Fotografia: L. Ventura
Com
os pés na terra (513)
Sobre
as Observações Ornitológicas do Eng. José Maria Álvares Cabral (1)
Nos
primeiros dias do mês de maio, estive a consultar o caderno de campo do Eng.
José Maria Álvares Cabral, gentilmente posto à minha disposição pelo seu neto
Rui Álvares Cabral. De acordo com o que se pode ler na capa do mesmo, trata-se
do 2º volume de observações ornitológicas começadas a 7
de setembro de 1966 e acabadas a 12 de dezembro de 1974.
A
observação de aves é uma atividade que pode ser feita por profissionais ou por
amadores, existindo em todo o mundo milhões de ornitólogos amadores que
praticam a atividade por razões sociais ou por lazer.
No
caso do Eng. José Maria Álvares Cabral, temos a certeza de que na sua vida a
ornitologia era uma paixão que estava associada ao seu espírito de cientista
interessado em dar a conhecer o património natural da sua terra.
Os
relatos diários das observações são muito pormenorizados. Neles normalmente é
referida a hora do início da observação, algumas vezes ainda antes do Sol se
levantar, do trajeto efetuado, por vezes vários quilómetros a pé, se era usado
um barco ou não, o número e a espécie de aves observadas e se estava só ou
acompanhado. Por vezes, no dia seguinte, são referidas correções às identificações
anteriormente feitas.
Nas
suas observações ornitológicas, o Eng. Álvares Cabral era geralmente
acompanhado pelo seu empregado que ele regista como sendo Camilo, que se chamava
Manuel da Costa e que era dos Mosteiros.
O
Camilo, não era um mero acompanhante do Eng. Álvares Cabral, pois com a prática
e com as observações que fazia acabou por se tornar num verdadeiro ornitólogo
amador, cuja opinião era tida em conta. Assim, a título de exemplo, refiro que
no dia 18 de novembro de 1966, o eng. Álvares Cabral descreve que foram vistas
perto da Península aves mergulhando e que contra a sua opinião “o Camilo
identificou-as como galeirões; Fulica atra” e acrescentou que “depois de
observar com mais atenção as aves em referência concordei que a determinação do
Camilo, em parte, estava certa”. No dia a seguir, quando se tratou de
identificar a marrequinha-americana, o eng. Álvares Cabral teve em conta a
observação do seu acompanhante, tendo escrito o seguinte: “Mas a concordância
dos detalhes notados pelos 2 observadores, a saber a mancha amarela dos lados
do rabo e a branca do cotovelo apontam com extrema probabilidade para a Anas
carolinensis”.
Entre
7 de setembro de 1966 e o final daquele ano, foram realizadas 23 saídas de
campo, onde foram feitas mais de uma centena de observações e identificadas cerca
de 30 espécies não residentes/nidificantes.
No
que diz respeito aos locais de observação, os principais foram a Caldeira do
Alferes, a Lagoa Rasa da Criação, a Lagoa de Santiago e as margens da Lagoa
Azul e da Lagoa Verde, com algum destaque para a Península e o Porto dos
Mosteiros.
Das
espécies subespécies endémicas dos Açores, o Eng. José Maria Álvares Cabral
apenas registou uma vez o tentilhão (Fingilla coelebs moreletti) e por
diversas vezes, o pombo torcaz (Columba palumbus azorica). Talvez, pela
raridade, na altura, por diversas vezes a sua ausência foi notada, como por
exemplo, a 23 de dezembro daquele ano, pode ler-se o seguinte: “Neste dia não
vimos nenhum Pombo torcaz”.
No
que diz respeito às espécies mais observadas, destacamos a rola-do-mar (Arenaria
interpress), o marrequinho-comum (Anas crecca), o zarro-comum (Aythia
ferina), o pato-real (Anas platyrhynchos) e o ganso-patola (Sula
bassana).
Por
último, selecionamos algumas das espécies observadas pelo eng. José Maria
Álvares Cabral, que são consideradas de ocorrência rara, de acordo com
informações constantes do livro “Observação de Aves nos Açores”, de Pedro
Rodrigues e Gerbrand Michielsen: maçarico-das-rochas (Actitis hypoleucos),
pilrito-de-colete (Calidris melanotos), pato-trombeteiro (Anas
clypeata), perna-verde comum (Tringa nebularia),
pilrito-de-Bonaparte (Calidris fuscicollis) e perna-vermelha-pequeno (Tringa
flavipes).
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 32481, 14 de julho de 2021, p. 14)
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