O
jornal “Luta Pela Democracia Popular” no PREC
Na
segunda quinzena de abril de 1975 surgiu em Ponta Delgada o jornal “Luta Pela
Democracia Popular”.
Redigido
por um grupo de estudantes, o jornal, que pretendia a participação de
trabalhadores, esperava dar um contributo para “apressar a transformação desta
sociedade numa Democracia Popular”
Os
promotores do jornal, logo no número inicial, definiram claramente o que
pretendiam com o mesmo e que era o seguinte:
Combater:
-
A deficiência informativa das lutas operárias;
-
O fascismo e o capitalismo;
-
Os falsos amigos do povo, venham eles donde vierem.
Apoiar:
-
Todas as justas lutas dos operários, pescadores e camponeses pobres.
Servir:
-
Para a divulgação dos problemas das classes exploradas;
-
Para dar notícias dos movimentos populares dos quais se possam tirar lições
para as nossas lutas;
-
Para denúncia e combate à reação local;
-
De elemento organizativo:
1- Ajudando a desenvolver a consciência
política das massas trabalhadoras micaelenses;
2- Unindo os trabalhadores contra o inimigo
comum: o capital.
No
seu primeiro número o jornal “Luta Pela Democracia Popular” traz, entre outros,
um texto sobre a situação dos camponeses e trabalhadores rurais, uma notícia
sobre a luta dos operários da Moaçor/Finaçor e Laticínios Loreto pelo aumento
dos seus salários, um texto sobre a situação dos moradores pobres de Ponta
Delgada em luta por uma habitação condigna.
Para
além do referido, regista-se a presença de uma página dedicada à Cultura
Popular e outra sobre questões internacionais, dedicada à situação vivida em
Espanha, governada por Francisco Franco, e à luta dos kmers vermelhos, no
Cambodja.
O
segundo número do jornal, relativo à primeira quinzena de maio de 1975, contém
um editorial onde os responsáveis demarcam-se do PCP. Com efeito, quando se
referem a José Gregório escrevem: “grande dirigente da classe operária
portuguesa foi militante do Partido Comunista Português, abandonando-o, quando
este deixou de ser vanguarda da classe operária e passou para o campo da burguesia
ao seguir a linha revisionista”.
No
referido editorial, é mencionado o MAPA- Movimento para a Autodeterminação do
Povo Açoriano, nos seguintes termos: “…Exemplo disto foi o termos conseguido
fechar as portas ao MAPA temporariamente porque eles já se preparam para
recomeçar as suas criminosas atividades”.
Nesse
número há um texto sobre o 1º de Maio e um apelo à participação nas suas
comemorações. Tal como no número anterior, há uma página sobre Cultura Popular,
que apresenta um poema de Tinos Flores e um texto sobre teatro popular. De
igual modo não é esquecida a situação internacional através de um texto sobre o
Brasil, ainda a viver em regime ditatorial, e outro sobre o imperialismo com
referência a instalações militares estrangeiras existentes em Santa Maria,
Terceira e Flores.
No
número três, relativo à segunda quinzena de maio de 1975, o jornal apresenta
uma autocrítica pelo facto de no primeiro número ter afirmado que as casas da
avenida D. João III já pertencerem aos moradores pobres.
Nesse
número, para além de notícias sobre as comemorações do 1º de Maio, no mundo,
surge, pela primeira vez, a colaboração de diversas pessoas não ligadas à
redação do jornal. Assim, um grupo de divulgação do “LUTA” denuncia o facto da
Vinha da Areia ter “o seu acesso reservado a franceses e a meia dúzia de
“meninos bonitos”, um trabalhador da Junta Geral denuncia o facto do Eng.
Damião, diretor de Obras Públicas, ter saneado trabalhadores, não respeitar a
legislação relativa ao vencimento dos trabalhadores e não cumprir qualquer
horário de trabalho. No mesmo número outro trabalhador, José Rosa, denuncia a
dificuldade em marcar uma consulta no posto clínico da Caixa de Previdência, em
Ponta Delgada.
