SOBRE AGRICULTURA
1 – O Governo dos Açores anunciou a elaboração de um estudo sobre a
Agricultura e deu um prazo de um ano para a sua conclusão. Este será um estudo
que atenderá a outros que já existem e terá em atenção os novos desafios que se
colocam ao sector agrícola. Em seu tender para que objetivo deve apontar este
estudo tendo em atenção que cada ilha é uma realidade agrícola própria?
O desenvolvimento da agricultura nos
Açores deverá ter sempre como meta, mesmo que inalcançável, a autossuficiência
alimentar da região, apontar para a máxima diversificação das culturas e ter em
conta as características dos solos de cada ilha. O estudo em questão também não
pode ignorar a história da ocupação do solo desde o povoamento e a tradição
agrícola de cada ilha.
Todos os estudos sobre o futuro da
agricultura também deverão ter em conta o respeito pelas áreas naturais e não
esquecer que existem pastagens implantadas em zonas de altitude ou declivosas
que deveriam ser ocupadas por matas ou mesmo por vegetação indígena e que seria
de todo o interesse proceder à sua recuperação.
Qualquer estudo e este em especial não
pode ser feito à margem dos interessados, pelo que é importante o envolvimento
de todos os agricultores em todas as fases do mesmo.
2 – A Agricultura açoriana está a entrar numa nova fase, com reajustamentos
que indiciam um decréscimo na fileira do leite e, em contrapartida, um aumento
da fileira da carne e da horticultura e fruticultura. Em sua opinião como se
devem processar estes reajustamentos? Que área de terra deve ser ocupada por
cada uma destas fileiras? Porquê?
A tendência mundial, pelo menos nos
países mais desenvolvidos tem sido a da redução gradual, ainda que lenta, do
consumo de carne e de leite, por razões ambientais ou por opções alimentares
relacionadas com a saúde dos consumidores. Assim sendo, a grande preocupação
deverá ser como reduzir as fileiras da carne e do leite e que alternativas para
as mesmas, haverá sem reduzir os rendimentos dos que hoje se dedicam à
agropecuária.
No que diz respeito às áreas ocupadas
por cada uma das fileiras, penso que já dei a resposta antes. Apenas não referi
que em cada área deverão ser usadas as melhores práticas agrícolas para obter o
máximo rendimento sem degradar os solos.
3 – A fileira da carne tem potencial para crescer nos Açores. Como se deve
desenvolver esse potencial e que raças se deve usar na fileira da carne?
Embora esteja atento a tudo o que se
passa na nossa terra, não estou suficientemente informado sobre que raças devem
ser usadas para melhor rentabilizar a fileira da carne.
Lembro-me que há alguns anos, o
arquiteto paisagista Ribeiro Teles ter mencionado o facto de as raças de gado
bovino existentes nos Açores para a produção de leite não serem as mais adequadas,
tendo em conta o seu peso e tamanho para as características das pastagens. Será
que este é um não problema ou um problema que já foi resolvido nos Açores?
4- Há quem defenda que uma das soluções para a “necessária” redução da
produção de leite é transformar as pequenas explorações de leite em explorações
de carne. Concorda com esta medida e como deve ser aplicada? Que programa de
incentivos deve acompanhar este importante reajustamento?
Para não se andar aos ziguezagues como
tem acontecido em várias áreas da vida económica açoriana tudo deverá ser bem
pensado. Como já referi anteriormente, para mim a grande aposta deverá ser na
produção de hortícolas e frutícolas, flores, na experimentação de novas
culturas, primeiro para consumo interno e depois para exportação.
5 – O cálculo do rendimento do produtor de leite e carne tem sido feito na
perspetiva da receita obtida por litro de leite e pouco pelo custo das
matérias-primas para o produzir. Quando se defende a
produção do leite biológico, do leite com iodo e do leite de pastagem, que
impacto terá essa alteração na alimentação do gado e, que impacto isso terá
para o rendimento do produtor e para o consumidor?
