segunda-feira, 20 de março de 2023

As plantas e a medicina popular no Pico da Pedra (1)

As plantas e a medicina popular no Pico da Pedra (1)

Em 1992, com a ajuda dos jovens do Programa OTL-J, apliquei um inquérito a algumas senhoras sobre as plantas usadas na medicina popular na freguesia do Pico da Pedra.

Através das respostas aos vários inquéritos fiquei a saber que eram cerca de 30 as plantas utilizadas no Pico da Pedra, sendo as principais o poejo, o funcho, o limoeiro (limão), a malva, o eucalipto e a arruda.

Antes de dar a conhecer a arruda, nomeadamente algumas características, propriedades e usos, quero deixar bem claro que o uso das plantas na medicina popular não é isento de riscos, pois algumas delas apresentam contraindicações e um perigo enorme é a confusão que existe na identificação das mesmas, pois plantas com propriedades terapêuticas diferentes apresentam o mesmo nome comum em localidades diferentes. Sobre o assunto, em 1955, o tenente-coronel José Agostinho escreveu que “o nome que numa terra pode indicar uma planta boa para remédio, pode noutra ser dado a uma planta que não tenha qualquer virtude ou até seja prejudicial”.

A arruda, cujo nome científico é Ruta chalepensis é uma das plantas mais usadas, nos Açores, quer na medicina popular quer associada a várias superstições. Este facto é comprovado pelo seguinte provérbio: “Eu sou a arruda, que sou a tua ajuda”.

A quadra popular, que a seguir se apresenta, mostra que se acreditava que a arruda era uma boa ajuda para “clarear a voz”:

Eu bem queria cantar alto,

Mas esta voz não me ajuda,

Vou esfregar a garganta

Com um raminho de arruda

O Dr. Carreiro da Costa, depois de referir que era possível encontrar a planta nos quintais de todas a povoações, menciona a ligação da arruda não só à medicina popular, como também a várias superstições. Assim, no nº 15 do Boletim da Comissão Reguladora dos Cereais do Arquipélago dos Açores, pode-se ler que “figueira, debaixo da qual se criem uns pés de arruda, dá pela certa os mais lindos e deliciosos figos que imaginar se possa” e mais adiante “galhos da mesma arruda presos ao pescoço das rezes as livra do mau-olhado”. E por último, “o fumo da arruda queimada sobre uma brasa viva imune as casas de maus-olhados e feitiços- e não só as casas como também as pessoas”.

Yolanda Corsépius (1997) aconselha manter alguns ramos da planta fresca nos locais onde se quer evitar a presença de ratos.

A arruda é um subarbusto de pequeno porte que pode atingir 60 cm de altura. As folhas são acinzentadas, segmentadas e fétidas. As suas flores são amarelas e pequenas.

Em 1894, Cândido de Abranches referia o uso da arruda para tratamento de padecimentos histéricos e uterinos, tomada em chá ou cheirando-a.

Em 2002, nas Sete Cidades, dizia-se que a arruda “tirava as dores do corpo e era boa para o estômago e vias urinárias”.

Nos questionários aplicados no Pico da Pedra, a arruda era usada em tisana ou numa solução em aguardente de vinho com macela (Chamaemelum nobile) para tratar problemas do estomago.

Pico da Pedra, 8 de março de 2023
Teófilo Braga

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