem os vilafranquenses ser um homem respeitado e admirado, tem publicado na imprensa micaelense, nomeadamente, no jornal Correio dos Açores . Semanas há que, da sua pena brotam dois e mais artigos publicados no diário, fundado por José Bruno Carreiro, todos eles com impacto no interesse dos seus leitores particularmente, aqui neste pedaço do mosaico da diáspora que é a Nova Inglaterra.
Da mesma terra de origem de Teófilo Braga, no cenário do nosso convívio do café da manhã no Dunkin Donuts, também propriedade do vilafranquense do António Arruda, a tertúlia sempre atenta à actualidade da terra de origem, fala sobre os acontecimentos nesse convívio , por nós denominada , “revista da imprensa”. O nome de Teófilo Braga, colaborador do Correio dos Açores, tem sido mencionado e referido com encómio os seus trabalhos publicados, especialmente pelos seus patrícios e leitores Gabriel Melo, natural de Ponta Garça e Manuel Brum, ainda aparentado com o jornalista, que é natural da Ribeira Seca de Vila Franca do Campo. Curiosamente, estes dois indivíduos são pessoas muito interessadas no estudo da Historia, açoriana, portuguesa e universal e ambos são possuidores de uma privilegiada memória particularmente no que concerne a historia da antiga capital micaelense. O Brum e o Melo são duas inteligências que poderiam ter ido longe, se no tempo devido tivessem sido potencializadas.
O Brum, num desses dias surpreendeu-nos com uma foto que vai “espantar” o jornalista Teofilo Braga, quando nos mostrou um instantâneo da família, com um fundo do que foram talvez os primeiros livros da biblioteca do “primo Teófilo” . Na foto para além da mãe e tias do Teófilo Braga, está o seu avô, um homem respeitado respeitador do lugar Ribeira Seca de Vila Franca do Campo.
Por seu turno, Gabriel Melo, natural da Ponta Garça, antigo empregado num Posto de recolha de leite conheceu o “tio Soares” na Ribeira Seca e lembrou-se de umas quadras dedicadas ao avô do Teófilo, por uma conhecido poeta popular daquele lugar de Vila Franca do Campo, um tal José Lopes. Dizia assim as quadras em questão:
Dá mais algumas passadas,
Se te queres fazer forte,
Tens já as mãos arroxadas,
É o primeiro sinal da morte!
A quadra não caiu bem no humor do “tio Soares” e este deixou de saudar o repentista Lopes, uma vez que, “tinha desejado a sua morte” .
Mais tarde o velho “ti Lopes” para se redimir, como conhecia fisicamente bem o patrício Soares, atirou-lhe outra quadra, neste tom :
Deus é que tudo destina,
E destina sem enganos,
Homem de canela fina,
Dura até aos cem anos ...
E deste modo, o “tio Soares” reconheceu a velha amizade e fizeram-se as pazes.
De certo que o T. Braga, desconhecia este episódio em que o seu avô protagonizou e cujas quadras ainda perduram na mente de muitos habitantes do concelho de Vila Franca do Campo, como é o caso do Gabriel Melo, uma memória fora do vulgar que, para alem de saber estórias e muita historia universal, conhece biografias de grandes vultos universais, como até conhece a obra de Pessoa e estrofes dos Lusíadas como poucos da sua geração. Já aqui falámos desses dois homens de Vila Franca, Brum e Melo.
Este despretensioso texto foi concebido, principalmente, para surpreender o Teófilo Braga e para lhe dizer que há nestes lados do Atlântico muita e muita boa gente que lê os seus apreciados escritos.

Fonte: https://www.correiodosacores.info/index.php/opiniao/27690-a-constancia-de-dedicados-jornalistas

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Parque Pedagógico Recreativo Infantil Maria das Mercês Carreiro


Parque Pedagógico Recreativo Infantil Maria das Mercês Carreiro

“Os povos civilizados dependem demasiado da página impressa. Eu voltei-me para o livro do Grande Espírito, que é o conjunto da sua criação. Podeis ler uma grande parte desse livro estudando a natureza” (Tatanga Mani)

No passado dia 16 de junho, foi inaugurado, no Pico da Pedra, o Parque Pedagógico Recreativo Infantil Maria das Mercês Carreiro, uma área verde com cerca de 7 500 m2.

