quarta-feira, 9 de junho de 2021

Sobre um guia das plantas do Jardim António Borges

 


Sobre um guia das plantas do Jardim António Borges

 

Com um intervalo de quinze dias, foram lançados, em São Miguel, dois livros sobre o Jardim António Borges.O primeiro, que ainda não li, editado pela Câmara Municipal de Ponta Delgada e o segundo, que é a razão deste texto, por parte da Letras Lavadas edições.

 

Com a edição do livro “Plantas do Jardim António Borges” a mencionada editora está a proporcionar a todos os interessados, naturais, residentes ou visitantes da ilha de São Miguel, informação que há alguns anos estava em falta para um melhor conhecimento do rico património botânico de um dos mais emblemáticos jardins dos Açores. Com efeito, através da sua leitura, é possível ficar a conhecer, entre outras informações, o nome científico, o nome comum, a família, a origem e os meses de floração de 219 dos 239 táxones existentes no jardim.

 

A disponibilização deste guia ao público é também um forte contributo para a educação ambiental de todos, nomeadamente dos mais jovens, tornando possível aprendizagens sobre e com a natureza. Trata-se de um pequeno passo para ajudar a cumprir a esquecida Carta de Belgrado que apresentava como meta da educação ambiental: “formar uma população mundial consciente e preocupada com o ambiente e com os seus problemas, uma população que tenha os conhecimentos, as competências, o estado de espírito, as motivações e o sentido de compromisso que lhe permitam trabalhar individual e coletivamente na resolução das dificuldades atuais, e impedir que elas se apresentem de novo”.

 

Este guia é, também, uma homenagem ao criador do jardim, António Borges da Câmara Medeiros (1812-1879), rico proprietário da ilha de São Miguel, apaixonado pelas plantas que, para além de ser o criador deste jardim que hoje ostenta o seu nome, em Ponta Delgada, criou o Jardim Pitoresco, nas Sete Cidades, e foi um dos responsáveis pelo surgimento do Parque das Murtas, atualmente conhecido por Parque Beatriz do Canto, nas Furnas.

 

António Borges, que no dizer do Dr. Urbano de Mendonça Dias, possuía um “reconhecido gosto artístico”, foi o responsável pelo desenho dos seus jardins e não era homem de se ficar pelo trabalho de gabinete. Com efeito, Alfredo Bensaúde, no livro “A vida de José Bensaúde”, sobre António Borges escreveu o seguinte: “surpreendia-me que uma pessoa tão distinta passasse o dia, ao sol e à chuva, a dirigir trabalhos de jardinagem”.

 

Para os seus jardins, nomeadamente o de Ponta Delgada, que começou a ser construído em 1858, António Borges mandou vir ou comprou diretamente no estrangeiro muitas plantas. Sobre o assunto, José do Canto, numa das cartas de Paris dirigidas ao primo José Jácome Correa, onde considera António Borges “excessivo em todas as cousas a que se aplica, e como é facilmente absorvido por ellas”, escreve que naquela cidade se entregou “única e exclusivamente às plantas; o dia todo é nos viveiros ou no Jardim das Plantas, e as noutes, com pequenas excepções, são empregadas em folhear catálogos e tomar notas”.

 

O autor do livro é Raimundo Quintal, doutorado em Geografia Física pela Universidade de Lisboa, madeirense que, desde 1983, tem vindo a estudar a fitodiversidade dos parques e jardins do nosso arquipélago e que foi o coordenador científico do projeto de recuperação do Jardim José do Canto, entre 2014 e 2017.

 

Para além dos livros já publicados da sua autoria, como “Jardim da Fundação Calouste Gulbenkian- Flora” ou “Quintas, Jardins e Parques do Funchal- Estudo Fitogeográfico”, Raimundo Quintal foi autor e realizador da série televisiva “Madeira e São Miguel à Luz da Geografia”, gravada em 1993 e exibida, pela primeira vez, em 1994, estando os quatro documentários disponíveis na página da Associação dos Amigos dos Parque Ecológico do Funchal no Youtube.

 

Está de parabéns a editora por, com esta iniciativa, valorizar um jardim que no dizer do Visconde do Ervedal da Beira “não só é uma obra de arte em que a natureza tomou grande parte, é também um poema, em que o seu autor revela sentimento e coração”.

 

Teófilo Braga

Correio dos Açores, 32452, 9 de junho de 2021,p.14

Sem comentários: