O Eng. José Maria Álvares Cabral em demanda do priolo
O
texto de hoje é sobre ave mais emblemática e rara dos Açores, o priolo (Pyrrhula
murina). Tem por base informações provenientes de apontamentos
coligidos pelo Eng. José Maria Álvares Cabral e das referências àquela ave existentes
em dois dos seus cadernos de campo.
Numa
carta, datada de 18 de abril de 1906, José Maria Raposo do Amaral (1856-1919),
proprietário rico, industrial e político, enviou uma carta ao Dr. Eugénio Vaz
Pacheco de Castro (1863-1911), formado em Filosofia Natural, na altura a
residir em Lisboa, onde responde a seis questões postas por este.
Perguntado
sobre se os priolos nidificavam “em outros pontos da Ilha além do Vale das
Furnas”, a resposta foi a seguinte:
“Nas Furnas nunca
os encontrei senão na Serra do Trigo e vi-os por vezes mais nas matas da Lomba
do Carro e Botão, na Lomba de Sebastião Alves, na Madeira Nova, na Madeira
Velha e Espigão da Igreja da Povoação, no Labaçal do Faial e no Espigão do
Galego de Água Retorta, e ouvi sempre dizer que em todas estas partes apareciam
ninhos. Ouvi também muitas vezes dizer que apareciam no Lombo Gordo e Lomba do
Meio, entre Água Retorta e Nordeste, mas conquanto por ali tenha andado em
diferentes épocas do ano nunca os vi.”
Em
1964, o Eng. José Maria Álvares Cabral esteve por duas vezes no Nordeste com o
objetivo de estudar as aves que aí nidificavam, nomeadamente o priolo. Não
tendo conseguido observar nenhum, apenas ouviu vários relatos sobre
avistamentos, o último ocorrido nos primeiros dias de maio.
No
final da década de 60 do século XX, o priolo era por muitos considerado
extinto, pelo que o Museu Carlos Machado decidiu atribuir um prémio de 500
escudos a quem apresentasse um exemplar, vivo ou morto, daquela espécie. Como
resultado da “campanha”, no dia 14 de janeiro de 1968, foi apresentado pelos
Drs. Victor Cabral Macedo e Carlos Manuel da Silva Medeiros um priolo que havia
sido apanhado no dia anterior, numa esparrela com flores duma espécie de
Polygonum.
De
acordo com o Eng. Álvares Cabral, tratou-se de um “facto sensacional para a
ornitologia açoriana a captura dum exemplar duma espécie que muitos
consideravam extinta e que é peculiar a S. Miguel” e acrescentou que ficava
“assim desfeito o mito do seu desaparecimento.”
No
dia 16 de janeiro de 1968, o Correio dos Açores, na sua primeira página, dá
destaque ao ocorrido, isto é, à captura de um priolo na Ribeira do Guilherme,
através de uma nota com o seguinte título: “Um grande “achado” ornitológico”
Foi apanhado vivo no último fim de semana um PRIOLO na região do Nordeste.
Confirma-se assim a presença em S. Miguel da famosa “ave rara” conhecida pelos
cientistas pelo nome “PYRRULA MURINA”.
A
nota referida complementa um comunicado emitido sobre o assunto, da
responsabilidade do Presidente da Direção da Secção de Ciências Naturais do
Museu Carlos Machado, o eng. José Maria Álvares Cabral. No final do comunicado,
o eng. Álvares Cabral chamou “a atenção para a proteção e propagação duma ave
que só em S. Miguel existe e que, pelo menos a partir da última metade do
século XIX, se encontra confinada no extremo oriental da ilha”.
No
dia 13 de dezembro de 1969, o Eng. Álvares Cabral conversou com várias pessoas
nas Furnas, tendo obtido várias informações sobre a presença de priolos na
localidade. Algumas delas informaram que a ave “caia muitas vezes em redes e
armadilhas, preparadas para outras espécies” e Jaime Moniz Borge (s)? afirmou
que havia “visto um, na semana anterior num pomar que confronta com o lar de
férias.”
Numa
das suas caminhadas pelas Furnas destinadas à observação de aves, o Eng.
Álvares Cabral relatou, do seguinte modo, o que apurou, no dia 15 de dezembro
de 1969, em relação ao priolo:
“Perto
das Casas do Senhor Dr. Hintze Ribeiro, encontrei um homem que, salvo erro, me
disse chamar-se João Moreira. Era empregado dos Serviços Florestais e disse-me
ter visto, há menos duma semana, um grupo de cinco ou seis priolos. As
indicações que deu quanto às características da ave eram bastante conformes à
realidade. Disse mais tê-los visto na Estrada Nacional que margina a Lagoa das
Furnas.”
Teófilo
Braga
(Correio
dos Açores, 32499, 4 de agosto de 2021, p.14)
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