terça-feira, 31 de maio de 2016

ULMEIRO


ULMEIRO

A meados do passado mês de maio, estive em Lisboa e como é habitual voltei a fazer o meu roteiro por algumas livrarias da capital à procura de livros que não chegam cá, por serem provenientes de pequenas editoras, de livros que já não se encontram à venda, porque há muito se esgotaram e só é possível encontrar em alfarrabistas, e de livros que pela sua temática não são vendidos pelas grandes distribuidoras comerciais.

Ao contrário do que tem acontecido em anos anteriores em que as primeiras livrarias visitadas são as que se situam na Baixa de Lisboa, na zona do Chiado, este ano a minha primeira visita foi à Livraria Ulmeiro, na Avenida do Uruguai, onde tive a oportunidade de trocar breves palavras com o seu dono e onde passei algum tempo à procura de publicações sobre os Açores, sobre o Estado Novo e sobre os primeiros anos a seguir ao 25 de abril de 1974.

Através da internet, a Livraria Ulmeiro costuma fazer leilões de livros e aproveitei a visita para pagar e levantar alguns dos livros que havia adquirido anteriormente através deste processo de venda.

Um dos livros adquiridos foi “Açores: Do 25 de abril até aos nossos dias”, da autoria de um grupo de estudantes açorianos, alunos do Instituto Superior de Economia de Lisboa, editado, em 1977, pela Cooperativa Livreira Editorial e Cultural Arma Crítica.

Hoje, o livro que pretendia “transmitir o máximo de informações que permitam perceber com rigor e uma visão de conjunto os problemas que hoje se põem quanto ao futuro do Arquipélago” e que ambicionava preencher uma lacuna já que segundo os autores, há alguns anos não se publicava “um livro de fundo sobre o Arquipélago dos Açores”, está completamente desatualizado mas continua a ser de consulta obrigatória para quem quiser conhecer um pouco mais alguns dados estatísticos e as movimentações políticas que ocorreram no período conturbado que se seguiu ao 25 de abril de 1974.

Outro livro que adquiri foi “Katafaraum é uma nação” da autoria de José Martins Garcia, picoense que foi biógrafo de Vitorino Nemésio e que, segundo Beja Santos, dominou “diferentes modos e géneros discursivos: romance, conto, poesia, dramaturgia, ensaio e crítica”, editado, em 1974, pela Assírio e Alvim.

Este livro, ainda segundo Beja Santos, “foi encarado como um ajuste de contas com professores universitários, ousadia que lhe terá custado a carreira universitária em Lisboa. Segundo ele escreve em 28 de Abril de 1974, katafaraum ocorreu-lhe depois de ter assistido ao I Encontros dos Professores de Língua e Literatura Portuguesa onde, segundo ele, foram apresentadas algumas das mais ridículas bacoradas que algum mortal pôde escutar”.

Este livro não perdeu atualidade apesar do tempo decorrido desde a sua publicação. Se a guerra colonial já pertence ao passado, mas não pode cair no esquecimento, as formações de professores continuam e com menos interesse do que no passado recente, quando existiam os Centros de Formação de Escolas.

Para aguçar o apetite, a docentes e não só, abaixo transcreve-se um excerto da crónica

“Katafaraum ou o método da docência”.
“Eis algumas regras docentes:
1- O docente é filho da docência e não deve pugnar contra natura.
2- O saber ocupa lugar e o docente não deve ter a casa a abarrotar.
3- A felicidade é o equilíbrio entre o ter e o não dar.
4- Uma casa bem imaginada vale por duas construídas.
5- O método cura as dores estomacais.
6- O método só irrita os mal nascidos.
7- O método nunca sai sem chapéu.

A minha visita não terminou sem uma festinha ao gato mais fotografado de Lisboa, o Salvador. que é também a mascote da livraria.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 30947, 1 de junho de 2016, p.12)

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