Os apoios à criação de gado serão sempre
inevitáveis, não pela vontade dos produtores, mas por “imposição” das políticas
de preços da Comunidade Europeia. Gostaria imenso de saber quantas explorações
agropecuárias seriam viáveis sem a receção de qualquer subsídio.
Creio que as necessárias alterações na
alimentação do gado farão com que, para a produção do leite biológico, do leite
com iodo e do leite de pastagem, os custos de exploração sejam maiores e que
não aumentando os subsídios às explorações o preço do leite terá de subir
muito, com consequências desagradáveis para os consumidores.
Meu pai que por circunstâncias da vida,
“herdou” uma pequeníssima exploração agropecuária, há 30 anos já se indignava
com o baixo preço do litro de leite pago pela indústria. Hoje parece-me que a
situação se mantém.
6 – O mercado da carne ainda tem muito caminho para fazer nos Açores,
nomeadamente, em São Miguel, onde se exporta ainda muito gado vivo, e a carne
em carcaça. O que é preciso fazer para que a Região possa certificar a carne
abatida nos matadouros dos Açores, já com a desmancha feita e embalada em vácuo
e, com isso, acrescentar valor e desenvolvendo a agroindústria, e criando
mais-valias?
Penso que quando há 20 anos foi
construído o matadouro da ilha de São Miguel, o objetivo era fazer com que na
região ficassem as mais valias da produção de carne e acabar com o transporte
de gado vivo para o continente português.
Não faço ideia por que razão tantos anos
depois continua a haver transporte de gado vivo para fora da região, prática
cada vez mais contestada nomeadamente pelas organizações integradas no
Eurogroup for Animals, por razões relacionadas com o bem-estar animal.
7 – A diversificação agrícola passa por um aumento significativo das
produções de hortícolas, frutícolas e flores, de modo a equilibrar o déficit
que existe quanto às importações que a Região faz. Tal como se tem feito com os
incentivos à plantação das vinhas, que incentivos devem ser disponibilizados
para incentivar o crescimento da produção agrícola em todas as Ilhas da Região?
Para
o combate às alterações climáticas é urgente o fomento da biodiversidade tanto
na agricultura, como na pecuária e também nos espaços florestais.
Acredito
que o futuro dos Açores tem de passar pela redução da criação de gado que tem
de ser acompanhada pela diversificação agrícola, através da produção de mais
hortícolas, mais frutos, mais flores, mais mel, etc., sempre que possível
associada a pequenas agroindústrias de aproveitamento das produções não
consumidas na região ou não exportadas. Para potenciar o rendimento dos
agricultores, às explorações agrícolas poderá estar associado o agroturismo.
Para
a manutenção dos rendimentos, são importantes apoios à reconversão das
explorações, que deverão ser maximizados nos primeiros anos até às novas
culturas atingirem a produção plena. Apoio especial, deverão ter todos os
agricultores que optem pelo modo de produção biológico.
Mas,
os incentivos não se devem limitar aos financeiros. O Governo Regional através
dos vários Serviços que possui, isoladamente ou em colaboração com a
Universidade dos Açores, deverá incrementar o apoio aos agricultores, quer no
aconselhamento das melhores culturas e das técnicas mais adequadas às
características dos solos, quer na investigação e desenvolvimento de melhores
cultivares e no combate a pragas e doenças.
Um
grande obstáculo à pequena produção é a comercialização dos produtos obtidos.
Embora dependa essencialmente da vontade dos produtores, a criação de
cooperativas de consumo/produção poderiam ser uma mais valia para o escoamento
das colheitas.
Outra
medida urgente a ser tomada é o ensino da agricultura nas escolas que não pode
ficar pelos alunos que não se adaptam ao ensino dito regular.
Pico
da Pedra, 25 e 26 de abril de 2021
Teófilo Braga
(Correio
dos Açores, 1 de maio de 2021)
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