quinta-feira, 23 de maio de 2019

A propósito de Simplício Gago da Câmara


A propósito de Simplício Gago da Câmara

Através da leitura do livro “Alguns aspectos de intervenção humana na evolução da paisagem da ilha de S. Miguel “Açores” da autoria do arquiteto paisagista José Marques Moreira, especialista em plantas ornamentais e uma referência como pedagogo, tomei conhecimento de que associado aos nomes de José do Canto, António Borges e José, Jácome Correa está Simplício Gago da Câmara, morador em Vila Franca do Campo, como responsáveis pela grande introdução de exóticas na ilha de São Miguel.

De acordo com Marques Moreira, a introdução referida ocorreu sobretudo a partir de 1853, mas enquanto os primeiros adquiriram as espécies, “originárias da América Central, ilhas do Pacífico, das costas Africanas, da Austrália e da Nova Zelândia”, em viveiristas de França, Bélgica e Inglaterra, Simplício Gago da Câmara mandava-as vir diretamente da Austrália.

Muito conhecidos José do Canto, António Borges, José Jácome Correa sobretudo pelos jardins que deixaram, Simplício Gago da Câmara é quase desconhecido da maioria das pessoas, pelo que importa recordar alguns aspetos da sua vida.

Simplício Gago da Câmara, proprietário rico e aventureiro que foi para a Austrália para explorar ouro, nasceu em Ponta Delgada a 19 de maio de 1808 e faleceu na mesma cidade a 7 de agosto de 1888.

A ida para a Austrália para explorar jazigos de ouro destinava-se, segundo o seu trineto José Gago, a fazer fortuna para “obter os meios de estabelecer novas indústrias e desenvolver a sua terra natal”. Se é certo que a exploração de ouro foi um fracasso, não é menos certo que o tempo em que Simplício Gago da Câmara esteve na Austrália permitiu que ele, apaixonado pela História Natural, observasse e estudasse a fauna e a flora locais, ao mesmo tempo que já selecionava as espécies da flora australiana que poderia levar para São Miguel.

Depois de ter ganho algum dinheiro como barbeiro e hortelão na Austrália, Simplício Gago da Câmara regressou a São Miguel trazendo consigo plantas e ou sementes de eucaliptos, acácias e araucárias.

De acordo com José Gago, Simplício Gago da Câmara oferecia às centenas ou aos milhares as plantas que obtinha nos seus viveiros localizados no prédio do Convento, em Vila Franca do Campo, e ele próprio plantava em matas em São Brás e na Fajã do Calhau. Para além das espécies já referidas, Simplício Gago da Câmara plantou, em terrenos localizados por cima da Gorreana, pinheiros, giestas e criptomérias.

Outra aventura em que se meteu e que se traduziu em mais um fracasso foi a da pesca do bacalhau. Com efeito, tentando introduzir a pesca do bacalhau nos Açores, em vez de comprar um navio no continente decidiu aproveitar as madeiras que possuía nas suas matas mandando construir um barco no Porto Formoso. Tendo partido para a Terra Nova, onde a pesca foi proveitosa, acabou por perder quase todo o bacalhau apanhado ao trazê-lo para Vila Franca do Campo para o secar.

Em termos de participação cívica, Simplício Gago da Câmara esteve ligado à Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense que teve como principal dinamizador o seu primo José do Canto, à Santa Casa da Misericórdia de Vila Franca do Campo e à Associação das Escolas Móveis.

Agricultor, sendo produtor de vinho e produtor e exportador de laranja, Simplício Gago da Câmara foi membro da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense, tendo sido secretário da comissão vinícola.

Dirigiu com sucesso durante quatro anos a Santa Casa da Misericórdia de Vila Franca do Campo, tendo, entre outras iniciativas, contratado dois médicos. Apesar disso, tal não impediu que viesse a ser vítima de uma “demissão injusta e violenta”.

Simplício Gago da Câmara, generoso como era, foi um dos principais contribuintes da Associação das Escolas Móveis.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31835, 24 de maio de 2019, p. 16)

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