O espaço agora disponibilizado, pela Câmara Municipal da Ribeira Grande, à população do Pico da Pedra, sobretudo às crianças, e a todos os visitantes é a concretização de um desejo de Maria das Mercês Carreiro e dos seus filhos que fizeram a doação do terreno à referida autarquia.

Com uma ótima localização, no centro da freguesia e muito próximo da Escola do 1º Ciclo do Ensino Básico, o parque tem todas as condições para ser um precioso auxiliar a todos os docentes que queiram implementar ações de educação ambiental, estejam dispostos a livrar-se do ensino livresco e não tenham qualquer receio em derrubar os muros das salas de aula.

Não me vou alongar com referências às denominadas zonas pedagógicas, mas de entre elas destaco o anfiteatro ao ar livre que poderá ser aproveitado para aulas, realização de ações de sensibilização, apresentação de pequenas peças de teatro, atuação de grupos musicais, etc.

Numa visita, muito rápida, que fiz ao parque no dia da sua inauguração identifiquei cerca de 30 espécies de plantas diferentes pelo que o mesmo poderá ser, com algumas medidas a serem implementadas, um pequeno jardim botânico, onde para além da conservação de várias espécies, como as endémicas dos Açores, poderá ser feita a sensibilização e consciencialização para a importância das plantas para a vida humana e para os ecossistemas.

Para a formação dos visitantes e sobretudo dos picopedrenses é importante fornecer informação sobre o que os mesmos observam. Assim, sugiro que a Câmara Municipal da Ribeira Grande faça a identificação das espécies vegetais presentes com uma pequena placa com a indicação do nome científico, do nome comum, da família e da origem geográfica de cada planta. Se para a identificação será necessária a colaboração de um especialista, pelo menos para algumas espécies, pelo menos numa primeira fase as placas poderiam ser pintadas pelos alunos da Escola António Augusto da Mota Frazão.

Sobre as plantas presentes no parque, destaco a ideia acertada de manter algumas das já existentes no terreno, como os eucaliptos, os incensos, os louros, as acácias, as anoneiras e os araçazeiros e de introduzir várias espécies da flora primitiva dos Açores, como a urze, que foi usada para fazer vassouras e em tinturaria vegetal para obtenção do verde, o folhado, cuja madeira era usada no fabrico de alfaias agrícolas, a faia-da-terra, que foi muito usada em sebes e em tinturaria para a preparação de uma coloração amarela, chegando a sua madeira a ser utilizada para produzir um carvão medicinal usado como adsorvente de gases do estomago e intestinos, o azevinho, cuja madeira foi usada em obras de marcenaria e o cedro-do-mato, considerado a mais nobre “essência dos bosques dos Açores”, que foi utilizado pelos antigos na construção de igrejas, conventos e barcos e na tinturaria vegetal para obtenção do cinzento-escuro.

Entre as espécies introduzidas mais recentemente destaco a presença da estrelícia, oriunda da Árica do Sul, do ginko, um fóssil vivo de origem chinesa que é “símbolo de paz e longevidade por ter sobrevivido às explosões atómicas do Japão” e do dragoeiro, oriundo dos arquipélagos da Madeira e das Canárias.

Por último, uma chamada de atenção para uma bonita planta ornamental, a sevadilha, originária da Região Mediterrânea, que é muito comum entre nós em bermas das estradas, jardins de casas e em recreios de escolas mas que é extremamente venenosa tanto para o homem como para os animais.

Os meus parabéns à família e à autarquia que tornaram possível a concretização de um sonho.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31258, 21 de junho de 2017, p.16)

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Luís Leitão, Pestalozzi e os animais


Luís Leitão, Pestalozzi e os animais

No texto de hoje, volto a recorrer à Revista Pedagógica, criada e dirigida por Maria Evelina de Sousa, no século passado, e a um dos colaboradores daquela publicação, Luís Leitão que no nº 241, de 28 de novembro de 1912, deu a conhecer aos leitores o texto “Animais e Crianças”.

No seu texto, Luís Leitão, depois de referir que em Siracusa um mestre-escola havia defendido que a melhor forma de “adoçar o caracter das crianças duras e grosseiras “ seria através do “despertar nelas o apreço pelos animais”, afirmou o seguinte: “Que beleza não era para todos nós se cada professor primário destinasse uma hora de cada semana para falar com os seus discípulos em assuntos que os prendessem com os animais em geral”.

