domingo, 23 de outubro de 2016

ONGA: VOLUNTARIADO E LIDERANÇA




ONGA: VOLUNTARIADO E LIDERANÇA


Síntese - Um dos temas que tem sido aflorado, nas aulas de Educação Ambiental em Contextos Diferenciados, é o da liderança. Dada a importância desta temática, quer quando se fala em educação ambiental, quer no funcionamento das Organizações Não-Governamentais de Ambiente, optei por apresentar um breve texto de reflexão, que tem por base a minha participação como voluntário em diversas associações privadas sem fins lucrativos e uma revisão bibliográfica.

Nas ONGAS- Organizações Não Governamentais de Ambiente, associações sem fins lucrativos, que, quanto a mim, deverão manter a sua independência dos poderes económico e político, os seus membros devem ser este garante e suporte, quer através da disponibilização do seu trabalho, em regime de voluntariado, necessário para o seu funcionamento democrático e implementação das suas actividades, quer para a participação pública e representação institucional da mesma (Nave e Fonseca, 2000).

A aprovação da Lei das Associações de Defesa do Ambiente (1987) e da Lei das ONGA (1998), fez com que as associações passassem a ser consideradas parceiros sociais, sendo ouvidas na definição das políticas públicas do ambiente (Nave e Fonseca, 2000). A institucionalização das associações, por via da legislação referida, abriu as portas. a algumas delas, para uma maior participação e visibilidade pública, levando em alguns casos ao seu crescimento e profissionalização. Por outro lado, a ausência de tradição de intervenção dos cidadãos na resolução dos problemas com se debate quotidianamente a sociedade portuguesa, em geral e a açoriana, em particular, aliada ao peso tutelar do Estado, levou a que a institucionalização das associações criasse “mecanismos de agrilhoamento”, para além de ter feito com que algumas delas passassem a viver na dependência de subsídios estatais (Nave e Fonseca, 2000 e Eloy, 1994).

A dependência das associações de apoios do Estado, levou a que a nível nacional houvesse uma cisão na Quercus, levando a que o grupo fundador daquela associação criasse o Fapas (Fundo de Apoio à Protecção de Animais Selvagens) (Eloy, 1994). A nível regional, a dependência levou, a alguma instrumentalização das principais associações por parte da Secretaria Regional do Ambiente, veja-se o caso dos Amigos dos Açores e dos Montanheiros que ao celebrar protocolos com aquele departamento governamental para a gestão de ecotecas foram “obrigadas” a ter ao “seu serviço” diversos profissionais para a implementação de um plano de actividades e de um orçamento que lhes é imposto e, muito recentemente, ao fecho da sede da Quercus de São Miguel.

Outras questões que estarão associadas à dependência estatal, será a falta de reflexão no seio das associações, acerca do papel do associativismo na sociedade de hoje, sobre o que se pretende com a educação ambiental, etc., e o não investimento “num dos seus maiores bens intangíveis – os voluntários” (Gomes, 2007, p. 35).

Com o trabalho voluntário, ganham os voluntários, em termos de desenvolvimento pessoal, maior estabilidade emocional e aumento das suas amizades ao contactar com outras pessoas e beneficiam as associações que podem fortalecer “os programas e serviços existentes da mesma forma que permite que novos talentos, habilidades e conhecimentos sejam adquiridos” (Gomes, 2007, p. 37).

Segundo Ducker (2006), citado por Gomes (2007): “uma das grandes forças de uma organização sem fins lucrativos é que as pessoas não trabalhem nela para viver, mas por uma causa, logo isso cria na instituição, através da sua liderança, a responsabilidade de manter viva essa chama e não permitir que o trabalho se torne um emprego”(p. 40).

Mas, o que se entende por liderança?

São várias as definições existentes. Para Davis (1967), citado por Bertrand e Guillemet (1994) liderança é “a habilidade para persuadir os outros a prosseguir com entusiasmo os objectivos estabelecidos. É o factor humano que reúne um grupo e o motiva para as intenções […] É, enfim o que permite transformar em sucesso o potencial de uma organização e dos recursos humanos” (p.173). Opinião semelhante é a defendida por Motta (1988), citado por Ceroni (2005) que a define como “o processo no qual um indivíduo influencia outros a se comprometerem com a busca de objectivos comuns” (p.55).

