Alice Moderno e a “Sociedade Futura”
Estando à procura de uma
fotografia de Joaquim de Araújo (1858-1917), poeta, jornalista e diplomata que
namorou com Alice Moderno, acabei por encontrar a revista “Sociedade Futura” de
que esta foi colaboradora.
Fundada, em 1902, por Maria Olga de Moraes Sarmento da Silveira (1881-1948),
escritora monárquica que lutou pelos direitos das mulheres, a revista
“Sociedade Futura” foi dirigida pela feminista republicana Ana de Castro Osório
(1872-1925) até ao nº 7. A partir do nº 8, a direção da revista passou a ser da
responsabilidade da sua fundadora.
De acordo com Zilda Osório de
Castro, a publicação foi muito mais do que uma “revista feminina e feminista,
pois as duas responsáveis pretenderam “a valorização global e humanista das
mulheres, fundamental para ocuparem na sociedade o lugar que lhes pertencia
como parte integrante dos seus membros. Neste processo, como já se tem
referido, a educação ocupava um lugar primordial, pois só nela estaria a génese
da cultura como vector de igualdade entre homens e mulheres. Seria este o
sentido das variadas temáticas focadas ao longo da publicação, que abrangiam,
pelo menos tendencialmente, todos os campos da acção humana, todos os seres
humanos: pedagogia e literatura, artes e letras, música e pintura, história e
filosofia, tradições e costumes, personalidades e presenças, etc.”
Para além de Alice Moderno e das
duas diretoras, a revista contou com uma vasta colaboração de vários autores,
de que destaco os que tinham uma ligação com Alice Moderno ou com os Açores: Mariana
Belmira de Andrade, Joaquim de Araújo, Joaquim Teófilo de Braga, Raimundo
Bulhão Pato e Maria Veleda, havendo também textos de António Feliciano de
Castilho e de Antero de Quental.
Em vários números da revista, na
maioria, é homenageada uma personalidade, nacional ou estrangeira, que se
destacou em várias áreas, como as artes, a literatura, a política, etc., tendo
no número 7, sido distinguida Alice Moderno, através de uma carta do poeta e
crítico literário Gomes Leal à fundadora da revista.
Depois de ter escrito que Alice
Moderno era “um talento poético, invulgar entre as intelectuais portuguesas”,
Gomes Leal afirma que ela “é a mais distinta poetisa e a mais conhecida no
estrangeiro”, tendo os seus versos sido traduzido por, entre outros, Wilhelm
Storck, poeta e tradutor alemão, Edgar Prestage, historiador e tradutor
britânico e Tommaso Cannizzaro, poeta, crítico literário e tradutor italiano.
Num texto publicado no nº 10, da
referida revista, Alice Moderno agradeceu a Gomes Leal nos seguintes termos:
“Considero o seu juízo, com respeito às minhas aptidões poéticas, como um
incentivo a novos e melhores trabalhos.”
A colaboração de Alice Moderno na
“Sociedade Futura” foi feita, quer através de traduções, quer através da
publicação de pequenos textos, em prosa ou em poesia. Dos 23 números da revista
que se conhecem em 11 há textos de Alice Moderno, existindo por vezes dois no
mesmo número.
Termino com extratos de dois dos
textos da autoria de Alice Moderno:
“Não há nada mais forte que a Humanidade!
Doma as forças da natureza, utiliza os ventos e as correntes oceânicas, dá aos
metais a forma adequada às suas necessidades, dirige o raio, vence o espaço,
corta os istmos, separa continentes, Ah! Não há nada mãos forte! Não há mais fraco
também! Uma mosca inutiliza um homem, um bacillus extingue uma existência! Um
olhar, uma palavra, um sorriso, subjugam, indefesa, uma vontade!” (nº6, 1 de agosto de 1902)
“Quantos sacrifícios se não fazem à convenção mundana!
É preciso muitas vezes mais coragem para afrontar um
olhar do que uma bala, e não são heróis somente aqueles que morrem nos campos
de batalha.” (Notas da minha carteira,
nº 8, 1 de setembro de 1902)
(Correio dos Açores, 32534, 15 de setembro de 2021, p. 15)
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