quinta-feira, 16 de agosto de 2012

A Escola do Passado - Lembrando a profª Maria Ana Carreiro




Depois de uma recente visita à Oficina Museu de Manuel João Melo, localizada nas Capelas, e de ter visto a reconstituição de uma sala de aula que se assemelhava à que encontrei quando, em 1964, comecei a frequentar a então denominada escola primária, na Ribeira Seca de Vila Franca do Campo, lembrei-me de remexer em “papéis velhos”.
Entre os vários documentos que tenho em minha posse sobre a escola/ensino do passado, deparei-me com alguns pertencentes às professoras Maria Emília Pereira e Maria Ana Bento Carreiro.
Dadas as limitações de espaço, hoje, apenas farei referência a parte do espólio da professora Maria Ana Carreiro que era natural de Vila Franca do Campo, tendo estudado no Instituto de Vila Franca, mais tarde Externato de Vila Franca, onde fui aluno no final da década de sessenta e início da de setenta do século passado.
Terei conhecido a professora Maria Ana Carreiro nos primeiros anos da década de 60 e lembro-me de a ter visitado, julgo que pela primeira vez, em sua casa, na rua dos Manaias, aquando da realização do meu exame do 2º ano do ciclo preparatório, na Escola da Arquinha.
Aquando do seu falecimento, fiquei com alguns móveis da sua casa e alguns livros, cadernos e outros materiais ligados à sua vida como docente.
Através de um horário que consultei, no início da década de trinta do século passado, no Magistério Primário a carga horária semanal era de vinte e oito horas, distribuídas por seis dias (segunda-feira a sábado), começando as aulas às nove horas e terminando pelas quinze horas, com um intervalo para almoço das doze horas às treze horas, exceto às segundas-feiras que começavam às dez horas e às sextas-feiras que terminavam às catorze horas.
No que respeita à distribuição da carga horária pelas diversas disciplinas, verifica-se que as duas disciplinas com maior carga horária eram a Pedagogia e os Trabalhos Manuais, com quatro horas semanais. As disciplinas de Costura, Higiene, Psicologia, Didática, Música e desenho tinham uma carga horária de três horas semanais e a Educação Física, apenas duas.
A leitura de uma palestra intitulada “Instrução e Educação”, feita pela professora Maria Ana Carreiro, a 19 de Maio de 1932, na Escola do Magistério Primário de Ponta Delgada, elucida-nos acerca do que se entendia na época por educação e instrução e sobre o papel do professor na escola e na sociedade.
Segundo a autora “devido à instrução, o progresso é ilimitado e a Humanidade tende continuamente à perfeição”, mas a instrução não é tudo se não for acompanhada pela educação, pelo que o professor deverá ter as duas funções, a de instrutor e a de educador.
Para a professora Maria Ana Carreiro, para educar com eficácia o professor não pode ficar apenas pelas palavras, é necessário que ele seja “um modelo perfeito onde a cada hora e a todos os momentos, o aluno copie fielmente os atos que lhe servirão de norma na sua conduta social”.
Para uma educação das crianças, a professora Maria Ana Carreiro considera fundamental a preparação das mães pelo que devem ser instruídas e educadas convenientemente e a dado passo afirma: “tornemos a mulher perfeita, não a desviando das funções de esposa e mãe, transformando-a no anjo do lar para que saiba prender e unir ao seu coração todos os entes que lhe são caros, porque a família é o ninho onde se esboçam os caracteres dos homens do porvir”.
Depois de ter referido a necessidade de serem criadas escolas infantis e de ter elogiado o que se passava em vários países, sugeriu que Portugal imitasse a Bélgica, onde em 1927 existiam 3734 escolas infantis que eram frequentadas por 245 186 alunos, de três a seis anos de idade.
Por fim, deixo aqui o ponto da situação do ensino, feito pela professora Maria Ana Carreiro, na altura, que embora não se compare com a atual poderá ter algum interesse pois muitas vezes é necessário recorrer a ideias antigas para responder às necessidades do presente: “Faltam-nos escolas, uma boa organização escolar, uma regular administração do ensino e uma assistência escolar bem desenvolvida, pois a que há, salvo exceções honrosas, não passa de papel; é por isso que se não pode tornar real a obrigatoriedade e gratuitidade do ensino em Portugal”.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 1 de Agosto de 2012)

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