De
destacar ainda a presença de um apelo à organização dos trabalhadores rurais
num só sindicato para a ilha de São Miguel e a denúncia da destruição de nichos
com imagens religiosas na ilha de São Miguel, nomeadamente em Água de Pau e
Cabouco. Segundo o jornal “a única intenção de tudo isto é revoltar as massas populares
contra aqueles que verdadeiramente defendem os seus direitos, para assim
continuarem a explorar e a enganar o povo” e os responsáveis são “as ovelhas
ranhosas (quem sabe algum dos doutores dos movimentos fascistas: F”L”A, MIA,
FRIA, MAPA, etc.) que estão por detrás destas manobras”.
O
número quatro do jornal, relativo à primeira quinzena de junho de 1975, surge
como sendo órgão do Comité de Apoio às Lutas Populares. Nesse número o jornal
inicia uma campanha de assinaturas com vista a introduzir um conjunto de
alterações, de que se destacam o aumento da tiragem, a passagem do jornal de
policopiado a impresso numa tipografia e com vista a tornar possível a edição
de pequenos livros “sobre a história dos trabalhadores açoreanos em luta contra
o capitalismo e a burguesia local, a história do movimento operário nacional e
internacional, etc.”
Ainda
nesse número do jornal, parta além das questões internacionais como as lições a
tirar do golpe fascista de Pinochet no Chile e do combate à NATO, as questões locais
merecem destaque. Assim, um leitor denuncia a morte de “um filho à míngua”, um
grupo de trabalhadores, tendo como primeiro subscritor José Carreiro Pimentel,
da Junta Autónoma dos Portos do Distrito de Ponta Delgada denuncia o PPD como
sendo “reacionário e capitalista”, a redação do jornal denuncia o facto de na
Lomba da Maia, num cortejo religioso, obrigarem “as crianças inocentes a levar
a bandeira do P “P” D e a dar-lhe vivas”.
Por
último, é feita uma entrevista a um trabalhador despedido na freguesia da
Bretanha e é mencionada a luta dos trabalhadores do jornal Correio dos Açores
nos seguintes termos: Toda e qualquer tomada de posição frente ao jornal
fascista que era o “CORREIO DOS AÇORES é de saudar. Mais razão para isto, por
terem sido os próprios trabalhadores daquela empresa que ocuparam o jornal”.
Na
segunda quinzena de junho, saiu o número cinco do “Luta Pela Democracia
Popular” dedicado, em grande parte, à manifestação do 6 de junho de 1975.
No
texto “A quem serve a independência” pode
ler-se:
“No dia 6 de junho a
reação saiu. Mais uma vez a burguesia fascista tentou manobrar o povo
trabalhador, servindo-se dele para os seus fins.
Sob o pretexto da
resolução dos problemas da lavoura. A partir da injusta situação dos pequenos
lavradores, os fascistas, orientados pela CIA (organização terrorista do
Imperialismo Norte Americano) conseguiram levar os menos conscientes a gritar
“Independência”.
Aproveitaram-se ainda
desta manifestação para fazer crer ao mundo capitalista, através da NATO, que
esteve cá, que o povo estava com os fascistas açoreanos”.
Para
o jornal a ideia da independência dos Açores surge para garantir a manutenção
de privilégios de alguns e para travar a luta dos trabalhadores pelos seus
direitos, como se pode deduzir pelo seguinte texto:
“Para criar medo no povo,
para mais tarde poder dominar e matar como quisesse e entendesse, para
continuar a sua situação de “quero, posso e mando”, para oprimir o povo ainda
mais”.
Sobre
a adesão à manifestação propriamente dita, pode ler-se:
“Os camponeses pobres
iludidos pelas palavras “mansas” dos ativistas burgueses reacionários, vieram à
cidade em camiões dos patrões, com dia pago. Pensando que viriam reivindicar
melhores condições de vida, protestar contra a situação de miséria a que estão
submetidos”.
Ainda
sobre o ocorrido no dia 6 de junho, o jornal refere o exemplo dos marinheiros
nos seguintes termos:
“Vejamos o exemplo dos
camaradas marinheiros que armados foram no próprio dia 6 para a rua, mostrando
desde logo, aos fascistas que haveria oposição”.
Ainda
nesse número é feito um apelo aos camponeses pobres, é publicado um comunicado
de trabalhadores da Lomba da Maia e da Ribeira Funda a denunciar o despedimento
de tratadores de gado e é divulgado um comunicado dois trabalhadores da Fábrica
de Tabacos Micaelense a denunciar a receção de “telefonemas com ameaças, feitos
pela FLA”.
