quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Apontamentos sobre José Orlando Bretão (2)

 


Apontamentos sobre José Orlando Bretão (2)

 

Em texto anterior apresentamos a figura multifacetada de José Orlando Bretão, um homem com um passado antifascista e de esquerda, sem ligações partidárias, um cidadão que muito deu à sua terra no âmbito da cultura e do desporto e sobretudo um forte aliado do movimento sindical da ilha Terceira, onde foi consultor jurídico dos sindicatos de Angra do Heroísmo.

 

A sua forte convicção de que os sindicatos podiam ter um papel fundamental na construção de uma sociedade mais justa era tal que numa entrevista publicada no nº 3 da revista açoriana de cultura “Memória da água-viva”, publicada em março de 1979, afirmou que o de mais significativo se verificou, depois do 25 de Abril de 1974, na ilha Terceira “foi a criação, quase do zero, das organizações sindicais representativas dos operários da ilha”.

 

A sua dedicação ao movimento sindical não foi bem vista por parte de algum patronato e por parte da FLA que, de acordo com Carlos Enes, num comunicado datado de maio de 1976, afirmou o seguinte: “…Alguns dos sindicatos, e como tal, os seus dirigentes levados possivelmente pela boa fé, têm sido manobrados pelo Dr. JOSÉ ORLANDO BRETÃO, indivíduo sobejamente identificado no nosso meio com os objetivos do PCP- A DESTRUIÇÃO”.

 

Não levou muito tempo para que, os inimigos de José Orlando Bretão, das ameaças passassem aos atos. Assim, aquele advogado viu,  no dia 19 de junho de 1976, a sua casa ser invadida, de acordo com um texto publicado no jornal “25 de Abril do Povo”, no dia 10 de julho daquele ano, por “um grupo de caciques da FLA, entre os quais se viam dirigentes locais do CDS”, que “devassaram e destruíram objetos pessoais, a que não escaparam as bonecas e outros brinquedos da filha daquele antifascista, uma criança de sete anos” . Para além do ato de selvajaria, os “fascistas da FLA deram-se ao luxo de apresentar um ultimato, nos termos do qual Orlando Bretão deveria abandonar a ilha dentro de alguns dias”.

 

No dia a seguir, 20 de junho de 1976, realizou-se uma concentração/manifestação de apoio a Orlando Bretão que foi noticiada pelo jornal citado nos seguintes termos:

 

“Cerca de um milhar de trabalhadores da cidade e do campo responderam ao apelo e, sob palavra de ordem “morte à FLA” e “Bretão amigo, jamais sairás daqui”, percorreram a cidade, exigindo o castigo para os separatistas e obrigando o comandante da PSP a garantir a segurança para o advogado e sua família.

 

Recusando personalizar a questão, este ao mesmo tempo que se dirigia às autoridades civis, avisando que só morto a FLA o expulsaria da ilha alertava os trabalhadores para o verdadeiro alvo do ataque fascista de que fora vítima.”

 

Depois desta manifestação dos trabalhadores da Terceira, todas as organizações acusadas de estar envolvidas nos ataques a José Orlando Bretão, declinaram a sua responsabilidade, mas um comunicado do Partido Socialista, de que abaixo citamos um extrato, pode ajudar a esclarecer algumas dúvidas:

 

“O PPD ataca a organização clandestina FLA (…) no entanto como se explica que no cortejo da FLA cuja bandeira seguia na primeira viatura, os manifestantes gritassem PPD – Vitória, ao mesmo tempo que faziam com os dedos o V do PPD? Como se explica que no mesmo cortejo da FLA, manifestantes envergassem camisolas do PPD? Seriam bases da FLA? Bases do PPD? Ou uma e a mesma coisa?”

 

Sobre a sua permanência na ilha Terceira, no nº 4 da citada revista, quando muitos saíram ou foram forçados a abandonar os Açores, José Orlando Bretão respondeu o seguinte:

 

“Estou porque estou. Como tantos outros. Porque é daqui que sou e porque é aqui que me sinto ser. É por isso que não saio voluntariamente…

 

Por três vezes tentaram matar-me… e uma delas com “sentença” e tudo…

 

Mas isso não chegou, nem chega, para me vergar. Nem chegou nem chega para vergar os milhares que me honram com a sua Amizade e apoio. E ao Povo da minha ilha eu devo tudo, tudo.”

 

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32522, 1 de setembro de 2021, p.7)

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