terça-feira, 14 de março de 2017

Mário Dionísio e o ensino

Retrato por João Abel Manta, 1949

Mário Dionísio e o ensino

Neste texto, pretendemos dar a conhecer um pouco do pensamento de Mário Dionísio (1916-1993) sobre a temática da educação, tendo por base o que ele escreveu e que está compilado no livro “O quê? Professor?!

Antes de entrarmos no assunto proposto, apresentamos sucintamente o percurso profissional de Mário Dionísio que foi pedagogo, poeta, ensaísta e pintor, tendo-se licenciado em Filologia Românica, em 1940, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

A sua dedicação ao ensino começou ainda antes da licenciatura, onde deu lições particulares e prosseguiu após esta. Concluiu o estágio pedagógico, em 1958, no Liceu Pedro Nunes, tendo prosseguido, até 1978, a lecionação no Liceu Camões.

Depois do 25 de Abril de 1974, foi presidente da Comissão de Estudo da Reforma Educativa e da Comissão Coordenadora dos Textos de Apoio que substituíram os antigos programas das várias disciplinas e terminou a sua vida profissional como Professor Associado Convidado da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

Mário Dionísio, depois do 25 de abril, recusou por duas vezes o convite para ser Ministro da educação, tendo também declinado o convite para presidir à instalação da Universidade Aberta.

Rui Canário, no prefácio ao livro citado, destaca quatro tópicos no pensamento pedagógico de Mário Dionísio. Neste texto, apenas, mencionamos três.

O primeiro diz respeito à profissão docente. Para Mário Dionísio “ser professor é uma profissão e não um emprego” e acrescenta” Um professor é para mim alguém de personalidade vincada, de sensibilidade aguda, de cultura geral apreciável e cultura especializada indiscutível”.

Sobre a pedagogia de Mário Dionísio, o autor citado considera-o “tributário de uma pedagogia racional (que integra as contribuições da sociologia e da pedagogia) e que se entrelaça com uma tradição que remonta aos libertários e à Escola Nova”. Para Mário Dionísio, “crítico da memorização inútil” …mas crítico também de conceções de não directividade” o ensino e a aprendizagem são: “ …uma responsabilidade dividida, mas nem por isso menos dirigida […] com a noção exata de que dirigir será fundamentalmente seduzir, atrair, guiar, guiar até à reflexão em comum e à prática comum, ponte de acesso para o desejo e o prazer da descoberta.”

Por último, Mário Dionísio defendeu a articulação entre a educação e a arte.

Mário Dionísio, que um dia escreveu: “faça-se negócio com tudo, menos com a educação e a saúde”, explicou por que razão escolheu ser professor, numa época em que “a imagem de professor estava intimamente ligada à de uma carreira humilde e pobretana”:

“ Pelo apelo inesquecível que havia nos olhinhos brilhantes daqueles pobres alunos tão vivos uns, tão mortiços outros, mas todos escandalosamente ludibriados nesse colégio de má morte? Pelo interesse que percebi ser capaz de despertar nalguns deles e pelo que eles pouco a pouco em mim foram despertando? Pela consciência nascente da importância humana e nacional da função do ensino? Por cedo ter compreendido que a criação literária em liberdade exigia não depender economicamente dela e o ensino me parecer a atividade (complementar) que com ela melhor se coadunaria?”

Mário Dionísio se hoje fosse vivo ficaria ainda mais desiludido com a situação do ensino em Portugal. Com efeito, em 1979, ele já denunciava “o contínuo abaixamento do nível da qualidade do ensino. Que não vem do 25 de abril, nem foi causado por ele. Que vem muito e muito de trás. E que se ele era (e é) muito útil aos propósitos do fascismo, só pode ser motivo de alarme e da mais profunda apreensão para todos nós.”

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31180, 15 de março de 2017, p.16)

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