Esta sugestão de solicitar aos professores alguns minutos semanais para uma sensibilização para a defesa dos direitos dos animais foi uma das primeiras medidas da Sociedade Micaelense Protetora dos Animais de Alice Moderno e de Maria Evelina de Sousa.

No texto que vimos referindo, Luis Leitão menciona o nome de Johann Heinrich Pestalozzi (1746 - 1827), um pedagogo e educador nascido na Suíça, que segundo alguns autores antecipou algumas conceções que surgiram mais tarde, no final do século XIX e inicio do século XX, com o Movimento da Escola Nova.

Pestalozzi, que era “o mais alto espírito de quantos se têm dedicado a estudar a alma das crianças”, segundo Luís Leitão, defendeu “que era preciso desenvolver nas crianças, desde a idade mais tenra a bondade e a compaixão para com os animais, porque é com eles que a criança está mais em contato. Tornado adulto, acrescenta o grande pedagogo, exercerá para com os seus semelhantes os mesmos sentimentos que tiver cultivado para com os seres inferiores”.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31257, 20 de junho de 2017, p. 11)

terça-feira, 13 de junho de 2017

Trabalho de projeto no ensino da Química



Trabalho de projeto no ensino da Química

Se não me falha a memória, a primeira vez que ouvi falar em trabalho de projeto foi através da leitura do texto “Projeto é projétil”, publicado na revista Raiz e Utopia, nº 9/10, relativa à Primavera-Verão de 1979, que adquiri na Horta, durante a semana do mar de 1984.

O texto em questão, da autoria de Luísa Cortesão, Manuela Malpique, Maria Amélia Torres e Maria de Jesus Lima, membros de uma equipa de formação de formadores, relata uma experiência implementada em 1977, apresentando as várias etapas de um trabalho daquele tipo.

Para as autoras, o trabalho de projeto “consiste fundamentalmente numa atividade a desenvolver em equipa, durante a qual se procura tratar um problema – que tenha real interesse para o grupo e que, sendo embora relacionado com a profissão, tenha as suas raízes na envolvente social”.

Embora seja uma proposta pedagógica antiga, o trabalho de projeto tem sido pouco usado nas escolas, podendo segundo Bernardino Lopes (2004) ser aplicado a qualquer nível de ensino. O autor mencionado corrobora a afirmação das autoras citadas anteriormente no que diz respeito ao facto de um trabalho de projeto partir de um problema e acrescenta que para o mesmo “se pretende obter uma resposta (sob a forma de produto, serviço, etc.) com relevância científica e/ou tecnológica e/ou social e destinada a um público-alvo”.

O Movimento da Escola Moderna, que na ilha de São Miguel vem, desde o ano letivo passado, organizando Sábados Pedagógicos abertos a todos os profissionais de educação, possui um modelo pedagógico assente em vários postulados de que destaco os seguintes:

1- O conhecimento constrói-se pela consciência do percurso da sua própria construção: os alunos caminham dos processos de produção integrados nos projetos de estudo, de investigação ou de intervenção, para a compreensão dos conceitos e das suas relações;

2- Os alunos partem do estudo, da experiência e da ação nos projetos em que se envolvem, para a sua comunicação. A necessidade de comunicar o processo e os resultados de um projeto de trabalho dá sentido social imediato às aprendizagens e confere-lhes uma tensão organizadora que ajuda a estruturar o conhecimento.

O trabalho de projeto é uma das técnicas ou melhor estratégias, segundo Pedro Gonzalez (2003), usadas pelo MEM para materializar as suas propostas pedagógicas.

Como tenho participado nas ações de formação do MEM, decidi implementar o trabalho de projeto, numa turma do 7º ano de escolaridade da Escola Secundária das Laranjeiras, com o objetivo de abordar o seguinte conteúdo: Separação das substâncias de uma mistura.

Os alunos tiveram liberdade de escolher com quem trabalhar, tendo-se formado vários grupos de dois elementos e um grupo com três. A cada grupo foi colocada uma questão inicial/problema a resolver, como por exemplo, como separar uma mistura de água e azeite ou como separar uma mistura de areia e sal.

