quarta-feira, 3 de março de 2021

Ernesto do Canto naturalista

 


Ernesto do Canto naturalista

Ernesto do Canto, filho de José Caetano Dias do Canto e Medeiros e de D.ª Francisca Vicência Botelho, nasceu nos Prestes a 12 de dezembro de 1831 e faleceu na mesma localidade a 21 de agosto de 1900.

 

Depois de estudar em São Miguel, Ernesto do Canto formou-se em Filosofia Natural, na Universidade de Coimbra, tendo concluído o curso a 25 de julho de 1856. Lá, frequentou, de acordo com Maria Teresa Tomé, “cadeiras de Anatomia e Fisiologia Vegetais, Botânica, Agricultura, Economia Rural e Tecnologia.”

 

Ernesto do Canto é mais conhecido pela sua faceta de bibliógrafo e historiador a ele se devendo, em grande parte, o Arquivo dos Açores. Neste texto, vamos dar a conhecer a sua ligação à terra e à botânica.

 

Tal como José Jácome Correia e António Borges, Ernesto do Canto rivalizou, no dizer de Emygdio da Silva “com o glorioso ancião [José do Canto] em ciência e entusiamo nas aplicações práticas de botânica”.

 

Ferdinand Fouqué, autor do livro “Viagens Geológicas aos Açores”, refere que Ernesto do Canto mandou plantar anualmente um milhão e meio de árvores. Embora possa haver algum exagero e alguma confusão, entre espécies, variedades e cultivares, de acordo com a mesma fonte, Ernesto do Canto terá ensaiado: “86 espécies de pinheiros, 28 de carvalhos, 36 de acácias, 16 de bordos, 14 de ciprestes, 5 de criptomérias, 10 de castanheiros, 8 de eucaliptos, 6 de casuarinas, etc. São no todo 800 espécies de plantas arbóreas”.

 

O interesse pelos jardins, por parte de Ernesto do Canto, traduziu-se na transformação por ele efetuada no seu prédio nos Prestes e no Vale das Murtas, hoje denominado Parque Dona Beatriz do Canto”, que possuía em copropriedade com José Jácome Correia, António Borges de Medeiros, José Maria Raposo do Amaral e António Botelho de Sampaio Arruda.

 

De acordo com Luís Arruda e Isabel Albergaria, no jardim dos Prestes “que se distinguia pela colecção de “plantas gordas” e sobretudo pela abundância de agaváceas, existiam também cicas, estrelícias, araucárias e uma palmeira das Canárias de grandes dimensões” e numa “depressão existente numa pedreira desactivada, onde um enorme filodendro trepava por uma parede, foi instalado um fetal, com exemplares arbóreos, e ainda bromeliáceas e sansevieras. No bosque, atravessado por pequenas veredas tortuosas, predominavam pinheiros e eucaliptos”.

 

O gosto pelas plantas em Ernesto do Canto não se limitava à teoria como se depreende da leitura de um extrato de uma carta dirigida ao seu irmão José do Canto, que foi citada por Maria Teresa Tomé: “…estava na minha estufa arranjando algumas coisas que não me tinham deixado fazer nos outros dias, quando a recebi e com as mãos sujas de terra é que a li…”

 

Os seus conhecimentos adquiridos em Coimbra e complementados pelas leituras que fazia e pela prática fez com que fosse contatado por várias pessoas para os mais diversos fins, como a recomendação de livros, para tirar dúvidas sobre determinadas espécies ou para apoiar visitantes que cá vinham fazer estudos.

 

Não pretendendo esgotar o assunto, refiro o caso, citado por Maria Teresa Tomé, de Francisco Ricardo Botelho que, sabendo que Ernesto do Canto era “amante da especialidade”, lhe pede “um tratado sobre a cultura de plantas de jardins...”

 

A autora referida, no seu livro “Ernesto do Canto: os Açores na problemática da cultura do século XIX”, menciona também que o médico naturalista Bruno Tavares Carreiro a ele recorre sempre que não se sente habilitado a responder, como aconteceu relativamente a umas perguntas sobre o cipreste feitas pelo botânico professor da Universidade de Coimbra, Dr. Júlio Henriques. Este mesmo Dr., Júlio Henriques a ele recorreu a pedir que apoiasse o diretor do Jardim Botânico de Missouri (EUA) que veio a São Miguel fazer estudos.

 

Para além do mencionado, Ernesto do Canto também apoiou e orientou outros naturalistas que visitaram São Miguel, como o malacólogo francês Henri Drouët, o zoólogo alemão Heinrich Simroth e o médico naturalista francês Théodore Barrois.

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, nº 32374, 3 de março de 2021, p.5)

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