Embora, numa organização, todos tenham capacidade de influenciar os outros há sempre quem exerça mais influência do que receba, são estas pessoas que são designadas de líderes (Bertrand e Guillemet (1994). Estes, de acordo com Ceroni (2005), deverão ter “capacidade de saber ouvir, alinhavar ideias, questionar, inferir, traduzir posições e sintetizar uma política de acção com o propósito de coordenar eticamente o processo efectivo de responsabilidade social” (p.55). Para além destas características, Bertrand e Guillemet (1994) referem ainda outras duas que considero muito importantes: a capacidade para delegar tarefas e “a aptidão para se fazer respeitar e estimar na organização e fora dela” (p. 176).

Outra questão importante, que merece ser abordada neste trabalho, relaciona-se com os diversos estilos de liderança.

Embora não existam estilos puros, isto é uma mesma pessoa pode ter mais do que um estilo de liderança, pode utilizar um estilo ou outro consoante a equipa de trabalho ou pode variar de estilo em face das circunstâncias (motivação da equipa, por exemplo) nem haja nenhum estilo que seja o mais adequado para todas as situações, o estilo de liderança depende das características pessoais dos lideres. (UOI-FEUP, s/d).

Muitas são as tipologias de estilos de liderança, neste trabalho apresenta-se, sucintamente, a atribuída a White e Lilliput que consideram existir três estilos de liderança: autoritária, liberal (“deixa-andar”) ou democrática (UOI-FEUP, s/d e Bertrand e Guillemet, 1994).

Enquanto o líder autoritário ao definir todas as políticas, ao fixar as tarefas a efectuar por cada um e ao impor as equipas de trabalho, não deixa espaço para a criatividade, o líder liberal ao não impor quaisquer regras, dando total liberdade ao grupo, fomenta a confusão e a desorganização. Por último, o líder democrático ao partilhar com o grupo a participação nas decisões, promove o bom relacionamento e a amizade (UOI-FEUP, s/d e Bertrand e Guillemet , 1994).

Sabendo-se que uma das características da ONGAS dos Açores é manterem por décadas os seus órgãos de gestão, nomeadamente as presidências das direcções, veja-se o caso dos Montanheiros e dos Amigos dos Açores, seria de todo o interesse estudar a razão pela qual não há renovação, que estilos de liderança estão em causa, em que medida os mesmos são obstáculo a uma maior participação dos associados e se são ou não impeditivos do fomento do voluntariado.

Outra questão que gostaria de ver debatida é a levantada por Viegas (2004): “como é que as associações podem ter tantos efeitos cívicos e democráticos, quando apenas uma minoria se envolve nas associações, sendo ainda menor o número de indivíduos que participa de um modo activo?” (p.46)

Por último, deixo outra questão: sabendo-se que os contributos das associações para a deliberação democrática são fracos (Viegas, 2004), será que as alterações deverão passar, em primeiro lugar, pela renovação dos seus órgãos dirigentes?



Pico da Pedra, 19 de Janeiro de 2007










BIBLIOGRAFIA


BERTRAND, Y., GUILLEMET, P., (1994). Organizações: Uma Abordagem Sistémica. Lisboa: Instituto Piaget.


CERONI, M., (2005), A Conduta Ética do Líder nas Organizações, Revista Eletrônica de Ética e Cidadania, v. 1, n. 1, p. 51-65, Data de consulta: http://www.mackenzie.com.br/universidade/teologia.


ELOY, A. (1994). O ambiente e o ordenamento do território, in Reis; A: (Eds.) Portugal, Vinte Anos de Democracia. Lisboa: Círculo de Leitores.

GOMES, P. (2007). O trabalho voluntário nas organizações não governamentais e a importância do líder educador, Scientia Una, nº 8, p.33-44. Data de consulta: 17de Janeiro de 2008, de http://www.praticanet.com/clientes/focca/revista_cientifica_8.pdf#page=33.


NAVE, J., FONSECA, S., (2000). Fenomenologia e Mobilização de Recursos das Organizações Não-Governamentais do Ambiente, Comunicação apresentada ao IV Congresso Português de Sociologia. Coimbra.


UOI-FEUP, (s/d), Liderança e Gestão de Equipas.Data de consulta: 16 de Janeiro de 2008, de http://paginas.fe.up.pt/~contqf/qualifeup/UOI/documents/Docs_Workshops_Formacao/Manual%20de%20Lideranca%20e%20Gestao%20de%20Equipas.pdf.

VIEGAS, J., (2004), Implicações Democráticas das Associações Voluntárias- o caso português numa perspectiva comparada europeia, Sociologia, Problemas e Práticas, nº 46, pp. 33-50.

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