quarta-feira, 3 de junho de 2020

José Sebastião Ávila Júnior e a Revista Pedagógica (2)




José Sebastião Ávila Júnior e a Revista Pedagógica (2)

Neste texto, vamos dar continuidade ao anterior sobre o professor primário republicano e anticlerical José Sebastião Ávila Júnior.

Na terceira parte de um artigo sobre a Lei da Instrução Primária, publicada na Revista Pedagógica, nº 199, de 14 de dezembro de 1911, Ávila Júnior continua a manifestar a sua desilusão com o ministro António José de Almeida e com o seu decreto que, segundo ele, sendo bom no preâmbulo é mau no seu conteúdo.

A propósito daquele governante, que conheceu, e de outros afirmou: “…quando estão na oposição, quando precisam de número, quando desejam captar simpatias, falam, barafustam, anatematizam os colegas que não cumprem as promessas feitas, prometem mundos e fundos, mas - uma vez no poder- esquecem-se  também, ou fazem pouco, e , se fazem muito, é às avessas”.  Hoje, será muito diferente?

O professor Ávila Júnior achou desprimoroso, vexatório e deprimente a lei considerar como superiores hierárquicos um delegado camarário e dois delegados paroquiais. Segundo ele, tal medida nem a reacionária monarquia, na sua legislação escolar, admitia.

No número seguinte da Revista Pedagógica, Ávila Júnior volta à carga condenando a legislação que vimos referindo, desta vez por considerar que o professor primário foi humilhado por ficar “sob a deletéria ação direta do caciquismo”, pois a lei previa que a nomeação dos professores pelas Câmaras Municipais depois de ouvido o inspetor escolar.

No número 202, da Revista Pedagógica, Ávila Júnior denuncia o facto de ser negado aos professores primários os lugares previstos na lei para eles nas Escolas Normais Primárias. Além disso, no texto, o autor, depois de estranhar o facto de António José de Almeida ter colocado à frente alguns círculos escolares “indivíduos sem nenhuma competência, que, no tempo da radiosa, perseguiram cruelmente os professores que mais se salientavam na defesa e propaganda dos princípios democráticos e que – em plena República- os perseguem ainda com mais descaramento”, deu a conhecer  que estava a sofrer “perseguições e injustiças com a República” que nunca havia sofrido no regime monárquico.

No número 203 da Revista Pedagógica, publicada a 18 de janeiro de 1912, a colaboração de Ávila Júnior é dedicada à situação da mulher. Depois de voltar a referir a contradição entre o que defendia António José de Almeida antes e depois da implantação da República, Ávila Júnior lamentou que aquele governante, “que teve à sua conta a lei eleitoral, muito podia ter feito em benefício da mulher, dando-lhe- sem favor- no que respeita a direitos políticos, as mesmas regalias que não teve receio de conferir ao homem mais boçal…”

Para Ávila Júnior, António José de Almeida podia, na lei de instrução primária, contribuir para a emancipação feminina, introduzindo “o ensino coeducativo”, nas escolas primárias, tal como o fez nas escolas primárias superiores e normais primárias. Segundo ele “era mais lógico e mais prudente que assim tivesse sido, pois é durante a puerícia e ainda no primeiro período da adolescência que tal sistema deve ser utilizado a fim de, com segurança, produzir o resultado desejado nos períodos seguintes”.

A sua colaboração na Revista Pedagógica prosseguiu até que no nº 209, do ano de 1912, afirmou que alguns professores, nos quais se incluía, estavam a ser perseguidos pelo inspetor António Maria de Mendonça.

Apesar de tal facto ter sido comprovado por outros docentes, como o professor José Fernandes do Couto que considerou injusta a sua classificação, tendo afirmado, num depoimento publicado na Revista Pedagógica, de 25 de julho de 1912, o seguinte: “O sr. Inspetor, se fosse mais reto e justiceiro, se não olhasse unicamente a questões políticas  e a inimizades pessoais, teria classificado o seu serviço com mais justiça e probidade, no que cumpria apenas um dever”.

Como resultado do seu escrito, Ávila Júnior foi repreendido disciplinarmente, tendo de imediato pedido a sua exoneração.  Num texto não assinado (escrito por Maria Evelina de Sousa?), sobre o assunto pode-se ler: “Felicitando-o pela independência do seu gesto, inteiramente à altura do seu carácter, lamentamos que deixe de pertencer à classe do magistério de que era um dos mais prestigiosos ornamentos”.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 32146, 3 de junho de 2020, p. 14)

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