domingo, 30 de dezembro de 2018

José Henrique Borges Martins, o Ferreirinha das Bicas e o Bravo



José Henrique Borges Martins, o Ferreirinha das Bicas e o Bravo

Neste último texto da rubrica que intitulei “Com os pés na terra”, que foi publicada no Correio dos Açores, entre 13 de abril de 2011 e 9 de outubro de 2018, e depois desta data no meu blogue “Pois alevá…diário de um professor”, em virtude de naquele jornal, sem qualquer explicação, não ter sido publicado um texto sobre Paulo Freire, farei uma singela homenagem ao poeta terceirense José Henrique Borges Martins e a dois improvisadores da ilha Terceira que ele tão sabiamente acarinhou e de algum modo os imortalizou, Francisco Ferreira dos Santos (o Ferreirinha das Bicas) e Manuel Borges Pêcego (o Bravo).

José Henrique Borges Martins que comigo esteve presente em diversas reuniões, onde um grupo de cidadãos preparou a criação, em Angra do Heroísmo, de um jornal independente dos poderes instalados, o “Directo”, que foi dirigido pelo meu colega da Escola Secundária Padre Jerónimo Emiliano de Andrade, António Neves Leal, foi um poeta de mérito e um destacado investigador da cultura popular, tendo elaborado, entre outos, e publicado trabalhos sobre os cantadores e improvisadores populares e sobre crendices e feitiçarias.

Para além de dar o seu contributo ao “Directo”, Borges Martins, que combateu o Estado Novo com a sua poesia, colaborou com o extinto jornal “A União” e com o “Jornal da Praia”.

Com os livros “Cantadores e improvisadores da ilha Terceira”, de 1984, e “Improvisadores da Ilha Terceira. suas vidas e cantorias”, de 1993, Borges Martins homenageou alguns heróis do povo, os cantadores populares.

De entre eles, destacamos o Ferreirinha das Bicas que terá sido, segundo alguns, o maior de entre eles, e o Bravo que foi um homem livre e que por isso teve problemas com as autoridades por dizer verdades que as incomodavam.

O Ferreirinha das Bicas nos seus improvisos mostrou preocupações sociais e denunciou as desigualdades e a sociedade hipócrita onde vivia.

As duas quadras abaixo ilustram bem o pensamento do seu autor:

Vai preso quem rouba um pão
Por sua necessidade,
Mas quem rouba meio milhão
Passeia pela cidade

Eu conheço falsos sábios
Que pregam religião
Que mostram Cristo nos lábios
E o diabo no coração

A temática das desigualdades sociais, também, foi por diversas vezes abordada por Manuel Borges Pêcego. Para além de ilustrar a sua condição social, a quadra abaixo revela o seu espírito crítico:
Fui pagar a contribuição,
Mas não foi com dinheiro falso,
P’ra calçar tanto ladrão
Que por mim, ando descalço

O Bravo teve problemas com a polícia que o mandou internar na casa de saúde de São Rafael. A causa terá sido uma quadra dita em frente à cadeia, onde denunciou as injustiças deste mundo:
Oh, como esta vida é feia
Presos, meditai a fundo.
Só nunca vão à cadeia
Os maiores ladrões do mundo.

Pico da Pedra, 31 de dezembro de 2018
Teófilo Braga

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