Depois de uma resposta inicial com recurso aos conhecimentos que já possuíam, tiveram que fazer uma pesquisa bibliográfica e depois desta realizaram o trabalho experimental necessário para resolver o problema.

Depois de concluírem o trabalho de laboratório, elaboraram um relatório final, onde registaram a técnica usada, o material utilizado e o procedimento experimental.

Por último, apresentaram oralmente o seu trabalho aos restantes membros da turma e fizeram a sua auto e heteroavaliação.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31253,14 de junho de 2017,p.19)

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Reclus e os animais



Reclus e os animais

O meu interesse em conhecer melhor as várias correntes da pedagogia e as várias publicações que ao longo dos tempos as divulgaram fez com que esteja a ler a “Revista Pedagógica”, criada e dirigida por Maria Evelina de Sousa, que se publicou no início do século passado.

Através de um texto, de Luís Leitão, intitulado “Nós perante os animais”, publicado no número 298, de 24 de setembro de 1915, tomei conhecimento de alguns pensamentos do famoso geógrafo anarquista francês Jean Jacques Élisée Reclus (1830-1905) sobre os animais e o seu relacionamento com os humanos.

De acordo com Luís Leitão, Reclus terá afirmado que “o homem recebeu da ave essa prenda inestimável que é a noção da beleza e mais ainda a da criação poética” e acrescentado: “ Como poderia ele esquecer a calhandra que se lança no espaço infinito soltando gritos de júbilo ou o rouxinol que durante as noites silenciosas enche o bosque com as modulações ardentes ou melancólicas do seu canto?”

A leitura de um texto de Reclus intitulado “A grande família” merece uma reflexão, pois apesar dos progressos materiais alcançados pelas sociedades modernas, se queremos ser mais humanos devemos aprender com os bons exemplos do passado e das culturas que muitas vezes consideramos inferiores. Sobre este assunto Reclus escreveu: “Enquanto em relação aos animais, nós falamos hoje em dia de educação ou domesticação no sentido de escravidão, o primitivo pensava fraternalmente na associação. Ele viu nestes seres companheiros, e não servos, e de facto as criaturas – cães, pássaros, serpentes –, vinham de encontro a ele em caso de perigo comum, especialmente em tempos de tempestade ou inundação.”

Reclus, no texto referido, também se debruça sobre a domesticação dos animais, escrevendo que aquela “atesta também em muitos aspetos uma genuína deterioração moral, pois, longe de melhorar os animais, nós os enfeiamos, vilipendiamos e corrompemos “ e acrescenta o seguinte: “Mesmo quando domesticaram os animais sob as melhores condições, eles diminuíram sua força de resistência à doença, sua capacidade de adaptação a novos meios, fazendo deles seres artificiais, incapazes de viver espontaneamente na natureza livre.”

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31252, 13 de junho de 2017, p.12)

quinta-feira, 8 de junho de 2017

“A República” e Ferrer Y Guardia




“A República” e Ferrer Y Guardia

“O verdadeiro educador é aquele que, às vezes até mesmo contra as suas próprias ideias e vontades, apoia a criança e o desenvolvimento de suas energias.” (Ferrer y Guardia)

Francisco Ferrer y Guardia (1859-1909) foi um pedagogo libertário espanhol criador da Escola Moderna que foi fuzilado em 12 de outubro de 1909, acusado, injustamente, de ter instigado uma insurreição operária em Barcelona, em julho daquele ano.

O assassinato de Ferrer y Guardia foi condenado em todo o mundo, não só pelas pessoas e organizações que possuíam a mesma ideologia, mas também por todos os que defendiam ideias humanistas e progressistas.

Em texto anterior, publicado neste jornal no dia 22 de outubro de 2014, mencionei algumas reações à sua morte publicadas nos seguintes jornais de São Miguel: “Vida Nova”, de Francisco Soares Silva, “A Folha”, de Alice Moderno e “O Repórter”, de Alfredo Câmara. Hoje, darei a conhecer o conteúdo de alguns textos publicados no jornal “A República” que tal como os anteriores se publicou em Ponta Delgada.

