sábado, 9 de março de 2024

Sanguinho


Sanguinho

O sanguinho (Frangula azorica Grubov) é uma espécie endémica dos Açores, pertencente à família Rhamnaceae, que é mais frequente nas ilhas Terceira, Pico e Flores e não existe em Santa Maria e na Graciosa.

O sanguinho é uma árvore caducifólia que pode atingir 10 m de altura, com folhas elípticas, acuminadas e pubescentes na página inferior. As flores, que podem ser vistas nos meses de abril, maio e junho, são amarelo-claras. Os frutos são carnudos, globosos e de cor vermelha a negra quando estão maduros.

Na sua obra Saudades da Terra, Gaspar Frutuoso por várias vezes se refere à planta e aos frutos do sanguinho.

Ao descrever Vila Franca do Campo, no capítulo XL do Livro IV, menciona o seguinte: “Vindo da vila, pelo caminho comum por dentro da terra, antes de chegar a São Lázaro, está a grota do Sanguinho, por ter ou haver tido ali algum, perto do mesmo caminho.”

No capítulo XLVIII, do livro IV, aquele cronista faz referência ao sabor dos frutos do sanguinho nos seguintes termos:

“As árvores, que aqui tornam a arrebentar, são faias, se Ihe não tiram a casca, uveiras, urzes, louros, tamujos, murtas e ginjas, cortando o tronco, que do pé lançam muitas e muito altas vergônteas, que são árvores agrestes, que dão um fruto tão grande e vermelho como ginjas, mas ao gosto são azedas, e o sanguinho dá outro fruto como cerejas, muito doce, que embebeda.”

Ao escrever sobre a ilha Terceira, no livro VI, Gaspar Frutuoso escreve o seguinte: “Da ilha das Flores vem madeira de cedro pera caixas e alguma de sanguinho, muitas lãs e enxergas, e pano feito da terra, branco e preto e de méscara …”

De acordo com Vieira, Moura e Silva (2020), a espécie é “dispersa a rara em ravinas, em florestas de Laurus, de Juniperus-Ilex e bosque de Juniperus (…) geralmente entre 500-700 m de altitude.”

Henry Drouet (1861) sobre o sanguinho escreveu o seguinte: “Linda árvore nativa, cuja madeira, dura e avermelhada, é utilizada por marceneiros.”

De acordo com Ramos (1871) o sanguinho é uma “bella arvore indígena, de cuja madeira, dura e avermelhada, fazem não pouco uso os marceneiros.”

Foi também ao sanguinho que os primeiros povoadores foram buscar o vermelho com que tingiam o seu vestuário.

A presença de sanguinhos deu o nome a algumas localidades ou sítios. Gaspar Frutuoso refere os sítios do Sanguinhal, do Sanguinheiro e do Sanguinho. Hoje, quem não conhece na ilha de São Miguel, o trilho pedestre do Sanguinho, na freguesia do Faial da Terra?

O sanguinho nos últimos anos passou a ser usada como espécie ornamental, podendo ser vista em alguns parques e jardins. Na ilha de São Miguel existe no Parque Terra Nostra, no Jardim Botânico José do Canto e no Parque pedagógico infantil Maria das Mercês Carreiro na freguesia do Pico da Pedra.

O sanguinho é também uma planta referida na poesia popular. Abaixo, transcrevo uma quadra citada pelo padre Ernesto Ferreira no seu livro “Ao espelho da tradição”, publicado em 1943:

São Martinho, meu patrão,

Feito de pau de sanguinho,

Consolai-me esta goela

C’uma pinguinha de vinho.

Teófilo Braga

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