Simão
Toco e o Farol da Ferraria
Há
alguns anos, o Manuel Pato, num dos passeios pedestres organizados pelos Amigos
dos Açores, apresentou-me Carlos Toco, que trabalhava na extinta CTM- Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos, a bordo do
navio Ponta Delgada. Na altura troquei algumas palavras com ele e fiquei a
saber que o seu pai, Simão Gonçalves Toco, havia sido ajudante de faroleiro no
Farol da Ferraria.
No passado dia 25 de janeiro, acompanhei uma turma de uma colega minha da
Escola Secundária das Laranjeiras numa visita ao Farol da Ferraria, que data de
22 de outubro de 1901 e possui uma torre de 18 m de altura e 107 m de altitude,
possuindo um alcance de 27 milhas (50 km).
No
farol, para além do magnífico e bem conservado edifício e de todo o equipamento
que merece ser visitado, tive a oportunidade de ver uma fotografia de Simão
Gonçalves Toco e uma placa com os seguintes dizeres: “Aqui viveu e prestou serviço, como ajudante de faroleiro, o
cidadão Simão Toco (1963-1974), fundador do Tocoísmo”,
Depois
da visita, decidi investigar mais sobre a vida de Simão Toco, recorrendo-me a
pessoas amigas, que conheceram alguns dos filhos, e à internet.
Para
além do filho, Carlos que estando reformado vive atualmente em Angola, Simão
Toco trouxe para São Miguel duas filhas, Ilda Rosa que vive em Inglaterra e
Esperança que já faleceu.
Maria Antónia Fraga conheceu e
estabeleceu relações de amizade com as duas irmãs que eram pensionistas no
Convento da Esperança e estudavam na Escola Comercial e Industrial de Ponta
Delgada e Carmélio Rodrigues, antigo funcionário da Secretaria
daquela escola, conheceu a Ilda e falou diversas vezes com Simão Toco quando
este se deslocava àquele estabelecimento de ensino para tratar de assuntos
relativos às filhas.
Simão
Gonçalves Toco foi um nacionalista e líder religioso angolano que foi deportado
com a família (filhos) pela ditadura salazarista para a ilha de São Miguel, em
1963, tendo permanecido cá até 1974.
Ao
longo dos 11 anos que esteve em São Miguel Simão Toco, fundador do tocoismo, um
dos maiores movimentos cristãos de Angola, que neste momento conta com sedes em
vários países, nunca esmoreceu e trocou cartas com os seus seguidores naquela
antiga colónia portuguesa.
Segundo
ele, nos Ginetes, passou muitas dificuldades, recebia pouco, os filhos não
podiam viver com ele e a mulher não veio para São Miguel por ser muito doente.
Mais tarde, teve algum aumento e as filhas uma bolsa de estudo para poderem
estudar.
Simão
Toco não se envolvia na política, não era contra o estado e respeitava todas as
religiões. Segundo ele, todos os cristãos deviam respeitar todas as crenças.
Após
o seu regresso a Angola apenas a 31 de agosto de 1974, já depois da chamada
Revolução dos Cravos, Simão Toco amante da paz, e antevendo o desentendimento
entre os movimentos de libertação, tomou a iniciativa de promover conversações
entre a FLNA, o MPLA e a UNITA com vista a um entendimento que permitisse uma
transição pacífica rumo à independência.
Como
é sabido, nem a sua iniciativa, nem outras tiveram qualquer sucesso, tendo-se
seguido uma guerra fratricida, entre 1975 e 2002 com resultados desastrosos
para a economia e sociedade angolanas e com mais de 500 mil mortes e mais de 1
milhão de pessoas deslocadas internamente.
Se
no passado, os seguidores de Simão Toco foram perseguidos, presos e até mortos ou
deslocados das suas terras para serem mais facilmente controlados, porque
resistiram contra a exploração colonial, hoje os tocoistas são mais de 2
milhões em todo o mundo e Simão Toco é considerado uma das personalidades mais
importantes na luta pela libertação os povos africanos.
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 32702, 6 de abril de 2022, p.11)
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