Em novembro de 1911, “A República” noticiou a inauguração de um monumento de homenagem ao “mártir da liberdade de pensamento”, Francisco Ferrer, na Praça de Santa Catarina na cidade de Bruxelas.

Em março de 1912, numa pequena nota intitulada “A reação protestou” o autor, a propósito da entrega dos livros de Ferrer aos seus legítimos herdeiros escreveu o seguinte:

“Olha a novidade! Pois o que havia de fazer se não protestar?

O que ela queria, era que os livros fossem queimados, e que a luz que d’eles possam receber os que os lerem, fosse apagada para não mais brilhar.

Mas que importa que a reação proteste, se o facho da Verdade e da Liberdade vai iluminando quase todo o mundo?

Para crime bem bastou a morte de um homem; ainda lhe queriam matar a obra.”

Em junho de 1913, o jornal publica um extrato de um discurso do “pai do socialismo” em Espanha, Pablo Iglésias (1850-1925), onde este depois de afirmar que ainda que Ferrer fosse responsável pela Semana Trágica de Barcelona seria “politicamente inábil matá-lo porque representava e simbolizava grandes elementos de opinião”. No mesmo discurso Iglésias afirmou o seguinte:

“Mas o mais monstruoso é que o mataram, como sendo o caudilho d’uma revolução, caudilho que de facto não foi. Não puderam nunca demonstrá-lo. Dizeis que se cumpriu a lei; pois se se tratou de um assassinato e se este se fez em nome da lei, essa lei é monstruosa”.

No mesmo mês, o jornal noticiava a morte de Paz Ferrer, filha do “imortal mártir de Montjuich” que sofreu muito com a morte do seu pai de tal modo que o autor do texto escreveu : “…Depois da morte de seu pai, o desespero tornou-a ainda maior, e na idade em que só há sorrisos e flores ela conheceu as inenarráveis amarguras da Dor. Esse seu desespero matou-a. Pobre Paz Ferrer! Foi vítima do crime que matou o pai!”

Hoje, com a escola a atravessar uma grande crise, com os governantes a tentar implementar reformas atrás de reformas, projetos atrás de projetos importa estudar todas as experiências educativas, nunca esquecendo que não se consegue sucesso na escola numa sociedade de sucesso para muito poucos.

O projeto pedagógico de Ferrer y Guardia, que teve a primeira concretização em 1901 com a criação da primeira escola moderna, numa altura em que em Espanha a taxa de analfabetismo era superior a 50%, é um dos que deve merecer a atenção por parte de quem se preocupa em deixar uma melhor sociedade para os vindouros.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31248, 8 de junho de 2017, p.15)

terça-feira, 6 de junho de 2017

Maria Evelina de Sousa e a Sociedade Micaelense Protetora dos Animais


Maria Evelina de Sousa e a Sociedade Micaelense Protetora dos Animais

Penso não estar errado ao afirmar que embora Maria Evelina de Sousa tenha abraçado várias causas a que terá tido mais importância em termos sociais foi a da educação, quer através da sua profissão de professora, quer através da direção da Revista Pedagógica.

A outra grande causa a que ela se dedicou foi a da proteção animal, através dos textos que publicou em vários periódicos, como a Revista Pedagógica ou o Correio dos Açores, e através do seu trabalho na SMPA- Sociedade Micaelense Protetora dos Animais de que foi uma das fundadoras, em 1911.

Maria Evelina de Sousa foi a autora dos estatutos da SMPA, tendo para a sua elaboração usado como “modelo os estatutos da Sociedade Protetora dos Animais de Lisboa”. Sobre as diligências para a criação da SMPA, Maria Evelina de Sousa lamentou, na Revista Pedagógica de 6 de outubro de 1910, o facto de ter suspendido os trabalhos para a sua concretização “por falta de coadjuvação da parte dos restantes membros da comissão”.

Depois de um período de alguma inatividade da SMPA, foi criada, em 1931, uma comissão que teve por missão a sua reorganização. Maria Evelina de Sousa foi um dos membros da comissão que desenvolveu esforços para a eleição de uma nova direção e para o estudo dos meios a usar para intensificar a proteção aos animais.

