quarta-feira, 21 de setembro de 2016

A ilha Verde de Maria Lamas


A ilha Verde de Maria Lamas

Acabei de ler o romance “A Ilha Verde” da autoria da escritora Maria Lamas, bem como extratos do seu livro “As mulheres do meu país”. Em ambas as obras a autora, que conheceu muito bem os Açores, onde foi sempre muito bem recebida, fala da nossa terra como uma açoriana que sente orgulho na sua terra, não ignorando aquilo que merece ser melhorado.

Antes de fazer algumas referências ao citado romance, apresento uma breve nota biográfica da autora.

Maria da Conceição Vassalo Lamas foi uma escritora, tradutora, jornalista e uma cidadã que interveio quer cívica quer politicamente tanto durante o Estado Novo quer após o derrube deste. Nasceu em Torres Novas, a 6 de outubro de 1893 e faleceu aos 90 anos, em Lisboa, a 6 de dezembro de 1983.

De acordo com João Mário Mascarenhas, antigo diretor da Biblioteca-Museu República e Resistência, Maria Lamas foi “uma Mulher que nunca vacilou na defesa dos direitos humanos e políticos em Portugal e se bateu – de forma energética – pela plena assumpção da igualdade de oportunidades – num Portugal retrógrado que penalizava os seus melhores e perseguia politicamente com o exílio, o desterro e a prisão aqueles que ousavam levantar a sua voz contra a guerra, as torturas, as indignidades, o analfabetismo e a discriminação social, sobretudo das mulheres”.

Tendo vivido intensamente o 25 de abril de 1974, depois daquela data aderiu ao PCP. Foi presidente honorária do Movimento Democrático das Mulheres, desde 1975, e dirigiu a revista “Mulheres”, criada em 1976. A 25 de abril de 1980 recebeu, das mãos do presidente da República, General Ramalho Eanes, a Ordem da Liberdade.


O livro “A Ilha Verde”, editado em 1938, pela Editorial “O Século”, para além de ser “um romance de amor intenso que decorre no cenário maravilhoso da ilha de S. Miguel” é um autêntico roteiro do património cultural e natural, onde a autora refere os principais pontos turísticos da ilha, menciona algumas tradições e aborda, ao de leve, alguns aspetos da sociedade micaelense, como a pobreza, a emigração, a relação entre os “senhores” da ilha e os restantes habitantes, etc.

Sobre os Açores, Maria Lamas escreve: “ilhas de fantástica beleza, adormecidas ainda na serenidade do mistério inicial, quási ignoradas do grande turismo que tudo vulgariza”.

Os romeiros são, segundo a autora, “figuras primitivas, arrancadas a velhos retábulos, evocações vivas dos peregrinos de antanho, a correr mundo em romagem de penitência e humildade”.

A procissão dos enfermos do Vale das Furnas é também descrita com pormenor. Sobre o assunto, Maria Lamas escreve: “Cada morador toma a seu cargo a extensão de rua correspondente à casa em que habita, e as azáleas de todas as cores, que mal desponta abril, transformam o Vale das Furnas em jardim magnífico, vêm, aos braçados, cobrir o chão por onde há-de passar Aquele que, um dia, ensinou aos homens o sentido universal da palavra irmão”.

Muito mais poderia mencionar neste texto, como a procissão do Senhor Santo Cristo, um império do Espírito Santo em Rabo de Peixe ou uma subida à Lagoa do Fogo de burro, a partir de Água de Pau, mas por razões de espaço termino com a seguinte referência ao ilhéu de Vila Franca do Campo: “A caldeira circular, que lhe fica no interior e onde a água do mar tem a serenidade e a transparência de um lago, tudo suplanta. O entusiasmo foi geral. Mais bela piscina natural ninguém tinha visto”.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31043, 21 de setembro de 2016, p.18)

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