Apontamentos
sobre José Orlando Bretão (2)
Em
texto anterior apresentamos a figura multifacetada de José Orlando Bretão, um
homem com um passado antifascista e de esquerda, sem ligações partidárias, um
cidadão que muito deu à sua terra no âmbito da cultura e do desporto e
sobretudo um forte aliado do movimento sindical da ilha Terceira, onde foi
consultor jurídico dos sindicatos de Angra do Heroísmo.
A
sua forte convicção de que os sindicatos podiam ter um papel fundamental na
construção de uma sociedade mais justa era tal que numa entrevista publicada no
nº 3 da revista açoriana de cultura “Memória da água-viva”, publicada em março
de 1979, afirmou que o de mais significativo se verificou, depois do 25 de
Abril de 1974, na ilha Terceira “foi a criação, quase do zero, das organizações
sindicais representativas dos operários da ilha”.
A
sua dedicação ao movimento sindical não foi bem vista por parte de algum
patronato e por parte da FLA que, de acordo com Carlos Enes, num comunicado
datado de maio de 1976, afirmou o seguinte: “…Alguns dos sindicatos, e como
tal, os seus dirigentes levados possivelmente pela boa fé, têm sido manobrados
pelo Dr. JOSÉ ORLANDO BRETÃO, indivíduo sobejamente identificado no nosso meio
com os objetivos do PCP- A DESTRUIÇÃO”.
Não
levou muito tempo para que, os inimigos de José Orlando Bretão, das ameaças
passassem aos atos. Assim, aquele advogado viu, no dia 19 de junho de
1976, a sua casa ser invadida, de acordo com um texto publicado no jornal “25
de Abril do Povo”, no dia 10 de julho daquele ano, por “um grupo de caciques da
FLA, entre os quais se viam dirigentes locais do CDS”, que “devassaram e
destruíram objetos pessoais, a que não escaparam as bonecas e outros brinquedos
da filha daquele antifascista, uma criança de sete anos” . Para além do ato de
selvajaria, os “fascistas da FLA deram-se ao luxo de apresentar um ultimato,
nos termos do qual Orlando Bretão deveria abandonar a ilha dentro de alguns
dias”.
No
dia a seguir, 20 de junho de 1976, realizou-se uma concentração/manifestação de
apoio a Orlando Bretão que foi noticiada pelo jornal citado nos seguintes
termos:
“Cerca de um
milhar de trabalhadores da cidade e do campo responderam ao apelo e, sob
palavra de ordem “morte à FLA” e “Bretão amigo, jamais sairás daqui”,
percorreram a cidade, exigindo o castigo para os separatistas e obrigando o
comandante da PSP a garantir a segurança para o advogado e sua família.
Recusando
personalizar a questão, este ao mesmo tempo que se dirigia às autoridades
civis, avisando que só morto a FLA o expulsaria da ilha alertava os
trabalhadores para o verdadeiro alvo do ataque fascista de que fora vítima.”
Depois
desta manifestação dos trabalhadores da Terceira, todas as organizações
acusadas de estar envolvidas nos ataques a José Orlando Bretão, declinaram a
sua responsabilidade, mas um comunicado do Partido Socialista, de que abaixo
citamos um extrato, pode ajudar a esclarecer algumas dúvidas:
“O PPD ataca a
organização clandestina FLA (…) no entanto como se explica que no cortejo da
FLA cuja bandeira seguia na primeira viatura, os manifestantes gritassem PPD –
Vitória, ao mesmo tempo que faziam com os dedos o V do PPD? Como se explica que
no mesmo cortejo da FLA, manifestantes envergassem camisolas do PPD? Seriam
bases da FLA? Bases do PPD? Ou uma e a mesma coisa?”
Sobre
a sua permanência na ilha Terceira, no nº 4 da citada revista, quando muitos
saíram ou foram forçados a abandonar os Açores, José Orlando Bretão respondeu o
seguinte:
“Estou porque
estou. Como tantos outros. Porque é daqui que sou e porque é aqui que me sinto
ser. É por isso que não saio voluntariamente…
Por três vezes
tentaram matar-me… e uma delas com “sentença” e tudo…
Mas isso não
chegou, nem chega, para me vergar. Nem chegou nem chega para vergar os milhares
que me honram com a sua Amizade e apoio. E ao Povo da minha ilha eu devo tudo,
tudo.”
Teófilo
Braga
(Correio
dos Açores, 32522, 1 de setembro de 2021, p.7)
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