quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Cenas da Vida Escolar Marciana


Mia

No dia 8 de Dezembro de 2012 pelas dez horas e quinze minutos dirigi-me, em sonhos, ao anfiteatro de uma escola secundária marciana para assistir a uma ação de sensibilização sobre proteção dos animais, promovida pela lista W candidata às eleições para a Associação de Estudantes da referida escola.
Foi com muita satisfação que me desloquei à referida sessão pois normalmente, pelo menos nos últimos anos, as candidaturas aos órgãos sociais da referida associação de positivo nada fazem para a formação dos jovens estudantes.
Foi com muita atenção que comecei a assistir à apresentação de um PowerPoint por uma representante da APAM - Associação de Proteção dos Animais de Marte que se fez acompanhar pela Mia, uma simpática cadelinha que por ela havia sido adotada.
Embora soubesse que na sala estavam algumas turmas consideradas difíceis, nunca esperei assistir ao episódio que deve envergonhar todo o corpo docente e os órgãos de gestão da mencionada escola. Com efeito, enquanto a oradora convidada estava a fazer a sua apresentação foi interrompida três vezes pelo mesmo aluno que, ora fez uma pergunta provocatória, ora fez afirmações que tiveram por único fim boicotar a sessão.
Depois de ter sido informado de que as intervenções da assistência seriam feitas no fim, logo no início da apresentação surgiu a seguinte pergunta: “senhora, aquela cadela tem pulgas?”. Um pouco depois, veio uma afirmação provocatória: senhora, aquele ali já matou um cão”. Não satisfeito com as tolices pronunciadas, voltou à carga, tendo afirmado que outro colega havia colocado piripiri na “coisa” de uma gata.
Não consegui assistir a tantos disparates ou melhor a tanta malcriação e com muita pena minha, pois a apresentação estava a ser bastante interessante, saí da sala. Não sei se o aluno foi devidamente repreendido ou não, mas tudo leva a crer que tal não aconteceu. Com efeito se a um aluno que ameaçou uma docente com uma faca (também existem em Marte) a repreensão limita-se a um dia de suspensão (“férias” para ele), para o aluno mencionado neste texto possivelmente terá sido suficiente uma simples repreensão verbal ou então um elogio pelo facto de ele ter sido comedido nas suas intervenções.
Tenho fortes razões para acreditar que nada terá acontecido, pois noutra escola do hemisfério sul do referido planeta, segundo me disseram, os castigos são semelhantes. Assim, a um aluno que cortou os pneus a um robot de um professor o castigo foi uns dias de suspensão e a realização de um PowerPoint sobre a violência na escola.

Tudo doido varrido

Não sei o que se passa naquele planeta, mas um extraterrestre contou-me que, para além de estarem a nascer menos crianças, as que nascem, em número que parece que está a crescer exponencialmente, apresentam graves problemas do foro psicológico ou psiquiátrico ou outro qualquer, que não foi capaz de especificar pois não tinha conhecimentos suficientes para os identificar.
Embora seja grave, o meu amigo considerou que as referidas maleitas, também, já estavam a atacar os pais dos alunos. A título de exemplo, mencionou casos de alguns pais que não valorizam a escola e dão cobertura a tudo o que os filhos fazem, desculpando os seus maus comportamentos e não se interessando pelos seus resultados, de tal modo que a sua única preocupação, transmitida aos professores e a alguns diretores de turma, é a de que eles estejam dentro do recinto das escolas, nos horários escolares.
Face a esta situação muitos professores marcianos que receberam formação específica para transmitirem conhecimentos de determinadas disciplinas/conteúdos estão a trabalhar em áreas distintas das suas, como a educação especial, ou estão, pura e simplesmente, a guardar os alunos em aulas de substituição, que nunca funcionaram bem em Marte mas que, segundo parece, são exemplares na Terra, ou nas salas de encaminhamento disciplinar ou mesmo nas próprias aulas pois há turmas onde a grande maioria não quer aprender.
Por último, o meu amigo também se referiu aos cursos profissionais que, sem alunos dignos deste nome, são uma grande fraude. A propósito destes, disse-me ele que alguns alunos, numa determinada turma, de uma escola da capital de um próspero país daquele planeta, quando chamados à atenção por um docente para o facto de ser necessário fazer uma determinada tarefa mandavam o professor para muito longe, para um “lugar” que por pudor não sou capaz de reproduzir aqui.
Felizmente na Terra nada disso acontece e se houver, neste relato, algo de semelhante ao que por cá ocorre não passa de mera coincidência.
T. Braga
(Correio dos Açores, nº 27335, 23 de Janeiro de 2013, p. 13)

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