Base das Lajes: um atentado à vida
Dada
a localização dos Açores, no meio do Atlântico, entre dois continentes, na
Primeira Guerra Mundial instalou-se uma base naval e na Segunda Guerra Mundial
duas bases aéreas. No presente texto faremos, apenas, referência à utilização
pelos Estados Unidos da América, da Base das Lajes e outras infraestruturas a
ela associadas, na ilha Terceira.
Base
das Lajes tem servido ao longo dos tempos como instrumento de agressão e
morticínio de populações em várias partes do mundo e é um foco de poluição
ambiental associada à degradação da qualidade de vida da população da ilha
Terceira.
No
que diz respeito à utilização da Base das Lajes para espalhar a morte, não
pretendendo ser exaustivo, aqui vão alguns exemplos: em julho de 1958,
intervenção americana no Líbano com vista a proteger o “governo pró-Ocidente”; em 1973, apoio militar
aos israelitas durante a última guerra israelo-árabe; em 1975, envio de
material de guerra para as forças de direita no Líbano e entre agosto de 1990 e
fevereiro de 1991, escala e reabastecimento de aviões para a guerra do Golfo;
A existência de armas nucleares na ilha Terceira foi por diversas vezes
denunciada por várias entidades, nomeadamente num relatório da francesa
Fundation pour les Etudes de Defense Nacional, na década de 80 do século
passado. Como se sabe a presença de armas nucleares leva ao aumento da
radioatividade e esta associada um conjunto de problemas de saúde, entre os
quais doenças do foro oncológico.
Mais recentemente, o armazenamento de munições e de combustíveis e os
consequentes efeitos perniciosos na saúde das populações foi denunciado por uma
petição pública (1), em cujo texto se pode ler o seguinte:
“Já em 2005, há 12 anos,
foram identificados, pela força aérea dos Estados Unidos da América, 35 locais
contaminados com hidrocarbonetos e metais pesados nos solos e aquíferos da ilha
Terceira. Contaminação posteriormente confirmada, em 2009, pelo Laboratório
Nacional de Engenharia Civil (LNEC).
A saúde pública dos habitantes da ilha, é algo que tem vindo
a ser discutido localmente durante décadas. Atualmente, existe um medo palpável
entre a população devido ao número anormal de casos de cancro, e a suspeita do
mesmo estar relacionado com uma possível contaminação dos solos e aquíferos. Só
no concelho da Praia da Vitória incidem 33% dos casos de cancro nos olhos e 21%
de casos de cancro de colo do útero a nível regional, num concelho que
representa apenas 8,5% da população regional.”
Face aos problemas existentes, surgem várias reações por parte de
personalidades diversas ou das forças partidárias.
A esmagadora maioria das forças partidárias, ou ignora o assunto ou
pretende esconder o sol com uma peneira, não só desvalorizando a perda da
qualidade de vida e nunca pondo em causa a presença militar dos
norte-americanos. Assim, sendo cúmplices de todos os atentados cometidos, hoje,
após terem acordado de longa letargia, passaram a reivindicar a descontaminação
ambiental da ilha Terceira e a exigir que o Estado Português assuma as suas
responsabilidades.
Felizmente, a comunicação social dos Açores, nomeadamente o jornal
terceirense Diário Insular, tem dado voz a quem se preocupa com o problema e tem
divulgado relatórios e análises à água e aos solos. A título de exemplo, a 15
de agosto de 2019, aquele jornal anunciava que a água da Base das Lajes estava
contaminada com bromato, um produto químico sob suspeita de ser cancerígeno. O
mesmo periódico, no dia 9 de novembro de 2019, publicou um texto “intitulado
“Contaminação degrada na Terceira todas as formas de vida”, onde um americano
confessa que mais do que a questão dos cancros, o grande problema é o da
bioacumulação que põe em causa toda a qualidade de vida, em geral, e em
particular, está na origem, mais cedo ou mais tarde, de várias doenças
responsáveis pela diminuição da esperança de vida”.
A comunidade científica que poderia ser útil no esclarecimento das
populações com verdade e sem alarmismos, está dividida. Se a grande maioria
mantém-se em silêncio absoluto, muito poucos alertam para a gravidade dos
problemas e apelam à necessidade urgente de se proceder à descontaminação e outros
há que quando se fazem ouvir é para “chamar de alarmistas” aos colegas e para tentar
branquear a situação, afirmando que apesar da contaminação, afinal nada de
grave se passa.
Uma das poucas pessoas que não se tem calado é o professor da Universidade
dos Açores, Félix Rodrigues, que, por várias vezes, tem denunciado o secretismo
que pretendem que exista em torno do assunto. No Diário Insular de 21 de
dezembro de 2018, Félix Rodrigues afirmou o seguinte: “Tanto Lisboa como os EUA
têm muito que explicar aos açorianos e terceirenses em particular. A explicação não deverá ser somente
filosófica ou política, mas concreta, onde se deve dizer o que se fez, passo a
passo e com que tecnologia. É incompreensível que o controlo da descontaminação
seja feito sem a participação de quem é afetado. Faz sentido que quem me pode envenenar
seja a pessoa que me faz o tratamento de cura, sem que tenha conhecimento
disso? Isso é no mínimo incompreensível e pouco ético.
José Soares
Letra a Letra nº 9, fevereiro de 2020
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