Continuando
a minha consulta aos documentos que pertenceram à professora do primeiro ciclo
do ensino básico, Maria Ana Carreiro, encontrei dois cadernos onde ela
registava as suas despesas e receitas: um relativo ao ano letivo de 1944-1945 e
outro respeitante ao ano de 1946-1947.
Através
de uma análise aos dois cadernos, verifica-se que, no primeiro ano letivo
referido, o ordenado era de 766$30 e no segundo 869$30, no mês de outubro,
tendo sido aumentado para 1008$50, no mês de Novembro de 1946. Tendo o cuidado
de, com pormenor, analisar as despesas e as receitas, facilmente se chegará à
conclusão que naquela época os professores não tinham uma vida desafogada. Com
efeito, se a professora Maria Ana Carreiro não desse explicações, ela chamava
lições, nomeadamente ao 1º, 2º e 3º anos e de admissão ao liceu, o seu ordenado
mal daria para cobrir as suas despesas em alguns meses e noutros ficaria muito
aquém daquelas.
Hoje,
se continuarem os cortes salariais, incluo o não pagamento do subsídio de
férias e do de Natal, a situação de muitos professores, que já não é boa, irá
degradar-se tanto que muitos terão de recorrer a outras fontes de receitas,
para equilibrar os seus frágeis orçamentos familiares.
O
segundo aspeto que queria divulgar, hoje, está relacionado com a presença ou
não de crucifixos nas escolas.
Antes
de prosseguir, queria registar o facto de, para mim, ser indiferente a sua
presença ou não. Considero que as crenças ou a fé, para além de não se
encontrarem em qualquer parede, não se medem pelo
número de crucifixos nas paredes de qualquer edifício. Contudo, também acho que
sendo a escola pública laica e sendo o estado português laico não faz qualquer
sentido a presença de cruxifixos e outras imagens religiosas nas escolas
públicas, por isso aceito perfeitamente a afirmação do sociólogo Moisés
Espírito Santo quando considera “sinal de civismo e
maturidade” a sua não presença em escolas não cristãs.
Na
década de quarenta do século passado, as circunstâncias eram outras e a
polémica acerca dos crucifixos não se colocava. Pelo contrário, terá sido uma
conquista para a professora Maria Ana Carreiro ter conseguido adquirir um para
a escola do isolado local das Gramas, na Ribeirinha, o que só foi possível com
a colaboração do “bom povo” da localidade.
No
seu discurso proferido perante algumas autoridades, colegas e alunos, a
professora Maria Ana Carreiro, depois de manifestar o seu embaraço por usar da
palavra, justificou por que o fazia, dizendo que era grande a alegria por ver
na sua escola alçada a Cruz de Cristo.
Para
ela, “sendo a criança a mais carinhosa promessa da humanidade e a sua mais
ridente esperança” era necessário envidar “todos os esforços na sua preparação
para a vida” e acrescentou:
“Mas, nós, os
professores primários, prepará-la-emos convenientemente, não só instruindo-a,
porque a instrução só por si não basta. É até capaz de produzir monstros. É
necessário aliar à instrução a educação, mas a educação cristã e tradicional do
nosso querido Portugal.”
Depois
de se referir a vários episódios da história de Portugal, sempre “à sombra da
Cruz”, como a batalha de Ourique, os descobrimentos que tiveram um “duplo fim:-
propagar a fé e dilatar o império”, a oradora ter-se-á referido à primeira
república nos seguintes termos: “no entanto, durante algum tempo uma rajada de
indiferentismo obscureceu o céu límpido da nossa Pátria e arrancou a tradição
gloriosa de tantos séculos de existência cristã” e lembrou o que se estava a
passar na Rússia e em Espanha.
Quase
a terminar o seu discurso, como era costume na altura, a professora Maria Ana
Carreiro falou na obra de António de Oliveira Salazar que foi Presidente do Conselho de Ministros,
entre 1932
e 1968,
nos seguintes termos:
“Foi por isso que o
governo português sob a direção do grande estadista Dr. Oliveira Salazar, que
muito se preocupa (com a preparação da juventude) com a educação das crianças,
futuros homens, determinou que se colocasse a imagem de Jesus Cristo na escola,
para lhes servir de modelo pela vida adiante, daquele Jesus que foi o maior
pedagogo e só praticou o bem”.
Teófilo
Braga
(Correio
dos Açores, 15 de Agosto de 2012)
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