quinta-feira, 5 de março de 2020

Batalhas de flores, limas ou plásticos?



Batalhas de flores, limas ou plásticos?
Nos últimos anos, parece-nos que tem crescido a oposição à denominada Batalha das Limas que na verdade é uma Batalha de Plásticos. Este ano houve mesmo uma associação de proteção do ambiente e um partido político que manifestaram a sua oposição à sua realização, sobretudo devido à utilização de sacos de plástico.
Nas redes sociais, as opiniões dividem-se entre os que apresentam como principal argumento a proteção do ambiente, onde incluem o desperdício de água e o uso dos plásticos e os que apresentam como grande argumento, e talvez único, o da tradição.
Neste texto, não vou esgrimir argumentos a favor ou contra a referida batalha. Vou limitar-me a provar, com alguns exemplos, que estão errados aqueles que defendem a batalha das limas, em detrimento das de flores, argumentando que apenas terá existido uma batalha de flores.
Em 1915, realizou-se uma Batalha de Flores, promovida pela Câmara Municipal de Ponta Delgada, no Domingo Gordo, 14 de fevereiro, pelas 12 horas, no Largo 5 de Outubro (Campo de São Francisco). A referida batalha, para além do divertimento das pessoas, apresentava fins humanitários, neste caso as receitas obtidas foram distribuídas pela Cruz Vermelha e pela Federação Operária.
De entre os carros presentes, destacaram-se um alusivo à conflagração europeia e outro da Federação Operária “alusivo à crise que, segundo consta, é também interessante, embora menos jocoso, visto a alusão não se prestar, pelo seu simbolismo, à charge carnavalesca”.
Não sabemos se chegou a haver Batalha de Flores em 1918, pois de acordo com os jornais da altura, a dois dias do Carnaval ainda não se falava na tradicional batalha que se realizava anualmente.
O jornal “Diário dos Açores” sugeriu que naquele ano as receitas da batalha revertessem para a “Cruz Vermelha Portuguesa e Comissão Suíça para os soldados portugueses prisioneiros dos alemães…”
O Açoriano Oriental, estranhando a falta de notícias defendeu o seguinte: “Agora mais do que nunca se impunha uma confraternização com os nossos benquistos hóspedes americanos, que presentemente guardam a nossa ilha…”.
O mesmo jornal que reprovava “os folguedos carnavalescos pelas ruas”, apoiava uma “Batalha de Flores, decente e sem mascaradas, assim como os bailes nos teatros e festas de flores, porque serão festas civilizadoras e altruístas”. O que escreveriam os redatores do referido jornal se assistissem à atual batalha de plásticos?
Em 1920, coube aos alunos do liceu a organização de “batalhas de flores”, na Praça 5 de Outubro. Sobre as mesmas o Diário dos Açores publicou uma nota onde a dado passo pode ler-se: “São dois dias de folia carnavalesca e a ninguém ficará mal divertir-se um bocado, quer tomando parte direta nas batalhas, quer vendo os seus efeitos sobre os combatentes, ao longe.”
Em 1950, no domingo, 19 de fevereiro, cerca de 10 mil pessoas assistiram à Batalha de Flores que se realizou, uma vez mais, na Praça 5 de Outubro, em Ponta Delgada.
No ano referido, o cortejo abriu com a Filarmónica Rival das Musas a que se seguiram carros representando várias empresas da ilha, como a fábrica de Tabaco Micaelense, os “adubos Labor”, a casa de modas Eliela, a empresa Azevedo e Ca. Sucrs., a Fábrica de Tabaco da Maia e a Casa Africana. A presença de danças de cadarços também foi muito bem acolhida pelos assistentes não só devido ao colorido das suas roupas, mas também pelas suas músicas e cantigas populares.
No mesmo ano, na terça-feira, dia de Carnaval, o Governador Civil do Distrito entregou prémios. Para além de taças aos carros que se distinguiram, foram entregues prémios pecuniários às danças dos cadarços, a que se seguiu um desfile dos premiados pelas ruas da cidade de Ponta Delgada.
Tal como era tradição, as receitas da Batalha reverteram para uma instituição, neste caso o Albergue Distrital.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 32071, 4 de março de 2020, p.17)
Imagem: Instituto Cultural de Ponta Delgada -PT/ICPD/CFD.01505

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