quinta-feira, 1 de agosto de 2019

Praças de Touros e touradas de praça em São Miguel

Praças de Touros e touradas de praça em São Miguel

Há alguns dias, tomei conhecimento do espanto de uma leitora pelo facto de existir numa conhecida rede social uma página intitulada “São Miguel Livre de Touradas”. Para além do referido, na página mencionada, alguém perguntou se na ilha de São Miguel já existiram touradas de praça.

A resposta à questão levantada é afirmativa, isto é, em São Miguel já houve touradas de praça e já existiram praças de touros, sendo a última (?) tentativa para a construção de uma datada de 1961.

No texto de hoje, darei a conhecer uma tentativa de construção de uma praça de touros e a realização de touradas no século XIX, a qual tal como as outras que se seguiram tiveram sempre o incentivo e ou colaboração de adeptos de touradas e de empresários da ilha Terceira.

A primeira notícia que encontrámos sobre o assunto foi publicada no jornal “A República Federal”, órgão do Centro Republicano Federal de Ponta Delgada, de 5 de abril de 1881. Na nota referida, o jornal menciona a construção de uma praça de touros para os lados da Mãe de Deus e insurge-se contra as touradas nos seguintes termos:

“Quando por toda a parte e mesmo nos países em que estes espetáculos tiveram a sua origem, estão a correr com esta barbaridade, aparece-nos este sujeito a querer iniciar entre nós um divertimento que até parece ser repelido pelo nosso clima; pois a nossa terra nunca produziu touros para este fim; e para vermos animais mal tratados, bastava termos as cenas que todos os dias se dão com os que andam em serviço..”

A 11 de abril de 1881, “A República Federal” volta à carga, lamentando que só depois de duas épocas é que surgiram outros jornais a condenar as touradas que classifica como “umas chinfrineiras a que se chama corridas de touros, mostrando-se o noticiarista desafeiçoado e reprovando a continuação d’esta desumana brincadeira”.

No ano seguinte, a 18 de julho de 1882, o referido jornal, tal como já havia divulgado no ano anterior que eram empresários da Terceira a fomentar e a animar as touradas em São Miguel, anuncia a chegada “das ilhas do Oeste o vapor Açor, trazendo para esta ilha os touros, seu empresário e mais pessoal”.

A 8 de agosto de 1882, depois de referir que o número de presentes a uma segunda tourada diminuiu, acrescenta o seguinte: “está-nos parecendo que se o tal sujeito da Terceira quiser importunar muito com estes espetáculos, talvez a brincadeira não acabe bem”. O texto prossegue, denunciando os maus tratos de que são vítimas os touros, nos seguintes termos:

“Asseguram-nos que pelo menos quatro touros já cá estiveram o ano passado e que todos os outros já foram corridos, e é talvez por isso que os tais amigos depois de espicaçarem bem os animais antes de entrarem na praça, como é costume, para darem melhor sorte, metem-lhes as farpas de maneira que o pobre animal fica logo a escorrer sangue, como aconteceu na primeira corrida, com o primeiro que entrou em praça.

Nós não fazemos questão do gado, nem das manadas a que pertençam; o que estimaríamos era ver que não pegava entre nós esta barbaridade, quando está a acabar por toda a parte, apesar de lá fora ter outros encantos para os amadores; mas infelizmente o nosso povo habituado a ser rigoroso com todos os animais, não tem deixado de consentir nas judiarias que para ali vão fazer a uns pobres bois que para ali vieram engaiolados de tal forma que abalou meia cidade!

Que se sacrifiquem animais para algum fim proveitoso estamos de acordo, mas para divertimentos ou por brutalidade, não nos podemos conformar.”

Logo que tenhamos mais informação voltaremos ao assunto.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores 31891, 1 de agosto de 2019, p. 16)

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