sábado, 29 de agosto de 2015

CANDIDATURA DE SÃO JORGE A RESERVA DA BIOSFERA



CANDIDATURA DE SÃO JORGE A RESERVA DA BIOSFERA

Está em preparação a candidatura da ilha de São Jorge a Reserva da Biosfera, a qual merece todo o meu apoio.

Dada a extensão do texto da proposta de candidatura, nesta minha colaboração semanal apenas farei referência a duas áreas, a espeleologia, que está praticamente ausente, e a tauromaquia, que mereceu uma breve menção, onde para além de não haver referência às sangrentas touradas de praça, felizmente raras em São Jorge, as touradas de corda são apresentadas como “pílulas douradas”

Na proposta de candidatura, encontramos apenas a menção a “grutas não exploradas pelo turismo”, o que é muito pouco para uma ilha que possui várias cavidades vulcânicas que, ao longo dos tempos, têm sido alvo de várias expedições vulcanoespeleológicas que tiveram a participação da comunidade científica nacional e internacional.

A título de exemplo, embora desconheça se a listagem está atualizada, no 6th Internacional Symposium on Vulcanospeleology, que se realizou, em 1991, no Hawaii, foi apresentada uma comunicação da autoria de Paulo Borges, da Universidade dos Açores, e de A. Silva e F. Pereira, da Sociedade de Exploração Espeleológica Os Montanheiros, onde são mencionadas 12 cavidades vulcânicas. Destas, sete são tubos de lava: Furna da Pomba, Furna do Poio, Furna do Pombal, Gruta da Beira, Gruta da Granja, Gruta da Lomba do Gato e Gruta do Leão e cinco são algares: Algar das Bocas do Fogo, Algar do Montoso, Algar do Pico da Maria Pires, Algar do Pico dos Suspiros I e Algar do Pico dos Suspiros II.

Em relação à tauromaquia, no texto da proposta pode ler-se: “Fortemente enraizadas na cultura jorgense, as touradas à corda são corridas de touros adultos da raça brava, ao longo de um arraial montado numa rua, num percurso de cerca de 500 metros. O animal é controlado por uma corda atada ao seu pescoço que é segura pelos pastores (homens que conduzem a lide e impedem sua saída para além do troço de via estipulado. Após a lide, que não inclui farpas ou maltrato dos animais, são devolvidos às pastagens e repetidamente utilizados, depois de um período de descanso mínimo.”

Se é certo que há touradas em São Jorge, atividade criada para satisfazer os interesses económicos de ganadeiros e o vício de quem desde criança foi habituado a elas, também é certo que até há pouco tempo as mesmas estavam confinadas à ilha Terceira. Com efeito, o etnógrafo terceirense Dr Luís Ribeiro, numa comunicação apresentada ao Congresso Luso-Espanhol realizado em Lisboa, em 1950, afirmou: “Em todas as ilhas foi o costume caindo em desuso e hoje só na Terceira há touradas.” Sobre o mesmo assunto, o historiador e também etnógrafo Pedro de Merelim no seu livro Tauromaquia Terceirense, publicado em 1986, cita o professor João Nogueira que escreveu que as ilhas vizinhas mostravam repugnância pelas touradas. O mesmo Pedro de Merelim só em 1977 se refere a touradas na Graciosa e São Jorge nos seguintes termos: “ Mas, com o típico divertimento a estender-se as ilhas próximas. Levaram-se a efeito na Graciosa 21 e em S. Jorge 17”.
Relativamente à apresentada “suavidade” da tourada à corda, discordamos pois embora não haja farpas é sabido que muitas vezes os animais são feridos e alguns acabam mesmo por morrer, como já aconteceu em São Jorge e em Rabo de Peixe. Sobre este assunto, João da Cândida, antigo pastor disse: “De resto é o “bota abaixo” no duro e escorregadio asfalto, provocando, quantas vezes, graves e irreparáveis lesões aos animais” e o antigo médico-veterinário da Praia da Vitória, Dr. Vasco Reis escreveu o seguinte:

“Na tourada à corda o touro arrisca ferimentos, que podem conduzir à morte; é provocado, ludibriado e exausto; sofre susto e ansiedade.
O risco de ferimento, mais ou menos grave, e de morte de pessoas está muito presente na tourada â corda, o que absolutamente a não recomenda.
Por estas as razões, a tourada à corda impressiona negativamente imensas pessoas portuguesas e do estrangeiro e atua para perda da imagem de harmonia e tranquilidade, que seria uma marca da boa qualidade dos Açores”.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 30715, 26 de agosto de 2015 p.12)

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