sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Açafroa


Açafroa

A açafroa, açaflor ou saflor cuja designação Carthamus deriva do hebraico kartami, que significa tingir, foi uma das plantas tintureiras mais importantes até ao aparecimento dos corantes químicos. Pertencente à família Asteracea, a açafroa (Carthamus tinctorius L.) é originária do Irão.

Nos Açores, a açafora é cultivada em todas as ilhas, mas no Faial, Flores e Graciosa é possível encontrar escapada da cultura sobretudo em terrenos abandonados e com entulhos.

De acordo com o camponês Carlos Agostinho (2024), natural e residente na Ribeira Seca de Vila Franca do Campo, a sementeira faz-se no final de fevereiro, colocando-se 3 sementes em cada caseira que devem estar separadas de 30 a 40 cm umas das outras.

Silvano Pereira (1947) sobre o cultivo da açafroa escreveu o seguinte:

A eclosão das flores realiza-se em Julho e Agosto, saindo primeiramente as periféricas e depois as do centro da inflorescência, por uma estreita abertura do invólucro capitular. Semeia-se em linhas, em Março ou Abril, nas margens das hortas ou dos quintais, perto da casa de habitação do cultivador, para facilitar a colheita.

Para isso, abrem-se sulcos de 10 a 15 centímetros de profundidade, aduba-se com um pouco de estrume consumido e lançam-se as sementes (aquênios) que se cobrem com uns 10 centímetros de terra. Como amanhos culturais, procede-se a um desbaste e uma ou duas sachas.

Por ocasião da floração, cortam-se as flores (que desabrocham dos capítulos) de dois em dois dias, servindo-se da unha do dedo polegar apoiada no indicador. Esta colheita faz-se de-manhãzinha, quando as folhas estão brandas e os espinhos menos acerados. Retiradas as primeiras flores desabrochadas (corolas e estiletes), outra camada de flores vai eclodir para ser cortada, e assim sucessivamente, por uma ou duas semanas.

A açafroa é uma planta herbácea, anual, que pode atingir 1,5 m de altura. Apresenta caules glabros, folhas serradas e espinhosas e capítulos isolados amarelo-alaranjados. As flores surgem normalmente entre junho e setembro. Os frutos são aquênios brancos, tetragonais, glabros.

Cultivada em alguns países como planta oleaginosa, nos Açores é usada essencialmente para fins culinários e no passado na medicina popular.

Sobre o seu uso nos Açores, Silvano Pereira (1947) escreveu o seguinte:

“As flores colhidas expõem-se ao sol a secar em tabuleiros e, quando secas, são moídas por processos rudimentares, geralmente, amassados dentro dum saco de pano, resultando um pó alaranjado, que se guarda em frascos bem rolhados—a farinha de açafroa. Serve este pó para condimentar e corar molhos e guisados, como substituto do pimentão doce ou colorau. É um condimento fundamental do famoso “molho de vilão”. O o seu emprego típico e tradicional é nas açordas — caldo magro usado pela gente pobre, confeccionado com água, sal, banha, cebola e alho e a competente açafroa, que lhe dá o cheiro e o gosto peculiares.”

Em 1997, Yolanda Corsépius refere o seu uso como digestiva e purgante e acrescenta que as “folhas ou as sementes deitadas no leite servem para o coalhar”.

O terceirense Augusto Gomes, para além de mencionar o seu uso como corante na doçaria, menciona o facto de “alguns antigos livros de casas morgadias” darem-nos “a receita de uma tisana feita com os filamentos amarelos da flor, eficaz para a asma, coqueluche e doenças nervosas”.

O mesmo autor no seu livro “A Alma da Nossa Gente” apresenta a receita de um xarope destinado às crianças na fase da dentição que apresentava a seguinte composição: açaflor (3g), tamarindo (30 g), mel de abelha (200 g) e água (100 g).

No livro “Plantas e produtos vegetais em fitoterapia” é mencionado a utilização do óleo na prevenção da aterosclerose e em micoses. O mesmo livro aconselha a não utilização de “preparações à base de flores, nem sementes, durante a gravidez”.

Teófilo Braga

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