Mudam-se
os tempos, mudam-se as vontades
Embora
alguém já tenha decretado o fim da história e outros o fim das ideologias o
certo é que, embora ache que não têm razão, por vezes fico com muitas dúvidas.
O
que ouço mais, hoje em dia, por parte de alguns comentadores que se reclamam de
direita é que não faz qualquer sentido falar na divisão entre esquerda e
direita. Por outras palavras, o seu sonho é que a chamada esquerda
desaparecesse do mapa e que todo o mundo adotasse um pensamento único, o deles.
Para
a maioria da chamada esquerda, sobretudo para a que vive, com a direita, sob o
manto ou guarda-chuva estatal, as ideologias ainda existem, mas para não
amedrontar o cidadão mal informado ou desinformado o melhor é deixar cair todas
as referências aos pais do socialismo ou mesmo da social-democracia.
Para
quem acompanha, ao longe e de fora, a vida dos partidos políticos, nos Açores,
desde o 25 de Abril de 1974, é fácil perceber as mudanças que ocorreram ao
longo dos tempos.
Já,
em texto anterior, referi que o PPD/PSD começou por se afirmar social –
democrata e que hoje muitos dos seus militantes nem sabem o que é isto ou mesmo
estão, pelo menos ideologicamente, frontalmente em oposição a qualquer política
que pretenda conciliar o capital e o trabalho.
Tempos
houve em que, tal como nalguns partidos marxistas-leninistas que evocavam os
seus mentores, Marx e Lenine, no Partido Social-Democrata os candidatos a
qualquer cargo interno mencionavam a sua fidelidade aos princípios do seu
fundador, o Dr. Francisco Sá Carneiro, que alguns consideravam como populista e
outros como um defensor da social-democracia adaptada ao contexto da sociedade
portuguesa.
Se
fosse vivo hoje e se consultasse as redes sociais, Sá Carneiro indignar-se-ia
ao ler afirmações de alguns militantes do PSD que não escondem as suas
afinidades com o pensamento do ditador de Santa Comba Dão, pois ele, embora
tenha sido eleito deputado pelo partido único, desenvolveu esforços, sob a
ditadura, para a transformar num regime democrático e não o tendo conseguido teve
a coragem de resignar ao cargo.
O
Partido Socialista que começou por se anunciar como marxista, mas defensor de
um socialismo em liberdade, e que no seu primeiro congresso apresentou um
programa arrojado, diria mesmo que mais avançado do que o do Partido Comunista
Português foi, com o passar do tempo, deixando cair as suas bandeiras e hoje,
pelo menos nos Açores, é constituído por gente cuja única preocupação parece
ser a de ocupar lugares no aparelho de estado, proveniente de todos os
quadrantes políticos e partidários.
Não
tenho a mínima ideia se os seus militantes ainda se reclamam do socialismo em
liberdade ou da social-democracia ou se são daqueles que acham que as
ideologias acabaram e o que há a fazer é governar a contento dos poderosos,
distribuindo umas migalhas aos mais desfavorecidos para que, com alguma
caridade, não se chegue a qualquer revolta.
Disse
revolta pois as revoluções não estão na ordem do dia e as que existiram no
passado falharam ou foram traídas pelos vencedores ou por quem a elas se juntou
com o único objetivo de açambarcar privilégios.
Não
menciono aqui o CDS/PP pois continua igual a si mesmo, pelo menos nos Açores. A
nível nacional, a par da rejeição do centrismo, distingo as guinadas à
“esquerda” dos seus ex-líderes Prof. Freitas do Amaral e Dr. Basílio Horta, tendo
este passado de armas de bagagens para a salada russa que é o Partido
Socialista.
O
PCP e o BE, pelo menos nos Açores, suponho que perderam qualquer veleidade
revolucionária e limitam-se a tentar melhorar o regime, defendendo com as suas
propostas e a sua ação, aparentemente (ou não?), muito centrada na atividade
parlamentar, algo semelhante a uma social-democracia.
Com
uma população desmotivada e cansada de tantas promessas que são esquecidas logo
a seguir às tomadas de posse, independentemente das cores partidárias, a
chamada democracia representativa parece que está esgotada e não se vislumbra
qualquer alternativa mais “democrática” que concilie maior participação cidadã
e uma distribuição mais equitativa da riqueza criada.
No
horizonte, só vislumbro mais autoritarismo e mais injustiça social. Oxalá
esteja enganado.
Teófilo
Braga
(Correio
dos Açores, nº 2900, 18 de setembro de 2013, p.16)
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