quarta-feira, 31 de março de 2021

Bulhão Pato, Alice Moderno e a sua excomunhão em Vila Franca do Campo

 



Bulhão Pato, Alice Moderno e a sua excomunhão em Vila Franca do Campo

 

Raimundo António de Bulhão Pato nasceu em Bilbau, a 3 de março de 1829, e faleceu na Torre do Monte da Caparica, a 24 de agosto de 1912, na sequência do desenvolvimento de uma arteriosclerose e de uma angina de peito.

 

Filho de um pequeno proprietário com bens em Alcochete e Colares, Bulhão Pato, que fora funcionário amanuense das Obras Públicas e se reformou como segundo oficial da Direção-Geral do Comércio e Indústria, no fim da vida passou por dificuldades financeiras.

 

Por terem mais posses e por serem mecenas, José do Canto e Aires Jácome Correia custearam a publicação de algumas das suas obras. Este último, que foi o único marquês de Jácome Correia, era afilhado de Bulhão Pato e foi responsável pela impressão do tomo III, das “Memórias”.

 

Memorialista de pessoas e factos, Bulhão Pato que esteve em São Miguel por três vezes, em 1866, em 1868 e em 1886, dedicou uma parte dos seus escritos a micaelenses ilustres, como Antero de Quental, ou a pessoas que contribuíram para o engrandecimento desta ilha, como António Feliciano de Castilho.

 

Quando esteve cá em 1866, Bulhão Pato assistiu à chegada à ilha de alguns padres jesuítas, liderados por Carlos Rademaker, que vieram pôr em polvorosa a pacata sociedade micaelense. Com efeito, segundo Bulhão Pato, “ao terceiro sermão estavam completamente fanatizados homens e mulheres de três ou quatro casas principais e os conflitos domésticos começavam já a picar, pela divergência de opiniões, até entre parentes mais chegados e afectivos”.

 

Para denunciar o fanatismo, Bulhão Pato escreveu “as Cartas dos Açores” o que levantou contra ele “o ódio da piedade evangélica dos santos missionários”.

 

Estando ele a residir em Vila Franca do Campo, em casa de Sebastião do Canto, em 1868, os ânimos exaltaram-se de tal modo que foi acusado, pelo padre, por ser responsável por não chover nos seguintes termos: “desde que está aqui aquele ímpio, até os milheirais estão com as mãos para o céu a pedir chuva”.

 

Depois de se escapar para Ponta Delgada para onde foi a convite de Ernesto do Canto, Bulhão Pato foi excomungado “em missa plena!”

 

Aquando da última estada cá, em 1886, Bulhão Pato foi visitado por Alice Moderno no palacete mandado construir por José Jácome Correia.

 

Aquela poetisa, que o considerou simpático, elegante, amável, instruído e fascinador, dedicou-lhe o poema, que abaixo se transcreve, publicado no Novo Correio dos Açores, no dia 5 de dezembro de 1886:

 

Bulhão Pato

Parte! … A amplidão do céu tolda-se agora,

As flores se desfolham tristemente,

Ergue-se em nostalgia a rósea aurora,

E vacila do sol a chama ardente!

 

Parte! …Esta ilha formosa, encantadora,

Que no seio o acolheu feliz, contente;

Na convulsão terrível de quem chora,

Envolve-se n’um véu de penitente!

 

Nas piras do sofrer tudo palpita! …

O mágico poeta da – Paquita, -

O autor de formosíssimas canções,

 

Vai de júbilo encher os pátrios lares,

Mas … aqui, nesta pérola dos mares,

Deixa um vácuo fatal nos corações!

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32398, 31 de março de 2021, p.12)

Sem comentários: