sábado, 10 de julho de 2021

Contra os subsídios à incineração

Carta enviada ao Ministro do Ambiente 



Foi enviada a seguinte mensagem em seu nome:

Venho por este meio transmitir a V. Exª a minha enorme preocupação com a decisão do Ministério do Ambiente e da Ação Climática de utilizar verbas do Fundo Ambiental, cerca de 50 milhões de euros até 2024, para suportar os sobrecustos associados à incineração de resíduos urbanos, solução que se encontra no segundo patamar mais baixo da hierarquia de resíduos, só acima do aterro, e que contribui diretamente para a emissão de gases de efeito estufa.

Por outro lado, os dois sistemas de gestão de RU do continente (VALORSUL e LIPOR), mantêm uma taxa de reciclagem claramente abaixo das metas europeias estabelecidas para 2020, demonstrando que na reciclagem não é, decididamente, uma aposta da tutela. Numa outra perspetiva, não se percebe qual o objetivo do MAAC em financiar uma solução como a incineração, em detrimento das outras soluções mais desejáveis no topo da hierarquia, nomeadamente o biogás produzido em unidades de digestão anaeróbia de bioresíduos.

Ao contrário da incineração, a transformação da fração orgânica dos resíduos urbanos (biorresíduos), em composto e biogás, contribui para o cumprimento de várias metas do plano de gestão de resíduos. De facto, este processo promove a redução do volume enviado para aterro e transforma um material rejeitado em recurso, ou seja, um processo que produz energia renovável e não liberta gases de efeito estufa.

Lembro ainda, que a Comissão Europeia emitiu um aviso (Commission notice 2021/C 58/01) no qual refere que o Plano de Recuperação e Resiliência não pode contemplar nenhuma medida que cause danos significativos ao cumprimento de determinados objetivos ambientais (Art. 17), nomeadamente a economia circular. Mais especificamente, o aviso da CE exemplifica os casos de atividades que danificam a economia circular, encontrando-se incluídos os processos que aumentam a produção, incineração ou deposição em aterro de resíduos urbanos, por causarem danos ambientais significativos e a longo prazo.

Também não se compreende como é que o Ministério justifica que a população residente fora das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto suporte os sobrecustos associados à incineração, em benefício de alguns poucos concelhos nas zonas mais ricas do país. Através do Fundo Ambiental, as regiões mais desfavorecidas vão suportar um custo económico injusto e contrário a uma ótica de coesão nacional.

Finalmente, considero que este subsídio à incineração de resíduos urbanos, através do Fundo Ambiental, é uma subversão total do que está estabelecido no Decreto-Lei n.º 102-D/2020, nomeadamente no seu Anexo III:

“ANEXO III – Exemplos de instrumentos económicos e outras medidas para incentivar a aplicação da hierarquia dos resíduos (a que se refere o artigo 7.º)

8- Supressão de subsídios que não sejam coerentes com a hierarquia de resíduos”.

Face ao exposto, apelo a V. Exa. que, enquanto Ministro do Ambiente e Ação Climática, tome medidas no sentido da revogação da legislação que está a permitir a utilização de avultadas verbas do Fundo Ambiental no financiamento da incineração de resíduos urbanos, financiamento esse que vai contra os objetivos ambientais, da proteção do clima e da tão falada economia circular.

Aguardando a melhor recetividade a esta solicitação, subscrevo com os meus cumprimentos.

9 de Julho de 2021
Teófilo José Soares de Braga

(Texto sugerido pela associação Zero)

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