quarta-feira, 14 de julho de 2021

Sobre as Observações Ornitológicas do Eng. José Maria Álvares Cabral (1)

 

Fotografia: L. Ventura

Com os pés na terra (513)

Sobre as Observações Ornitológicas do Eng. José Maria Álvares Cabral (1)

 

Nos primeiros dias do mês de maio, estive a consultar o caderno de campo do Eng. José Maria Álvares Cabral, gentilmente posto à minha disposição pelo seu neto Rui Álvares Cabral. De acordo com o que se pode ler na capa do mesmo, trata-se do 2º volume de observações ornitológicas começadas a 7 de setembro de 1966 e acabadas a 12 de dezembro de 1974.

 

A observação de aves é uma atividade que pode ser feita por profissionais ou por amadores, existindo em todo o mundo milhões de ornitólogos amadores que praticam a atividade por razões sociais ou por lazer.

 

No caso do Eng. José Maria Álvares Cabral, temos a certeza de que na sua vida a ornitologia era uma paixão que estava associada ao seu espírito de cientista interessado em dar a conhecer o património natural da sua terra.

 

Os relatos diários das observações são muito pormenorizados. Neles normalmente é referida a hora do início da observação, algumas vezes ainda antes do Sol se levantar, do trajeto efetuado, por vezes vários quilómetros a pé, se era usado um barco ou não, o número e a espécie de aves observadas e se estava só ou acompanhado. Por vezes, no dia seguinte, são referidas correções às identificações anteriormente feitas.

 

Nas suas observações ornitológicas, o Eng. Álvares Cabral era geralmente acompanhado pelo seu empregado que ele regista como sendo Camilo, que se chamava Manuel da Costa e que era dos Mosteiros.

 

O Camilo, não era um mero acompanhante do Eng. Álvares Cabral, pois com a prática e com as observações que fazia acabou por se tornar num verdadeiro ornitólogo amador, cuja opinião era tida em conta. Assim, a título de exemplo, refiro que no dia 18 de novembro de 1966, o eng. Álvares Cabral descreve que foram vistas perto da Península aves mergulhando e que contra a sua opinião “o Camilo identificou-as como galeirões; Fulica atra” e acrescentou que “depois de observar com mais atenção as aves em referência concordei que a determinação do Camilo, em parte, estava certa”. No dia a seguir, quando se tratou de identificar a marrequinha-americana, o eng. Álvares Cabral teve em conta a observação do seu acompanhante, tendo escrito o seguinte: “Mas a concordância dos detalhes notados pelos 2 observadores, a saber a mancha amarela dos lados do rabo e a branca do cotovelo apontam com extrema probabilidade para a Anas carolinensis”.

 

Entre 7 de setembro de 1966 e o final daquele ano, foram realizadas 23 saídas de campo, onde foram feitas mais de uma centena de observações e identificadas cerca de 30 espécies não residentes/nidificantes.

 

No que diz respeito aos locais de observação, os principais foram a Caldeira do Alferes, a Lagoa Rasa da Criação, a Lagoa de Santiago e as margens da Lagoa Azul e da Lagoa Verde, com algum destaque para a Península e o Porto dos Mosteiros.

 

Das espécies subespécies endémicas dos Açores, o Eng. José Maria Álvares Cabral apenas registou uma vez o tentilhão (Fingilla coelebs moreletti) e por diversas vezes, o pombo torcaz (Columba palumbus azorica). Talvez, pela raridade, na altura, por diversas vezes a sua ausência foi notada, como por exemplo, a 23 de dezembro daquele ano, pode ler-se o seguinte: “Neste dia não vimos nenhum Pombo torcaz”.

 

No que diz respeito às espécies mais observadas, destacamos a rola-do-mar (Arenaria interpress), o marrequinho-comum (Anas crecca), o zarro-comum (Aythia ferina), o pato-real (Anas platyrhynchos) e o ganso-patola (Sula bassana).

 

Por último, selecionamos algumas das espécies observadas pelo eng. José Maria Álvares Cabral, que são consideradas de ocorrência rara, de acordo com informações constantes do livro “Observação de Aves nos Açores”, de Pedro Rodrigues e Gerbrand Michielsen: maçarico-das-rochas (Actitis hypoleucos), pilrito-de-colete (Calidris melanotos), pato-trombeteiro (Anas clypeata), perna-verde comum (Tringa nebularia), pilrito-de-Bonaparte (Calidris fuscicollis) e perna-vermelha-pequeno (Tringa flavipes).

 

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32481, 14 de julho de 2021, p. 14)

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