Para além de ter sido o braço direito (e o esquerdo) de Alice Moderno, em muitas ocasiões foi Maria Evelina de Sousa a porta-voz da SMPA, tendo também feito parte dos seus órgãos sociais. A título de exemplo, mencionamos a sua eleição para suplente da Presidente da Direção, nos anos de 1934 e 1935, e para tesoureira, no ano de 1936.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31247, 7 de junho de 2017, p.13)

segunda-feira, 5 de junho de 2017

Touradas à corda e festas (religiosas)


Touradas à corda e festas (religiosas)


Todos os anos a bola de neve cresce, isto é a lista de touradas tradicionais vai aumentando o que prova que nas ilhas Terceira, Graciosa e São Jorge, a indústria tauromáquica tem sido bem-sucedida no seu intento de ganhar dinheiro à custa do desrespeito pelos direitos dos animais e da deseducação das pessoas que desde a mais tenra idade são obrigadas a assistir a touradas, acabando por a elas se habituar.

O sucesso do negócio não seria possível sem o apoio hipócrita dos fundos europeus e dos governantes e autarcas da região que apoiam ganadarias e touradas associadas a festas, religiosas ou não.

Como se não bastassem os apoios monetários há legislação nacional e regional que regula a tortura tauromáquica. No caso das touradas à corda, há legislação que define o que é uma tourada tradicional, que é a que “realizando-se na mesma data, na mesma área territorial, estando ligada a uma festividade da freguesia onde se realiza e sendo organizada exclusivamente por entidades cujo eventual fim lucrativo contribui, do modo direto, para essa mesma festividade”.

Atendendo a que a maioria das festas realizadas nos Açores são religiosas não é difícil associar as touradas à corda àquelas festas, sobretudo na ilha Terceira que é onde a indústria tauromáquica tem maior implantação.

O que não se pode afirmar é que haja uma associação perfeita entre touradas e religião e que sobretudo é uma característica açoriana a realização de touradas à corda associadas às irmandades do Espírito Santo. Com efeito, tal quase só acontece na ilha Terceira que é um verdadeiro inferno para os bovinos e na Graciosa e São Jorge, ilhas onde os tentáculos da indústria tauromáquica são maiores.

A provar o que afirmámos, basta os leitores consultarem o jornal “Angrense” que se publicou entre Setembro de 1836 a Setembro de 1910, para constatarem que nem todas as festas do Espírito Santo, que se realizavam na ilha Terceira, eram acompanhadas por touradas à corda, havendo noutras touradas de praça para angariação de fundos.

A leitura de um texto publicado no jornal, angrense, “Primeiro de Maio”, no dia 6 de setembro de 1902, desmascara todas as patranhas que são hoje divulgadas pelos defensores das touradas à corda.

No início do século passado o número de touradas era muito menor do que o atual como se pode ler no seguinte extrato:

“No meu tempo, eram consideradas clássicas três touradas: São João de Deus, Serreta e Terra Chã.

Depois a pretexto d’isto e daquilo, anunciava-se uma tourada à corda; mais tarde a política tanto esticou a corda, que esta trouxe o bravo até ao centro da cidade.”

Sobre a ligação entre as festividades religiosas e as touradas o autor, depois de afirmar que touros só havia na festa da Serreta acrescenta:

“Depois veio a festa da Senhora de Lourdes, nos Altares, …etc. etc. de modo a que cada Senhora arranjou a sua festa e o bom povo da localidade, como complemento e suplemento, a iluminação da véspera, a respetiva ladainha, e, na segunda-feira a competente tourada.

E assim ficou subentendido que à festa religiosa se devia aliar …a dos touros, e o povo que pagava as primeiras, impôs-se, e as segundas vieram, como parte obrigatória, a despeito de muitos ralhos de algum prior refratário à inovação de se misturar o sagrado com o profano.”

Depois, os políticos populistas viram nas touradas uma oportunidade para caçar votos e passaram a oferecê-las aos eleitores, previamente deseducados, como terá acontecido no passado na Ilha Terceira e mais recentemente na ilha de São Miguel pela mão de dois ex- presidentes de Câmara e por um candidato a tal que acabou por ser eleito.

O autor citado, relativamente à ilha Terceira, sobre o assunto escreveu: “Depois as lutas eleitorais, os melhoramentos iniciados em qualquer freguesia começaram também a pedir a parte obrigada de touros à corda.”

Algures nos Açores, 4 de junho de 2017
J. Ormonde