quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Sindicalismo agrícola em São Miguel

 


Sindicalismo agrícola em São Miguel

Com este texto, para além de registar uma época da nossa história recente, pretendo homenagear todos os trabalhadores rurais da nossa terra. Como não posso nomear todos, aqui ficam os nomes de alguns, pedindo perdão aos que involuntariamente esqueci, que trabalharam as terras que transitoriamente estou a cuidar: Durval Carreiro (Carreirinho), Artur (da Canada), Eduardo Vicente, José Brum, João Salema, Manuel de Sousa, José Fernando Araújo, Gilberto Mansinho e Carlos Agostinho

 

De acordo com as estatísticas, em 1970, existiam no distrito de Ponta Delgada (ilhas de Santa Maria e São Miguel) 14 310 assalariados rurais, o que correspondia a 65% da população rural do distrito.

 

Com o golpe de estado de 25 de abril de 1974, impulsionados por partidos de esquerda foram criados em 1974 e 1975 vários sindicatos de trabalhadores rurais na ilha de São Miguel que, de acordo com um texto não assinado publicado, no nº 2 da revista “Trabalho”, de novembro/dezembro de 1981, eram “dirigidos em grande parte por sindicalistas não reformistas próximos do MES”.

 

Em algumas localidades da ilha de São Miguel, com destaque para o Pico da Pedra e a Fajão de Baixo realizaram-se reuniões de trabalhadores rurais. A título de exemplo, regista-se a reunião realizada no Pico da Pedra, a 1 de maio de 1975, com a presença de trabalhadores rurais de Santa Cruz e do Rosário, do Livramento, das Capelas, de São Vicente Ferreira e do Pico da Pedra e a realizada, a 29 do mesmo mês, na Junta de Freguesia da Fajã de Baixo que contou com a presença de “cerca de 50 camponeses representando à volta de 11 freguesias micaelenses”.

 

Embora não possuamos dados, cremos que terá sido diminuto o número de trabalhadores rurais sindicalizados na ilha de São Miguel e a sua duração foi efémera. Sobre esta, na revista referida que tinha como um dos administradores o micaelense Eduardo Pontes, em 1981, existia apenas um Sindicato Agrícola, resultante da fusão dos anteriores, mas que vivia da atividade de um funcionário e não tinha implantação na maioria das empresas agrícolas, não desenvolvia qualquer trabalho sindical ou atividade reivindicativa.

 

A fusão dos vários sindicatos de trabalhadores rurais ocorreu em julho de 1978, tendo numa reunião realizada na Fajã de Baixo, que contou com a presença das direções dos Sindicatos dos Trabalhadores Rurais da Lagoa, do Livramento, do Pico da Pedra e da Cultura do Ananás, da Fajã de Baixo, sido eleita a Comissão Diretiva Provisória do agora designado Sindicato dos Trabalhadores Agrícolas de São Miguel, que ficou constituída por José Luís Pereira da Ponte (presidente) e José Horácio (tesoureiro).

 

Quais eram as principais reivindicações dos sindicatos agrícolas de São Miguel, em 74/75?

 

Para responder a esta questão, por falta de bibliografia disponível, socorremo-nos de um comunicado da Comissão Pró-sindicato dos Trabalhadores Rurais do Concelho de Vila Franca do Campo que, de entre outras medidas urgentes que deveriam ser tomadas pelas autoridades e pelas Forças Armadas, referia as seguintes:

 

1-      Fim dos despedimentos;

2-      Proibição da criminosa prática de deixar de cultivar milho, batatas e feijão, entre as vinhas, por conduzir à diminuição da produção e aumento dos despedimentos.

3-      Proibição do arranque das vinhas para transformação dos terrenos em pastagens.

 

Por parte dos proprietários e dos rendeiros, a criação dos Sindicatos não foi bem vista. Com efeito, se as exigências dos trabalhadores rurais não afetavam muito os grandes, para os pequenos e médios, a situação não era bem assim, pois, não organizados em cooperativas de produtores, era-lhes difícil suportar o aumento das despesas já que não tinham, muitas vezes, garantida a venda dos produtos da terra.

 

Na altura, alguns dos dirigentes foram intimidados e alguns trabalhadores aconselhados a não aderirem aos sindicatos por “estarem ligados ao Partido Comunista”. No Pico da Pedra, segundo o jornal Voz Popular, de abril de 1977, o presidente do Sindicato daquela freguesia, sr. António Brum, “foi alvo de uma queixa a aguardar sentença em tribunal, por parte de duas entidades patronais” pelo facto de, segundo os queixosos, ser também sócio do Sindicato dos Estufeiros.

Teófilo Braga

(Correio dos Açores, 32229, 9 de setembro de 2020, p.11)

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