sexta-feira, 18 de julho de 2025

Notas sobre a oposição dos anarquistas à(s) guerra(s)

 



Notas sobre a oposição dos anarquistas à(s) guerra(s)

 

Em 1907, o congresso internacional anarquista da Aliança Antimilitarista que se realizou em Amesterdão, corroborou uma resolução da AIT- Associação Internacional dos Trabalhadores que considerava a greve geral insurrecional como “o único meio de impedir a guerra e assegurar a paz.” (Tavares, s/d)

 

O congresso de Amesterdão, segundo Tavares (s/d), “também incitou à revolta individual, à rejeição isolada ou coletiva do serviço militar, à desobediência passiva e activa e à greve militar com vista à destruição radical dos instrumentos de domínio.”

 

Após a declaração da Primeira Guerra Mundial, o campo anarquista dividiu-se: uns mantiveram-se intransigentes na sua oposição à guerra enquanto outros “enterraram” o seu antimilitarismo ao aliarem-se aos governos aliados na luta contra a Alemanha. Em Portugal, mantiveram-se fiéis aos seus ideais antimilitaristas a revista A Aurora, do Porto, a maioria da UON, as Juventudes Sindicalistas e Gregório Nazianzeno Moreira de Queiroz e Vasconcelos, mais conhecido como Neno Vasco.

 

De acordo com Fontes (n/p), foram vários os anarquistas presos por se oporem à participação de Portugal na guerra, como Emílio Freitas da Silva, António Casimiro da Silva, José dos Reis Couto e Sabina Lopes Condeça (1888-1977). Esta, segundo o Arquivo MOSCA, operária conserveira, esteve 3 meses na prisão militar de Évora, acompanhada da sua filha Antonina.

 

Em julho de 1925, num comunicado “Contra a Guerra”, a CGT, dirigindo-se ao proletariado português, reproduz um texto da AIT.

 

Depois de referir que com a guerra terem sido mortos milhões de seres e que o grande vencido fora o proletariado, o texto apela a que todos os trabalhadores “tomem a responsabilidade da paz nas suas próprias mãos, como classe consciente, arrancando à burguesia a determinação sobre os destinos do mundo, sobre o seu próprio destino, e se convertam em propulsores da sua própria história”.

 

O comunicado termina com uma referência a uma resolução do segundo congresso da AIT que abaixo se transcreve:

 

“O congresso resolve exortar as organizações aderentes a realizar em todas as cidades e aldeias de todos os países, no primeiro domingo de Agosto, manifestações antimilitaristas em comemoração do início da grande guerra mundial. Esses actos podem ser empreendidos em comum com outras organizações que não possam ser responsabilizadas pelo rebentar da grande guerra”.

 

Que o proletariado de todos os países demonstre no primeiro domingo de Agosto a sua oposição unânime contra a guerra e a sua aspiração por um novo sistema de vida.

Abaixo o militarismo, viva a revolução social!

 

Com a instauração da ditadura em Portugal a prioridade foi a luta antifascista, pelo que alguns anarquistas passaram a colaborar com outros opositores ao regime enquanto outros como o açoriano Adriano Botelho, “mantiveram-se apolíticos, antigovernamentais, antimilitaristas”.

 

Terminámos, este texto com a apresentação de três citações sobre a guerra e o militarismo: do anarquista Neno Vasco, do sindicalista-revolucionário, Perfeito de Carvalho e do anarcossindicalista, Francisco Quintal.

 

Neno Vasco, uma das principais figuras do anarquismo em Portugal, num artigo intitulado “A guerra”, publicado no jornal brasileiro “A Lanterna”, escreveu o seguinte:

 

“Entretanto, uma guerra é uma aventura perigosa, pondo em risco poderosos interesses. Seria, pois, modernamente evitável, mesmo independentemente dos esforços proletários, se não houvesse uma categoria especial de interessados no estado de guerra declarado ou latente: os construtores de couraçados e material de guerra, os fornecedores do exército, o militarismo profissional. Amontoam-se armas e soldados, cria-se um espírito agressivo e provocador, convence-se a massa, por meio da grande imprensa, da iminência da guerra e da invasão, fomentam-se ambições e paixões guerreiras. No fundo, o que se pretende são encomendas e boas colocações. Mas vem um dia em que se inflamam os explosivos acumulados e em que triunfam os interesses de carniça e de pilhagem. Há dezenas de anos que a Europa corre desesperadamente para o abismo.

Que resultará desta colossal guerra? Um longo eclipse da civilização? O desaparecimento das magras liberdades conquistadas? O recuo do ideal socialista e libertário e da organização operária? A revolução?

Angustioso problema!

No princípio, a multidão falsamente educada, vilmente ludibriada, está toda entregue às paixões brutais, à embriagues guerreira, à loucura nacionalista – essa loucura de que o insigne Jourès foi a primeira vítima ilustre. Mas com os efeitos da guerra virá talvez a reflexão – e a revolta. Não talvez com as vastas finalidades da revolução social, levada a cabo com maior desenvolvimento de força e de consciência; mas rasgando em todo caso novos horizontes e novas possibilidades.

Melhor seria que a guerra fosse impedida pela greve geral insurrecional. Em todo caso, houve impotentes manifestações de protesto em todos os países: há progresso sensível sobre o estado de espírito anterior à guerra de 70, coroada depois com a Comuna de Paris…”

 

Francisco Perfeito de Carvalho, que foi secretário-geral da União Operária Nacional, na altura em que dirigia o jornal madeirense “Trabalho e União”, foi preso e deportado para o continente por ser um feroz opositor à participação de Portugal na I Grande Guerra-

 

Em 1915, escreveu no jornal mencionado:

 

“Guerra à guerra, pois! Guerra aos seus sinistros causadores! Guerra à organização social presente, prenha de absurdo e iniquidades, repleta de vícios e antagonismos! Guerra aos que, na perseguição de odiosas ambições não exitam em provocar a temerosa hecatombe - nos campos de batalha um mar de sangue, nas povoações enlutadas um oceano de lágrimas”.

 

Francisco Quintal, que entre 1927 e 1929 esteve deportado em Angola e que foi preso em 1932, num texto intitulado “A campanha anti-militarista deve intensificar-se”, publicado em “A Batalha-Suplemento Literário e Ilustrado”, em 1925, escreveu o seguinte:

 

“As Juventudes Sindicalistas delinearam claramente os seus propósitos de instrução e educação como acção especial que lhes compete.

 

As Juventudes Sindicalistas têm a ajuntar a esta acção cultural e digna de todos os aplausos, a acção anti-militarista. Compete-lhes sobretudo esta acção.

 

Os jovens não devem ir para a tropa, devem reagir por todas as formas contra essa exigência criminosa, contra esse tributo de sangue proletário consagrado ao capital.

 

E devem estabelecer uma bem orientada propaganda anti-militarista conjugada com todos os núcleos do país e que merecerá, tenho a certeza, o concurso de todos os revolucionários.”

 

Bibliografia

 

Fontes, C. (2022). Anarquismo em Portugal (1796-2021). https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2021/09/10/anarquismo-em-portugal-1796-2021/ (consultado a 21 de maio de 2023)

 

Medina, J. (1986). Portugal na Grande Guerra “Guerristas” e “Antiguerristas”. Lisboa, Centro de História da Universidade de Lisboa/ Instituto Nacional de Investigação Científica.

 

A Batalha-Suplemento Literário e Ilustrado, Nº 91, 24 de Agosto de 1925.

 

https://www.marxists.org/portugues/vasco/1914/08/02.htm

 

Arquivo MOSCA

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