No
editorial do número seis, correspondente à segunda quinzena do mês de julho de
1975, o jornal discorda dos “falsos amigos do povo que nos querem fazer crer
que com as prisões feitas no 6 de Junho, tínhamos vencido, arrastando-nos para
mostrarmos confiança em indivíduos que não merecem” e alerta para “o perigo da
escumalha fascista atacar de novo”. Como exemplo desta “ameaça”, o jornal refere
“os panfletos fascistas que continuam a ser distribuídos na nossa ilha”, a
presença no liceu de “grupos da juventude da F”L”A [que] tentam criar um
ambiente de tensão, para melhor boicotarem as Reuniões Gerais de Alunos” e “o
preparar terreno pelo P “PD” …que com a sua hipocrisia muda de cor meia dúzia
de vezes por mês”.
Ainda
no referido editorial, o jornal denuncia que “notórios fascistas como José de
Almeida, prepararam a guerrilha urbana para S. Miguel (Portuguese Times, 26 de junho,
p.12) contratando comandos e bufos da Universidade”.
Para
além de textos sobre o colonialismo português e sobre a situação política na
Madeira, surgem outros de carácter mais “teórico”, como um sobre a “Relação
Explorador- explorado” e outro sobre o “Movimento Operário”.
O
número do jornal que vimos referindo dedica, também, alguns textos sobre a
situação no campo, nomeadamente sobre a vida dos trabalhadores rurais e dos
camponeses pobres e acerca dos exportadores de gado que “têm vindo a encher os
bolsos cada vez mais com o negócio da exportação de gado”.
Por
último, regista-se a presença de um pequeno texto de João Manuel Raposo Alves,
da JRA- Juventude Revolucionária dos Arrifes, onde o autor denuncia a situação
das estradas na sua freguesia e a falta de um parque infantil.
A
partir do número sete, setembro de 1975, o jornal deixa de ser quinzenal e
adquire a periodicidade mensal. Para além desta alteração é, também, anunciada
a criação de corpos redatoriais noutra ilha (Terceira?) e a intenção de criar
noutras.
Para
além da situação nacional, onde é dado destaque “à escalada reacionária e
fascista”, com “os burgueses” a recorrerem “ao boicote económico”, à
organização de “grupelhos fascistas, E”L”P (no continente), F”L”A (nos Açores)
e a “F”L”AMA (na Madeira) ” é dada destaque à situação na Madeira, através de
um texto sobre a “luta contra os fascistas-separatistas” levada a cabo pelo
povo do Machico.
Ainda
a nível nacional, o jornal saúda uma tomada de posição de três organizações
marxistas-leninistas que deram “a conhecer ao Povo Português a constituição de
uma Comissão Organizadora do Congresso para a reconstrução do Partido Comunista
Marxista-Leninista no nosso país”.
A
nível regional, é dado destaque ao “caso de um médico que quer estar ao serviço
do Povo” (Simas Santos, na ilha do Pico), à violência ocorrida em Vila Franca
do Campo e é transcrita uma entrevista a um morador que “esteve desde o início
na luta dos moradores pobres de Ponta Delgada por casas decentes”.
O
oitavo número do jornal é relativo aos meses de outubro e novembro de 1975 e é
quase todo dedicado a questões internacionais e nacionais. Contudo, a situação
política regional não é esquecida, sendo dado destaque à denúncia da atuação
dos separatistas, nos seguintes termos: “não conseguindo o apoio do Povo
Açoriano os fascistas/separatistas tentam intimidar a população de todas as
maneiras e para tal não hesitam em recorrer ao terror fascista lançando bombas
contra quem ousa fazer-lhes frente”
Relacionado
com este assunto, o jornal apresenta um pequeno texto onde relata a ação dos
pescadores de Vila Franca do Campo, contra o separatismo, que no dia 17 de novembro
concentraram-se na Praça Bento de Góis onde derrubaram todas as bandeiras da
FLA.
Ainda
neste número, o jornal volta a referir-se à luta do povo da Madeira, menciona a
situação em Angola, apresenta críticas ao PCP e publica um texto longo sobre o
social imperialismo russo.
Teófilo
Braga
20
de fevereiro de 2022
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